domingo, 28 de março de 2010

Os véus e a República

Subjacente à proibição das burcas em França, não está um amor aos valores republicanos, mas sim uma Islamofobia alarmante que de resto se faz sentir por toda a Europa. As burcas, utilizadas por uma pequena minoria das mulheres muçulmanas em França, tornou-se agora no último cavalo de batalha do Sr Sarkozy (convém lembrar que o Republicanismo de direita tem contornos xenófobos e racistas bastante fortes, como aliás demonstra o Sr Jean-Marie Le Pen), porque é um tema populista e o presidente bem precisa duns “brownie points” para salvar o seu mandato.
As burcas a mim incomodam-me, mas incomoda-me mais o republicanismo selectivo que vigora em França. Os seios nus da Marianne lembram bem que “La République” é acima de tudo patriarcal. Até 2005, Em França as mães não podiam transmitir os seus apelidos aos seus filhos (declaro o meu interesse neste assunto, pois ainda não recuperei do facto de não ter podido transmitir o meu apelido à minha filha, quando esta adquiriu a nacionalidade francesa). E os documentos oficiais ainda falam em chefes-de-familia.
O republicanismo francês não é só selectivo, é também profundamente illiberal pois confunde a igualdade com a uniformidade. França não é o Irão e proibir as burcas ou as hijabs não contribui em nada (muito pelo contrário) para a emancipação das muçulmanas francesas (muitas delas mais emancipadas que francesas “bon chic, bon genre” que abandonam sem hesitar os seus apelidos para adoptar os dos seus maridos e que abdicam da sua independência económica em nome da preservação das tradições e da família).
Se a batalha é a igualdade entre os sexos, não nos fiquemos pelas burcas, abordemos também os rituais misógenos das igrejas cristãs, a desigualdade salarial entre homens e mulheres, a objectificação do corpo feminino na indústria da moda e na pornografia, as políticas de família, etc, etc.
Se a República francesa quer de facto emancipar as mulheres muçulmanas podia começar por não lhes negar o direito à educação e à esfera pública.

8 comentários :

Ricardo Alves disse...

Eunice,
a République terá imensos defeitos. Ser selectiva na forma como trata as religiões será um deles. Mas não no caso do véu: a lei que entrou em vigor proibiu por igual os véus islâmicos, os quipás e os crucifixos, e os turbantes dos sikhs. E não excluiu as raparigas das escolas: as que escolheram ir para casa ou para as escolas privadas acabaram por ser muito poucas, na ordem das dezenas.

Existem em França líderes políticas do sexo feminino. Ségolène Royal e Martine Aubry, para não ir mais longe.

O islamismo é a ideologia mais nociva e perigosa para as mulheres que existe na Europa, e fora dela, neste momento. Só essa razão basta para pensarmos duas vezes antes sobre proibir a burca. Muitas mulheres agradecerão se for proibida.

Filipe Castro disse...

Eu acho que a ministra da justiça (Rachida?) antes desta senhora era de origem marroquina (a mãe era argelina) e chegou a ministra da quinta república.

Infelizmente, enquanto ministra defendeu um fundamentalista que anulou o casamento ainda durante a festa, alegando que a noiva não era virgem. Ao abrigo da lei francesa, troglodita e machista, que a Eunice refere.

E acho sensato que fundamentalistas com burcas não cheguem NUNCA a ministras da justiça, nem em França nem em nenhum país europeu.

Anónimo disse...

engrçado... nunca vi islamofobia contra bosnios e albaneses

Anónimo disse...

Quem é a França pra julgar os islamicos em se tratando de mulheres?? Por que a França faz isso?? Será que é pra limpar o passado dela??
Devemos nos lembrar que depois ke a França foi "libertada" em 1944, inumeras francesas acusadas de "traição e colaboracionismo" tiveram a cabeça rapada , sofreram humilhações, linchamentos, apedrejamentos etc. (nem falo da execução sumária de acusados de colaboracionismo). Essa barbaridade toda aconteceu com as bênção do "bom" De Gaulle.

P Amorim disse...

Em relação a este assunto, faz-se, eventualmente de propósito, uma grande confusão. A burca é um atentado à segurança. (ponto final). É, na maioria dos casos, uma canga ou um cinto de castidade, impostos às mulheres para que se submetam à lei dos homens. Comparar a obrigatoriedade do seu uso em certas famílias, a leis sobre apelidos e a mulheres BCBG que abandonam (elas abandonam) a sua independência económica, parece-me má fé. O penúltimo parágrafo contem verdades, mas só faz parte de igrejas cristãs quem quer e só se fotografa ou desfila quem quer. O Estado é que tem que ser isento, não as organizações ou clubes privados.

Filipe Castro disse...

Concordo plenamente. Não há comparação entre o machismo francês (ou português) e as barbaridades que os muçulmanos impõem às mulheres.

Anónimo disse...

Não sei. Em todo o caso seria interessante discorrer sobre o que pensam as jovens de famílias muçulmanas que encontram na proibição do uso véu a única forma de poderem escapar à repressão e discriminação das mulheres imposta pelo islamismo dos seus famíliares.

Ricardo Alves disse...

O véu não lhes permite escapar. Repito: há muitas mulheres que agradecerão quando for proibido. Já há testemunhos disso. E é espantoso que haja feministas que acham que a maioria das emburcadas se tapam voluntariamente.