sábado, 27 de julho de 2013

O PCP e o BE devem pôr os olhos no CDS

Nos já quase 37 anos de governos constitucionais, o CDS-PP esteve no governo quatro vezes. Sem nunca ter mais do que 16% (e só em 1976), muitas vezes abaixo dos 10%, este pequeno partido de direita marca o regime com numerosos ministros; os seus dois líderes históricos, Freitas do Amaral e Paulo Portas, passaram pelo cargo de vice-primeiro-ministro. Nos mesmos 37 anos, a esquerda à esquerda do PS teve sempre mais votos, nunca menos de 10% e algumas vezes 20%. Mas não teve um único secretário de Estado.

O desequilíbrio político fundamental da 2ª República é este: quando a direita governa, o regime desequilibra-se à direita; quando o PS governa, gere o centro. Em quase quatro décadas, a esquerda «radical» foi sempre muito pura, coerente e intransigente. O resultado é que nunca teve poder. O CDS foi algumas vezes oportunista, incoerente e maquiavélico. O resultado é que exerceu o poder.

Sem surgir à esquerda uma força política que seja capaz de desempenhar um papel semelhante ao do CDS, a 2ª República continuará a tender mais e mais para a direita.

Não se esqueçam de perguntar também o partido, o sindicato e a confissão religiosa

  • «Os partidos da maioria querem que os agentes das secretas passem a fazer um registo de interesses no qual terão de revelar se pertencem à Maçonaria. O projecto de lei entregue pelos dois partidos no parlamento estabelece que no documento terá de constar a "filiação, participação ou desempenho de quaisquer funções em quaisquer entidades de natureza associativa".» (i)
É típico da ascensão dos fascismos procurar bodes expiatórios, sejam eles os judeus, os comunistas, os mações ou outro qualquer grupo minoritário/internacionalizado/discreto. Em 1935, a maçonaria foi «interditada» em Portugal, e os funcionários públicos a partir de então foram obrigados a assinar declarações em como não pertenciam à dita agremiação. Em 2013, o PSD/CDS tem a brilhante ideia de perseguir os mações, a pretexto da justa inquietação que existe quanto às actividades criminais dos serviços de espionagem sucessores da PIDE (SIS/SIED). Esta discriminação é parcial. Parece que não se exigirá que funcionários públicos declarem se pertencem a partidos, sindicatos ou comunidades religiosas (organizações que, legitimamente e tal como a maçonaria, não publicam as listas dos seus membros).

Fica tudo claro. Não digam é que são «liberais», depois de mais esta. «Liberalismo» não é andar a perguntar às pessoas de que organizações fazem parte, muito menos perguntar-lhes que drogas já consumiram, quantos parceiros sexuais já tiveram ou de que género sexual. Acho eu. (Nem falo da origem histórica do liberalismo em Portugal, muito menos das filiações dos primeiros liberais. Basta o conceito.) E, enquanto esta coisa transita, pensem lá se não haverá contradição com os preceitos seguintes da Constituição da República Portuguesa.

quinta-feira, 25 de julho de 2013

Revista de blogues (25/7/2013)

  • «(...) Só voltei a pensar nos fiéis defuntos, há poucos anos, quando soube do interesse autárquico por eles. Os fiéis defuntos adicionam 5% do ordenado do PR ao de vários edis e deles dependem as dotações orçamentais das juntas de freguesia e o nível do salário dos seus elementos. Sem a sua persistente permanência nos cadernos eleitorais, e nos censos populacionais, eram muitos os que só tinham a perder e apenas beneficiava o erário público que, por ser público, serve para benefício privado. Os fiéis defuntos merecem que as associações autárquicas lhes mandem rezar a missa.» (Carlos Esperança)

quarta-feira, 24 de julho de 2013

O CV de Machete merece manchetes

Sim, Rui Machete chegou a ser vice-primeiro-ministro durante um ano ou isso há quase trinta anos. Mas convém acrescentar que teve responsabilidades no BPN e no BPP. Os tais bancos que nos atiraram «para o buraco». Além disso, há o delicioso telegrama de 2008 da embaixada dos EUA, que recorto em baixo (agradeço à wikileaks a divulgação). Machete saiu da FLAD em 2010, depois ser «Presidente do Conselho Executivo» durante os primeiros 22 anos da Fundação.
  • «(...) The USG subsequently contributed some $111 million to FLAD, but during the past two decades the Embassy's efforts to exercise responsible oversight over FLAD's financial management have been thwarted by the foundation's leadership, creating deep and continuous friction between FLAD and the Embassy. We propose to wage another campaign to change FLAD's direction, but failing that, we must consider whether our continued participation in this institution is in the USG's interest. (...) The tension came to a head in 1992 when the Embassy directly approached Prime Minister Cavaco Silva seeking clarification of reports that FLAD Director Rui Machete had offered FLAD business to companies in which he had a stake. Machete admitted no wrongdoing but did terminate one key contract. (...) Machete has long been critical of the U.S. and has resisted embassy participation at every turn. He is wired into both major political parties and is suspected of disbursing FLAD grants to curry political favor and maintain his sinecure. Machete has historically opposed all efforts at independent oversight, professional accounting practices, and transparent review of FLAD's programs. Since the early 1990s, nearly every U.S. ambassador has urged Machete to carry out his fiduciary duties or step aside, but to no avail (...) FLAD continues to spend 46% of its budget on overhead for its luxurious art-adorned offices, bloated staff, fleet of chauffeured BMWs, and on "personnel and administrative costs" that has included at times wardrobe allowances, low-interest loans to staff, and honoraria for staffers participating in FLAD's own programs (...) FLAD's portfolio in November 2007 was 122 million euro. By November 2008 this had shrunk to 106 million euro. At this pace, FLAD could burn through the entire endowment by about 2014. (...)»

terça-feira, 23 de julho de 2013

Governo protege a sua guarda pretoriana

  • «O Governo está a preparar a saída da PSP do regime geral da Função Pública, passando a polícia para o regime que tinham antes de 2008 (...) os ministérios da Administração Interna e das Finanças estão a criar um grupo de trabalho conjunto para debater com a PSP a passagem dos agentes para o regime do Corpo Especial do Estado (...) aplicado à GNR e militares.» (Económico)
Quem diz que o governo quer atacar o funcionalismo público erra o alvo. Como se tem documentado neste blogue, o governo protege os serviços do Estado essenciais à sua visão neoliberal neomedieval da sociedade: a espionagem e as polícias. Também acarinha a ICAR, e portanto tudo bate certo: a Idade Média foi muito estável, durou mesmo muitos anos. Morto o Estado social, renascerá o Estado inquisitorial e repressor.

segunda-feira, 22 de julho de 2013

«Escolas públicas preparam melhor os alunos para terem sucesso no Superior»

é o título de uma notícia do Público, que pode ser acedida na sua versão completa a partir do site do Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas.

A notícia diz o seguinte: «As escolas privadas preparam melhor os alunos para os exames, mas não para terem um bom desempenho na universidade. A Universidade do Porto (UP) analisou o percurso académico de 4280 estudantes admitidos no ano lectivo 2008/09 e concluiu que, entre os 2226 que concluíram pelo menos 75% das cadeiras dos três primeiros anos, os estudantes que provinham de escolas públicas apresentavam melhores resultados académicos do que os provenientes das privadas.

[...]

Este estudo (o primeiro do género e que foi repetido no ano lectivo seguinte, sendo que estes últimos resultados deverão ser conhecidos dentro de dois meses) partiu de uma amostra inicial de 4280 alunos. Destes, 954 abandonaram os estudos, 83 tinham-se recandidatado a outros cursos, 131 tinham concluído menos de 45 dos 180 créditos do curso, 303 tinham completado entre 45 e 90 créditos, 583 entre 90 e 135 créditos e apenas 2226 tinham completado mais de 135 créditos, ou seja, o equivalente a 75% das cadeiras do curso. Foi no desempenho académico destes últimos que a análise se baseou. Entre as conclusões possíveis, destaca-se a de que os alunos que recorrem às bolsas — e beneficiam delas — têm desempenhos comparáveis aos que não precisam do apoio social. Ao contrário, os que se candidatam e vêem negado aquele apoio tendem a sair-se pior, o que "evidencia bem a importância da Acção Social", segundo Sarsfield Cabral.

Para o pró-reitor, resulta claro que as universidades deveriam estar a equacionar formas alternativas ou complementares de selecção dos seus alunos. "Dos 340 alunos que naquele ano entraram nos dois cursos de Medicina da UP, todos com notas elevadíssimas e separadas por centésimas, havia, um ano depois, quem tirasse 20 e quem nem aos 10 conseguisse chegar. Isto torna muito claro que a nota de entrada do aluno não permite perceber qual vai ser o seu desempenho, o que nos leva a questionar se o critério de selecção dos alunos não estará a deixar de fora alunos que podem vir a revelar-se excelentes", questiona.

Sarsfield defende assim que as universidades devem estudar métodos alternativos de selecção dos alunos. "Há de certeza outras variáveis que merecem ser consideradas. As universidades têm de começar a olhar para o exemplo das universidades estrangeiras e pensar em soluções".»

Esta notícia revela a falta de fundamento de muito do que se diz sobre a qualidade do ensino público, mas também a importância do apoio social para uma efectiva meritocracia - que está de braços dados com a mobilidade social. O discurso que pretende cortar apoios sociais em nome da responsabilização individual é inconsistente anti-meritocrático. 

Tudo como dantes (mas não digam mal de Abrantes)

Nem eleições antecipadas, nem «Compromisso de Salvação Nacional»(*), nem sequer remodelação(?). A única novidade é mesmo que agora é o Presidente quem anuncia as moções de confiança que o governo apresenta ao Parlamento, ou seja, tornou-se o porta-voz do governo. Ou então quis convencer-nos de que ordena o que o governo apresenta ao Parlamento, o que só lhe dá responsabilidades muito acrescidas em tudo o que o governo faz...

domingo, 21 de julho de 2013

O SIS. Ou o SIED. Oficialmente ou em horário extra-laboral?

  • «O Partido Socialista suspeita que os telefones e outros meios de comunicação da sua sede nacional, em Lisboa, estão sob escuta. Um pedido de investigação foi já enviado à Procuradoria-Geral da República.» (Público)

sábado, 20 de julho de 2013

Duas negociações que correram bem

Não se cedeu de mais, nem de menos.

Vamos ver se assim continua.

A riqueza e a decência

Já tinha escrito um texto neste blogue cujo título perguntava «As pessoas mais ricas são tendencialmente menos honestas?». Nele mencionava estudos diferentes que respondem afirmativamente a essa questão.

No entanto, nesse texto não foram tornadas claras as razões que explicam esse fenómeno. Será a falta de escrúpulos que aumenta a probabilidade de alguém enriquecer, ou será a riqueza que pode criar uma sensação de independência que leva o indivíduo a dar menos importância aos códigos de conduta sociais?

Este vídeo, sobre estudos que continuam a explorar esta relação, acaba por responder a essa pergunta:

terça-feira, 16 de julho de 2013

Como os partidos de esquerda se «unem» neste momento de crise

  • «O PS recebeu hoje o BE, a pedido deste último partido. (...) Iniciou-se um processo de diálogo. O PS insistiu que nesse processo participassem todos os partidos políticos. O PCP e o BE excluíram-se desse diálogo. Fizeram mal. Agora, em competição, cada um deles lança o seu processo. (...) O PS não entra neste jogo partidário. O PS está empenhado no processo de diálogo, lamenta uma vez mais que o BE e o PCP tenham recusado dar o seu contributo. Não tem sentido iniciar processos paralelos. (...) O PS não abdica dos seus valores e das suas posições em defesa da continuação de Portugal na zona euro; da sustentabilidade do Estado Social e de colocar o emprego e a economia no centro das políticas para o equilíbrio das nossas contas públicas. (...)» (PS)
  • «A pedido do Bloco de Esquerda, o PS recebeu uma delegação do Bloco. Na reunião propusemos que se iniciasse de imediato, e nos prazos indicados pelo Presidente da República, um diálogo para o estabelecimento de um acordo fundamental em torno da renegociação da dívida e da defesa do Estado Social. O PS, no entanto, evidenciou que a sua prioridade neste momento é chegar a acordo com os partidos de direita, encontrar pontos de suavização da austeridade e não fazer qualquer espécie de acordo à esquerda. Não deu por isso continuidade às propostas apresentadas. Lamentamos que assim seja. (...)» (BE)
  • «(...) uma política de defesa e recuperação dos serviços públicos, em particular nas funções sociais do Estado (como a saúde, educação e segurança social), reforçando os seus meios humanos e materiais, como elemento essencial à concretização dos direitos do povo e ao desenvolvimento do País (...) o PCP endereça convites para a realização a curto prazo de encontros com organizações sociais, com o PEV, o Bloco de Esquerda e a Intervenção Democrática (...) O PCP não está, nem estará disponível, para ser instrumento ou cúmplice de políticas que mantenham orientações estruturantes da política de direita.» (PCP)

Mais um passo em direcção ao fascismo

O Russia Today relata: «Congressmen Mac Thornberry (R-TX) and Adam Smith (D-WA) introduced “The Smith-Mundt Modernization Act of 2012” (H.R. 5736) last week during discussions for the NDAA 2013. It was voted on by the US House of Representatives to be included in next year’s defense spending bill, which was then voted on as a whole and approved. The amendment updates the antiquated Smith-Mundt Act of 1948 and Foreign Relations Authorization Act of 1987, essentially clarifying that the US State Department and the Broadcasting Board of Governors may “prepare, disseminate and use public diplomacy information abroad,” but while also striking down a long-lasting ban on the domestic dissemination in America. For the last several decades, the federal government has been authorized to use such tactics overseas to influence foreign support of America’s wars abroad, but has been barred from such strategies within the US. If next year’s NDAA clears the US Senate and is signed by President Obama with the Thornberry-Smith provision intact, then restrictions on propaganda being force-fed to Americans would be rolled back entirety.»

Ao fim de 40 anos em que o uso de propaganda sobre cidadãos norte-americanos era ilegal se conduzido pelo estado, esta proibição acabou.
E o seu fim foi discreto. Os ataques à Democracia são tantos, que esta esta alteração legislativa passou quase despercebida.

Parabéns ao BE



Iniciativas como esta são precisamente aquilo que estava em falta.
Está na hora de tentar forjar as alianças possíveis e necessárias para dar força às alternativas às políticas desastrosas que estão a destruir o país.

Agora é atentar ao processo de diálogo, às contribuições, propostas e cedências de parte a parte. Para já, o BE está de parabéns por ter tomado a iniciativa.

sábado, 13 de julho de 2013

Revista de blogues (13/7/2013)

  • «Deu-se há dias a primeira manifestação organizado pelo sindicato do governo. Não foi na rua, nem na Assembleia (nas galerias), nem às portas duma fábrica ou empresa, nem a cantar a Grândola, foi numa igreja durante uma missa. Não sei o que pensa o novo Patriarca, ou a Igreja, mas assistir à primeira manifestação pública do sindicato do governo durante uma missa coloca-lhe o dilema da lembrança de Cerejeira, presumo que lembrança muito mal vinda. Ele há cada uma, ir manifestar-se para uma Igreja durante uma missa, com dezenas de guarda-costas cá fora, é um penoso retrato do nosso sindicalismo governamental. No entanto, tem uma enorme vantagem sobre os grevistas da CGTP e da UGT, não perdem o salário de um dia de trabalho. (...)» (José Pacheco Pereira)

Demolir o Euro 2004, dez anos depois

Há dez anos atrás, políticos promoveram-se, construtores civis lucraram e dirigentes da máfia da bola «engrandeceram-se» com um torneio de futebol que nunca devia ter sido realizado em Portugal. Agora, resta demolir os estádios que nunca encheram, que nunca serviram realmente para a população, mas sim para encher os bolsos dos do costume. O único aspecto positivo seria mesmo que os cidadãos desta República entendessem de vez para que serve realmente o futebol.

sexta-feira, 12 de julho de 2013

Ainda se lembram(*) da manifestação de 14 de Novembro?

  • «Não [ficou] provado em tribunal que o Corpo de Intervenção da PSP tenha dado ordem de dispersão aos manifestantes» (Público).
Não lamento que se condene em tribunal quem atirou pedras. Lamento sim que não haja condenações da polícia que começou a carregar em S. Bento (sem aviso prévio, provou-se agora em tribunal), só tendo parado no Cais do Sodré, onde deteve dezenas de jovens, independentemente de terem participado na manifestação, muitas cabeças partidas e muita violência depois.

quinta-feira, 11 de julho de 2013

Deixem-me ver se eu entendi

  1. Esperava-se que Cavaco aprovasse a «solução» que lhe apresentaram, porque a alternativa seria convocar eleições antecipadas (imediatas). Não fez nenhuma das duas: no seu discurso não diz que aceita a remodelação governamental, o que significa que a vetou (por enquanto?).
  2. Propõe que um senhor vá falar com os «três partidos», com o objectivo de gizar um «compromisso de salvação nacional» que inclui eleições daqui a um ano e um vago «acordo de médio prazo» económico-financeiro.
  3. Tenta entalar principalmente o PS, que ficaria amarrado ao rascunho do segundo resgate; secundariamente, Paulo Portas, que ficaria sem o alargamento do seu poder; e finalmente Passos Coelho, que no meio de tudo isto é irrelevante.
  4. Ninguém acredita que as reuniões dêem mais do que tempo perdido. Logo, haverá «outras soluções no quadro do nosso sistema jurídico-constitucional». Porque a culpa será, ainda mais do que até ontem, «dos partidos». O Presidente até tentou «que se entendessem» para um «compromisso patriótico».
  5. A outra solução é um governo «de iniciativa presidencial» por um ano, o que só pode acontecer com o apoio do PSD e do CDS. Passos Coelho parece-me suficientemente fraco e agarrado ao poder para aceitar. Paulo Portas, não acredito que o fizesse (a menos que tivesse, vá lá, metade dos ministros menos um).
  6. Portanto, a agonia vai prolongar-se (e agravada). O mesmo presidente, o mesmo governo, a mesma maioria, no mesmo manicómio.

Quer-me parecer que a crise política mal acabou de começar


A melhor análise que eu li sobre as consequências do discurso do Cavaco

Da autoria de José Vítor Malheiros, foi publicada no seu facebook. Transcrevo-a aqui. É um verdadeiro programa político.
Cavaco fez um discurso confuso, que exigiu umas horas de trocas de impressões entre comentadores até se conseguir uma leitura minimamente consensual sobre o que o presidente tinha dito. Em momento de crise, valia a pena ter feito um maior esforço de clareza. Cavaco fez com este discurso a sua própria moção de censura ao Governo. Cavaco explicou que só não convocava eleições antecipadas imediatamente devido ao “resgate” em curso. Mas informou que, mal a oitava avaliação termine, as convocará sem hesitar. Este Governo não lhe parece de confiança. É provisório. Não se percebe como é que "os mercados" devem confiar nele se o presidente não confia. Cavaco desautorizou e humilhou Pedro Passos Coelho, a quem não reconheceu as capacidades de liderança, de negociação e de intermediação necessárias numa fase grave da vida nacional. Cavaco permitiu mesmo que o PM pensasse que ele, Cavaco, iria aceitar o último modelo de remodelação governamental e que esta sua comunicação ao país serviria para a anunciar. Cavaco não deixou sequer Passos Coelho fazer a sua remodelação. Cavaco acha que não pode confiar o governo ao primeiro-ministro. O que pode fazer Passos Coelho? Demitir-se? Depois do “Não me demito.”? Cavaco desautorizou e humilhou Paulo Portas (recusando-lhe a promoção que ele e o seu partido tinham como garantida), obrigando-o a manter-se no Governo sem nenhuma das vantagens territoriais que tinha conseguido à custa do seu recuo. Portas não lhe parece digno de mais responsabilidades nem de uma vitória política. O que pode fazer Paulo Portas? Demitir-se de novo? Publicando um comunicado dizendo que desta vez a sua decisão é… irrevogável? O Governo está hoje mais frágil do que antes e não pode merecer a confiança ou o respeito de ninguém. É, de facto, um Governo de gestão, com capacidade diminuída, que fica à espera do momento da saída, em Julho de 2014, e que perdeu estrepitosamente o apadrinhamento do seu maior apoiante. O programa político do governo é, agora oficialmente, o memorando da troika e o programa do segundo resgate. As negociações com a troika serão aliás levadas a cabo por uma pessoa muito lá de casa, a ministra Maria Luís Albuquerque. E Cavaco passou a ser o dono do Governo. Alguém se conseguirá demitir? Cavaco sabe que vai ser necessário um segundo resgate e quer prender o PS à assinatura desse resgate, tal como esteve preso ao memorando da troika. O que pode fazer Seguro, depois de ter jurado mil vezes a pés juntos que iria cumprir o memorando e pagar tudo o que devemos? Se o PS aderir ao acordo – e é provável que o “negociador” que Cavaco vai nomear para o representar proponha um acordo mínimo, irrecusável – a liderança de Seguro ficará esvaziada e o partido dividido em dois. O PS resistirá? Ou parte? E que argumentos poderá Seguro invocar para não assinar um "acordo de salvação nacional" que contenha algumas daquelas frases ocas que ele costuma dizer? E o PSD, amarrado por natureza ao Governo e ao memorando, com um acordo tripartido que lhe irá retirar toda a margem de manobra, resistirá a um segundo resgate e a mais austeridade? Mesmo quando já não tiver benesses para distribuir pelos amigos? Ou parte? Com que programas se apresentarão às eleições antecipadas os três partidos PSD, PS e CDS se assinarem o acordo? Todos apresentarão o mesmo programa? Cada um deles irá criticar os outros dois por terem assinado o acordo? O PCP e o BE conseguirão alargar a sua base de apoio de forma significativa? Quantos partidos e que partidos haverá daqui a um ano? Cavaco parece ter recuperado há algumas semanas as suas capacidades mentais e demonstrou hoje a sua capacidade para ocupar o centro do tabuleiro político e para dar um abanão ao espectro político. Para fazer de eucalipto, como só ele sabe. Há aqui alguma oportunidade para alguma coisa interessante? Há. As pessoas do CDS e do PSD com alguma independência de espírito, que recusam a subserviência perante a troika e que não gostaram de transformar o país num capacho para os bancos limparem as botas podem encher-se de brio e mostrar o seu patriotismo. O PS pode aproveitar para sacudir o seu líder (antes ou depois de ele assinar o acordo tripartido). E a esquerda pode aproveitar a oportunidade para a) demonstrar como é importante ter uma alternativa e b) construir essa alternativa.

quarta-feira, 10 de julho de 2013

Portas: técnica e irrevogavelmente mentiroso

Ouvi grande parte da audiência de Portas na Comissão parlamentar de ontem. O resumo é que vários deputados lhe perguntaram, repetidamente, quais tinham sido as «considerações técnicas» para não autorizar a aterragem do avião de Morales; e que ele não respondeu. Ou melhor, «respondeu» com longas divagações em que aparecia intercalada a expressão «não querer importar um problema que não é nosso». Portanto, o que Portas cobardemente insinuou é que não autorizou a aterragem porque temia que Snowden estivesse a bordo. Não sabemos quem lhe deu a informação falsa (SIED? CIA? outros?). Mas concluí que mentiu conscientemente ao colocar as palavras «considerações técnicas» no seu comunicado. Ou então, sonegou informação ao Parlamento sobre gravíssimas questões técnicas.

Note-se que esta genialidade do monárquico Portas conseguiu que a bandeira da República portuguesa fosse queimada por uma multidão em La Paz. É um epitáfio adequado para a passagem pelo MNE do homem que à hora a que este artigo sair estará prestes a tornar-se no primeiro vice-primeiro-ministro desde 1985.

terça-feira, 9 de julho de 2013

Revista de imprensa (9/7/2013)

  • «(...) A missa, instrumentalizada pelo Governo moribundo que temos, tornou-se uma vergonha inaceitável. A presença do Presidente da República, nada discreta, de Passos Coelho e de Paulo Portas e mais a claque dos capangas que lá puseram para bater palmas aos políticos presentes resultou num escândalo. Nenhum católico verdadeiro pode aceitar uma tal humilhação a que sujeitaram o patriarca, que, julgo, não a merecia. Mas a verdade é que não reagiu e pelo contrário parecia satisfeito, como se viu na televisão. Se a Igreja não deve intrometer-se na política, a verdade é que os políticos também não devem aproveitar-se da Igreja para fazerem propaganda. Teremos voltado ao tempo triste do fascismo? Foi o que aconteceu, sem que o senhor patriarca tivesse reagido minimamente. Começou muito mal com a sua primeira missa. Direi mesmo que foi uma vergonha que infelizmente o vai marcar negativamente perante os católicos sinceros e progressistas, sem falar dos leigos, como eu, que se lembram bem dos tempos em que o fascismo utilizava a religião... Não sei agora como é que o senhor patriarca vai falar dos desempregados e dos pobres, quando deixou que os responsáveis por essa desgraça nacional fossem aplaudidos nessa primeira missa, obviamente organizada pelos políticos, como está à vista, quando são vaiados sempre que se atrevem a aparecer na rua. (...)» (Mário Soares)

segunda-feira, 8 de julho de 2013

O casamento perfeito do neoliberalismo e do clericalismo

Após uma semana alucinante, no domingo reuniram-se todos para a missa: o pífio Pedro, o irrevogável Paulo, o mudo Aníbal e a Assunção. Porquê? O oficiante do ritual cripto-necrófago (o sr. Clemente) dissera no dia anterior, ainda antes de ser conhecida a rendição de Pedro e a revogação de Paulo, que recusava eleições, que queria «estabilidade»; e hoje acrescentou que «pelos responsáveis pelo governo da nossa pátria, oremos irmãos» (tudo devidamente transmitido pela RTP, claro).

Não houve, desde o Estado Novo, um governo tão anti-social como este. E não houve, desde o Estado Novo, um governo tão apoiado pela igreja católica portuguesa. Os exemplos abundam: na crise da TSU e perante a primeira grande manifestação, o Policarpo apelou a que não houvesse manifestações (não apelou a que os reformados tivessem uma pensão justa); quando se preparava a manifestação de Março, acrescentou que a sociedade portuguesa «aguenta tudo» - e falava da austeridade; o mês passado, durante a greve de professores que fez recuar Nuno Crato, Clemente apelou a que os professores parassem com a greve (não apelou a que Crato ponderasse); este fim de semana, abençoou a surreal «solução» governamental que segundo as sondagens tem o apoio de um terço do eleitorado. Não sugeriu eleições, o que está de acordo com a sua formação: não chegou a bispo por eleição dos católicos de Lisboa, mas sim por nomeação de um ditador estrangeiro (a quem já jurou obediência). Todavia, sendo um cidadão português de 64 anos, Manuel Clemente viveu a maior parte da sua vida em democracia. Poderia ter aprendido qualquer coisa. Infelizmente, é muito católico e nesta crise pensa principalmente no que a sua igreja pode lucrar.

Já o disse e repito: o neoliberalismo e o clericalismo fazem um casamento perfeito. O neoliberalismo destrói o Estado social, a caridade católica «acolhe-os» com hóstias e um sorriso cínico; no fundo, quanto mais pobres e miseráveis houver, melhor para a ICAR. É a isto que Clemente chama uma sociedade «que procura o bem comum», e Passos um «Estado magro». Serve aos dois. Só espero que desta vez a esquerda  (toda) aprenda a lição e entenda de que lado está e estará sempre a ICAR.

domingo, 7 de julho de 2013

Rendição

Entre o burro e o escorpião, foi maior o medo do primeiro da mordidela do segundo. Por causa (ou apesar, mas pouco importa) das vertiginosas piruetas do irrevogável/revogado/invertebrado escorpião, que até ficou quase isolado no seu próprio partido, o burro encolheu-se e leu hoje uma declaração de rendição em que até «confirma» (sic) Maria Luís Albuquerque como Ministra das Finanças, cinco dias depois da posse. Para além de promover o escorpião a Vice-Primeiro-Ministro (chegam três maiúsculas?) e de lhe dar a coordenação de quase tudo o que neste momento importa.

A confirmar-se este cenário, Passos Coelho tornou-se o responsável por tudo o que correr mal com o governo de Portas. Afinal, ele ainda é «o Primeiro»... formalmente.

sexta-feira, 5 de julho de 2013

O Recreio dos Jotinhas

As pequenas maldades entre jotinhas, os jogos de poder entre líderes de facções, ora agora mandas tu ora agora mando eu, as facadinhas nas costas e depois o fazer as pazes quando o tacho está em perigo, esta coboiada que já conhecíamos no que há de mais degradante da vida partidária foi transposta para o governo por este primeiro ministro, um dos maiores jotinhas da vida política portuguesa. O pior é que a previsível alternativa, do lado PS, é mais um jotinha com a mesma escola.

Sim, eleições. Qual é o problema?

O Partido Socialista Europeu apoia eleições em Portugal; o comentariado da direita independente também; o próprio patrão Schauble já disse que «não há crise». Qual é o problema, então?

quinta-feira, 4 de julho de 2013

«Os demitidos» (Jorge Palma, 2004)

Uma vitória da liberdade de expressão

O processo contra Miguel Sousa Tavares (por se ter referido a Cavaco Silva como «palhaço»), foi arquivado. E com uma argumentação rara nos tribunais portugueses: «a liberdade de expressão é válida não apenas para juízos de valor favoráveis, inofensivos ou indiferentes, mas também para os que ferem, chocam ou incomodam. Estas são as exigências do pluralismo, da tolerância e do espírito de abertura, sem os quais não há sociedade democrática». Que algo mude para melhor em matéria de direitos fundamentais na jurisprudência portuguesa é algo que valorizo muito positivamente.

quarta-feira, 3 de julho de 2013

Pedro Passos Coelho defende eleições antecipadas

Pedro Passos Coelho disse, a propósito das eleições antecipadas: «o caminho que vamos agora seguir, que é um caminho normal em Democracia (...) o caminho de devolver a palavra aos portugueses, irá permitir ao país escolher um novo Governo, com mais confiança, com mais força e com mais determinação para vencer a crise em que vivemos».

E acrescentou:
«sempre que encontramos uma situação pantanosa, o pior que pode acontecer é ficar com medo e com receio de assumir responsabilidades e de pôr fim ao clima irrespirável que essas situações propiciam.»

Vale a pena ver as declarações por inteiro.

Também em relação a isto, parece ter mudado de opinião.

Símbolos partidários impressos com tinta invisível (6)


A águia é altaneira mas mata as próprias crias. Ficam a saber.


segunda-feira, 1 de julho de 2013

Auf wiedersehen


  1. Os dois ministros mais contestados pelos cidadãos saíram do governos em poucos meses. A lição a retirar é que o governo lida mal com a pressão popular. Ganham força aqueles que acham que o governo pode cair «pela rua». (Por outro lado, Gaspar refere explicitamente o Tribunal Constitucional como razão para a sua demissão.)
  2. A sua substituta tem um mandato eleitoral, o que abona a seu favor num país em que infelizmente se aceitou que um indivíduo que nunca tinha concorrido a eleições e que não tivera sequer exposição pública prévia tivesse o tremendo poder de Vítor Gaspar.
  3. Passos Coelho e Paulo Portas estão a ficar sem ministros extremamente impopulares para se esconderem por trás. Como nenhum deles é homem para oferecer o peito às balas, é essa a explicação da escolha de Maria Luís «Swap» Albuquerque.

Símbolos partidários impressos com tinta invisível (5)