sexta-feira, 28 de maio de 2010

Em defesa do nosso Presidente

Já escrevi que Cavaco merece a minha admiração e respeito por ter colocado a decisão que mais interessava ao todo nacional - não vetar o casamento entre pessoas do mesmo sexo - acima das suas convicções pessoais e religiosas. Acrescento agora que tem também o meu respeito por o ter feito de tal modo que não lhe permite ganhar votos nem entre os anti-casamento (pela substância do acto, a promulgação), nem entre os pró-casamento (pela forma, ressentida e desagradável, da mensagem de promulgação). Ninguém o pode acusar de eleitoralismo.

Não me surpreende, todavia, a fúria clerical que se começa a ouvir. De Aura Miguel que lhe chama - servindo-se de palavras do Papa - «pessoa falsa» e «crente envergonhado que [dá] as mãos ao secularismo e [constrói] barreiras à inspiração cristã», até ao José Policarpo que «[tem] muita dificuldade em ver como é que um veto político vinha prejudicar a crise económica», passando pelo inevitável César das Nevesmuito desiludido (...) pela falta de tomada de posição pessoal») e chegando até a acusações de «hipocrisia» e a esgares de «vómito». Muitos católicos parecem não compreender que o que se espera dos políticos é justamente que coloquem de lado as suas convicções pessoais e religiosas no momento de decidir sobre legislação que diz respeito a todo um povo. O privado (incluindo o religioso) deve ficar à porta do gabinete do político.

Há algo em que lhes dou razão: teria sido mais frontal e mais limpo Cavaco Silva ter anunciado a sua decisão antes da chegada de Ratzinger à Portela. Nesse aspecto, faltou-lhe coragem. Mas estou convencido de que a zanga lhes vai passar e que meterão a cruz, direitinhos, em Aníbal António Cavaco Silva em Janeiro de 2011. Só é pena que não apresentem mesmo o tal candidato impecavelmente católico que Santana Lopes e outros pedem. Gostaria muito de saber quantos votos obteria uma candidatura presidencial de Ribeiro e Castro ou Isilda Pegado.

2 comentários :

João Vasco disse...

Concordo.

Além disso, sempre achei inconsistente o argumento «não devaríamos perder tempo com estas coisas sem importância numa altura de crise grave» como razão para se opôr ao casamento homossexual, de forma a que todos acabassem por «perder mais tempo».

Cavaco foi, finalmente, coerente com esse argumento que sempre foi apresentando. E todos os que iam repetindo esse argumento ficaram sem palavras.
Como iam ficando quando lhes dizia «se achas que é perda de tempo e não é importante, deixa a esquerda passar e lei e não se fala mais nisso, não se perde mais tempo». Foi o que Cavaco fez.

Ricardo Alves disse...

Não sei se foi coerente. Se o assunto realmente não tinha importância, ele não teria usado uma «mensagem ao país» para se pronunciar. Ele acabou por dar importância ao assunto.

Entretanto, parece que já há um hipotético candidato para o sector conservador católico... Bagão Félix.