terça-feira, 24 de janeiro de 2012

A importância de uma cidadania atenta - II

Em resposta a apelos como os que fiz no texto anterior sobre este tema, muitas pessoas justificam o seu desinteresse por política com base na sua impotência. Não é apenas sentir que «os políticos são todos iguais», é sentir que o esforço todo de descobrir quais os mais honestos e competentes, quais as políticas que têm melhores e piores consequências, não justifica face à pequena diferença que um voto faz. E por um lado têm razão, mas por outro não têm nenhuma. Para que se compreenda o que estou a dizer, convido o leitor a fazer um exercício de imaginação.

Estão 10 pessoas sentadas à volta de uma mesa laboratório: serão cobaias de uma experiência. A cada uma destas pessoas serão entregues 20 moedas de 1€, e cada uma terá de decidir quantas moedas vão para a mesa e quantas vão para si. O pessoal do laboratório tem instruções para duplicar a quantia de dinheiro que estiver na mesa, e depois dividi-la igualmente pelos participantes (independentemente de quem e quanto cada um contribuiu). Os participantes não podem falar uns com os outros, e tomam a decisão simultâneamente sem qualquer possibilidade de conhecer as decisões dos outros jogadores. No fim podem reter todo o dinheiro que tenham destinado para si, e a tal décima parte do dobro do dinheiro que tiver sido colocado na mesa (20%).

Do ponto de vista colectivo, qual a melhor estratégia para maximizar os ganhos? Quanto mais dinheiro for partilhado, mais ganham os participantes. A melhor estratégia é mesmo colocar todo o dinheiro na mesa: se os dez participantes fizerem isso, cada um irá para casa com 40€, perfazendo um total de 400€: melhor é impossível.

E do ponto de vista individual? Tendo em conta que cada participante não tem qualquer poder sobre as decisões dos outros, que não as pode influenciar, a melhor estratégia é diferente: independentemente da sua decisão, irá sempre receber 20% daquilo que os outros jogadores tiverem colocado. Quanto às suas moedas, o participante receberá uma moeda adicional por cada cinco que colocar na mesa, mas receberá a totalidade daquilo que destinar para si. A estratégia que maximiza os ganhos é a oposta: é não colocar nada na mesa.

Claro que se todos os participantes seguem esta estratégia, todos eles acabam por ficar a perder. Cada um ganha 20€, perfazendo um total de 200€, que é o total mínimo para o conjunto dos participantes.

É esta discrepância entre aquilo que é melhor para cada participante individualmente e aquilo que é melhor para todos no seu conjunto que está no coração da necessidade de sistemas morais, que condenam desde o furto ao homicídio, entre tantas outras coisas dependendo em grande medida da intuição a respeito das acções que mais prejudicam o bem comum.

Com o voto passa-se algo semelhante: cada um de nós pode investir tempo e esforço para reflectir debater e discutir a respeito de quais as melhores opções, quais as melhores políticas, quais as melhores leis. Se um português dedicar em média cerca de 30 minutos por dia (ou dois dias por mês, de 8h em cada) a informar-se, a reflectir e a debater, o tempo gasto neste esforço ao longo de uma legislatura valeria cerca de 4000€ se remunerado ao valor do salário médio. Mas as decisões face aos votos nesse período vão ter um impacto directo na gestão de cerca de 40 000€ por eleitor (não considerando a venda de activos, que fariam este valor disparar), além de afectarem questões fundamentais (liberdade de expressão, liberdade de associação, igualdade perante a lei, etc..) de valor virtualmente incalculável. O voto é um instrumento poderoso como se pode constatar por todo o esforço de persuasão e propaganda em seu torno.
O problema, é que, como no caso da mesa, o eleitor acaba por usufruir de uma pequeníssima parte do seu esforço individual (menos de meio cêntimo, fazendo a analogia). Ser um eleitor consciente é portanto uma decisão extremamente racional do ponto de vista colectivo, mas irracional do ponto de vista de um indivíduo sem qualquer empatia pelos outros.

É aqui que entra a moralidade. Há sociedades onde os cidadãos, pela atenção que dedicam às decisões que têm de tomar em comum (a política é isso: chegar a decisões colectivas) acabam por conseguir construir sociedades mais prósperas e humanas, sendo representados por políticos mais honestos e competentes. Para que isso aconteça existe certamente uma diferença de valores: considera-se que existe um dever de participação política, em relação ao qual ninguém se deve abster.

Note-se que sou visceralmente contra o voto obrigatório ou qualquer forma coerciva de levar as pessoas a participar politicamente. O dever a que me refiro deve ser um dever moral, que decorre da empatia que devemos sentir uns pelos outros, e não um dever legal.

Se cada um de nós contribuir com o seu tempo e esforço, existirão menos políticos corruptos e incompetentes, e as decisões destes corresponderão aos nossos valores e opções colectivas - e portanto, havendo valores e perspectivas diferentes existirão sempre eleitores insatisfeitos - mas não tanto à satisfação de interesses privados inconfessáveis, o que será melhor para todos.

5 comentários :

E agora para algo con pateta mente diferencial disse...

Muitas pessoas justificam o seu desinteresse (pela ) (e não por) política(,) (Baseados) com base na sua impotência (perante ela?).

Não é apenas sentir que «os políticos são todos iguais», é sentir (repetição) que o esforço todo de descobrir quais os mais honestos e competentes?(ca raio), quais as políticas que têm melhores e piores consequências, não justifica face à pequena diferença que um voto faz. E por um lado têm razão, mas por outro não têm nenhuma. Para que se compreenda o que estou a dizer,(o que tentei e mal escrever?)

convido o leitor a fazer um exercício de imaginação....

imagino que fumaste alguma coisa da pesada?

nazies é a palavra de verificação

faz sentido em cada esquerdista há um nacional socialista escondido

A Fénix de Schroedinger disse...

Ao comentador anterior: Tens algum comentário útil a fazer ao conteúdo do artigo ou apenas verborreia rica em adubo para plantas mas esterilizante do debate, terminada com uma frase que podia ser do Estaline?

João Vasco disse...

roskoff:

Quando aprenderes a escrever, não se tornará ridículo quereres dar lições.

Unknown disse...

Excelente exemplo convenientemente simplificado para possibilitar uma melhor compreensão do fenómeno associado!

De facto, consegue clarificar esta problemática.

Não sei se te apercebeste do completo alcance deste modelo.

Tal como disseste, por cada 5 moedas que põe na mesa, o jogador só ganha 1, ou seja, por cada 5 moedas na mesa, perde 4. É claramente vantajoso não colocar nenhuma na mesa. Até porque ele continua a receber um quinto do bolo...

E é aqui que entra o factor "esperteza saloia"...
O jogador, sabendo que continua a ganhar um quinto do bolo, pensa:
"epa, eu não vou colocar nenhum na mesa, por que só perco, e se os outros tansos colocarem o dinheiro todo na mesa, eu ainda consigo mais do que se todos colocássemos o dinheiro todo na mesa!!"

É claro que se todos pensarem assim, isto tende para todos ficarem apenas com os €20, ao invés dos €40, que teriam se todos contribuíssem. Mas se realmente todos puserem o seu dinheiro todo na mesa, excepto o jogador, ele conseguiria ir para casa com um máximo de €56!

No caso individualista mais sofisticado, o jogador sabe que tem de garantir que o total da mesa é igual ou superior a €100 para sair a ganhar.

Assim, estabelecendo um paralelo com os impostos, o indivíduo tenta pagar o mínimo de impostos e tem de se assegurar que os outros colocam na "mesa" o suficiente.

É, assim, um claro exemplo para a justiça social!

Maquiavel disse...

Muito bem visto, Filipe!

Ora cá está um argumento de peso para subir os impostos aos ricos, que näo por acaso säo quem mais foge aos impostos: fazê-los pagar mais impostos beneficia a sociedade em geral, incluindo (até com efeito multiplicador) os próprios ricos.
De certo modo foi isso que os nórdicos (até os ricos) perceberam logo em 1917...