«Pigmaleão» é uma peça de teatro de Bernard Shaw que passou a musical e a filme. Retrata um homem de classe alta que, por desfastio, pega numa rapariga jovem e pobre que vende flores na rua e a transforma, para todos os efeitos práticos, numa mulher «de alta sociedade». A transformação não é meramente de aparência: apesar das enormes diferenças de classe social e de idade, no final a rapariga discute de igual para igual com o seu mentor. E, no epílogo preferido do grande público, casam-se e são felizes para sempre.
Na vida real, as relações do tipo «Pigmaleão» nem sempre são tão felizes. Pela desigualdade em que se baseiam, são veladamente suspeitas de «interesse», de falta de sinceridade, de falsidade. O que será injusto em muitos casos. Mas, regra geral, arriscam-se a ser relações desequilibradas e, no extremo, negramente perversas. Das quais a violência doméstica, por exemplo, não estará ausente. E que nunca se tornam relações entre iguais.
No caso concreto de Carlos Castro e Renato Seabra (sim, é aí que quero chegar), não falta quem já tenha decidido que a culpa foi da «homofobia internalizada» do jovem. Parece-me apressado. Sabemos que era uma relação com várias desigualdades (ou assimetrias, se preferirem): de idade, de classe social, de poder aquisitivo, de independência económica, de segurança quanto à própria sexualidade e de poder e influência social. Não era uma relação entre iguais.
Antes que alguém me trucide: eram adultos, consentiram, etc. E quem mata deve ser punido. E não, não desculpo quem matou. Mas este caso lamentável, se servir para algo de útil, pode servir para que, em vez de se forçar a tecla da homofobia, se recorde que nem tudo o que é legal é recomendável. Só nos filmes ou nas revistas cor-de-rosa é que relações tão desiguais têm sempre finais tendencialmente felizes. A vida real é bem menos simples do que as fantasias.
Antes que alguém me trucide: eram adultos, consentiram, etc. E quem mata deve ser punido. E não, não desculpo quem matou. Mas este caso lamentável, se servir para algo de útil, pode servir para que, em vez de se forçar a tecla da homofobia, se recorde que nem tudo o que é legal é recomendável. Só nos filmes ou nas revistas cor-de-rosa é que relações tão desiguais têm sempre finais tendencialmente felizes. A vida real é bem menos simples do que as fantasias.
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