sábado, 12 de março de 2011

A Geração à Rasca e o Aborto, ou Porque torci o Nariz à Manif

Todos somos contra o aborto. Ninguém ficará contente por ele existir, seja ele legal ou ilegal. Aliás, o debate nunca se centrou sobre isto, mas sobre o como lidar com o problema. Em traços gerais, a esquerda considerou que a consciência da mãe seria o melhor critério a usar e que a mulher deveria ter condições de segurança para o fazer, enquanto a direita opinou que era um acto hediondo de mais para não ser tratado como um crime... e depois havia o Marcelo Rebelo de Sousa. Uma manifestação contra o aborto nunca aconteceu apesar de o tema ter dominado o espaço público durante largos períodos.
Todos somos contra precaridade, o desemprego e as condições de trabalho da minha geração. Alguns defenderão uma solução próxima ao antigo modelo cubano (com empregos garantidos), outros ao americano (flexibilidade total), ao escandinavo (flexível mas com segurança), ao mediterrânico (inflexível e com segurança), etc. mas até hoje ninguém tinha marcado um protesto que englobasse toda a gente. A manif de hoje o que defenderia? Nunca o saberemos, o manifesto é o mais vago possível.
Uma manifestação que consegue englobar desde anarcas, estalinistas até neo-nazis, e que conta com participação de deputados do PCP ao CDS (excepto do PS, não vá o diabo tecê-las), é uma manifestação de Marcelos.

Antecipando-me às críticas: não, não estou com uma situação laboral aconselhável, nem nunca fui de crítica de mesa do café: poucos participarão em tantas manifestações como eu.

7 comentários :

Tiago Pinto disse...

Um grande desabafo colectivo? Será que não passou disso?!

Tá na laethanta saoire thart-Cruáil an tsaoil disse...

Não é uma manif de desagravo

a pedir empregos como quem pede chuva

uma passeata de nostalgia para outros

não foi uma manifestação

foram duzentas mil

João Vasco disse...

Um amigo meu escreveu o seguinte:

«"Já te disse qye não tenho nada contra a manifestação. COmo te disse na mesnagem, faço figas para que tenha um impacto positivo. Se aí estivesse até me juntaria (em frente ao Consulado tuga em Londres não vale a pena - punham-te em fila de espera 1 semana). Gostava era que ao menos tivessem objectivos concretos. Hoje no centro de Londres cruzei-me com uma manifestação contra certos cortes orçamentais. Ao contrário das de Portugal tinham objectivos concretos - protestavam contra artigos específicos do orçamento e todos os slogans apresentavam argumentos contra esses cortes e/ou alternativas. Era uma manifestação mais pequena mas focada e articulada. Em Portugal, os slogans eram todos "Estamos à rasca", "tenho direito a ser feliz", "quero ser livre", "isto tá mal". Tentei explicar e mostrar o conceito da manifestação a vária malta cá hoje à noite e todos eles me perguntavam: "Mas ao certo o que é que eles querem mudar? Mas quais são os objectivos da manifestação?" - e sim, falei-lhes do manifesto, mas todos ficaram confusos com o quão abstrato era.

Desculpa lá Pedro, mas os Portugueses (na sua maioria) desligaram-se da política há muito, não percebem o funcionamento dos orgãos governamentais e das implicações das suas decisões, poderes e limitações - da mesma maneira que não vêm o seu próprio poder e espaço de manobra para mudar a sua situação. Têm uma visão infantilizada do sistema político, comparável à forma como um adolescente vê os pais - "Eles são maus e só querem estragar-me a vida!" (comentário não meu mas de um analísta americano na New Yorker*) e, em vez de trabalharem como gente grande, fazem birra e gostam de palhaçada.

*não consigo encontrar o artigo agora

Mas quem é que os pode culpar, com o clima e as praias que temos?

E não Pedro, não sinto a revolta do povo aí. A revolta que sinto trago-a dentro de mim há já muito tempo e não é contra os políticos. É contra uma cultura popular ignorante, preguiçosa e de bodes espiatórios em que, sendo a minha, não me revejo nela."»

isto tem o seu quê de verdade.


Depois de alguma indecisão, acabei por aparecer. Mas, enquanto lá estava, não fui capaz de verbalizar estas palavras, mas senti-as um pouco.

Enfim, esta mobilização pode ter sido o primeiro passo. Mas é preciso acompanhar o processo político, e não apenas fazer barulho por fazer.

Miguel Carvalho disse...

João, é isso mesmo.

Até agora só ouvi uma coisa que me criou alguma simpatia pela manifestação, e tem a ver com esse desinteresse pela política. Isto pode ter sido um despertar mais "adulto" para os problemas do país. Muita daquele gente nunca tinha saído de casa, e depois de gritar na manifestação terá ficado a pensar no que deveria ser feito.

Se houver este efeito, excelente.

Curiosamente, pelos cartazes que vi enquanto lá passei, e pelo que me dizem as pessoas com quem falei, havia ali muitas opiniões diametralmente opostas ao que se deveria fazer em termos de políticas. E isto, é, uma manif de Marcelos :)

no name disse...

vale a pena ler isto:

http://jumento.blogspot.com/2011/03/desenrasquem-se-porque-nao-alinho-com.html

Ricardo Alves disse...

Ricardo,
depois das manifes de ontem é necessário estar muito distraído ou ser muito fanático do socratismo para não entender que há um mal estar grande no país, e que se corporizou no protesto contra a precariedade dos jovens. Lê o meu post.

no name disse...

nem uma nem outra. se é claro que existem muitos problemas no país, não é menos claro que um deles passa pela imobilidade das gentes, a começar pelos participantes na manif, que pedem que lhes dêm trabalho, em vez de o procurar (se necessário fora do país), ou sequer em vez de mostrar algum espírito empreendedor e criarem os seus próprios postos de trabalho. ora bolas, se são 200 mil tão descontentes, quantas empresas potenciais não poderiam criar?!? não alinho de todo neste género de peditórios.