quinta-feira, 15 de setembro de 2011

A vida miserável de Ayn Rand

Não me posso pronunciar sobre os livros, que não consegui ler senão aos bocadinhos - como os discursos intermináveis dos heróis dela. Mas Glenn Beck tem promovido Ayn Rand regularmente na FOX (a musa dos yuppies, de Farrah Fawcet, Clarence Thomas e Alan Greenspan) como a filósofa mais importante do século XX. Os livros dela vendem-se outra vez como nos anos oitenta e em 2009 sairam mais duas biografias desta mulher horrível: "Ayn Rand and the World She Made" e "Goddess of the Market: Ayn Rand and the American Right".

"The Nation" publicou uma recensão crítica destes dois livros que vale a pena ler, mas a "Slate" explicou melhor a vida desta sociopata, cujo sucesso parece difícil de explicar. Diz Johann Hari: "Her heroes are a cocktail of extreme self-love and extreme self-pity: They insist they need no one, yet they spend all their time fuming that the masses don't bow down before their manifest superiority."

A hipocrisia e a ausência completa de empatia pela espécie humana, fazem desta mulher um monstro inexplicável: "O criador vive em função do seu trabalho. Ele não precisa de ninguém. Seu objetivo principal está dentro de si mesmo. O parasita vive em função dos outros, de segunda mão. Ele precisa dos outros. Os outros são a sua motivação principal".

Ayn Rand tinha morrido de fome se não fosse o altruísmo dos comunistas, que lhe proporcionaram o acesso à educação gratuita - na Rússia de antes da revolução, nem mulheres, nem judeus podiam estudar. Da mãe, do pai e dos irmãos, que venderam as jóias e arriscaram a vida para que ela pudesse ir para os EUA. Da comunidade judaica de Chicago, que lhe abriu os braços e a ajudou a arranjar um emprego e depois da comunidade judaica em Holywood, especialmente Cecil B. DeMille, que a ajudou mais uma vez de forma altruísta e desinteresada. Incapaz de gratidão, Ayn Rand passou o resto da vida a dizer que nunca tinha sido ajudada e que não precisava de ninguém, embora fosse completamente dependente do desgraçado que casou com ela, um actor de segunda que ela torturou psicologicamente e convenceu que aceitar a vida sexual dela fora do casamento era uma forma de grandeza e heroicidade, e de um miúdo - um sex toy - que ela perseguiu até à morte quando descobriu que era velha demais para ele e que ele "lhe era infiel". :o) A vida desta mulher é uma sequência interminável de actos repugnantes, mas eu não vos quero tirar o prazer de lerem o artigo da Slate. E o da "Nation". E o do "New Yorker". Na altura lembro-me de ter lido uma recensão particularmente virulenta, mas que não consigo encontrar agora.

62 comentários :

João Vasco disse...

«Mas Glenn Beck tem promovido Ayn Rand regularmente na FOX»

Isso diz pouco sobre Ayn Rand e mais sobre Beck.
Ele é um Mormon, e tudo na obra e pensamento dela é perfeitamente oposto à religião, e em particular religiões como essa.


De resto, sobre a vida pessoal dela não sabia, mas assumi que muitas das oportunidades que teve foram devidas à generosidade de terceiros (pelo menos familiares), pois isso é verdade para todos menos os seres humanos que sobrevivem até à idade adulta (até os meninos da selva sobrevivem devido à ajuda de lobos que fazem o papel de mãe, ou assim).

Maquiavel disse...

Rand é um caso típico de "pobre a mal-agradecida". Se ninguém a ajudasse morria à fome, ponto final. Ou ela "compensou" as ajudas com dinheiro, para saldar a "dívida näo-moral"?

Näo sei é como é que os livros dela vendem tanto, tantos a serem influenciados pelos seus dogmas, mas o täo esperado filme "Atlas Shrugged" foi um grandessíssimo fiasco.

Onde é que eu li que grande parte das vendas dos livros säo... à Sociedade Objectivista ou coisa semelhante, que depois os oferecem a bibliotecas escolares?

nando disse...

Nesse caso também eu sou um mal-agradecido, pois sou socialista apesar de tudo o que tenho me ter sido "oferecido" pela sociedade capitalista: o meu diploma e o meu emprego, o dinheiro, a roupa, etc.

João Vasco disse...

nando:

A questão é mais profunda do que capitalismo vs comunismo.

Ayn Rand é contra o altruísmo. É por ser contra o altruísmo que faz sentido dizer que é ingrata, pois sem as várias ajudas dsinteressadas que teve ao longo da vida nem sequer chegaria a adulta.

João Vasco disse...

De qualquer forma, a vida pessoal dela interessa-me pouco.

O que tinha adizer sobre a sua obra e filosofia disse-o aqui:

http://esquerda-republicana.blogspot.com/2011/09/fountainhead.html


Maquiavel:

Essa «sociedade» é tão cheia de inconsistências que até faz impressão.
Adoram Any Rand de uma maneira que ela escreveu ser absolutamente desprezível adorar alguém.
A perfeita ironia para coroar o edifício de inconsistências que é o «objectivismo».

Ricardo Alves disse...

O artigo do Johann Hari explica quase tudo. ;)

Maquiavel disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Filipe Castro disse...

Eu também gostava de ir ver onde é que a sociedade capitalista oferece coisas, porque estava a precisar de férias e aqui não são pagas...

tempus fugit à pressa disse...

Eu também gostava de ir ver onde é que a sociedade capitalista oferece coisas...há muito sítio até aí (apesar de nunca ai ter ido, até eu beneficiei das ofertas americanas)

E já que está no Texas podia falar do Buddy Roemer um dos mavericks republicanos

Lá como cá Republicanos ou Democratas
Socialistas ou comunistas
só consegue ser eleito quem joga dentro do sistema

Que as leis anti-trust também tiveram os seus lobbys

Por falar nisso aqui no Burgo arrancaram uma pista de ciclovia e mais três empedrados colocados este ano passé

para porem novos canos de esgoto por baixo....

logo até a comunistas o sistema capitalista oferece coisas

200 mil pela ciclovia deve ter dado 2 anos de férias

os empedrados 100 mil euros
deve ter dado 80 dias em balão

os canos de esgoto e a reconstrução da ciclovia ou doutra coisa qualquer

secalhar dão uma viaje ó Texas

pecebeu

nã?

Críticas de quem nada sabe disse...

Como sempre, falam mal de Ayn Rand as pessoas que não leram seus livros ou leram somente "bocadinhos". Essa situação se torna pior quando repetem, sem refletir a respeito, o que outros críticos falam desonestamente. E, obviamente, vocês não conhecem suas concepções. Altruísmo, em seus escritos, designa um pensamento e uma prática que promovem o auto sacrifício em favor do outro, sem que se receba nada em troca. Ela até usa, em “The virtue of selfishness”, o exemplo de um marido que se sacrifica por sua esposa, que está com câncer no leito de morte. Ora, o que o marido recebe em troca? Tudo, ela responde, pois sua esposa é quem dá sentido à sua vida e ele se sente muito bem quando a vê sorrir, quando a vê saudável. Ele se sacrifica, porque não consegue enxergar sua própria vida sem sua esposa. Logo, ele é egoísta, o que é ótimo. Este foi só um dos vários exemplos.

Um outro problema na sua crítica é a falácia do argumentum ad hominem (abusivo e circunstancial). Neste caso, argumentum ad uxorem. Não é por dizer o que ouviu falar sobre ela, que seus argumentos (os dela) tornam-se inconsistentes. É preciso contra-argumentar, e não depreciar a vida de quem argumentou.

Ela certamente foi ajudada, mas isso não significa que a pessoa ou as pessoas que a ajudaram não tenham recebido algo em troca. Seus pais, que venderam joias, o fizeram por sua filha, e não por qualquer outra menina. Ou seja, fizeram para preservar uma pessoa que eles amam, o que significa que agiram de maneira egoísta. Não se arriscaram por qualquer pessoa indiscriminadamente, mas por suas filhas. Cecil Blount DeMille não a ajudou desinteressadamente. Afirmar isso é mentir. Ela tinha talento, interesse e foi contratada. O que há de altruísmo em tal ato? Sobre o esposo, ela disse em entrevista que o sustentaria, se fosse necessário.

Nada do parágrafo anterior, na verdade, importa. O que interessa, no entanto, são as argumentações de Rand, mas não sua vida. Você não deveria ter feito um texto sobre um tema de que você apenas ouviu falar. Termos como egoísmo, altruísmo, auto-sacrifício, amor etc. têm significados bem específicos em seus contextos. Portanto, não é interessante tamanha deturpação: é desonesto e contraproducente do ponto de vista de ganho intelectual. Ayn Rand pode, sim, ser criticada, mas esta não é a melhor abordagem. Ninguém critica as ideias de Marx, dizendo o quão violento ele foi com sua esposa, apontando para o quanto batia nela. Ninguém faz esse tipo de argumentação. Por que com Rand deveria ser diferente?

Cansei de ver pessoas falando sobre aquilo que desconhecem. Ninguém, nesses comentários, parece ter lido Ayn Rand.

João Vasco disse...

«críticas»:

Por acaso li o livro «The Fountainhead», e critiquei-o no texto que já citei.

Gostei muito do livro, mas a filosofia nele defendida é perfeitamente inconsistente.

O comentário do «críticas» também revela alguma inconsistência. Define altruísmo da seguinte forma: «um pensamento e uma prática que promovem o auto sacrifício em favor do outro, sem que se receba nada em troca», para depois dizer que os pais não foram altruístas porque «amam a sua menina». Então quando se ama aquele a quem se dá sem receber nada em troca, já não existe altruísmo?

Então e quem encoraja alguém a amar todos, para assim lhes dar em vez de receber, está a pregar o egoísmo?

De acordo com Any Ryand não:

«Mas o homem que se escraviza voluntariamente em nome do amor é a criatura mais desprezível que existe. Ele degrada a dignidade do homem e degrada o conceito de amor. Mas é essa é a essência do altruísmo.»

Ou seja, o amor não é «desculpa» para o «pecado» de dar desinteressadamente, pelo que atitude dos pais foi, nesse sentido, altruísta e portanto vil e desprezível, de acordo com esse sistema de valores (original, mas cheio de inconsistências que exponho no meu texto).

Maquiavel disse...

Já cá faltava o objectivista de serviço em socorro da sua dama! Olhe, ela NÄO lhe agradeceria o sacrifício! :D

Como referi noutro lado, tive o desprazer de ter de ler obras delas na totalidade, e a única coisa positiva disso foi perceber o quäo execrável aquilo é, a nível literário, e sobretudo a nível ideológico.

Qualquer ser humano *digno desse nome* se enoja com aquelas "argumentaçöes", a näo ser que a mente tenha bloqueado na adolescência. E mesmo aí...

No Caso de Rand, qualquer comentário à obra/"filosofia" é necessariamente "ad femina", já que a sua vida reflectia os seus dogmas.

Por isso com ela é MESMO diferente... para além do facto de Marx, entre outros, ser *um filósofo a sério*!

Críticas de quem nada sabe disse...

Ok, crianças. Eu vi que aqui as pessoas possuem certo interesse em distorcer o que os outros dizem, mas tudo bem... “Vamos tentar”.

Sim, os pais de Ayn Rand não foram altruístas (com o sentido da palavra supracitado), pois ajudaram sua filha e, em troca, ganharam o bem-estar dessa pessoa (a filha) que tanto amavam. Basta que ela esteja bem, para que eles aumentem sua “porção” de felicidade. Logo, é óbvio que eles não a ajudaram desinteressadamente. Se assim fosse, teriam ajudado quaisquer outras meninas, mas, não!, houve um critério para a escolha.

Mais uma vez, a descontextualização ocorre de maneira desonesta. Então vamos rever o trecho: “O homem que tenta viver para os outros é um dependente. É um parasita em sua motivação, e faz daqueles a quem serve parasitas também. Essa relação não produz nada além de corrupção mútua. É impossível conceber tal relação. O exemplo mais próximo na realidade – o homem que vive para servir aos outros – é o escravo. Se a escravidão física é repugnante, quão mais repugnante é o conceito de escravidão espiritual? O escravo, mesmo sendo subjugado, ainda retém um vestígio de honra. Ele tem o mérito de haver resistido e de saber que a sua condição é revoltante. Mas o homem que se escraviza voluntariamente em nome do amor é a criatura mais desprezível que existe. Ele degrada a dignidade do homem e degrada o conceito de amor. Mas é essa é a essência do altruísmo”.

Existe uma diferença básica entre escravizar-se em nome do amor e amar. Observe-se, ainda, que Roark diz que o homem que se escraviza degrada o conceito de amor. Ou seja, neste viés, o amor não deixa de existir. Ela, a autora, só não acha interessante a concepção de amor altruísta, que preconiza o auto sacrifício desinteressado, sem qualquer retorno. Seus pais, como já disse, tiveram esse retorno, mas, mesmo que não tivessem, não é sua vida que deve ser criticada, mas seus argumentos, que aliás podem e devem ser refinados. Sobre os pais mais uma vez: esses não fizeram nada em nome de um amor idealizado em livros “sagrados”, mas ajudaram sua filha com grande carinho, e isso talvez, em determinado contexto, possa ser chamado de amor. Ou seja, o amor foi um nome dado para especificar a relação entre eles, foi uma consequência de algo que já existia, mas não o contrário: eles não ajudaram sua filha em nome do amor, mas diz-se que tiveram amor por terem, antes, ajudado. Mesmo assim, mesmo que eu a esteja defendendo, sua filosofia não deve ser encarada como os cristãos encaram a Bíblia, ou como os islâmicos encaram o Corão. Estes livros, para seus seguidores, é incontestável. Mas, quando se trata de filosofia, por que não contestar? Acontece que isso tem sido feito de maneira desonesta.

Críticas de quem nada sabe disse...

PARA MAQUIAVEL
Meu caro, eu não fiz críticas a Marx. Eu apenas mencionei que fazer o que vocês têm feito aqui é tão desprezível quanto criticar as ideias de Marx com o argumento de que ele espancava sua mulher. Vocês sabem que isso é uma falácia. Para que insistir? Saber esse tipo de coisa não interessa, senão como fofoquinha ou papo de boteco.

Você disse: “Olhe, ela NÄO lhe agradeceria o sacrifício!” Para mim, não é um sacrifício. Pelo contrário, eu posso aprender muito com vocês, se pararem com esses argumentos “fora do alvo”. Portanto, ganho com isso. E mais: novamente você usou uma falácia, que consiste em ridicularizar (“desprazer”, “execrável”, “enoja”, “'argumentações'”), mas não contra-argumentar. Quando disse que sua vida (a de Rand) refletia seu dogma, você errou novamente (é uma sucessão de erros que você comete, Nicolau), pois – e aí um exemplo simples – ela fumava. Já que ela prezava pela racionalidade, cabe a pergunta: o que tem de racional em fumar (tanto)? Sendo assim, podemos dizer que ela mesma falhou quanto ao que se refere a seu paradigma. Porém, isto não é fator de invalidação desse.

Eu preciso fazer mais uma pergunta: quais são seus critérios para avaliar a literariedade de um objeto linguístico? Afinal, está na moda dizer que Ayn Rand não possuía tal desenvoltura, mas nunca ouvi alguém dizer o porquê. Por favor, explique-me isso com o profundo conhecimento em estudos literários, crítica e teoria da literatura que você tem.

João Vasco disse...

«Críticas»:

Não creio que seja muito justo dizer que insisti na vida pessoal da autora quando mesmo antes do críticas chegar eu disse:

«De qualquer forma, a vida pessoal dela interessa-me pouco. »

O facto de ela ter sido alvo do altruísmo dos pais tem valor argumentativo enquanto um entre muitos exemplos - e um mais curiosos - da tese que aqui expus (no meu texto sobre o «The Fountainhead»), de que é impossível chegar à idade adulta sem benefício de alguma forma de altruísmo.

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Quanto à idade de que os pais não são altruístas porque a amavam, ela exemplifica perfeitamente a rede de inconsistência em que qual pessoa que adira à sua filosofia tem de mergulhar.

Ora vejamos: em última análise grande parte do altruísmo ocorre porque a pessoa altruísta se sente melhor a fazer o acto altruísta. Sente-se melhor com o bem estar da outra. Ou porque a Ama, ou por outra razão qualquer.

O vilão de «The Fountainhead», Ellsworth Toohey, tal como Jesus, pregava o amor a todos, enquanto combustível do altruísmo. A autora critica como desprezíveis todos aqueles cujo bem estar vem de agradar aos outros. Isto acontece inclusivamente nas relações de amor romântico.

Mas se dizemos que quando alguém ajuda outro, a ajuda não é desinteressada caso o ajudante ganhe «o bem-estar dessa pessoa», e isso traga bem estar ao próprio, então praticamente nenhum altruísmo existe para ser criticado, e praticamente ninguém prega ou pratica altruísmo.

Portanto, das duas uma:

a) Ou uma vida «em segunda mão» em que o bem estar da pessoa não vem da satisfação do seu ego, mas em parte do bem estar de outros (os que ama, por exemplo), é uma coisa desprezível - e nesse caso seria desprezível a atitude dos pais.

b) Ou não existe nada de desprezível na atitude dos pais, mas nesse caso não existe mal em gestos altruístas, desde que quem os faz se sinta bem com o «bem estar» da pessoa ajudada, que é 98% das vezes. O que basicamente contraria praticamente tudo o que é escrito em «The Fountainhead».

Críticas de quem nada sabe disse...

É justo dizer que você insistiu na vida da autora e esta afirmação é corroborada pelo título do seu texto “A vida miserável de Ayn Rand”. Ela não foi alvo de altruísmo de seus pais. A definição de altruísmo segundo o dicionário “Caldas Aulete da língua portuguesa” (2007, L&PM Pocket I Lexikon, Rio de Janeiro) é : “dedicação desinteressada ao próximo”. Seus pais não a ajudaram desinteressadamente. Se assim fosse, teriam ajudado qualquer outra criança. Além disso, nenhuma pessoa gostaria de receber algo de outrem dessa forma: “Olhe, eu estou fazendo isso por você, mas não me importa quem você seja. O que eu faço aqui faria para qualquer outra pessoa.” Imagine ouvir isso de sua mãe, seu pai, sua namorada, seu namorado, seu amigo, sua amiga etc.

João, você escreveu: “em última análise grande parte do altruísmo ocorre porque a pessoa altruísta se sente melhor a fazer o acto altruísta”. Porém, se se tem interesse em quem se ajuda, isso já não é mais altruísmo. Para ser mais específico, ela não nega que se deva ajudar um desconhecido, mas desde que, no ato, não haja risco de vida para o que for ajudar. O que ela ataca é o auto-sacrifício imposto pela sociedade, que se dá através da ameaça, do medo, da chantagem e de todo tipo de argumentação sórdida, que, aliás, o cristianismo desenvolveu muito bem.

Exatamente como você disse, ela criticou Ellsworth Toohey – esse arquetípico Jesus – justamente por causa deste último. Se você conhece a história bíblica (é óbvio que conhece), então sabe qual foi o seu fim: a morte. É claro que, no mito, o homem revive, mas nós somos humanos reais e a sobrevivência é algo primordial, enquanto “negar-se a si mesmo” é tudo o que devemos evitar. No entanto, o indivíduo tem todo o direito de se matar, embora não seja muito aconselhável.

Não altero nada do seu sétimo parágrafo, mas a sua argumentação A/B constitui um erro lógico, porque nos leva a uma dicotomia simplista. A premissa de Ayn Rand, em relação ao altruísmo, é esta: você não deve se sacrificar por ninguém nem exigir que outros se sacrifiquem por você. No seu outro texto sobre “The Fountainhead”, você compara um ladrão a um comerciante, mas a questão não é a dependência, mas, sim, a interdependência. O ladrão, um dependente, rouba, prejudica o outro e só ganha com isso, mas o comerciante, um interdependente, se o sistema for justo, ganha e oferece. É uma troca, o que difere essa atitude de um roubo.

É um prazer ler seus argumentos, João. Eu deparei com outra realidade: vocês são portugueses, certo? Pois bem... se vivessem no Brasil, saberiam o inferno que a imposição altruísta causa aqui.

João Vasco disse...

«É justo dizer que você insistiu na vida da autora e esta afirmação é corroborada pelo título do seu texto “A vida miserável de Ayn Rand”.»

Ah!Ah!Ah!
Então esse texto é meu? Leia lá com atenção...




«O ladrão, um dependente, rouba, prejudica o outro e só ganha com isso, mas o comerciante, um interdependente, se o sistema for justo, ganha e oferece. É uma troca, o que difere essa atitude de um roubo.»

Conforme escrevi no meu texto, eu vejo bem a diferença entre as duas situações. Eu acho que o comerciante (ou o arquitecto) pode estar a prestar um trabalho útil, e o ladrão geralmente não.

Mas aquilo em que elas são semelhantes é que nenhuma delas é autónoma.
Ora a autora diz que o ladrão não é egoísta - ele vive em segunda mão. E a razão que ela dá é precisamente a falta de autonomia do ladrão - sem vítima o ladrão não rouba.

Mas se essa razão é válida, ela aplica-se ao comerciante e arquitecto. E nesse caso, Roark «vive em segunda mão». E isto é perfeitamente contrário ao que ela escreve.

E se alegarmos que Roark não precisa dos seus clientes, imaginando que pode viver no bosque como caçador/recolector caso queira, o mesmo poderia acontecer com um ladrão ocasional. Isto é uma inconsistência flagrante.

Porque eu concordo que o ladrão é censurável onde o arquitecto não é. Onde eu vejo inconsistência é nas razões que ela dá para censurar o ladrão (dizendo que está a ser o oposto de egoísta!!) que se aplicam afinal de igual forma ao arquitecto, sem que isso seja reconhecido quando se vê este último como perfeitamente egoísta e autónomo.


Por fim, sobre altruísmo
«Porém, se se tem interesse em quem se ajuda, isso já não é mais altruísmo.»
Se eu ajudar alguém de quem gosto não sou altruísta porque EU me sinto melhor, é essa a ideia.
Algumas pessoas até defendem que não existe verdadeiro altruísmo, porque em última análise quem ajuda voluntariamente sempre acaba por ter uma razão para o fazer que em última análise se reporta a si próprio.
Mas se definimos altruísmo de forma tão limitada que ele nem sequer existe, então qual o sentido de criticar o altruísmo? É criticar acções e atitudes (quase) inexistentes.

Pelo contrário, o livro «The Fountainhead» o altruísmo parece estar por todo o lado, e aquele que se sente melhor por ajudar outros é visto como não tendo ego próprio.
Por isso Roark recusa sempre a ajuda que os seus AMIGOS lhe querem dar, mesmo que estes pudessem sentir-se melhor em ajudá-lo. Porque isso é altruísmo e o altruísmo é vil.

Assim, há aí uma inconsistência na forma de definir altruísmo. Ou é generalizada para qualquer acto que, podendo fazer o próprio sentir-se bem em última análise, o beneficiário directo é um terceiro - e nesse caso os pais foram altruístas; ou é muito mais restrita, e só é altruísmo quando o próprio não se sente bem por ajudar, e nesse caso Jesus que pregava que se amasse toda a gente, não pregava o altruísmo (só ficamos a sentir-nos bem por ajudar aqueles que amamos). Parece que uma ou outra forma, apesar de muito diferentes, são usadas sem grande critério conforme dá mais jeito. É inconsistente.


« Eu deparei com outra realidade: vocês são portugueses, certo? Pois bem... se vivessem no Brasil, saberiam o inferno que a imposição altruísta causa aqui.»

Sou português e não faço ideia do que é viver no Brasil. Mas oiço dizer que está cada vez melhor para a maior parte das pessoas.
Cá está cada vez pior... :s

leidesleiman disse...

Sou muito a favor da Dialética, da verdadeira Dialética. Mas o que vemos aqui nada mais é do que um desfile de despeitados e orgulhosos cujas argumentações, pífias, não resistem a um sopro de "Críticas de quem nada sabe". Penso que será melhor apenas lê-lo. Assim, evitaremos derramamentos de sangue. Bem melhor será uma transfusão. Transfundam em vós o sangue que traz sabedoria. Ouçam, repito, ouçam o que diz o “Críticas”.

Críticas de quem nada sabe disse...

Ops! Errei em atribuir a autoria a você...

Você escreveu: “[...] eu vejo bem a diferença entre as duas situações. Eu acho que o comerciante (ou o arquitecto) pode estar a prestar um trabalho útil, e o ladrão geralmente não”. Mas, João, esse “geralmente” que usou deve ser retirado. O ladrão, enquanto tal, além de prejudicar o outro, não presta trabalho algum e nada produz. Aqui, está a falta de autonomia dele. É nesse sentido que a palavra é empregada. O comerciante, porém, (o arquiteto se preferir) produz. Ayn Rand mesma diz que é importante viver em sociedade, justamente por causa da troca. No contexto de suas obras, é muito claro que palavras como “autonomia” e “independência” revestem, semanticamente, o indivíduo que não se escora nos ombros dos outros para sobreviver. Basta lembrar de “Atlas shrugged”. O ladrão, segundo o conceito de “egoísmo” de Rand, realmente não é egoísta. Talvez o fosse para Nietzsche, que, para ela, confunde vontade própria com razão. E mais: quando você escreve que sem vítima o ladrão não rouba, soa como se a vítima fosse culpada por ter sido roubada. Agora que você entendeu o conceito de autonomia em Ayn Rand, essa analogia ladrão/arquiteto, daqui em diante, corre o risco de se tornar ridícula. Mas, é claro, conforme o que o senso comum pensa ser autonomia, ou em lato sensu, eu devo concordar: “nenhum homem é uma ilha”.
Assim, desfeito esse erro conceitual, os sexto, sétimo e oitavo parágrafos em que você desenvolveu o raciocínio são inconsistentes, pois estão apoiados em uma falsa premissa.

Concordo com sua afirmação sobre o altruísmo: “[...] porque em última análise quem ajuda voluntariamente sempre acaba por ter uma razão para o fazer que em última análise se reporta a si próprio” (Você gosta de escrever “em última análise”, hem!). No entanto, discordo quando diz que ele quase não existe, porque, “em última análise”, o discurso altruístico é predominante! E sua característica principal, nos termos que temos colocado aqui, é o auto-sacrifício ou a exigência deste em relação a outras pessoas. Aqui no Brasil, existe, por exemplo, o “kit mendigo” – pesquise no youtube. Você verá como o discurso funciona na prática. Ainda mais em um país extremamente religioso, cujos habitantes, majoritariamente, são movidos pela culpa que a religião lhes incute. Fazem tudo pela ameaça e pela chantagem. São egoístas? Sim, pois têm medo de ir para o inferno, de ser amaldiçoados etc. Mas não são conforme o egoísmo que defende Rand, porque esse não pode ser pensado sem a razão (isso gera uma outra discussão, mas citei apenas para diferenciar a noção de egoísmo).

Roark recusa sempre a ajuda de seus “amigos”, porque sabe que nada vem de graça, embora esses amigos, como Keating, ofereçam ajuda como se nada quisessem. Aí está o problema: para que fingir que nada se quer? É exatamente isso que caracteriza o hipócrita: “Que ou quem simula ter sentimento, ideia, comportamento que na verdade não tem, ou finge ser uma declaração, um gesto, uma medida etc. sinceros, verdadeiros, eficazes etc. (sabendo que não são)”. Ou seja, Roark evita, e assim deve fazer, os hipócritas.

Jesus é uma personagem mítica (mesmo que tenha existido, ele foi mitificado) e amar a todos é algo que, além de ser impossível, é injusto, porque não define critérios para o ato de amar e as pessoas que merecem ser amadas (outra discussão longa) recebem o mesmo bom sentimento ou tratamento de quaisquer outras pessoas.

Críticas de quem nada sabe disse...

Ouvi dizer de uns amigos, que estiveram aí, que Portugal está passando por uma crise. Atribuíram o problema ao alto custo do euro, que afugenta os turistas. Não sei se isso procede, mas é o que ouvi. Aqui no Brasil, os governos fazem propaganda de que o país melhora, mas isto é mentira. Esta nação religiosa e altruísta possui as maiores taxas de impostos do mundo (mais de 40% do salário em média), possui os governos com maior corrupção do planeta. Mesmo pagando altas taxas, não temos segurança, escolas, universidades, saúde ou transporte de qualidade mínima aceitável. João, se você passar mal aqui e for a um hospital público, provavelmente morrerá nos corredores, isto se der a sorte de conseguir chegar até eles. A única melhoria que houve se deve à descoberta de muito petróleo, mas isso não configura uma vantagem de nosso sistema altruísta, este Estado do bem-estar social. Como pode ser um lixo um país enorme, com terras férteis, com mais água potável do que qualquer outro no mundo, com muito verde, com um território marítimo gigantesco? Eu não entendo. Aliás, eu entendo sim.

João Vasco disse...

« O ladrão, enquanto tal, além de prejudicar o outro, não presta trabalho algum e nada produz. Aqui, está a falta de autonomia dele. É nesse sentido que a palavra é empregada. O comerciante, porém, (o arquiteto se preferir) produz.»

Essa distinção é perfeita para explicar porque é que uma actividade é imoral e outra não.

Mas não explica porque é que uma é autónoma e outra não.
O ladrão beneficia-se a ele enquanto prejudica o outro, mas várias acções do egoísta terão esses mesmos efeitos.

E mesmo que o arquitecto beneficie o outro, isso não deixa de ser algo pouco autónomo.


«Ayn Rand mesma diz que é importante viver em sociedade, justamente por causa da troca.»

Sim. Mas aí precisamente está a contradição.
É que o que distingue a troca do roubo não é autonomia - ambas as actividades são inconciliáveis com a autonomia.
E ambas as actividades são muitas benéficas para quem a elas se dedica, ou pelo menos quem a elas se dedica está convencido disso.

O que distingue as actividades são os efeitos sobre terceiros.
E o que faz com que uma pessoa íntegra não queira roubar, mas possa querer prestar um serviço é uma atitude de CONSIDERAÇÃO pelos efeitos da sua acção no outro. Não quer roubar porque isso o vai prejudicar contra a vontade deste outro, mas pode trocar porque isso não vai contra a vontade deste outro.

É este RESPEITO pela vontade do outro, esta consideração, que DEVEMOS ter que faz com que não queiramos roubar, mas possamos transaccionar ou vender serviços.

Ora isto é perfeitamente contrário ao egoísmo. O ser perfeitamente egoísta ou não se importa de roubar porque não tem consideração pela vontade do outro; ou caso não queira roubar para ter total autonomia, também não vai vender coisa nenhuma - será uma ilha.

O ser perfeitamente egoísta não pode distinguir entre roubar e vender se o que permite distinguir a moralidade dessas actividades é a consideração pela vontade do outro.

É por isso que o egocentrismo e integridade de Howard Roark - incapaz de roubar ou mentir, não importa quanta vantagem possa obter com tais actos - torna-o um personagem apaixonante, do ponto de vista literário, mas um conceito inconsistente de um ponto de vista filosófico.

João Vasco disse...

«Roark recusa sempre a ajuda de seus “amigos”, porque sabe que nada vem de graça, embora esses amigos, como Keating, ofereçam ajuda como se nada quisessem.»

Não me referia a «"«amigos»"» como Keating, mas sim aos verdadeiros amigos de Roark, que várias vezes lhe oferecem ajuda desinteressada.
Fazem-no porque se sentiriam bem por ajudar Roark, e no sentido restrito de altruísmo poderíamos dizer que essa atitude não é altruísta. Mas essa oferta é rejeitada violentamente como sendo uma oferta vil. Porque altruísta.


Quanto ao Inferno, também sou ateu, também acho que o cristianismo é fundamentalmente falso. E, no sentido restrito do termo altruísmo é claro que quem faz o bem à procura de ir para o céu não está a ser altruísta - está a procurar o seu interesse.
Mas faz sentido dizer que também não está a ser egoísta porque é irracional acreditar no céu?
Para se ser egoísta é necessário não estar equivocado? Onde é que surge essa definição de egoísmo que exige não estar enganado a respeito dos efeitos da acção em causa?


«amar a todos é algo que, além de ser impossível, é injusto, porque não define critérios para o ato de amar e as pessoas que merecem ser amadas»

Concordo, e é particularmente impossível «amar os nossos inimigos» (que como a palavra indica são aqueles não amamos, de todo!). O nosso amor não é uma torneira que possamos abrir e fechar para amarmos quem quisermos, e se fosse desvirtuaríamos completamente o valor do sentimento se tivéssemos a torneira sempre aberta no máximo.

Mas isso não altera o valor do argumento que apresentei.

SE a definição de altruísmo for tão restrita que não inclui as acções daqueles que, a algum sacrifício pessoal, fazem o bem por aqueles que amam, visto que o bem estar que obtêm com o bem do ajudado é superior ao sacrifício,

ENTÂO, Jesus não prega o altruísmo. Ele apenas prega o amor universal, e desse amor não decorre nenhuma acção altruísta, mas apenas acções egoístas.

Como esta conclusão contraria aquilo que já tínhamos estabelecido antes - que quer Jesus quer Tohey representam o altruísmo no seu pior, da perspectiva da autora, temos de concluir que a premissa está errada. Que a definição de altruísmo não é tão restrita, e como tal podemos classificar a atitude dos pais como altruísta.

João Vasco disse...

«Atribuíram o problema ao alto custo do euro, que afugenta os turistas»

é difícil que seja essa a razão, porque o nosso turismo tem estado continuamente a bater recordes nos últimos anos.

Quanto ao Brasil, sei pouco, mas o seu comentário mostra que o Brasil ESTÁ MAL, mas isso não é incompatível com a ideia de que está a MELHORAR.

Pode estar mal e a piorar, e bem e a melhorar; mas também pode estar bem e a piorar, e mal e a melhorar.

De resto, não sei se podemos dizer que o Brasil é um país mais «altruísta» que os países que «estão bem».
Mas eu quis evitar falar de política e centrar-me nas ideias ÉTICAS que fundamentam as ideias políticas.

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João, ou você não entendeu os conceitos, o que eu acho difícil, ou está jogando com as palavras para render assunto, recusando enxergar Ayn Rand sob outros olhares. A autonomia se encontra no fazer laboral, mas não na troca. É esse o sentido de autonomia empregado. Mas digo novamente que, em sentido amplo, “nenhum homem é uma ilha”. Autonomia designa, no contexto, um conjunto de práticas individuais em que não se faça do outro um escravo. Simples assim. É preciso se desprender um pouco dos signos linguísticos normativos e transitar com os significantes em outros campos semânticos. Estamos discutindo Ayn Rand, e, em seus textos, as palavras tomam significados específicos. Faríamos da mesma maneira se debatêssemos acerca de outros filósofos. Discutir egoísmo em Nietzsche, por exemplo, seria totalmente diferente – você sabe disso.

Você disse “É este RESPEITO pela vontade do outro, esta consideração, que DEVEMOS ter que faz com que não queiramos roubar, mas possamos transaccionar ou vender serviços” e afirmou que isto é perfeitamente contrário ao egoísmo. Você, mais uma vez, cometeu um erro lógico, que a alguém desatento passaria desapercebido. Esse seu erro está no fato de você haver inoculado um sentido pejorativo de egoísmo que herdou provavelmente desde que nasceu, assim como eu e todo mundo. Perceba que desrespeitar o outro, desconsiderar o outro e roubar o outro é uma referência ou uma ação contra o outro. Logo, a ênfase da ação não se dá no EGO, mas no ALTER. Se não é no EGO, então não é EGOísta. Repetindo: nesse sentido, o ALTER não pode ser sacrificado pelo EGO nem este por aquele. Este é o egoísmo de que fala Rand. Quando você escreve sobre o ser perfeitamente egoísta, está ainda se reportando ao sentido comum de egoísmo. De qualquer maneira, e aí eu retomo a ideia de que a obra de Rand deveria ser refinada, eu digo que o problema está na ênfase dada ao altruísmo. Há comunidades inteiras cujos indivíduos se forçam a viver negando-se a si mesmos e que submetem todo o seu eu à vontade do coletivo.

Quanto aos amigos de Roark, é preciso dizer que sim: as ofertas, dados os contextos, seriam consideradas vis, porque, para a personagem, seria vil aceitá-las; seria vil também, para ele, criar este tipo de vínculo com os amigos, porque esse é o início de algo chamado fisiologismo. Se tem uma coisa repudiada pelo objetivismo, essa é o fisiologismo, que é uma prática bastante comum aqui no Brasil.

Seu argumento sobre os cristãos foi relevante, mas eu não quero dizer que a pessoa egoísta seja necessariamente racional, mas que o egoísmo objetivista esteja necessariamente associado à racionalidade e ao ateísmo, o que não quer dizer que o ateu seja sinônimo de razão, embora muitos ateus façam a associação (meu cachorro, por exemplo, é ateu pff).

Com certeza, Jesus não prega o altruísmo, mas a ideia que se tem de Jesus, sim. Explico: ele, um ser mítico, é capaz de “amar o próximo” (qualquer um, principalmente se for bandido), dar sua própria vida (que revive) aos outros, ficar triste por todos etc. O problema é que o cristianismo tenta submeter todos a uma vida que somente um ser imaginário pode viver e a uma ideia deturpada de amor que somente um ser irreal pode sentir. É claro que ele foi egoísta, mas qualquer pessoa real que, como gostam de dizer os defensores da fé, “seguisse o seu caminho”, de fato, estaria cometendo uma grande estupidez, mas não o egoísmo possível e permitido apenas ao “filho de deus”.

O Brasil é permeado em demasia pelo altruísmo: aqui temos cotas para negros e para pessoas mais pobres nas universidades públicas, temos a “bolsa-família”, muitas escolas funcionam apenas como creches, os pesquisadores são mal pagos para trabalharem e, ainda assim, o governo diz que está fazendo um favor a eles; também, o governo quer que, terminada a graduação, todo recém-formado trabalhe sem salário durante, pelo menos, um ano em favor e em retribuição da SOCIEDADE etc. etc. etc.

João Vasco disse...

Críticas:

Vou centrar a minha resposta neste ponto, que me parece o fundamental:

«Esse seu erro está no fato de você haver inoculado um sentido pejorativo de egoísmo que herdou provavelmente desde que nasceu»

Não é o caso. Foi por isso mesmo que escrevi no meu texto que Any Rand usa a palavra egoísmo para se referir ao conceito de egocentrismo.

No que diz respeito ao egocentrismo, eu não atribuo esse sentido pejorativo. As pessoas egocêntricas do dia-a-dia têm certamente vários defeitos, mas têm também importantes qualidades (tendem a ser mais originais, menos influenciáveis pela pressão social para fazer seus juízos de valor, etc.), e por isso as conotações que associo à palavra são mais neutras que negativas.

Mas as conotações são perfeitamente irrelevantes para o argumento. Um egocêntrico tende a pensar menos nos outros, e isto não é muito mau desde que pense o mínimo para não ultrapassar certos limites - a sociopatia.

Mas um ser perfeitamente egocêntrico ou egoísta (no extremo têm algo em comum) não pensa nos outros, de todo. Isto não são conotações, resulta da definição dos termos.

Mas o que distingue a acção de vender da acção de roubar é o efeito dessa acção no outro - num caso a sua vontade é respeitada, no outro a sua vontade não é respeitada - por isso só alguém com uma preocupação mínima pelo outro pode notar diferença entre as acções, considerando uma legítima e outra vil. Repito: essa diferença só pode ser justificada à luz de uma preocupação com o outro.

Ora com conotação negativa ou sem conotação negativa, não faz sentido dizer que um ser perfeitamente egoísta se preocupa com o outro.

Não faz sentido defender que devemos ser egoístas, e devemos ter suficiente preocupação com o outro para não roubar, mesmo quando existe grande vantagem pessoal em fazê-lo. Abdicar dessa vantagem é fazer um sacrifício para bem daquele que afinal não é roubado.

---

«Perceba que desrespeitar o outro, desconsiderar o outro e roubar o outro é uma referência ou uma ação contra o outro.»

É possível roubar com o objectivo de prejudicar o outro. Esse tipo de crueldade é vil, mas não é nada egoísta, concordo.

Mas obviamente eu referia-me aos roubos que ocorrem em nome da vantagem pessoal de quem rouba, na desconsideração total e completa da vontade/sentimentos da vítima.

É este o caso que me parece indistinguível da venda para alguém que é completamente egoísta, e quem apenas considera as vantagens para si. As consequências para o outro são irrelevantes.

Neste sentido, roubar tem tanto como referência o outro como vender (um trabalho arquitectónico). É igual.

Maquiavel disse...

O críticas disse de que "novamente você usou uma falácia, que consiste em ridicularizar (“desprazer”, “execrável”, “enoja”, “'argumentações'”), mas não contra-argumentar."
Eu näo tentei ridicularizar, apenas constatei um facto. Ao ler os escritos de Rand isto parece-me täo auto-evidente que prescinde de contra-argumentaçäo...

"Quando disse que sua vida (a de Rand) refletia seu dogma, você errou novamente"
É verdade. Ela professava o livre pensamento, e depois expulsava da seita quem a criticava. Lá está, uma perfeita hipócrita. Mas há mais exemplos. Procure-os, que eu näo estou cá para evangelizar ninguém!

"um exemplo simples – ela fumava. Já que ela prezava pela racionalidade, cabe a pergunta: o que tem de racional em fumar (tanto)?"
Porque dizia que os estudos que davam o tabaco como cancerígeno eram de "entidades comunistas".

"Afinal, está na moda dizer que Ayn Rand não possuía tal desenvoltura, mas nunca ouvi alguém dizer o porquê." É porque só lê o que lhe interessa e/ou valida as suas ideias pré-feitas.

"Não é por dizer o que ouviu falar sobre ela, que seus argumentos (os dela) tornam-se inconsistentes." E tem toda a razäo, críticas. Os argumentos dela säo internamente inconsistentes que cheguem... só säo consistentes na desumanidade e "adolescência mental". Mas como se fala neste artigo da vida dela, referindo duas *biografias*, é normal que as pessoas discutam... a pessoa, além da obra!
E *mais näo digo*, percebeu.

...

Referiu o Brasil, olha que bacano! O Brasil só disparou economicamente após se ter tornado mais "altruísta", levantando o nível de vida de *todos* e criado uma verdadeira classe média... com Lula! Petróleo? Já era explorado antes do Lula, mas os pé-rapados nunca viram um centavo disso.
O que é facto também é que o Real vale hoje mais 30% que há 6 anos relativamente ao Euro, o que tornou o Brasil bem mais caro para os turistas europeus... peixada de 20 reais já só na minha memória... näo importa, porque agora até um brasileiro pobre já a pode comer, mesmo mais cara! E isso é que é avanço civilizacional!

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Você escreveu que “Não faz sentido defender que devemos ser egoístas, e devemos ter suficiente preocupação com o outro para não roubar, mesmo quando existe grande vantagem pessoal em fazê-lo. Abdicar dessa vantagem é fazer um sacrifício para bem daquele que afinal não é roubado”. João, não houve defesa para que uma pessoa seja perfeitamente ou completamente egoísta (perceba que você costuma usar o adjunto adverbial). E você está correto quando usa “suficiente preocupação”, que não chega a ser altruísmo, mas sim o mínimo requerido para uma convivência social saudável. O problema, como geralmente ocorre, está em enfatizar o outro e o auto-sacrifício pela coletividade, tornando-os prioridade acima do eu. Você deve lembrar-se dos discursos de Toohey, que sempre proferia algo parecido quando possível.

Dizer que não roubar é auto-sacrifício é um exagero, concorda? Hehe Isto seria um sacrifício só para pessoas com uma vontade indômita de roubar (cleptomaníacos também). Essas, por sua vez, não deixariam de roubar pela preocupação com o outro, mas pela preocupação consigo mesmas: afinal, seriam presas, sua reputação cairia e com ela suas chances na sociedade, talvez açoitadas etc. Pessoas psicologicamente equilibradas não têm uma vontade tão grande assim de prejudicar outros ou de se beneficiar às custas do sofrimento de outros. E, mesmo que tenham alguma vontade, saberão que serão punidas. Transitam entre nós várias pessoas com o que chamam de psicopatologia tendenciosa ao assassínio, mas que jamais mataram ou roubaram. Você tem certeza de que elas se preocupam com os outros? Não! É sempre o eu! Você poderia fazer-me a pergunta: “Então você só não rouba porque tem medo de ser punido?” Resposta: é claro que não. Eu simplesmente não tenho vontade, mas, se eu tivesse alguma vontade, seria impedido por saber as consequências; mas, se eu tivesse muita vontade, daria um jeito de burlar, de maneira que não fosse descoberto. E é exatamente isso o que acontece (ai, se você conhecesse o Brasil, João! hehe). (Um adendo: Vai dizer que não rouba uma loja da Ferrari ou não furta comida do McDonald's porque se preocupa com a estabilidade financeira dos donos? Até parece...)

Ou seja, as pessoas, que só pensam em si mesmas, apenas roubam por não terem capacidade lógica suficiente para compreender as consequências. E, ainda que não houvesse consequências penais, estas pessoas o fazem por não terem alguns princípios éticos que, de acordo com o altruísmo, seria a preocupação com o outro (meio inverossímil) e que, de acordo com o objetivismo, seria a integridade mental e física do próprio indivíduo. Alguém que assalta é alguém que não tem autoestima suficiente e que se deprecia diante da posse de outros; logo, não é egoísta, conforme Rand, nem egocêntrico, conforme você. Comparar o trabalhador com o bandido já não é sustentável em nenhum nível.

A propósito, meu nome é El-Buainin.

João Vasco disse...

El-Buainin:

Nas última mensagens parece que temos andado a dizer o mesmo, sem nos entendermos.

Vou tentar então usar outra forma de explicar a minha posição.

Imagino que tenha visto o filme «Matrix». Nesse filme existe uma cena em que o «Neo» está com Morpheus num programa de simulação, onde se vê entre uma multidão uma mulher de vermelho.
Na verdade não havia multidão alguma, nesse caso tudo aquilo era ilusão e aquelas pessoas nem sequer eram pessoas como as da «matrix» que tinham um humano «por trás». Eram meros programas sem consciência.

Imaginemos que o senhor X vive sozinho num mundo que na aparência é igual ao nosso, mas na verdade ele é a única pessoa consciente, tudo o resto são programas de computador sem consciência.

É imoral matar, roubar, ou agredir? Certamente que não, pois todo este mundo é um gigantesco objecto. Seria tão imoral agredir uma pessoa deste mundo como agredir uma pedra no nosso: seria moralmente neutro.

Neste mundo, seria perfeitamente idiota qualquer sacrifício em nome das outras pessoas.

Neste mundo haverão situações em que roubar será péssima ideia. Podemos ser apanhados, e as consequências podem ser desastrosas.

Mas imaginemos que existe uma situação em que podemos roubar a «pessoa Z» que é, na verdade, tão consciente como uma pedra. Imaginemos que esse roubo nos pode trazer vários benefícios, e que é possível fazê-lo de forma a que não sejamos apanhados.

Neste caso a «pessoa Z» é como a natureza. Considerar que é imoral roubar é como considerar imoral roubar o trigo à terra. Esse seria um crime sem vítima.

Não existe cá «falta de auto estima», ou depreciar-se perante a pose do outro, porque em última análise não existe «outro».

Agora imaginemos alguém perfeitamente egoísta/egocêntrico. Faria diferença para essa pessoa estar no mundo que descrevi, ou no mundo que existe?

Dir-se-ia que não. Que um ser perfeitamente egoísta/egocêntrico não tem considerações pelos outros além das instrumentais - não faço A porque fazer A implica que me façam B.

Mas este ser é muito semelhante a um sociopata, e muito diferente de Roark. Comecemos pela honestidade: Roark é praticamente incapaz de mentir. É honesto e frontal. Mas que é a honestidade senão uma forma de consideração pelos outros?

Um ser que encara os outros sem consideração (como se estivesse no universo que descrevi) teria algum problema em enganar? Não se sentiria menorizado pelo facto de enganar, porque nem sequer teria consideração suficiente pela vítima do engano para se comparar com ela. Dizer mentiras a alguém seria como dizer «abracadabra» a uma porta de pedra, não envolveria qualquer forma de interiorização.

Por isso é que quem não sente empatia alguma é muito diferente de Roark. Onde Roark é honesto e frontal, quem não sente empatia nem o dever moral de ter consideração pelos outros não hesita em mentir, principalmente se considera que não será apanhado.

João Vasco disse...

Um ser assim não distingue entre vender e roubar, não porque tenha auto estima baixa e não se importe de ser rebaixado pela vítima do furto - porque em ambos os casos nem sequer considera a outra parte. Apenas analisa as vantagens para o seu lado.
Considerar que roubar alguém nos rebaixa perante essa pessoa é ter uma forma de consideração pelo colectivo, e pela convenção social que é a propriedade (uma convenção que aliás considero muito útil) instituída por este colectivo.

Por isso, Roark está muito longe de ser realmente egoísta. É perfeitamente indiferente aos outros numas coisas, mas radicalmente sensível noutras.
Não é por acaso que tem tanta vergonha da ajuda que deu a Keating na torre que ganhou o concurso, que abdicou de um cheque (para poder esconder a sua vergonha), pondo em risco a possibilidade de voltar algum dia a praticar o ofício de que tanto gostava.
Isto não é coisa de um egoísta, nem egocêntrico - é coisa de alguém que «vive em segunda mão», tendo consideração pela opinião dos outros a seu respeito.

E esta contradição profunda no carácter de Roark, que aliás torna um personagem tão mais interessante, denuncia as inconsistências profundas da filosofia que ele representa.

Críticas de quem nada sabe disse...

PARA MAQUIAVEL

Nicolau, você é uma peça rara, é um desfile de falácias. Eu estive argumentando com o João, que também argumentou com bastante desenvoltura, mas você poderia se poupar do ridículo e do vexame. Vamos lá:

1 – A falácia da fábula das entrelinhas:
“Eu näo tentei ridicularizar, apenas constatei um facto. Ao ler os escritos de Rand isto parece-me täo auto-evidente que prescinde de contra-argumentaçäo...”.

Esta consiste em dizer que algo é tão óbvio que não precisa de explicação. E você, se quiser, deveria dizer quais são seus critérios para a crítica literária.

2 – A falácia da pressuposição e a da invenção de fatos ao mesmo tempo:
“É porque só lê o que lhe interessa e/ou valida as suas ideias pré-feitas.”

Você, de fato, mente.

3 – A falácia do arfumentum ad nauseam e a do apelo ao ridículo:

“Os argumentos dela säo internamente inconsistentes que cheguem... só säo consistentes na desumanidade e "adolescência mental"”.

Ou seja, aqui você apenas esbravejou e tornou a repetir os ataques, sem argumentação que defenda as presenças da “desumanidade” e da “adolescência mental”.

4 – A falácia do argumentum ad hominem:

“Mas como se fala neste artigo da vida dela, referindo duas *biografias*, é normal que as pessoas discutam... a pessoa, além da obra!”

Não há problemas alguns em falar sobre a vida de uma pessoa, quando o título sugere isso. O problema é ridicularizar o argumentador, intencionando invalidar suas argumentações.

Sobre o Brasil, eu não vou dizer que cometeu falácias, mas que mentiu! De onde você tirou a informação de que o Brasil “disparou economicamente”? O salário médio do professor, no Brasil, é R$ 1527, 00, o que corresponde a € 646,68!!! Esse é o valor que esse país altruísta dá ao professor, que parece ser uma profissão importante, não?! Dinheiro do petróleo distribuído? Ah! Faça-me o favor. Por causa dessa palhaçada de copa do mundo, o governo federal está investindo BILHÕES de reais, RETIRADOS DOS IMPOSTOS – inclusive e principalmente dos que você chamou de “pés-rapados” – nos estádios, que não são do Estado, mas são PRIVADOS. Enquanto isso, cada porcaria de senador custa, ao ano, mais de 33 milhões de reais! Vá descascar batata, seu moleque!

Maquiavel, se for para continuar escrevendo asneiras, é melhor parar de escrever. Que é isso? Vem falar um monte de bobagem? Aí não dá para levar você a sério.

Críticas de quem nada sabe disse...

João, estou meio cansado... Acho que você é inteligente e que concordamos em muitas coisas. O problema maior são os conceitos. Mas, para resumir, digo: ter consideração pelos outros não é deixar de ser egoísta. É por isso, volto a afirmar, que você usa o termo "totalmente egoísta". Ser egoísta significa apenas que não se deve sobrepor os outros ao eu. No entanto, não se pode exigir que o outro se sacrifique por esse mesmo eu. Esta é a premissa do objetivismo. Não existe isso de ser "realmente egoísta" conforme os conceitos de Rand. Isso significaria viver na Matrix, como você disse, ou em uma ilha isolada, sem mais ninguém por perto. Quase um autismo social... Não há essas inconsistências, mas, sim, incompatibilidades conceituais. Não se pode trabalhar os signos linguísticos do senso comum com os escritos de Rand.
Se quiser, me mande um e-mail para maquiavelnicolau@yahoo.com.br

Deste, eu lhe envio outro, através do qual poderemos debater este e outros assuntos. Aqui, não dá mais para mim.

Abraço!

Filipe Castro disse...

O anónimo que acha que eu nada sei insiste em atribuir sentido aos jogos de palavras dos heróis da Ayn Rand, como os astrólogos, ou os teólogos interpretam os horóscopos ou o Antigo Testamento... a verdade é muito mais simples: Ayn Rand odiava os comunistas, empenhou-se em criticá-los com o talento (pouco) que tinha e a América rural, anti-comunista primária, que hoje é representada pelo Tea Party adorou-a. As inconsistências e os amuos infantis dos heróis dela não interessam, porque os livros dela não são intelectuais, são molhos de emoções.

Filipe Castro disse...

E a ideia de que devemos o progresso a um pequeno grupo de génios - que merece todos os privilégios do mundo - é criminosamente estúpida.

Críticas de quem nada sabe disse...

Filipe, "Críticas de quem nada sabe" era o nome do meu blog excluído e não faz referências a você, mas só consegui comentar aqui através dele. Quanto aos argumentos que você trouxe, devo dizer que são insustentáveis do ponto de vista lógico. Ou seja, são falácias (dê uma olhada nos comentários que fiz sobre as afirmações de "Maquiavel"). De todos os que têm raivinha de Rand aqui, o único que argumentou foi o João Vasco.

Mas não precisa perder tempo... eu já estou meio cansado disso aqui.
Quer ficar feliz? Então está bem: eu finjo para você que fui convencido por suas agressões verbais (porque, de fato, não passam disso suas palavras).

Agradeço a todos. Até a próxima!

João Vasco disse...

El-Buainin:

Como imagino que a discussão será longa, enviarei o e-mail quando tiver mais tempo do que agora.

Nesta mensagem quero apenas esclarecer duas coisas rápidas:

a)«ter consideração pelos outros não é deixar de ser egoísta. É por isso, volto a afirmar, que você usa o termo "totalmente egoísta".»

Não foi por isso. No priberam egoísta é «Que ou pessoa que trata só dos seus interesses.» Claro que as pessoas em geral - mesmo as mais egoístas - têm apesar de tudo em conta os interesses alheios. Muitas não roubam nem matam mesmo que possam fazê-lo impunemente e isso lhes seja útil porque o seu egoísmo não chega a esse ponto.
Daí fazer a distinção «totalmente egoísta».
Esta distinção é importante porque logo no início da história somos confrontados com «espantosa» indiferença de Roark ao que pensam dele. Esta força de carácter é apresentada não como sendo «muita» mas como sendo «total». E como ela é apresentada na obra como sendo parte do pacote «egoísmo» (e eu acho que as pessoas mais egocêntricas tendem a ter mais força de carácter, isso parece-me correcto), o «egoísmo» é apresentado como sendo «total» e não apenas «muito». A palavra geralmente é usada com o sentido de «muito» porque não existe quase ninguém a quem o conceito se possa aplicar na totalidade - Roark é ficção.

b) Mas eu não tenho de usar a palavra conforme ela vem definida no dicionário. Se a autora apresenta outro conceito, posso usar esse conceito. É só imaginar que onde ela escreve «egoísta» ela escreve outra palavra que é definida de outra forma.
O problema que eu apresento é que a forma como a palavra é usada não é consistente.
Veja-se a palavra oposta «altruísmo», ora é usada de forma muito restrita para «desculpar» os personagens quando eles se ajudam desinteressadamente (ou tendo em vista a sua própria satisfação por ajudar, que seria uma motivação egoísta em última análise); ora é usada de forma muito abrangente para condenar as massas e muitos comportamentos comuns, que não poderiam ser vistos como altruístas se fosse usada a definição mais restrita (imagine-se que quem dá uma esmola se sente feliz por ter dado essa esmola, e então o seu comportamento não terá sido altruísta e vil, mas sim egoísta - claramente a perspectiva da autora é que a esmola é sempre desprezível).

Críticas de quem nada sabe disse...

João, você persiste em dizer que as personagens em “The fountainhead” oferecem ajuda desinteressada. Eu não consigo lembrar-me de uma passagem em que isso se apresente. Se você quiser refrescar minha memória, sinta-se à vontade. Eu realmente não me lembro. Eu também acho sem sentido dar esmola, mas se alguém quiser fazê-lo, está tudo bem. O problema é o obrigar-se a dar esmola que vem de uma pressão social, a qual é apoiada por um conceito duvidoso de amor, de bondade etc. Assim também, se Jesus quer oferecer sua própria vida por pessoas que ele jamais vira, não há problemas. Porém, ninguém deve ser obrigado, como ocorre frequentemente, a ser e a agir como ele quis agir.
E, antes, eu não quis escrever porque estava muito cansado – acredito que você também –, mas “egocentrismo” não pode ser confundido com “egoísmo”. Por exemplo, Toohey é egocêntrico. Ele é o centro de todas as coisas: das conversas, das atenções, da admiração etc. E sabe disso, como pode ser visto em conversações com a Sra. Holcombe. Roark não é egocêntrico, mas egoísta somente. Ou seja, ele põe seu próprio eu acima de quaisquer outros “eus”, embora estes não sejam totalmente desprezados por ele. Ele pode, sim, ser egocêntrico em relação a si mesmo. Quero dizer que ele se considera o centro de sua própria atenção, mas não da atenção dos outros. O egocêntrico, você sabe, pensa que o mundo gira a seu redor. Ser egoísta ou não é uma questão de hierarquia, mas não uma questão de anulação. Importar-me com minha sobrevivência não significa que os outros devam morrer. O pensamento altruísta afirma que o coletivo deve vir em primeiro lugar, enquanto o egoísta defende que o indivíduo é quem primeiro deve ser beneficiado por si mesmo.

Maquiavel disse...
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Maquiavel disse...

Ao "críticas", você além de fundamentalista é torpe, mas se escrevesse qualquer coisa que näo o seu chorrilho religioso inflamado relativamente aos factos que apresentei, é que eu achava estranho. Pode seguir e tentar catequizar outra freguesia, daqui nada leva. Quer "aprender comigo", como diz? Entäo PAGUE! E olhe, nem pagando, que por alguma razäo näo me interessa falar com fundamentalistas. Fique a falar sozinho, que você até gosta...

... eu näo diria melhor que o Filipe Castro!

João Vasco disse...
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João Vasco disse...

El-Buainin, o livro tem 700 páginas e agora custa-me encontrar a página exacta, mas lembro-me de ofertas de ajuda desinteressada por parte de Mike, Heller e Mallory (tentando evitar tudo o que diz respeito a Domininque). Tanto era desinteressada a ajuda, que Roark sempre a recusou, no caso de Heller ameaçando um corte de relações (ou algo do tipo) caso ele voltasse a repetir a sua oferta.

Essa ajuda que é oferecida é vista como uma «falha» dessas personagens, que não são tão «perfeitas» como Roark, que desde logo esclarece Mallory que toda a ajuda que dá é interessada (no trabalho de Mallory).

Claro que o critério de altruísmo mais restrito, podemos considerar que qualquer um destes amigos de Roark lhe estava a oferecer ajuda pensando também no seu bem, podendo sentir-se melhor com o bem de Roark de quem gostam, e sofrendo também com o espezinhamento de tudo o que Roark representa (eles não têm a confiança de Roark, que mesmo na pedreira não se sente espezinhado).

Mas se os amigos não estão a ser altruístas e sim egoístas quando oferecem ajuda a Roark, que razão teria Roark para considerar essa ajuda senão vil pelo menos imperfeita?

Encontro uma explicação simples: não existe uma verdadeira consistência.


Quanto ao colectivo vs indivíduo, temos o mesmo problema que já tenho apontado. Quando um indivíduo com elevada perícia no furto é impedido de o fazer, estamos a colocar o colectivo acima da vontade desse indivíduo. Claro que quando nos referimos ao colectivo referimos-nos também à vontade individual das potenciais vítimas do furto. Mas creio que todo o colectivismo faz essa alegação em última análise.

Assim, o perfeito individualismo não se coaduna com a existência de regras para proteger o colectivo tais como não furtar ou não agredir.

O problema é quando regras que são impostas sob a alegação de proteger o colectivo (e consequentemente cada pessoa individualmente) são tão invasivas da liberdade individual, que ao nível de cada pessoa aquilo que ganha é menos do que aquilo que perde. O fascismo ou estalinismo são exemplos desses extremos.

Mas o extremo oposto a essa situação - em que nenhuma limitação pode ser imposta ao indivíduo sob a alegação de proteger o colectivo - não é o capitalismo laisez faire que Any Ryan advoga, visto que esse impõe uma série de limitações, escolhidas arbitrariamente.

A discussão de quais devem ser as limitações aceitáveis à nossa liberdade individual (tais como não agredir, não ameaçar violência física, não furtar) é uma discussão complexa, que não pode ser fundamentada numa ética inconsistente.

Críticas de quem nada sabe disse...

PARA MAQUIAVEL

Nicolau, você é desonesto, pois diz que apresentou algum fato, quando, na verdade, fez apenas acusações. O que você escreve é irrisório, porque é inconsistentemente cíclico: “Ayn Rand é sociopata”, você diz. “E quais os seus argumentos para afirmar isso?”, eu pergunto. “É porque eu e o Castro dissemos”, você responde.
Ou seja, os argumentos, até agora, eu os tenho esperado... Esse seu discurso se parece com aquele utilizado em festas universitárias, que os rapazes usam para conquistar uma ou outra caloura ingenuamente idealista. Até que funciona, não?! Mas aqui é diferente. Pensaram que, por ser um blog de esquerda, poderiam falar as besteiras que quisessem, sem que ninguém contestasse. Agora aguente e não se acovarde, ou apenas admita a pobreza do que você fala. Na próxima vez que você escrever, se continuar com essas acusações sem qualquer fundamento, eu deixarei você “falar com a minha mão”. (Não sei se existe essa expressão aí em Portugal, mas, basicamente, significa que você se manterá em solilóquio).

Críticas de quem nada sabe disse...

João, eu só comentarei um trecho. Afinal, você não espera que eu acredite que houve esse tipo de ajuda a Roark ou a recusa deste, sem que me mostre a passagem. Aliás, sobre a recusa, eu já escrevi anteriormente: trata-se de evitar o desencadeamento do fisiologismo, com que, provavelmente, nem socialistas gostariam de conviver. O trecho que comento é esse: “Quando um indivíduo com elevada perícia no furto é impedido de o fazer, estamos a colocar o colectivo acima da vontade desse indivíduo.” Um indivíduo, João, que possui alta PERÍCIA no furto simplesmente não é impedido de o fazer, a não ser que ele mesmo perceba, no ato, grandes riscos a si mesmo, os quais o impeçam. Ora, o PERITO é alguém especialista em determinada área. Ninguém é especialista sem antes ter praticado muito. Se ele pratica muito, significa que, durante todo esse tempo, não foi impedido. O que o faria parar? A preocupação com o outro? Qual situação você acha mais provável no caso de interrupção: depois de vinte anos de furtos, o indivíduo interromper a prática por estar preocupado com o outro, ou, depois de vinte anos, ele parar por perceber todos os riscos que tem corrido durante seu tempo em atividade?

Só para deixar claro: egoísmo é uma questão de hierarquia. Ser egoísta não significa que você não se preocupa minimamente com o bem-estar do outro, mas que o eu é mais importante do que qualquer outra coisa.

Algo mais: eu, obviamente, não estou aqui para converter quem quer que seja, pois, como já disse, não devemos encarar o capitalismo ou o socialismo (que parecem nunca ter existido) como os religiosos encaram o Corão ou a Bíblia. Antes, estou aqui para refinar, através do debate, nossas posições discursivas. Até agora, defendendo o ponto de vista coletivista, somente o João Vasco tem tentado argumentar com alguma integridade, mas tem começado a elidir palavras minhas, por esquecimento ou por distração (sobre o fisiologismo por exemplo).

Se é só isso, “camaradas”, então eu me despeço.

João Vasco disse...

El-Buainin,

Se eu tivesse acesso a uma versão do texto em computador, na qual eu pudesse fazer «find» eu certamente dizia já a página. Mas 700 páginas em papel, e como me lembro das cenas, mas não da altura exacta da história em que ocorrem, a minha esperança era que se lembrasse também dessas cenas. Em particular do facto de Roark ter ameaçado Heller caso ele continuasse a insistir em oferecer ajuda. Mas se não se lembra, nada feito, porque realmente é difícil encontrar a cena exacta num livro tão extenso quando só tenho a versão em papel (tentei chegar lá pelo google, mas não tive grande sorte).

Quanto à questão da perícia do ladrão, é uma falsa questão, prende-se com um detalhe do exemplo e não com o fundamental da questão.
Pensemos antes na agressão física, e em como certas pessoas muito fortes fisicamente sairiam beneficiadas se a agressão fosse permitida.
Mas nós impedimos essas pessoas de agredirem, pondo a vontade colectiva de evitar agressões à frente da sua vontade individual.

«Ser egoísta não significa que você não se preocupa minimamente com o bem-estar do outro, mas que o eu é mais importante do que qualquer outra coisa.»

Pois. Para o ladrão o seu benefício em roubar é mais importante do que o transtorno que vai causar à vítima.


«mas tem começado a elidir palavras minhas, por esquecimento ou por distração (sobre o fisiologismo por exemplo).»

Se aconteceu não foi por mal.


«Se é só isso, “camaradas”, então eu me despeço.»

Adeus

omingoD disse...

Um artigo que começa dizendo: "Não me posso pronunciar sobre os livros, que não consegui ler senão aos bocadinhos..." ja perdeu toda a credibilidade.

Quem ainda nao tenha perdido a curiosidade pela filosofía de Objetivismo - que é simplesmente Aristóteles melhorado e atualizado - devería ler os livros da Ayn Rand, tanto as novelas como as obras de não-ficcão, pois todas elas são verdadeiras jóias.

omingoD disse...

Concordo com este comentário acima. Ayudar a quem o merece não é altruismo nem sacrificio. E mais:

Ayn Rand é a pessoa mais importante que existiu no século XX, e são as idéias dela as únicas que podem salvar o mundo, que está morrendo de uma orgía de altruismo e colectivismo. Quem for inteligente e honesto deve chegar as suas proprias conclusões depois de ler esta autora diretamente, não ficando com opiniões destructivas (e falsas) de segunda mão.

omingoD disse...

Acho que não adianta discutir neste blog. Já chegaram às suas conclusões, condenando a pessoa e as idéias, não acho que vão sair daí...

Críticas de quem nada sabe disse...

Finalmente, depois de tanto tempo, alguém, além de mim, veio lançar um olhar sóbrio à obra de Ayn Rand. Vale a pena também ler um pouco de Max Stirner.

Críticas de quem nada sabe disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
xtpo disse...

Aqui no Brasil, estamos com uma bolha quase a explodir. Enquanto existir pessoas que trabalhem, produzam e possam ser exploradas pelo Estado com altos impostos, sustentando os que não querem nada, a coisa vai funcionar. Quando elas cansarem e falirem ou cairem fora...veremos o que acontecer.

Politica e economia. disse...

Acho que voce se sentiria melhor num pais socialista tipo cuba ou coreia do norte

Politica e economia. disse...

Acho que voce se sentiria melhor morando num pais socialista tipo cuba ou coreia do norte.

Unknown disse...

Vejo que não conhece a obra dela! Ela nunca disse que não poderia ser ajudado, disse que deveria merecer a ajuda, o que é totalmente diferente. O resto que se fala, não é da obra dela, é da vida dela. Tem gente que se presta a investigar a fofoca do que ler um obra. "...desprezava as afeições imotivadas como despreza os bens imerecidos."

Anónimo disse...

Admiradores de Ayn Rand não chamam ambulâncias para feridos. Assistem a morte alheia enquanto ponderam sobre a incompetência dos acidentados em não conseguir lidar com as próprias feridas.

Bruno Rand disse...

Chamam sim! Fez a leitura dos livros dela?

Bruno Rand disse...

Concordo!
Não pode ter credibilidade um texto que começa assim!

Bruno Rand disse...

Seria correto morrer para salvar um desconhecido da morte? Seria correto morrer para salvar a vida da pessoa que ama?
Se sua resposta for "não" e "sim"... Ayn Rand te explica!
Entenda o que a autora defende lendo os livros dela.

Unknown disse...

Cá estamos 6 anos depois que o João Vasco fez sua postagem lendo pessoas inteligentes (nem todas) com suas próprias visões discutindo de forma interessante os conceitos que Ayn Rand tratou na sua obra, escrita há 75 anos. E há quem diga que sua obra é irrelevante, que não sabem pq fez sucesso ou mesmo que nem deveria ter existido. Então tá.

Unknown disse...

Nao basta ler um pedaco do texto dela e ficar ai com a boca ambilente de palavras falaciosas. EU, EU, EU, mas nao digo, VOCE, VOCE, VOCE, noz noz noz ee um conceito vazio. eu penso, tenho que dar com a minha vontade e nao por sentimento.

O homem que luta para não reconhecer que o mal é mau, acha cada vez mais perigoso reconhecer que o bem é bom. Para ele, uma pessoa de virtude é uma ameaça que pode derrubar todas as suas fugas particularmente quando uma questão de justiça está envolvida, exigindo que tome uma posição.