O eleitor de esquerda seria claramente contra: afinal de contas, quando faltam recursos para as escolas, para os serviços públicos mais elementares, quando existem pessoas na miséria, estar a usar esses recursos para favorecer um conjunto de indústrias cuja actividade contribui para a degradação do meio ambiente é «juntar o insulto à injúria».
O eleitor de direita também seria claramente contra: com o país a endividar-se mais em cada ano, e sendo os impostos sobre os pequenos e grandes negócios a seu ver excessivos, seria ainda mais grave uma intervenção do estado na economia que inevitavelmente distorce o funcionamento do mercado livre.
Havendo uma posição comum por grande parte do eleitorado que ultrapassa o posicionamento ideológico, é expectável que num sistema democrático nem um tostão seja usado pelo estado para subsidiar as empresas petrolíferas, certo?
Errado: entre 78 e 150 mil milhões de dólares todos os anos são gastos em subsídios a esta indústria. Para dar uma ideia da dimensão do gasto, posso dizer que se poderiam construir todos os anos 15-30 aeroportos como o que tem dado tanta polémica cá em Portugal. Ou que o maior projecto científico internacional (que inclui aos EUA, a Europa, o Japão, a Coreia do Sul, a Rússia, a China e a Índia), também na área da energia, custará ao longo dos 30 anos estipulados (incluindo construção e operação) cerca de 15-7% desse valor, e existem dificuldades políticas fortes para manter o seu financiamento.
Por um lado, existe um consenso entre os eleitores que ultrapassa o posicionamento ideológico, e por outro lado um conjunto de políticas efectivamente seguidas que vai no sentido diametralmente oposto. Como explicar esta discrepância?
O que acontece é o seguinte: nos EUA uma empresa pode, legalmente, dar contribuições de campanha para as eleições individuais dos diferentes candidatos a membros da Câmara dos Representantes do Senado. Tomemos um congressista em particular, com vontade de ser reeleito: ele sabe que terá acesso a mais fundos para a sua campanha caso vote favoravelmente à criação/aumento de subsídios para estas empresas. Por outro lado, sabe que os eleitores atentos vão penalizá-lo nas urnas por tomar uma decisão que não os agrada. Se a sua preocupação exclusiva é a reeleição, ele terá de reflectir sobre o que é que lhe custa mais votos: abdicar de fundos de campanha que podem ser usados para comprar anúncios, cartazes, telefonemas, e outras ferramentas de persuasão que tais; ou abdicar directamente dos votos de eleitores atentos e informados que deixarão de votar nele por causa desta decisão.
Quanto maior for a proporção de eleitores atentos e informados, menos peso têm anúncios e cartazes, mais peso têm as decisões efectivas dos congressistas naquilo que são os seus resultados eleitorais. Mas esta proporção é tão baixa, que grande parte dos votos dos congressistas são contrários à vontade do seu eleitorado.
Seja nos EUA ou em Portugal, os grupos de interesse conseguem lucrar à custa do desinteresse dos cidadãos, prejudicando-os.
Por outro lado, se um político honesto defender o interesse comum dando menos importância às contribuições de campanha ou outro tipo de «ajudas» que os interesses privados podem propiciar, é num ambiente de eleitores informados e atentos que triunfa, e num ambiente de eleitores indiferentes e desinteressados que fracassa. Todos nós que criticamos os políticos profissionais temos de ter bem presente que se são desonestos e incompetentes a culpa é da falta de informação e interesse do eleitorado - é nossa.
O preço que um cidadão paga pelo seu desinteresse em política é elevado. Manifesta-se nestas questões concretas, e o seu alcance ultrapassa os aspectos financeiros: desde a economia, o emprego, a educação, a saúde até às liberdades fundamentais, se os cidadãos não se interessam acabam por sair derrotados.
Platão dizia «O preço que os homens bons pagam pela sua indiferença à política é serem governados por homens maus». Em diferentes sociedades no espaço e no tempo, se existe um sistema democrático, esta frase é verdadeira.
4 comentários :
E já agora, uma posição que vai de encontro à sua, no fundamental, é a anarco-capitalista. O fim do Governo implicaria o fim da classe burocrática e dos subsídios dados pela mesma às grandes empresas capitalistas.
nando:
O exemplo foi escolhido precisamente porque quase todas as posições do espectro ideológico estão de acordo. Cerca de 80% do eleitorado é contra tais subsídios e isso inclui opiniões mais moderadas e mais extremas, de esquerda e de direita.
Que os anarco-capitalistas estejam contra tais subsídios não é estranho, mas os comunistas também estão.
Mas é evidente que não é necessário ser pelo fim do estado para defender o fim desses subsídios em particular.
O que o exemplo tem de curioso, repetindo a ideia do texto, é que os legisladores eleitos fazem algo que vai contra a vontade de cerca de 80% do eleitorado.
E isto explica-se tendo em conta a falta de participação política do mesmo.
Os grupos de interesse triunfam à custa dos cidadãos, de forma contraria ao bem comum, quando os eleitores não estão atentos e vigilantes. Este é um exemplo concreto, e espero que tenha algum poder de persuasão para com aqueles que não se interessam por política.
bou já copiar algum poder de persuasão...asão...para dar um dia destes em fascículos em DesFormação Cívica ou Em Atira Pedrada no JãoBasko
Cerca de 80% do eleitorado é contra tais subsídios...ó jã ranhoca 50% do eleitorado não vota e está-se lixando 40% vota por hábito modas ou por quem lhe avança mais
10% se tanto são votantes que compreendem (ou pensam que compreendem ) as subtilezas ideo ilógicas subjacentes
com uma falta das tais grandes super-empresas no mundo ocidental todo o discurso é...é jãbasquista?
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