«entre le fort et le faible, entre le riche et le pauvre, entre le maître et le serviteur, c’est la liberté qui opprime, et la loi qui affranchit.»
(Lacordaire)
«(...) a pompa do Vaticano, as viagens dos papas, o regresso parcial ao latim, a «reconciliação» com os herdeiros do Marcel Lefebvre, a intransigência e a sobranceria moralista em termos de costumes e, agora, o que se sabe sobe o encobrimento dos crimes de pedofilia durante décadas. Nada é por acaso, tudo faz sentido. A estrutura hierárquica desenha e defende uma estratégia rígida, mesmo que disfarçada, que é condição de sobrevivência e de conservação do poder. Percebeu-o há quarenta anos e não vai ceder. (...) Quanto à democracia, ela será construída e a humanidade progredirá apesar do Vaticano. Mas não deve, de modo algum, contar-se com o seu contributo positivo. Muito pelo contrário.» (Vias de Facto)
«Acabo de assistir ao Jornal das Nove da SIC Notícias. Aquele do Mário Crespo. Estou sem palavras. Mário entrevistava Pedro Passos Coelho. O próprio, o verdadeiro Pedro Passos Coelho. Crespo exultava de alegria por cada poro e caiu redondo nos braços de Pedro Passos CoelhoÂngelo Correia. O verdadeiro Pedro Passos Coelho não estava menos radiante com tanta mesura e explicou ostensivamente, minuciosamente, com verdadeiro conhecimento de causa o que ia ser a política do PSD a partir de agora. (...) As explicações dadas pela fonte são sempre mais claras.» (Puxa Palavra)
Com jovens assim, a República está segura(!). O discurso de proclamação da República do aluno Xavier Rodrigues, do 12º ano de uma Escola da Figueira da Foz, pode ser lido na íntegra no Almanaque Republicano. Aqui, fica só um excerto.
«Cidadãos!
Depois desta noite de intensa peleja, começo por vos agradecer e vos saudar fraternalmente, em nome do Partido Republicano Português, pela vitória retumbante que alcançámos! (...) Foram precisos séculos para chegarmos aqui, a este dia em que nos libertamos finalmente deste regime de ignomínia, de arrogância e de tirania. (...) Amigos! No reino de Portugal a Lei é de estatura baixa - daí que não alcance a varanda de um palacete, nem suba as escadas de uma abadia, nem chegue às janelas de uma casa brasonada – mas tem altura para atormentar o povo, que no labor do dia-a-dia, anda pelas ruas rasas das cidades e dos campos. Mas de hoje em diante, a Lei estará por toda a parte, vertical e não inclinada; absoluta e não relativa; instrumento de união e nunca de segregação. (...) Meus irmãos! Somos os fundadores de uma Hora nova e, com ela, uma nova Nação! Hoje, Portugal afirmou que quer dar o salto. O salto do reino do opróbrio em que vivíamos, para uma Pátria em que a todo e mulher é concedida a dignidade de um cidadão. O grande salto da carruagem decadente da Monarquia para o comboio veloz da República, alimentado com o carvão da Democracia e sobre os carris firmes da Liberdade.
Neste novo país, não há nenhum rei que não seja cada um de nós. Juntos, sentar- nos-emos no trono da Igualdade, gritando alto ao mundo que a nobreza não está na cor do sangue, mas no tamanho do coração.
Agora vem o Schonborn, arcebispo de Viena, dizer que o Ratzinger não investigou a pedofilia do seu predecessor em Viena (Gröer), porque Wojtyla o impediu (notícia via Diário Ateísta).
Não há problema. Não creio que isto impeça o investigador frustrado de santificar o encobridor. Ficará tudo na «paz de Deus». Literalmente.
Na verdade, Sócrates não fez um décimo do que Jardim faz.
«O PSD rejeitou, na semana passada um debate de urgência na Assembleia Legislativa da Madeira sobre a liberdade de expressão e apoios à comunicação social na região, proposto pelo BE. E prepara-se para "chumbar" uma comissão de inquérito, que o PS vai requerer hoje, para avaliar a interferência do Governo Regional na comunicação social. (...) "Que aconteceria naquela Lisboa e arredores se Sócrates resolvesse governamentalizar o DN de lá até 99 por cento do capital, injectar-lhe uma fortuna diariamente, e depois, apesar do crescendo assustador do passivo, torná-lo gratuito e agravar ainda mais as despesas com o aumento da tiragem e alargamento desenfreado da distribuição, tudo com a ambição de fechar os que não domina? Como reagiriam CM e PÚBLICO, por exemplo, e quantos dias mais aguentaria Sócrates no poder? Pois é essa situação que existe na Madeira, sem tirar nem pôr, e bem à vista de todos".» (Público)
Espera-se a indignação dos bloguistas de direita, o lançamento de petições e a convocatória de uma manifestação pela liberdade de expressão na Madeira. Ou não?
Mohamed Valian é um estudante iraniano que está condenado à morte por «actos contra Deus». Ou seja, por ser um contestatário ao regime teocrático do clero xíita.
Subjacente à proibição das burcas em França, não está um amor aos valores republicanos, mas sim uma Islamofobia alarmante que de resto se faz sentir por toda a Europa. As burcas, utilizadas por uma pequena minoria das mulheres muçulmanas em França, tornou-se agora no último cavalo de batalha do Sr Sarkozy (convém lembrar que o Republicanismo de direita tem contornos xenófobos e racistas bastante fortes, como aliás demonstra o Sr Jean-Marie Le Pen), porque é um tema populista e o presidente bem precisa duns “brownie points” para salvar o seu mandato.
As burcas a mim incomodam-me, mas incomoda-me mais o republicanismo selectivo que vigora em França. Os seios nus da Marianne lembram bem que “La République” é acima de tudo patriarcal. Até 2005, Em França as mães não podiam transmitir os seus apelidos aos seus filhos (declaro o meu interesse neste assunto, pois ainda não recuperei do facto de não ter podido transmitir o meu apelido à minha filha, quando esta adquiriu a nacionalidade francesa). E os documentos oficiais ainda falam em chefes-de-familia.
O republicanismo francês não é só selectivo, é também profundamente illiberal pois confunde a igualdade com a uniformidade. França não é o Irão e proibir as burcas ou as hijabs não contribui em nada (muito pelo contrário) para a emancipação das muçulmanas francesas (muitas delas mais emancipadas que francesas “bon chic, bon genre” que abandonam sem hesitar os seus apelidos para adoptar os dos seus maridos e que abdicam da sua independência económica em nome da preservação das tradições e da família).
Se a batalha é a igualdade entre os sexos, não nos fiquemos pelas burcas, abordemos também os rituais misógenos das igrejas cristãs, a desigualdade salarial entre homens e mulheres, a objectificação do corpo feminino na indústria da moda e na pornografia, as políticas de família, etc, etc.
Se a República francesa quer de facto emancipar as mulheres muçulmanas podia começar por não lhes negar o direito à educação e à esfera pública.
«Os actos pedófilos cometidos por padres e demais religiosos são crimes individuais mas a ICAR, ao longo de décadas, não só não denunciou estes crimes como encobriu, protegeu e fez tudo para evitar que fossem investigados pelas autoridades policiais, inclusive coagiu as vítimas e demais envolvidos a votos de silêncio para não «manchar» a reputação da Igreja.
Este encobrimento é um crime que muitos tentam desculpar dizendo que apenas recentemente se descobriu que a pedofilia era um crime abominável. Não só estas desculpas me parecem contraproducentes numa Igreja que carpe o relativismo moral das sociedades que não aceitam as verdades «eternas e absolutas» de que a ICAR é detentora como me parece que o comportamento dos últimos tempos nos indica que o problema é outro: a ICAR quer ser ela a impor as leis a todos e não aceita ser regida por leis seculares. (...)A Igreja precisa de responder pelos seus crimes para perceber, de uma vez por todas, que não está acima da lei.» (Palmira Silva)
Parte importante da esquerda europeia rejubila com a «reforma de Saúde» que passou na câmara dos representantes dos EUA.
A meu ver, só a ignorância a respeito do que se passou justifica o júbilo.
Quando Bill Clinton iniciou a sua luta por uma reforma de saúde, o partido Republicano, amedrontado com uma reforma com pés e cabeça, apresentou uma contra-proposta. Essa contra-proposta que foi bem recusada na altura, é muito semelhante à lei que Obama propõe.
Vejamos: actualmente existe pouca concorrência entre seguradoras. Isto tem como consequência que os EUA sejam de longe o país (componente privada somada à pública) onde a saúde é mais cara (cerca do dobro do segundo classificado), e no entanto tenham um sistema de saúde que, no global, tem a mesma qualidade que o nosso, abaixo de muitos países desenvolvidos (por volta do trigéssimo lugar no ranking mundial).
Se este problema é grave, como será possível agravá-lo? Há uma maneira: instituir a obrigatoriedade de adesão a um seguro de saúde. Assim, se as seguradoras aumentarem os seus custos em bloco, as pessoas perdem a derradeira escolha de recusar o dito seguro. Se a cartelização é a regra e não a excepção - uma regra que aliás é permitida por lei, ao contrário do que acontece nos outros negócios - deixa de existir neste momento qualquer incentivo para que as seguradoras não respondam à maior procura (porque obrigada pelo estado) com preços sufocantes. O partido Democrata teve a habilidade de pegar num problema grave, em que as seguradoras obtinham lucros pornográficos, e agravá-lo, propiciando ainda maiores lucros a estas seguradoras.
Estas deixam de poder recusar pessoas com «condições pré-existentes», sim. E isso é positivo. Mas podem cobrar-lhe até ao triplo do custo que cobram aos outros clientes. Custo esse que deve disparar, agora que as pessoas perderam a possibilidade de recusar os seus serviços.
Mas não foi isto que Obama prometeu, e não é isto que os norte-americanos querem. A «opção pública» seria uma seguradora do estado que garantiria a concorrência com as privadas. Que faria com que estas não pudessem subir excessivamente os preços. A implementação desta seguradora iria fazer com que o estado poupasse vários biliões em transferências para as seguradoras (de acordo com os resultados obtidos por uma comissão bipartidária do Senado). Iria ser melhor para os cofres do estado, iria ser melhor para os cidadãos, iria ser o cumprimento de uma promessa eleitoral central.
A desculpa para esta traição é a falta de votos. Visto que os Democratas vão avançar no senado com «reconciliação», precisariam de 51 votos senatoriais; algo que alegam não ter. Mas existem 51 declarações de diferentes senadores a dizer que apoiam esta opção. E se o voto fosse feito, mesmo que a opção não passasse, os eleitores saberiam quais os senadores fieis ao eleitorado, e quais os vendidos. Actualmente a desculpa continua a ser: «não há votos». A Casa Branca tem lutado contra a opção pública, e pressionado sempre na direcção contrária. Obama traiu os seus eleitores, e esta lei que vai passar é o testemunho da sua traição.
Não lamentarei se perder as próximas eleições. Quem faz pouco de quem o elegeu não desmerece governar um só mandato.
A defesa do «bom nome» resulta em limitações à liberdade de expressão. Mas diferentes sociedades estabelecem a fronteira dessas limitações diferentemente. A meu ver e infelizmente, na forma como interpretam a lei, os nossos tribunais causam limitações excessivas à liberdade de expressão.
Sucede-se o seguinte: indivíduo B faz uma afirmação pública sobre C. O indivíduo C decide processar indivíduo B, e ganha. B recorre sucessivamente e perde sucessivamente. B vai, quando vai, expor o caso ao Tribunal Europeu dos Direitos do Homem. Este tribunal não pode, obviamente, reverter as decisões dos tribunais nacionais. Ao invés, se considera que o castigo sofrido por B foi ilegítimo, condena o estado a pagar-lhe uma indemnização. Na UE, Portugal é recordista destas indemnizações.
Desde o líder da SOS racismo, condenado por ter dito que nos tribunais da margem Sul havia discriminação racial; até César das Neves condenado na primeira instância por ter defendido que a homossexualidade é uma doença (sim, é disparatado, mas há uma minoria de psiquiatras que acredita nisso); passando por este último caso que diz muito sobre a forma como é castigada a corrupção e defendida a liberdade de expressão. Passo a palavra a Daniel Oliveira:
«Por corrupção activa para acto lícito, provada em tribunal, Domingos Névoa foi condenado a um multa de cinco mil euros. Por ter chamado corrupto a Domingos Névoa (termo absurdo para nos referirmos a alguém que é condenado por corrupção), Ricardo Sá Fernandes foi condenado a pagar ao próprio 13 mil euros. Saldo para Domingos Névoa: mais oito mil euros. Compensa. É para continuar.»
Entretanto, anteontem foi dia de greve da CP. O pobre septuagenário provavelmente desejaria ter morrido logo na terça feira, mas por causa dos malvados grevistas teve de adiar tudo um dia. Na próxima greve da CP, para além dos transportes alternativos, será de exigir também um serviço mínimo de suicídios?
Documentos tornados públicos no contexto de um processo jurídico envolvem o então cardeal Joseph Ratzinger no encobrimento dos crimes de um padre - Rev. Lawrence C. Murphy - que assaltou talvez duas centenas de rapazes surdos. Mudado de paróquia, o padre Murphy continuou a exercer durante mais 24 anos, em contacto livre com crianças atá à sua morte, em 1998. Vale a pena ler o artigo do NYT todo.
(Quem está farto de ler sobre véus e burcas que vá ler outro blogue...)
Continuando na missão deste blogue de dar voz a mulheres de origem muçulmana que defendem a proibição da burca ou a restrição do uso do véu (*), chegou a vez de uma deputada belga de origem mali, que não tem papas na língua e diz tudo aquilo que algumas pseudo-feministas europeias têm que ouvir, quer lhes agrade, quer não: que o véu é o símbolo e instrumento de uma ideologia totalitária, que a liberdade das mulheres se ganhou contra o clericalismo cristão e se pode perder contra o islamismo, e que as mulheres que usam o véu sem serem obrigadas ou sequer sem pensar não lhe retiram o significado liberticida que tem. Leia-se.
Israel deve ser tratado como um Estado normal - e é um passo nesse sentido que o Reino Unido expulse um responsável da Mossad. Afinal, falsificar passaportes de outro Estado e usar as identidades de outrém é crime. E os Estados não estão acima do crime, tenham tido antepassados que morreram nas câmaras de gás ou não.
Um dos comentadores deste blog sugeriu que uma frase que escrevi num cometário - "O celibato é uma perversão, um pecado contra a natureza, um crime contra 450 milhões de anos de evolução!" - podia ser transcrita para "um outro tipo de blog" se se substituísse a palavra a palavra "celibato" por "homossexualidade".
Eu não posso discordar mais desta afirmação e acho que vale a pena discuti-la aqui, ainda que brevemente.
O celibato pode ser uma opção – como em Santo Agostinho – que eu pessoalmente acho abominável, mas que não discuto, como não discuto outras opções similares, desde que sejam tomadas por adultos: a macrobiótica, o consumo de drogas duras, os jejuns, o uso de silícios, as intoxicações com vitaminas, ou as curas homeopáticas.
Mas o celibato do clero é uma prática imposta aos miúdos dos seminários, juntamente com um conjunto de regras supersticiosas que condenam e demonizam o corpo e a sexualidade normal dos adolescentes. Os banhos frios, as mãos em cima dos cobertores, a cegueira inevitável que espera os masturbadores, somada ao opróbio de verem crescer pelos nas palmas das mãos, tudo isto são tolices que geram tensões inevitáveis nas crianças e adolescentes a quem são impostas e, eventualmente, desvios como a pedofilia.
Não acho possível que alguém possa ser feliz e sexualmente frustrado, ao mesmo tempo. Acho esta ideia absolutamente doentia. Ainda por cima, sendo um facto que o celibato dos padres foi imposto por razões materiais – relacionadas com as heranças dos bens do clero – entre os séculos XI e XII.
A homossexualidade não tem nada a ver com esta história: é uma manifestação absolutamente NORMAL da sexualidade humana.
O Público traz um parde artigos interessantes sobre o Lashkar-e-Taiba, a organização islamista paquistanesa responsável pelos atentados de Bombaim, em 2008. Os artigos descrevem como esta organização (e outras semelhantes) foram criadas pelos serviços «de informações» do Paquistão (ISI) e pelos militares paquistaneses, por razões de imperialismo regional: o controlo do Afeganistão (em particular depois da invasão soviética) e o desafio à Índia (por causa de Caxemira e não só).
Numa polémicarecente que mantive neste blogue, alguns islamo-esquerdistas manifestaram-se apoiantes do islamismo, de uma forma surpreendente para quem deveria estar no campo progressista. Fariam bem em compreender quer a natureza profundamente reaccionária do movimento político islamista, quer os interesses imperialistas (paquistaneses ou iranianos) que apoiam esses movimentos.
«O Fernando Nobre é meu amigo pessoal há muitos anos e colaboramos em várias missões. Na questão da chefia de Estado, ele diz o que qualquer pessoa inteligente sabe, que as repúblicas que têm reis são as melhores. Mas eu não voto nas presidenciais e não participo em nenhuma campanha.» (Duarte Pio)
Duarte é um monárquico coerente (não vota em eleições presidenciais), mas que, como se vê, aproveita a oportunidade da campanha de Fernando Nobre para tentar fazer avançar o seu projecto político.
«Trata-se de uma organização que habitualmente enche os ouvidos dos fiéis de moralismo sexual (basta ouvi-la falar de divórcio, casamento homossexual, aborto) e que, enquanto isso, encobria milhares de abusos sexuais de crianças praticados no seu seio. Agora, quando já não é possível continuar a encobri-los, o Papa vem de novo pedir "desculpa", mas omitindo qualquer sanção quanto a abusadores e encobridores (ele próprio terá participado nesse encobrimento quando arcebispo de Munique e Freising). A hipocrisia foi ao ponto de, um dia depois, o Papa ter exortado os católicos a não se assumirem como juízes "dos que cometem pecados". É em alturas assim que um ateu como eu lamenta que não haja um Deus que julgue gente desta.» (Manuel António Pina)
O mito central do cristianismo pode ser lido como uma alegoria sobre a transferência de responsabilidades. Segundo a interpretação mais difundida, Jesus Cristo teria morrido pelos «pecados» da humanidade inteira, «pecados» que não cometera e pelos quais não era responsável. Obviamente, os «pecados» incluem desde comportamentos inócuos e até banalizados na nossa civilização (como relações sexuais consentidas entre adultos), até actos que serão sempre crime em todas as sociedades (como o homicídio). Há duas formas diferentes de encarar o sacrifício crístico: ou se o entende como um heróico exemplo a seguir, e portanto deve-se assumir a responsabilidade pelos próprios actos e até pelos de outrém (e estar disponível para sofrer as consequências), ou pelo contrário transferem-se as responsabilidades para uma entidade transcendente («Cristo morreu por nós, e só a Deus prestamos contas»).
Ratzinger publicou ontem o seu documento sobre os abusos sexuais cometidos por padres irlandeses. A «imprensa amiga» tenta convencer-nos de que «assumiu a responsabilidade». Nada mais falso: Ratzinger nada disse, por exemplo, sobre a carta que ele próprio escreveu em 2001, enquanto prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, a exigir o «segredo clerical» para as denúncias de abuso sexual de menores dentro da ICAR. Nessa época, não recomendava a colaboração com tribunais civis. Também não assumiu, que eu saiba, a responsabilidade por um caso em que teve responsabilidade directa: o acolhimento de um padre pedófilo em Munique quando aí era arcebispo.
«Entre 2003 e 2007 o Ministério Público indiciou dez padres por abuso sexual de crianças. Nesse período, houve um total de 5128 casos desses em Portugal(1). Há cerca de quatro mil padres (2) e cinco milhões de homens em Portugal. Assumindo que esses 5128 casos correspondem a 5128 homens indiciados, dá cerca de 1 homem em cada 1000 indiciado por pedofilia contra 1 padre em cada 400. Contas por alto, o dobro da incidência nos padres. (...) Uma complicação é que dez indiciados em quatro mil é um número muito pequeno para uma conclusão estatisticamente significativa*. Mais elucidativos são os números acerca dos EUA. Houve mais de dez mil alegações de abusos sexuais por parte de padres católicos entre 1950 e 2002. Dessas, foram substanciadas por investigações posteriores 6,700 acusações a 4,392 padres**, o que equivale a 4% dos padres em exercício no período considerado(4). Uma incidência dez vezes maior que a reportada para os padres portugueses*** e quarenta vezes maior que nos homens em Portugal.» (Que Treta!)
Exactamente como os terrorismos de estado, os terrorismos privados têm três objectivos fundamentais: poder, dinheiro e sexo. As actas das “Brigadas 25 de Abril”, as histórias das vidas privadas de Carlos ou de Jacques Vergès,o livro de Stefan Aust sobre o grupo Baader-Meinhof, ou agora a aliança da ETA com a Camorra, não deixam muitas dúvidas sobre uma coisa: somos todos iguais.
Os bispos americanos alinharam com a indústria farmacêutica, contra o plano de Obama para proteger os milhões de americanos que não têm seguros de saúde. As angústias e o sofrimento que esta situação causa todos os dias a mais de 40 milhões de americanos são indescritíveis, mas deixam os bispos – os mesmos que abafaram mais de 11.000 crimes de abuso sexual de menores, durante 25 anos, e protegeram activamente os criminosos - absolutamente frios.
Num comentário ao texto do Ricardo Alves, inquiri-o se teria cabimento supor-se que algum condutor poderia alguma vez seguir de Alcântara a Benfica sem notar que a polícia o estava a mandar parar. Lembrei-me de uma história que era muito contada na universidade onde estudei, em Long Island, no estado de Nova Iorque, e concluí que essa possibilidade, embora muito remota, até pode ter algum cabimento.
A história resume-se da seguinte forma: um aluno tinha defendido a sua tese nesse dia, e decidiu ir a Nova Iorque com os amigos celebrar. O grupo foi de carro (uns 80 km), com o novo graduado ao volante. Saíram da universidade e não pararam num sinal de stop. A polícia viu e mandou-os parar. Só que o estudante não viu o carro da polícia (deveria ir a conversar com os amigos) e seguiu. Seguiu dentro da universidade, seguiu na estrada de acesso à autoestrada, seguiu na autoestrada. Sempre com um carro da polícia atrás, a mandá-lo parar. Tanto seguiu, tanto seguiu, até um certo ponto, em que tinha a autoestrada cortada com carros–patrulha à espera do carro fugitivo.
O que há a aprender deste episódio? Que fique bem claro: não defendo os modos de atuar da polícia americana, nem pretendo que ela seja exemplo para a portuguesa. Mas há sobretudo que comparar. Onde é que a polícia portuguesa alguma vez tinha meios para cortar uma autoestrada para intercetar um fugitivo? As notícias ontem falavam numa perseguição na Austrália que envolveu cem policiais. Não morreu ninguém nem consta que tenha havido tiros. Seria possível em Portugal mobilizar cem policiais para uma perseguição?
Desde essa altura que tenho a ideia que a polícia portuguesa tem muito poucos recursos, muito má preparação, e faz o que pode com eles. É uma profissão mal paga e muito pouco dignificada. Os polícias, que não podem ser sindicalizados, têm de andar sempre impecavelmente apresentados, e no entanto são eles que têm que comprar e tratar as suas fardas. Têm acesso a armas, mas têm de justificar toda e cada bala que disparam (e ainda bem!). Arriscam a sua vida. São sempre identificados. Quando erram, são responsabilizados. Têm muitas vezes opiniões xenófobas, que transparecem de certas declarações que eles não devem nem têm de proferir, mas não têm grande formação (nem sequer para o seu próprio ofício).
Situações como a que ocorreu esta semana são lamentáveis e não podem ficar sem resposta; devem ser apuradas responsabilidades e punir quem tiver de ser punido. O ministro da Administração Interna deveria exigir um inquérito. Agora, antes de desatarmos a tratar o corpo da polícia como um bando de criminosos (que eles não são), deveríamos refletir sobre o que lhes podemos exigir com os recursos, os meios e a preparação que eles têm ao seu dispor.
O resto da história do estudante, não sendo muito feliz, também não chega a ser trágica: o estudante ficou um ou vários dias na prisão, não sei precisar (sei que era europeu, e graças a esta história perdeu o avião de regresso ao seu país…). Por originalmente não ter parado num stop. Podemos achar exagerado, mas pelo menos cumprem-se as leis, que são iguais para todos. Mas o que eu quero frisar é que o estudante fugitivo foi apanhado e não morreu. Nem levou nenhum tiro.
Váriosjornais reportam hoje que os cortes nas prestações sociais (particularmente no RSI) tiveram oposição no próprio Conselho de Ministros. Até se descobriu subitamente uma «ala esquerda» do governo, liderada pelo Ministro da Economia Vieira da Silva e contando ainda com Alberto Martins e Ana Jorge. Seguiram-se os desmentidosda praxe, mas as divisões na bancada parlamentar, essas, são públicas (e indesmentidas).
Há razões para desconfiar que o PEC foi previamente decidido e acordado alhures, provavelmente em Bruxelas. Mas só em surdina se pode admitir que a nossa soberania está, de facto, limitada.
À semelhança da Grécia, em Portugal a factura da crise económica vai ser paga pelos sectores mais vulneráveis da sociedade. Com o típico encolher de ombros dos conformados, os comentadores ditos “sensatos” e que apoiam a contragosto o PEC dizem que “não há alternativa: o défice tem de ser reduzido, e já!; não vão os mercados finaceiros expulsar-nos do paraíso”.
Deixando de lado dúvidas sobre a viabilidade e sensatez de tal plano (economistas como David Blanchard e Paul Krugman afirmam que cortes drásticos na despesa pública em plena recessão podem comprometer a retoma económica), queria debruçar-me sobre as consequências sociais do PEC do governo socialista. Os cortes no Rendimento de Reinserção Social e noutros programas de ajuda aos maus vulneráveis deixaram os socialistas João Cravinho, João Pedroso e Pedro Adão Silva (entre outros) em estado de choque. E com razão. Portugal ocupa já o segundo lugar no ranking dos países da OCDE com as maiores desigualdades sociais. Com o PEC, Portugal vai seguramente disputar o primeiro lugar aos Estados Unidos.
Mas mais do que chocantes, estes cortes revelam uma miopia política extraordinária.
Como revelaram os epidemiologistas britânicos, Richard Wilkinson e Kate Pickett no seu estudo The Spirit Level: Why More Equal Societies Almost Always Do Better; (London: Allen Lane, 2009), as desigualdades sociais são a causa da recessão. Estas desigualdades são também contraproducentes, pois afectam a qualidade de vida de toda a população a todos os níveis.
Os países mais desiguais da OCDE (Estados Unidos, Portugal e Reino Unido) partilham entre si uma série de problemas: taxas elevadas de insucesso escolar, de homícidios, de doenças cardiovasculares, de obesidade, de depressão, bem como uma menor esperança média de vida e fraca mobilidade social. Estas sociedades têm também uma elevada proporção da população encarcerada, e o maior número de adolescentes grávidas do mundo desenvolvido, revelam Wilkinson e Pickett no seu estudo. Mais. Estes problemas não afectam apenas os mais pobres destas sociedades; afectam toda a gente. Os bilionários norte-americanos têm vidas mais curtas, mais ansiosas e menos saudáveis do que as dos seus comparsas finlandeses.
No Reino Unido, o estudo de Wilkinson e Pickett foi levado a sério por todos os partidos políticos. Seria bom que em Portugal o governo e a oposição fizessem o mesmo antes de se lançarem nos cortes selvagens aos serviços públicos.
«O governo do PS, em que votei, vai introduzir um tecto de despesa nas prestações sociais não contributivas, o que quer dizer que quando ele estiver esgotado, quem receber, por exemplo, o subsídio social de desemprego ou o complemento solidário para idosos, apesar de ter direito à prestação já não a receberá. (...) No corte das prestações sociais, o RSI tem direito a uma evidenciação especial e que lá está apenas para que o governo do PS diga – qual Portas – que os malandros dos beneficiários do RSI também vão pagar. De facto, a despesa com os mais pobres vai diminuir em 200 milhões entre 2011 e 2013, dos quais 30 milhões serão no RSI. (...) Repare-se que em 2011 o Estado vai buscar mais aos pobres do que ao adiamento das infraestruturas e que vai, afinal e para minha surpresa, buscar a estas prestações mais do que à famosa nova taxa de IRS de 45%.» (PauloPedroso)
Há 99 anos, em 1911, Carolina Beatriz Ângelo foi primeira mulher portuguesa a recensear-se e a votar.
A lei eleitoral de 14 de Março de 1911, não contemplando o sufrágio feminino, também o não rejeitava. Aproveitando a ausência de referência ao género na lei de 1911, Carolina Beatriz Ângelo exigiu que o seu nome fosse aceite nas listas de recenseamento eleitoral. Segundo a lei, os eleitores teriam de ser maiores de 21 anos de idade, saber ler e escrever e ser chefes de família. Carolina Beatriz Ângelo era maior de idade, era médica, viúva e com uma filha menor a seu cargo.
O processo não foi simples. O requerimento de recenseamento eleitoral de Carolina foi enviado à comissão recenseadora, que, não sabendo como decidir o remeteu ao ministro do interior. Em Abril de 1911 este era António José de Almeida e indeferiu o pedido. A requerente apelou então "para juízo, arrostando com o ridículo e com a má vontade dos homens, que não contavam com a nossa coragem nem com a justiça do julgamento". O juiz que lhe coube em sorteio, João Baptista de Castro, decidiu favoravelmente e Carolina Beatriz Ângelo foi finalmente recenseada tendo votado para a Assembleia Constituinte a 28 de Maio de 1911.
Foi um processo "mediático" e muitas e diversas opiniões e entrevistas cruzaram as páginas dos jornais. Previsões como "o requerimento dessa senhora não terá pois outro efeito que não seja o de tornar para o futuro, mais precavidos os ministros contra os estratagemas do belo sexo" cumpriram-se. No código eleitoral votado em 1913 o sexo masculino passou a constar como condição necessária ao recenseamento eleitoral e consequentemente ao direito ao voto.
Carolina Beatriz Ângelo morreu a 3 de Outubro de 1911, com 33 anos de idade.
Só em 1931, 20 anos após Carolina, puderam outras mulheres votar. Mas apenas aquelas que, sendo chefes de família, ou estando o marido ausente (nas colónias ou no estrangeiro) tivessem completado o ensino secundário ou superior. As restantes tiveram de esperar mais 43 anos, por 1974.
Este blogue leva cinco anos de existência. Começou como um projecto individual, alargou-se pela primeira vez em Maio de 2006, e pela segunda em Setembro de 2009.
Todavia, algo não estava bem. Saltava à vista que este blogue sofre de um defeito cromossómico muito comum na blogosfera, e ainda mais nos centros de poder: todos os autores têm um cromossoma coxo, o que resulta num elevado teor de testosterona que transpira dos textos e nos torna, bem, limitados.
É portanto uma grande honra e uma ultrapassagem dos nossos limites passarmos a contar com a Eunice Goes, ex-jornalista e professora de estudos políticos em Londres.
Há dois dias, um profissional da músicanão parou o carro ao sinal da polícia, e continuou de Alcântara a Benfica sem parar (ou sem se aperceber da ordem de parar). Era jovem, de origem africana e da pobre Chelas. Foi perseguido pela polícia e morreu com um tiro nas costas.
Há quatro meses, profissionais da «segurança» passaram vários semáforos vermelhos na Avenida da Liberdade, à velocidade de 120 km/h, provocando um acidente gravíssimo. Eram de meia idade, de origem europeia e, mais relevante, altos funcionários do Estado. A polícia não os mandou parar (nunca manda), e o Ministério Público «achou» que deviam ficar impunes.
Dirão que é demagógico traçar este paralelo. Talvez seja. Mas a verdade é que me sinto inseguro com uma polícia e uma Justiça que têm gatilho fácil para o puto de Chelas, e desculpas prontas para as excelências e seus excelsos motoristas. E se «mostrar serviço» passasse por ser forte com os fortes?
O socialismo de direita que nos governa descobriu onde é que o Estado gasta demais: no Rendimento Social de Inserção. Até 2013, promete-se uma redução de 8% na despesa. Já na consultoria, a redução é só de 5%.
Esperança média de vida portuguesa acima da média europeia
Segundo o Eurostat, a esperança de vida dos homens e mulheres portuguesas à nascença eram em 2008 ligeiramente acima da média europeia, sendo respectivamente 76,2 e 82,4 anos.
PIB português continua com evolução bem melhor que a média, diz Eurostat
Segundo o Eurostat, o PIB nacional continua com uma evolução bem acima da média da UE27. Dos dados divulgados (variação trimestral face ao trimestre homólogo) conclui-se que embora tenha havido um decréscimo em Portugal, este foi de apenas 0,8%, o que contrasta com os 2,3% da média comunitária.
Ciência portuguesa, de vento em popa
O relatório sobre a produção científica nacional de Fevereiro produzido pelo MCTES está repleto de boas notícias. No curto período de 2004 a 2008 houve um aumento de 68% no número de trabalhos científicos publicados. Os outros países europeus também melhoraram, mas a um ritmo inferior. Em apenas 4 anos Portugal passou de 52% para 72% da média europeia. De 2003 para 2008 o número de doutoramentos subiu 50%. O número de patentes de 2005 para 2008 triplicou nos registos americanos, e aumentou 2,3 vezes nos registos europeus. Na UE15 (os dados disponíveis), no período 2004-2007, Portugal teve o maior aumentou do número de investigadores.
O valor gasto em investigação também teve uma explosão, tendo Portugal ultrapassado a Irlanda e a Espanha - países que usualmente eram dados como referência pela sua semelhança.
Este aumento não vem só de gastos públicos. De 2005 para 2008 o investimento de empresas em investigação&desenvolvimento (em % do PIB) aumentou 2,5 vezes!
Mandaram-me isto e juraram-me que este personagem existe, que isto não é um sketch do Gato Fedorento... :o)
Para mim, que odeio futebol, que acho o jogo uma coisa incompreensível, com uns selvagens aos pontapés uns aos outros e numa bola, a cuspirem uns nos outros e a tentarem meter a bola num camaroeiro, as claques aos berros, com suásticas, os comentadores sem saberem falar... Ouvir isto é um sonho.
Fernando Nobre iniciou a sua campanha dizendo que o seu «espaço político» não estava definido «à esquerda, à direita, ou ao centro». Lendo as declarações excêntricas das últimas três semanas, começa a parecer que o seu real espaço político é o dos extremos. Ambos os extremos.
Na primeira entrevista, afirmou que o Hamas e o Hezbollah não eram «terroristas» mas sim «resistentes» (piscar de olho para o extremo esquerdo), assumiu-se monárquico e insistiu na questão de Olivença (piscar de olho para o outro extremo). Questionado sobre um referendo ao casamento entre pessoas do mesmo sexo, respondeu que referendada deveria ter sido... a participação portuguesa na guerra do Iraque (um referendo a uma guerra?!).
35 anos se passam sobre uma data que marcou a modernização da economia portuguesa na década de 70. Com efeito, nessa época a regra nos países europeus era as grandes empresas, os principais meios de produção serem considerados estratégicos e estarem nas mãos do estado. A isto acrescentou regalias para os trabalhadores que há quem ainda hoje não aceite, como os subsídios de férias e Natal e o salário mínimo. O que o governo do “terrível revolucionário” Vasco Gonçalves se limitou a fazer foi o mesmo que se fazia na Europa.
35 anos se passaram, e discute-se o PEC. O PEC que tem medidas muito positivas e há muito reivindicadas, como a criação de um novo escalão de IRS para os rendimentos mais altos e a taxação das mais-valias. Também concordo com o fim dos benefícios fiscais anunciados, e não me faz confusão os não-aumentos na função pública e a suspensão de obras públicas como o TGV até melhor data (embora, como afirma o João Vasco, tal medida venha dar razão ao PSD e lance dúvidas sobre se o PS mudou de ideias ou se (e nos) enganou nas contas – qualquer uma delas é má). Mas tais medidas não são suficientes para compensarem tudo o que o governo se prepara para anunciar, nomeadamente um pacote de privatizações de empresas e serviços públicos de que o estado não pode abrir mão, a começar pelos Correios e pela Rede Energética Nacional. Concordo: um governo socialista não privatiza os correios (nem a REN). Os socialistas têm de levantar-se e dizer "BASTA!”
Mesmo nas restantes empresas, e independentemente do que se achar que o Estado deve deter (e eu acho que deve detê-las), como anuncia o Daniel Oliveira, tais privatizações fazem mal ao défice.
Não direi que para mim tal intenção constitui a “gota de água” porque infelizmente representa muito mais do que uma gota (se só quisessem privatizar uma gota, estaríamos nós bem). De qualquer maneira, e uma vez que escrevo sobre política sem nenhum interesse que não seja o de exprimir as minhas opiniões e partilhá-las com os leitores, da mesma forma que anunciei antes das eleições que iria votar no PS, anuncio agora que, a confirmar-se este programa, se houvesse neste momento eleições não votaria no PS. Se o governo levar as privatizações avante, deixa de contar com o meu apoio.
Continuemos a falar do comércio a retalho, só que desta vez de legumes frescos.
Costumo brincar com os meus amigos economistas, dizendo-lhes que enquanto a física consegue prever com todo o rigor certas grandezas a economia não é capaz de prever sequer o preço do quilo da alface. Bem: não no “Pingo Doce” onde, desde Outubro de 2009 (pelo menos), o kg da alface tem sido sempre a 1,49 €. O mesmo com o espinafre e o tomate: sempre ao mesmo previsível preço.
O rapaz da foto entra-nos todos os dias em casa (para quem vê televisão), a anunciar que, na cadeia de lojas que ele promove, basicamente os preços são fixos, à boa maneira socialista (dizem que Salazar fazia o mesmo, pelo menos com o preço do pão, nem que tivesse que lhe diminuir o tamanho…). Enquanto nas outras lojas os preços flutuam com o mercado, com a lei da oferta e da procura e com as condições climatéricas (algo que, especialmente com um inverno rigoroso como o que temos tido, naturalmente afeta e muito o preço dos legumes frescos), no “Pingo Doce” os preços não aumentam (mas também não diminuem – não variam).
É curioso que os economistas, mais liberais ou mesmo mais keynesianos, gastaram nas duas últimas décadas tanto latim a explicarem-nos os problemas de uma economia planificada, e agora ninguém reclama por o “Pingo Doce” estar a planificar a economia (fixar preços é típico de uma economia planificada, e não de uma economia livre).
Dir-me-ão que o “Pingo Doce” é uma empresa privada, que pode vender os produtos aos preços que quiser numa economia livre, enquanto o estado fixar os preços é diferente. Mas será assim tão diferente? Terão os produtores liberdade de negociar livremente com o “Pingo Doce” o preço das suas colheitas? Não estou de modo nenhum a acusar o “Pingo Doce” de nada, mas sei que muitas vezes os grandes retalhistas exercem pressões enormes sobre os produtores, sendo que em muitas localidades detêm praticamente o monopólio. Os produtores têm que aceitar os preços que os grandes retalhistas oferecem; não têm escolha. Não sei se é esta a situação do “Pingo Doce” (repito – não estou a acusar ninguém), e pode ocorrer com outros retalhistas, hipermercados ou não. Sei é que esta situação hipotética não é a de uma economia livre.
Mas admitamos que nada disto se passa: o “Pingo Doce” é uma marca séria, e decidiu manter um compromisso com os clientes. Mesmo que a intenção do “Pingo Doce” não seja essa, a verdade é que todos aqueles anúncios são uma exaltação das virtudes da economia planificada como há muito não se via (e espanta-me, falo a sério, que nenhum economista comente este assunto). Ao ver aquele rapaz rechonchudo a repetir que “só o “Pingo Doce” respeita o seu dinheiro” por não variar os preços, questionamo-nos se não seria melhor que fosse assim com tudo. As lojas todas, todo o comércio. Não só o “Pingo Doce”. Desde que não houvesse esmagamento dos produtores. Se há pressões sobre os produtores, é intolerável; se não há, afinal a economia planificada funciona! Não é assim? Não consta que o “Pingo Doce” dê prejuízo!
Sim, e o rapaz é rechonchudo. Só num anúncio, o “Pingo Doce” reabilita a planificação da economia e os gordos para a publicidade. Quer-me parecer que o “Pingo Doce” está a tentar atrair clientes de esquerda.
«As privatizações vão fazer o Estado poupar, todos os anos, 170 milhões de euros em juros da dívida. Só a EDP e os CTT dão ao Estado isso em dividendos. Junte-se a Galp e a Fidelidade…»
A razão apresentada pelo governo para estas privatizações é a luta contra o défice. Seria difícil aceitá-las sem que as mesmas tenham sido propostas na campanha eleitoral. E o calendário piora as coisas, porque uma coisa é que os investidores tenham muito o que investir, e pouco onde o fazer, aí o património do estado poderia, pelo menos, ser bem vendido. Outra coisa, oposta, é a situação actual, onde os investidores privados em geral estão endividados. Privatizar empresas do estado nesta conjuntura será vendê-las por «tuta e meia». Mas a situação é desesperada - dizem-nos - e é necessário reduzir o défice com urgência.
Talvez por essa mesma razão, por ser uma má altura para vender, o dinheiro que se prevê poupar em juros com esta venda não cubra sequer os dividendos que as empresas apresentam anualmente. Mas nesse caso como justificar tais privatizações como medidas de combate ao défice? A ser assim, a sua venda vai agravar a situação orçamental.
A única resposta que me ocorre é preocupante - trata-se do medo de que os juros se agravem caso a dívida suba acima de um determinado patamar. Nesse sentido, esta privatização agrava o balanço face à situação actual, mas não face à alternativa possível que seria pagar juros mais altos sobre toda a dívida.
Claro que isto é um erro. Se é importante recorrer a receitas extraordinárias para evitar que a dívida suba acima de um determinado patamar, então faria mais sentido optar por receitas que não implicassem perda de rendimento. A venda de parte das nossas reservas de ouro é uma solução que me ocorre, e certamente haverão outras.
Outra possibilidade é a de que os dividendos que são apresentados por essas empresas não sejam mais do que cosmética, uma forma de desorçamentação. A ser esse o caso, é vergonhoso que a discussão pública sobre as medidas políticas e ecoómicas se tenha de travar perante tal opacidade, perante tanta informação enganadora ou mesmo falsa.
A única forma de acreditar que estas privatizações são a melhor opção para o governo combater o défice é acreditar que, depois de mentir descaradamente a respeito de todos os défices orçamentais, vai agora tentar enganar os investidores.
O guarda-lamas de bicicleta cuja embalagem vêem na figura foi comprado por mim no passado mês de Julho em Paris, numa loja de uma cadeia de hipermercados que há dois anos saiu de Portugal. Procurei e nunca encontrei um artigo semelhante em hipermercados portugueses. Disseram-me, mais tarde, que o poderia encontrar, em Portugal, numa conhecida loja de desporto francesa. Possivelmente fabricado em Portugal, como o artigo que eu comprei (cliquem na imagem e confirmem), da marca de uma cadeia que há dois anos saiu do país. Nas lojas portuguesas, nada semelhante. Passa-se o mesmo, sem surpresa, com as bicicletas propriamente ditas. Conforme se pode ler aqui, a mesma grande empresa francesa vende bicicletas portuguesas. A sua principal concorrente (e líder do mercado) em Portugal, uma empresa portuguesa, vende (informei-me) bicicletas fabricadas na Tailândia. É esta a visão dos grandes retalhistas portugueses. Entretanto, apesar de o setor estar em crise, Portugal ainda vai sendo o maior produtor europeu de bicicletas. Graças à França, e enquanto a Europa (neste caso, a França) quiser. Portugal nunca pode contar com os portugueses.
Chegou o Vias de Facto, um blogue à esquerda que promete pela diversidade de opiniões e registos. Inclui o Miguel Serras Pereira e o Miguel Madeira, entre outros.
O bispo Richard Williamson, conhecido por achar que o Holocausto é uma invenção "dos judeus", tem mais opiniões, algumas sobre as mulheres - essas porcalhonas! - que jogam tenis com umas saias absolutamente indecentes, que nos deixam a pensar se elas não terão um comportamento sexual tão prosmícuo como o dos homens. Imagine-se!
Diz o bispo: "The outfits worn by female tennis players, the bishop says indignantly, "hardly reach past the middles of their thighs." Williamson has noticed female fans wearing even shorter skirts. "Aren't there are any men left who tell their daughters, sisters, wives or mothers that this sort of outfit is only meant for the eyes of their own husbands?"
Diz Georg Ratzinguer, irmão do papa, sobre mais outro escândalo sexual na Igreja Católica, desta vez na Alemanha, num coro dirigido pelo padre Georg Ratzinger entre 1964 e 1994.
No HuffPo: "A man who lived in the choir-linked boarding school until 1967 has contended that "a sophisticated system of sadistic punishments in connection with sexual lust" had been installed there. Der Spiegel quoted the man, Franz Wittenbrink, as saying it would be inexplicable that the pope's brother didn't know anything about it."
Diferentes sociedades podem ter diferentes graus de tolerância para com comportamentos promíscuos. E diferentes indivíduos podem querer, ou não, ter esse tipo de comportamentos independentemente do grau de tolerância social para com os mesmos.
Uma sociedade onde o grau de tolerância para com esse tipo de comportamento difere se quem o pratica é homem ou mulher é uma sociedade sexista. Actualmente é difícil (mas possível...) encontrar quem discorde disto.
Mas tomemos duas sociedades A e B em que o grau de tolerância não difere consoante se trate de um homem ou mulher. No sociedade A a promiscuidade é censurada, os valores dominantes associam as relações sexuais à afectividade e condenam a dissociação entre estas duas realidades. Na sociedade B promiscuidade não é censurada nem incentivada, reservando-se a censura aos comportamentos sexuais para aqueles que são perigosos ou não consensuais (ou que envolvam menores).
Será uma das sociedades mais sexista que a outra?
Existe quem defenda que sim. Existe quem defenda que, sendo a vontade de ter um comportamento sexual promíscuo mais comum nos homens que nas mulheres, a sociedade B é mais machista que a sociedade A. Não porque homens e mulheres sejam tratados de forma diferente, alega quem defende tal posição, mas porque o próprio comportamento promíscuo é machista. E como pode ser machista um comportamento que tanto as mulheres como os homens podem apresentar? A justificação que é dada é que corresponde a um comportamento masculino, mesmo que sejam mulheres a praticá-lo.
Já li homens e mulheres feministas a defender esta posição. Uma posição que me parece... sexista.
Aquilo que acredito é que uma coisa é verificar na realidade que comportamentos é que homens e mulheres habitualmente apresentam, e reconhecer, de forma descritiva, diferenças. Estas descrições referem-se sempre a tendências gerais e nunca a todos os indivíduos, e se bem que muitas das diferenças tenham causas biológias, parte significativa tem causas sociais, e é difícil estabelecer ao certo qual a influência de cada uma destas. Outra coisa diferente, é etiquetar comportamentos como «masculino» ou «feminino» de forma normativa. Pode ser mais comum que os homens gostem de desporto que as mulheres, mas um homem que não goste não é menos masculino por isso. Pode ser mais comum que as mulheres invistam mais tempo a cuidar da aparência, mas uma mulher que não queira não é menos feminina por isso. Sexismo é considerar impróprio que uma mulher sirva nas forças armadas, ou que um homem seja caixa de super-mercado. Dizer que o comportamento promíscuo é masculino ou que a ausência de tal comportamento é feminina.
Há qum possa continuar a acreditar que os comportamento promíscuos deveriam ser censurados. Que tornar alguém um mero «objecto sexual», mesmo que este último não se importe ou até queira, é errado. Não é o meu caso. Eu acredito cada um deve ser casto ou promíscuo conforme queira, desde que não invada a liberdade de terceiros, nem tenha comportamentos perigosos.
Mas, num caso ou noutro, não é de sexismo que estamos a falar.
O Plano de Estabilidade e Crescimento, de acordo com esta notícia, vai significar o seguinte:
-«Os rendimentos colectáveis acima dos 150 mil euros vão estar sujeitos a uma taxa de 45 por cento.» Acho bem. Corresponde a um reduzido aumento da carga fiscal, feito sobre quem terá menos dificuldade em pagá-la.
-«as mais-valias realizadas em bolsa vão passar a pagar um imposto de 20 por cento» Acho óptimo. Já aqui tinha criticado o governo por não implementar esta medida, que aliás constava - e bem - do programa de governo.
-«Teixeira dos Santos anunciou ainda a redução de benefícios fiscais.» Estou de acordo. Pese embora a injustiça do PS ter ganho bastantes votos por ter alardeado a posição impopular do BE - a qual era favorável à diminuição ou fim destes benefícios - e agora vir fazer o oposto daquilo que o eleitorado entendeu, já durante a campanha eleitoral considerei que o BE tinha razão neste ponto.
-«O PEC prevê uma actualização dos salários dos funcionários públicos abaixo da inflacção até 2013» Isto já vem sendo o habitual. Sobem-se os salários bem acima da inflacção em tempo de eleições, para depois compensar nos outros anos. Discordo desta sazonalidade, mas entendo que sejam essas as «regras do jogo».
-«Na Saúde, o governo diz que vai limitar o recurso a outsourcing» Faltam detalhes para saber se é mesmo uma medida positiva, mas parece.
-«na Defesa prometeu “um corte de 40% das verbas previstas na lei de programação militar para aquisição de equipamentos” e deixou a garantia “não vão ser assumidos novos compromissos” neste sector» 100% de acordo!
Depois da enorme desilusão recente, eis que o governo me surpreende pela positiva a respeito do PEC. Bom, ainda faltam detalhes, mas aquilo que já sei é sem dúvida positivo.
Há umas dúvidas no ar, no entanto:
-«O Plano de Estabilidade e Crescimento apresentado hoje pelo governo prevê o adiamento das linhas de alta velocidade "por dois anos"» Um dos argumentos que o PSD avançava para a não continuação das obras do TGV era o facto da dívida pública não permitir essas aventuras. Haveria, diziam, um mau «timing» para esse investimento. O PS contrapunha que no Âmbito da crise mundial que se estava a viver, estimular a procura agregada era mais importante que limitar o endividamento. E perante a alegação do PSD de que esse investimento duraria vários anos em vez de corresponder a uma resposta rápida à crise, o PS respondia que a crise na procura também iria durar algum tempo. Esta medida parece dizer que o PSD tinha razão. Eis algo que não posso avaliar por mim, pois trata-se de uma questão técnica que me ultrapassa. Mas, ou bem que o PS mudou as suas prioridades face ao que anunciou nas eleições, ou bem que fez mal as contas. O grave nisto é que eu prefiro acreditar na primeira hipótese...
-«o que é realmente estrutural são as privatizações. Nisto, como sabemos por experiência acumulada, não se volta atrás. E se for verdade que os Correios estão incluídos, é motivo para um combate sem tréguas.» Hum.. Vejamos ao certo quais são as propostas concretas. Privatizar os CTT à partida parece-me má ideia.
O «Banco Astral» tem um capital próprio de 100 moedas. E tem 1000 moedas em depósitos. Todos os anos, entre os juros que recebe daquilo que pode emprestar e os juros que paga aos depositantes, consegue apenas o suficiente para pagar as suas despesas de funcionamento. Com 0 moedas de lucro líquido, os accionistas do «Banco Astral» sentem que as suas 100 moedas de capital próprio estão a render pouco. Mas não são eles que controlam quem é despedido ou contratado, nem sequer o CEO*. Mas, em 2000, o Painel faz a contratação pela qual todos ansiavam: Gustavo Alberto. O rendimento de Gustavo é inteiramente uma comissão. Se o «Banco Astral» tiver prejuízos, Gustavo não receberá nada. Se tiver lucros acima dos que existiam (zero), receberá 10% desse valor. Os accionistas aceitam de bom grado receber 90% dos lucros acrescidos que Gustavo lhes possa trazer, mas não têm voto na matéria*.
Sob a direcção de Gustavo, o «Banco Astral» compra um Picasso raríssimo. É tão raro e valioso, que Gustavo acredita valer bem as 10 moedas que serão dadas por ele.
Existem dois bancos que também mudaram de direcção recentemente. O «Banco Calculador» e o «Banco Fundamental». O primeiro banco compra uma gema de diamante gigante no valor de 10 moedas. O segundo compra um vasto terreno na lua por esse mesmo valor.
Em Dezembro de 2000 Gustavo decide que o terreno na Lua obtido pelo Banco Fundamental é uma óptima opção de investimento, mas este só está à venda por 20 moedas. «Ainda assim vale a pena», pensa Gustavo, e a oferta é feita. O Banco Fundamental oferece 20 moedas pela gema, e o Banco Calculador oferece 20 moedas pelo Picasso.
Antes que as transacções sejam feitas, é realizado o balanço da empresa. O Banco Astral comprou por 10 moedas um Picasso, cujo valor de Mercado é agora 20. Isto representa 10 moedas de lucro, e uma delas vai para os bolso de Gustavo.
Neste momento, a empresa tem 89 moedas de capital próprio ao qual se soma património no valor de 20 moedas. Além disso, o total de dinheiro depositado é de 1000 moedas.
No início de 2001, as transacções são feitas. O Banco Astral fica com os terrenos na Lua, o Banco fundamental fica com a gema, e o Banco calculador com o Picasso. No fim de 2001, o Banco gerido por Gustavo oferece 40 moedas pela Gema. O Banco Astral oferece 40 moedas pelo Picasso, e o Banco calculador 40 moedas pelo terreno na Lua.
Desta vez, o lucro foi de 20 moedas, e a comissão de Gustavo é de 2 moedas. O capital próprio do Banco Fundamental é de 87 moedas mais património avaliado em 40 moedas.
Em 2002, depois de feitas as transacções, o Banco Astral oferece 80 moedas pelo Picasso. O Fundamental 80 pelos terrenos na Lua, e o Calculador 80 pela gema. No início de 2003, o Banco Astral tem 83 moedas e património avaliado em 80 moedas. Curiosamente corresponde ao mesmo Picasso que o banco detinha em 2000, mas ele agora está oito vezes mais valioso. Como o património do Banco é avaliado em 163 moedas, Gustavo é visto como um gestor genial que em apenas 3 anos aumentou em 63% o patrimínio do banco. É por isso que é aceite a sua proposta de alocar algum do dinheiro dos depósitos para estas compras, abdicando de receber os juros dos empréstimos de baixo risco. Assim, Gustavo oferece 160 moedas pelo terreno na Lua. O ciclo mantém-se.
Em 2006 o Banco Astral tem novamente um Picasso, mas desta vez o quadro vale 640 moedas. Além disso, o banco tem um capital próprio de 18 moedas.
Em 2007 o banco faz um empréstimo de alto risco para poder oferecer 1280 moedas pela gema do Banco Fundamental. O Banco Astral oferece 1280 moedas ao Banco Calculador pelo Picasso. O Banco Calculador vende o Picasso, mas oferece apenas 10 moedas pelo terreno na Lua. Diz que o terreno não vale mais que isso.
O Banco Astral tem uma dívida líquida no valor de 1280 moedas, um capital próprio que corresponde a pouco mais do que o tereno na lua avaliado em 10 moedas. Como é que os depositantes reaverão o seu dinheiro? Como foi possível que tanto dinheiro desaparecesse?
Haverá quem alegue que esta história não faz sentido. A asneira de Gustavo e dos outros CEOs era mais que evidente. Ao que Gustavo poderia responder: «Asneira, qual Asneira?». No fim das contas, Gustavo obteve 63 moedas: 63% do capital próprio do banco para o qual trabalhou. Ele ficou muito bem nesta história, e presumivelmente assim terão ficado os CEOs dos outros bancos. Com esta brincadeira, todos os gestores de topo enriqueceram, quem perdeu foram os accionistas e os depositantes.
Mas e os accionistas? Não era para eles evidente a asneira que Gustavo e os outros faziam? Até poderia ser. Mas quem pensa que pelo simples facto de deter um banco se pode escolher quem o dirige está enganado:
Os euro-entusiastas dizem que a União Europeia, para os países pobres, não é uma forma de trocar soberania por dinheiro. E no entanto, parece que há pelo menos dois deputados alemães que encaram a UE como uma forma de a Alemanha ir comprando o sul da Europa.
«“Aqueles que se encontram em processo de insolvência têm de vender tudo o que têm para pagar aos seus credores”, argumentou Josef Schlarmann, membro do partido de Angela Merkel. “A Grécia tem edifícios, empresas e ilhas não habitadas, que podiam ser usadas para amortizar a dívida”, disse. “Se tivermos de ajudar a Grécia com milhões de euros, eles têm de nos dar algo em troca – por exemplo algumas das suas maravilhosas ilhas. O lema: vocês recebem carvão. Nós, Corfu”» (i)
Que lema tão bonito. Proponho que seja adoptado como letra do hino da Grande Nação Europeia.
Adenda: a notícia do i, como acontece frequentemente por aquelas bandas, é uma trapalhada. Os deputados são Frank Schaeffler (que sugeriu apenas a venda de «ilhas desabitadas» e é do FDP) e Marco Wanderwitz, que é da CDU e sugeriu, efectivamente, uma «troca»: ilhas gregas por ajuda económica alemã. A frase que destaquei em cima parece ser do tablóide Bild. Obrigado, The Guardian.
Entre as ocupações mais sinistras dos americanos, as execuções de pessoas devem ser uma das mais repugnantes. Encontrei este documento na internet que acho que ilustra bem o problema em 4 páginas de estatísticas. Lembro-me que quando cheguei aqui, há quase 12 anos, li um artigo muito interessante sobre o significado das execuções como sacrifícios humanos. Não me lembro do título nem do autor.
Se depois de lerem as estatísticas vos parecer que a pena de morte é uma coisa inexplicável - cruel, cara, injusta, ineficaz, etc. - pensem nisto: serve para acalmar uma população profundamente supersticiosa, puritana, isolada e que vive aterrorizada por um Deus horrível, um ditador do Terceiro Mundo que vive no Céu e vê tudo e sabe tudo, e que se regala a condenar e a torturar quem lhe desobedece ou, pior, quem se diverte.
Os americanos circuncisam os filhos para evitar que eles se masturbem e ofendam a Deus. E é dentro desta "lógica" que sacrificam "os maus".
Há tantos americanos malucos. Claro que o facto de terem todos montes de armas não ajuda (há entre 50 e 70 acidentes e suicídios com armas por dia). Mas a violência como primeira solução faz parte da cultura deste país e a quantidade de malucos, com teorias conspirativas, que desatam aos tiros por tudo e por nada, é inacreditável.
Mais um político republicano, violentamente anti-gay, apanhado bêbedo, a sair de um bar gay com "um homem não identificado" no carro... :o)
Parece-me espantosa a quantidade de políticos anti-gay que são gay. Quando são apanhados com a boca (literalmente) na botija desatam a fazer declarações que não sabem o que lhes aconteceu... Pergunto-me se no Vaticano a coisa será muito diferente.
No Prós e Contras desta semana (podem ver aqui o vídeo – por volta do minuto 15 da primeira parte) lá apareceu um senhor vice presidente da CIP, Armindo Monteiro de seu nome, a falar mais uma vez, numa conhecida retórica muito neoliberal, da situação de “desigualdade” que constitui um trabalhador poder despedir-se de um emprego a qualquer altura, mas um patrão não poder despedir livremente esse mesmo trabalhador.
Ao mesmo tempo, o senhor era, como é costume, socialmente conservador: queixava-se de que havia a ideia arreigada de que durante uma vida só se haveria de viver numa só cidade, ter uma só casa, um só emprego, um só casamento. E frisou: de tudo isto, a única instituição a preservar era a do casamento, que ele achava muito bem que fosse único e para a vida toda; deveríamos estar preparados para mudar tudo o resto. Ao menos o senhor não escondia nada ao que vinha. Só não passa por aquela cabeça que, com toda a precariedade que ele defende, é cada vez mais difícil as pessoas casarem e terem família. Se um trabalhador tem que estar sempre pronto para mudar de emprego, de casa e até de cidade, necessariamente a sua família terá que estar também. O que poderá ser impossível com filhos em idade escolar e com o cônjuge igualmente empregado. A menos que – deve ser isso que o sr. Monteiro preconiza – o homem “sustente a família” e a mulher foque em casa a tratar da mesma.
O argumento do sr. Armindo Monteiro sobre a “desigualdade” do despedimento não colhe. É evidente que a sua proposta não constitui uma situação de igualdade – um patrão também pode fechar uma empresa livremente, contra a vontade dos trabalhadores, bastando indemnizá-los. O que constituiria uma situação de igualdade verdadeira seria, a qualquer altura, o trabalhador poder despedir livremente o patrão. No dia em que um trabalhador puder pôr um patrão da empresa para fora, eu serei a favor da liberalização dos despedimentos.
«O Sr. Henrique Raposo comete vários erros: primeiro, não há qualquer «pulsão religiosa» nos homens, há apenas desconhecimento e questões que se querem respondidas atribuídas a uma ideia de divino. Este conceito funciona como um escape que logo justifica o inexplicável e evita demais explicações. Isto não é «pulsão», é falta de paciência na capacidade que nós temos de resolver os grandes problemas que o universo nos coloca e que devemos encarar sempre como desafios. (...) Insiste que Hitchens não deveria travestir a religião de fascismo. De facto, poucos são os pontos comuns das religiões com o fascismo e é um erro grosseiro se nos atrevermos a enumerá-los. Vejamos, são mesmo mínimos e não custa nada: quase todas apresentam normalmente um líder que cultiva uma imagem ridícula, preceitos e regras a serem cumpridos sem recurso, alianças forjadas (com outros regimes fascistas) quando convém, incentivos para lutar até à morte defendendo a causa, policiamento regular de quem não cumpre e, se alguém quiser abandonar o fascio na valeta, é o cabo dos trabalhos! (...) O contrário parece ser o caso do Sr. Henrique Raposo, que nos deixou ligeiramente preocupados quando afirma que não se admite ateu simplesmente por causa de homens «cool» como Hitchens e prefere afirmar-se agnóstico. É a mesma coisa que dizer: «Eu sou benfiquista, mas agora sou sportinguista porque está lá o Jesus. Se Jesus não fosse tão «cool», continuava benfiquista. Se não, ai Jesus!, ainda posso ficar como ele e começar a jogar muito pela esquerda!».» (Diário Ateísta)
Tenho escrito nos últimosdias sobre o fascínio de alguns esquerdistas europeus pelo islamofascismo. Tropecei hoje numa notíciasobre dois alemães-de-origem-alemã que levaram o seu fascínio ao ponto de: a) converterem-se ao Islão; b) integrarem uma rede islamista; c) planearem um atentado.
Enfim: quando os terroristas islamistas começam a ter nomes como Fritz Gelowicz e Daniel Schneider, podemos dizer que o islamismo se europeizou. Da pior maneira. Ou será que é tudo manobra da CIA?
O Renato Teixeira do Cinco Dias, após uma sucessão de posts provocatórios incensando variados líderes islamofascistas, dignou-se explicar o seu apoio (teórico) à «Resistência Islâmica». Este debate tem também acontecido aqui no nosso blogue, por exemplo nesta caixa de comentários.
Como eu previra, a motivação principal dos defensores do islamofascismo é o combate ao imperialismo (estado-unidense, claro, porque não há outro): verificando que a questão israelo-palestiniana se eterniza, que os EUA estão no Afeganistão e no Iraque, e que o Irão desafia o «Ocidente», uma certa parte da esquerda decide que, perante um combate tão avassaladoramente importante como a «resistência» ao imperialismo dos EUA, toda a ideologia e acções islamistas podem ser ignoradas, e que vale a pena alinhar com fascistas de persuasão islâmica.
Há um par de reparos que vale a pena fazer. E depois, há um cenário a considerar.
A ofensiva neoliberal contra a escola pública assenta a sua propaganda em dois temas: os rankings (seriações) escolares, e o cheque-ensino. Essa propaganda tem sido entusiasticamente difundida por alguns media, em particular o jornal Público da era JMF.
Através da divulgação anual, na imprensa amiga do lóbi da escola privada, das seriações das escolas em função dos resultados dos alunos, martela-se todos os anos a ideia de que as melhores escolas são as privadas. Esconde-se que as privadas recusam maus alunos e que nem todas (aliás, a maioria) ficam nos primeiros lugares das seriações.
Insistindo na ideia do cheque-ensino, espalha-se a ideia de que as escolas privadas são pagas pelos privados, enquanto as públicas são pagas por todos, e que portanto seria de justiça que a escola privada fosse subsidiada pelos impostos de todos. No entanto, cada vez se confirma mais que esta última ideia é falsa. Como referi ontem, 44% dos alunos do privado são financiados pelo Estado.
Com toda esta propaganda do lóbi da escola privada, não admira que a quebra demográfica se sinta apenas no público. E enquanto não aparece um governo de esquerda que devolva à escola pública a primazia que merece, os cidadãos pouco mais podem fazer do que protestar.
Nunca escrevi sob pseudónimo, nem aqui nem no Diário Ateísta (e nem sequer nos saudosos tempos da usenet). E, honestamente, preferiria que ninguém escrevesse sob pseudónimo (incluindo os comentadores). Afinal, o que se escreve na blogo-esfera é público, e o que se faz em público assume-se. Mas, sinceramente, que um jornal diário faça notícia de capa com um artigo que de novidade tem o nome de um bloguista que escreve sob pseudónimo, é de um ridículo atroz. Que o autor do artigo já tivesse defendido o anonimato do autor do blogue (ler aqui), só mostra que mesmo quem escreve com nome real nem sempre é o que mostra. E que vale tudo.
Em suma: a guerra suja continua na blogo-esfera. Como este blogue é tão pouco lido e tão desalinhado, só espero que nos deixem em paz.
A Madeira que, recorde-se, é a segunda região mais rica de Portugal. Mas que nem sequer dispunha de um radar decente. Teria o resto do país obrigação de a ajudar? É claro que sim, em nome da coesão nacional e por pura solidariedade. É claro que eu espero que as responsabilidades por tanta construção selvagem e em leito de cheia sejam apuradas - o tão propalado "desenvolvimento" da região assentava nestas obras, e como se vê subsistem desequilíbrios extremos.
Agora teria obrigação de ajudar quem, há dez anos atrás, na altura mais difícil, ouviu um "da Madeira nem um tostão"? É claro que não teria. É o que se chama "bofetada de luva branca".
Tanta conversa de «cheque-ensino», tanta treta de o ensino privado não necessitar do Estado para nada, e cada vez é mais claro que sem o Estado a escola privada portuguesa já teria falido, ou pelo menos visto drasticamente reduzido o seu peso no sistema de ensino: 44% dos alunos da escola privada são financiados pelo Estado. Imagino que, se o Estado retirasse estes apoios, os Martins e Gonçalos cujos pais realmente podem pagar as propinas dos colégios privados não fossem suficientes para manter as referidas escolas a funcionar. E os meninos teriam que ir para a escola pública, onde há menos missas e mais piolhos.
No seu documento de enquadramento da visita de B-16, os bispos da ICAR «apelam» a que este evento não «se esgote num mero acontecimento passageiro», mas que sirva para «fortalecer a nossa unidade [dos católicos] (...) com o intuito de poder responder às alterações civilizacionais em que vivemos». É cada vez mais óbvio que esta visita está concebida para fazer, não a mera propaganda católica (o que seria aceitável), mas sim, inevitavelmente, para fazer também o combate aos casamentos entre pessoas do mesmo sexo e para condicionar as celebrações do centenário da República. Enquanto monarca da última ditadura europeia, Ratzinger será recebido pelo Presidente e pelo Primeiro Ministro. Enquanto líder religioso, fará o que não seria tolerado a chefe de Estado algum: interferir na política interna portuguesa.
Subindo a parada, os bispos exigem ao governo que seja declarado feriado ou tolerância de ponto durante a visita, com o óbvio objectivo de aumentarem o número de pessoas presentes em manifestações que irão para além do ritual religioso para assumirem um cariz político. Já conseguiram que a Câmara Municipal de Lisboa aceitasse que a inauguração da «nova» Praça do Comércio, supostamente integrada nas celebrações do Centenário da República, seja feita pelo monarca do Vaticano. Mais exigências «pastorais» com água política no bico surgirão nas próximas semanas.
Após o fracasso da manifestação anti-homossexual de 20 de Fevereiro, o clericalismo português necessita de um reforço chamado B-16. E um governo em queda de popularidade não lhe recusará «pedidos» pastorais. Estupidamente.
O EsquerdaRepublicana é um blogue à esquerda, independente dos partidos mas não de valores e causas, republicano, laicista, democrata e plural. Foi fundado em Março de 2005.