Há quem afirme que uma questão política crucial é saber se queremos igualdade de oportunidades ou igualdade de resultados. Dificilmente poderia discordar mais.
terça-feira, 31 de janeiro de 2023
Igualdade de oportunidades ou igualdade de resultados? Sim!
quarta-feira, 14 de dezembro de 2022
A "Obsessão" do Défice e a "Nova Teoria Monetária"
A revista "A Gralha" publicou um artigo que escrevi chamado "A Obsessão do Défice".
Nele argumento que a preocupação com a consolidação orçamental é a única forma de alcançar objectivos de esquerda no médio/longo prazo, e que a esquerda deveria ser mais «obcecada com o défice» do que a direita.
O argumento principal é que receitas fiscais superiores às despesas correntes (e depreciação) aumentam o património público e vice-versa.
Depois, tal como um património positivo tende a originar rendimentos, que podem aliviar a carga fiscal, um património negativo tem associados encargos, que vão acentuar a carga fiscal. Como uma proporção relevante das receitas fiscais do Estado provém de impostos sobre o trabalho, um Estado cujo património líquido seja muito negativo é um Estado que cobra impostos aos trabalhadores para pagar juros aos credores, redistribuindo do factor trabalho para o factor capital, exactamente o oposto daquilo que a esquerda tenciona fazer.
No texto esclareço o que está em causa é o saldo médio, não existência de políticas contra-cíclicas (que se recomendam). Também argumento que, por muitas críticas justas e legítimas ao euro e BCE, este mecanismo teria lugar (e teve lugar, e frequentemente tem lugar) em contextos de completa autonomia monetária.
O texto nunca refere a "Nova Teoria Monetária" (NTM), mas queria dizer ainda algumas palavras sobre a relação entre essas ideias e as do texto (carregue em "ler mais" para continuar).
quinta-feira, 17 de novembro de 2022
Globalização e Democracia
A revista "A Gralha" publicou um artigo que escrevi chamado "Globalização e Democracia".
O artigo é mais para o longo, mas expõe em linhas gerais a minha perspectiva política sobre as causas dos problemas políticos, económicos, sociais e ambientais que o mundo enfrenta e o que podem a UE e os EUA fazer para os resolver.
Argumento que, face ao alargamento dos mercados, urge também alargar geograficamente os espaços de exercício do poder democrático, e que os défices democráticos a essa escala geográfica mais elevada acabam por ter efeitos catastróficos que se reflectem no aumento das desigualdades, insustentabilidade ambiental da actividade económica, ascensão da extrema direita, etc.
Pelas mesmas razões, importa também mudar radicalmente a política de comércio.
quarta-feira, 26 de outubro de 2022
Este post vai contra os padrões de comunidade do facebook
Algures numa discussão de facebook coloquei o seguinte comentário:
«
" e o superávit no sector privado"
»
O facebook considerou que violava os padrões de comunidade e embora me tenha dado oportunidade de exprimir a minha discordância com a decisão, afirmou não ter recursos para a rever.
Aparentemente dizer que a esquerda devia ser orçamentalmente responsável vai contra os padrões de comunidade do facebook.
quarta-feira, 21 de setembro de 2022
O T de «LGBT»
Os chamados «direitos trans» têm sido tratados nas redes sociais e nos media como se estivessem na continuidade direta das reivindicações LGB das últimas cinco décadas. Todavia, colocam problemas políticos muito diferentes, nomeadamente:
- Legitimam intervenções médicas irreversíveis em menores de idade;
- Geram conflitos de direitos com outros grupos (concretamente, as mulheres);
- Exigem da sociedade muito mais do que a mera indiferença.
1. Existem crianças e adolescentes que reportam algum desconforto com o carácter sexual do seu corpo. Numa abordagem mais médica, trata-se de uma «disforia de género» que deve ser acompanhada e tratada; numa abordagem politizada, uma «identidade de género» que deve ser celebrada e afirmada (primeiro com bloqueadores de puberdade, depois com hormonas do sexo contrário, e finalmente com operações cirúrgicas). De passagem: há quem não tenha aprendido a importante lição que politizar a biologia e a medicina nunca dá bons resultados. Mas adiante: pessoas que ainda nem cidadãos plenos são (e não podem casar, trabalhar, ser presos, etc) não têm maturidade para tomar decisões irreversíveis sobre a sua saúde. Não têm, e fora da bolha trans não se encontra quem generalize esta presunção de maturidade precoce para outras áreas da vida.
Como se sabe, a puberdade é quase sempre traumática (ainda mais para as raparigas do que para os rapazes): inclui muito desconforto físico e psicológico com mudanças anatómicas, fisiológicas e sociais. Mas a puberdade não é uma doença e não é de certeza prudente «tratar» as angústias da adolescência deixando pessoas mutiladas ou inférteis para o resto da vida (notar que existem testemunhos trágicos, embora estatisticamente pouco significativos, de pessoas arrependidas de «transições de género» que as prejudicaram fisicamente sem melhorar a sua saúde mental). E não deixa de ser contraditório e chocante que uma sociedade que tenta eliminar (e muito bem) a mutilação genital de menores em nome da cultura ou da religião assista sem reação à defesa de procedimentos médicos irreversíveis (até cirúrgicos) em menores em nome da «identidade de género».
Politicamente, defendo que o direito dos adultos a disporem de si próprios tenha poucos limites. Quer a morte assistida quer a mudança anatómica de género me parecem dentro desses limites em adultos esclarecidos das consequências e devidamente acompanhados (mas, mesmo nesses casos, não é assunto para celebrações ou likes de redes sociais). Inaceitável é efetuar procedimentos irreversíveis (hormonais ou cirúrgicos) em menores de idade.
2. Existem óbvios conflitos de direitos entre as reivindicações trans e as feministas. Considerem-se dois casos: os espaços segregados e os desportos.
Nos espaços segregados, é óbvio que mulheres trans correm um grande risco de violência em prisões masculinas (por exemplo); mas também deveria ser óbvio que mulheres trans não operadas colocam em risco mulheres não trans em prisões femininas. Este conflito de direitos existe também (com menor gravidade) em enfermarias hospitalares ou vestiários. E é improvável que exista uma solução que acomode perfeitamente os direitos de ambos os grupos. Teremos que viver com uma situação confusa e conflituosa? Já não será mau se se reconhecer que os direitos de cada um acabam onde começam os dos outros. O que no caso do movimento trans será difícil: é um típico movimento identitário, que não considera que as reivindicações do seu grupo possam ser limitadas por qualquer outro grupo.
Nos desportos, a existência de categorias segregadas por sexo garante que as mulheres ganhem medalhas e, no caso dos desportos de contacto, que os pratiquem em segurança. O movimento trans reivindica que qualquer pessoa que se auto-identifique como mulher (ou que esteja legalmente reconhecida como mulher) possa concorrer nas categorias femininas. Ora, é simplesmente injusto: atravessar a puberdade com biologia masculina e a correspondente dose maciça de testosterona tem consequências na força muscular, na resistência, e na solidez óssea (e na altura). Consequentemente, há vantagem masculina na quase totalidade das modalidades (com exceções como a ultra-maratona e o tiro ao arco).
3. Finalmente, e deixando de lado as reivindicações dos dois pontos anteriores, o movimento «trans» não se satisfaz com o apoio dos ativistas e a indiferença da maioria. Exige de toda a sociedade a adesão a um conjunto de conceitos pseudo-científicos, a formas de tratamento pouco convencionais, no limite a uma linguagem (dita «inclusiva»).
Compreensível, por outro lado, é que as pessoas adultas que concretizam uma transição de género, mesmo que apenas social, queiram ser tratadas por outrem pelo género com que se identificam. É o menor dos problemas e não deve ser razão para conflitos. Já redefinir os conceitos de «homem» e «mulher» de forma a significarem «aquilo que as pessoas dizem ser» dificilmente será completamente exequível. Há contextos em que será sempre necessário distinguir sexo feminino e sexo masculino. Por exemplo, o aborto é um direito das pessoas do sexo feminino (e não de «todos os géneros»); e o cancro da próstata é um problema das pessoas do sexo masculino (e não de «todos os géneros»). Perde-se bastante em contextos médicos e científicos (e políticos?) se se fizer a categoria «género» predominar sobre o «sexo».
Já agora: é falso que em Portugal exista «género atribuído à nascença». O que acontece, como todos sabemos, é que a partir da observação genital do nascituro se define a categoria legal «sexo (M/F)». Não resulta daí nenhuma classificação na categorial social «género».
Finalmente, se a minoria de ativistas acredita que vai impor toda uma nova linguagem à totalidade da população, vive numa ilusão (e querer que todos saibamos todas as definições de categorias de género e de orientação sexual existentes começa a ser, na fase atual de fúria classificativa com multiplicação infindável de caixinhas, uma exigência quase sádica). Mais: a maioria de indiferentes, se forçada a mudar - por imposição ideológica - de linguagem e de conceitos básicos como homem e mulher, pode chatear-se. É que a maioria gostaria presumivelmente de continuar indiferente a estas questões.
Aconteça o que acontecer, já sabemos que quando as tropas de Putin chegarem à fronteira do Caia não estaremos a discutir quantos anjos cabem na ponta de um alfinete, mas sim em quantos géneros se divide a espécie de primatas a que pertencemos. E se houver mobilização geral, os homens terão uma escapatória: declararem-se mulheres ou não binários.
sábado, 28 de maio de 2022
Peso dos salários no PIB, esquerda e direita
Uma das métricas mais importantes (e simples de medir) para aferir se as políticas económicas são de esquerda, direita ou de centro é a evolução do rácio entre os salários e o PIB: políticas de esquerda tenderão a aumentar o rácio; políticas de centro tenderão a manter o rácio e políticas de direita tenderão a reduzi-lo.
Nas últimas décadas este rácio tem descido na generalidade dos países, e em particular na OCDE e em Portugal:
(A primeira imagem corresponde a cálculos meus feitos a partir da Penn World Table, enquanto a segunda imagem corresponde a cálculos de Paulo Coimbra e João Rodrigues publicados na edição portuguesa do Le Monde Diplomatique)
Os economistas têm discutido as causas desta alteração substancial. Será que o problema está no mercado dos produtos, onde se tem verificado um aumento da concentração e uma subida das margens de lucro; ou será que está no mercado do trabalho onde o mesmo aumento da concentração das empresas e redução do poder dos sindicatos levou a aproximar o panorama do caso extremo do monopsónio? Têm sido apresentadas respostas diversas, mas sempre reconhecendo que o panorama da estagnação salarial é real, e não coincide com a evolução da produtividade. A produtividade aumenta, os salários não.
Em Portugal, assinalei com dois traços verticais o período em que esteve no poder a "geringonça". Foi um período aparentemente apreciado pelos portugueses, que deram aos partidos que a compuseram a votação mais elevada que já tinham atingido em conjunto. Embora não pareça ter ocorrido nenhuma política radical e disruptiva que nos fique na memória, foi palco de uma subida rápida e sustentada no peso dos salários no PIB.
Infelizmente, e dando razão a quem diz que o PS não é um partido de esquerda (muito embora seus militantes o sejam), assim que terminou a "geringonça", a tendência de descida do peso dos salários no PIB voltou ao que era.
E para 2022 prevê-se uma descida maior e mais rápida que qualquer das outras representadas no gráfico. Seria necessário um aumento dos salário nominais na casa dos 8-10% para não se verificar uma descida do peso dos salários, dado aumento da produtividade e o valor da inflação. O governo não controla os segundos, mas tem algum controlo e influência sobre o primeiro, e até um moderado como Paulo Trigo Pereira considera que as opções do governo estão aquém daquilo que poderia fazer para defender o interesse de quem vive do seu trabalho.
sexta-feira, 11 de fevereiro de 2022
A «lei dos sefarditas»: um erro histórico?
quinta-feira, 20 de janeiro de 2022
O voto LIVRE nas próximas eleições à Assembleia da República
Já vem sendo habitual que partilhe neste espaço as minhas razões para votar no LIVRE nas eleições à Assembleia da República. Gostaria de destacar duas razões muito importantes e duas razões menos importantes, embora existam muitas outras. Comecemos pelas mais importantes:
1- Razões de cariz ambiental. São poucos os partidos que colocam o ambiente no centro das suas preocupações. O actual contexto é um que exige uma acção urgente e determinada de combate às alterações climáticas, ao colapso da biodiversidade e a um conjunto de outros problemas ambientais que assumem cada vez mais os contornos de um desafio civilizacional. A sociedade continua em grande medida inerte e míope face a estes problemas, e o debate político reflecte essa indiferença e incapacidade de reagir com a urgência e determinação necessária. Três partidos colocam o ambiente no centro da sua acção política: o LIVRE, o PAN e o PEV. A exclusão do MPT é deliberada (no parlamento europeu juntaram-se à bancada liberal e não à bancada verde e votaram a favor de acordos de comércio e investimento com impactos ambientais absolutamente desastrosos - são menos ecologistas que qualquer partido de esquerda), e o PEV não concorre isoladamente nestas eleições, sendo que correspondem a uma pequena proporção dos deputados eleitos pela CDU, a qual, no seu todo, não coloca as questões ambientais no centro da sua acção política. O eleitor que considere as questões ambientais absolutamente cruciais e prioritárias terá dificuldade em votar num partido que não o LIVRE ou o PAN. Partidos como o Volt ou o BE merecem um honroso segundo lugar, relativamente distante dos restantes partidos. O PS, juntamente com todos os partidos à sua direita, pela sua posição face ao Tratado da Carta da Energia, defende que se continue a acelerar em direcção ao abismo. É lamentável.
Infelizmente, partidos/coligações como o BE ou a CDU não constituem boas alternativas. Há uma boa razão pela qual o Syriza não conseguiu implementar um projecto progressista que merecesse o aplauso do BE, e em vez disso governou de forma pouco distinta da de um partido "tipo PS". É que quando a direita diz que o tipo de medidas progressistas que o BE e a CDU defendem iriam tornar o país menos competitivo, o que reduziria o investimento e encorajaria fugas de capital, com impactos negativos no emprego e nos salários ela tem, no actual contexto, ... alguma razão.
As duas razões acrescidas são as seguintes:
3- Entendimentos à esquerda. Rui Tavares insistiu muito neste ponto durante os debates, e foi das questões mais esmiuçadas pela comunicação social. Parece relativamente plausível que a eleição de deputados do LIVRE torne mais fácil o entendimento à esquerda. O LIVRE pode aliás criar o "ponto focal" para esse entendimento.
4- Combate à corrupção. O programa do LIVRE tem um capítulo dedicado a esta questão. Não conheço nenhum partido com melhores propostas nesta matéria. O combate à corrupção pode ajudar o país a convergir com o resto da UE.