A questão que me interessa não é, realmente, proibir ou não proibir os véus integrais. O meu problema é que não consigo pensar em maior símbolo da opressão da mulher, neste planeta e neste século, do que a burca. E é evidente que não é apenas um símbolo: é um instrumento (entre outros) da ideologia extremista que, da Arábia Saudita e do Irão até aos subúrbios europeus, pior lugar reserva para o sexo feminino.
Pensava eu, na minha ingenuidade, que a esquerda em particular e os progressistas em geral o compreendiam. Mas não.
Sou acusado pela Maria João Pires e pelo Daniel Oliveira de ter um programa formatado (e compulsivo) para a «libertação das mulheres», e até de pretender saber o que é uma «mulher livre». A prova do delito? Um parágrafo interrogativo no meu texto anterior, em que lançava algumas perguntas (os perigos da retórica...) sobre a vivência concreta das mulheres emburcadas.
Porque não estamos, digam o que disserem, a falar de mulheres que usam burca ou nicabe como quem usa mini-saia ou calças. Que existem mulheres que usam a burca obrigadas é, para mim, uma evidência. A violência contra mulheres que usam o véu está documentada. Mas essas mulheres não parecem entrar em conta nas posições que vejo por aí tomar. O que dirão a Maria João Pires e o Daniel Oliveira se, um dia, as mulheres muçulmanas agradecerem que as burcas tenham sido proibidas? «Desculpa lá, não sabia, imaginei que gostasses»?
Ah, e o meu programa para a «libertação das mulheres» (versão minimal): escolham o que querem. É esse o meu programa. Mas há outro programa nesta conversa: o do islamismo extremista. E esse é que deveria preocupar as feministas. Porque proibir a burca e obrigar à burca não são duas faces da mesma moeda. São divisas diferentes.
Obrigar à burca em nome da versão talibã do islão, espancar as mulheres de Teerão que descobrem o cabelo, ou forçar as mulheres dos subúrbios de Paris a cobrirem-se, é tudo parte de um projecto de sociedade em que a mulher não tem os mesmos direitos do homem, nem liberdade. Multar as sauditas que desfilam de nicabe nos Campos Elísios, ou as francesas que se emburcam, é parte de um projecto de sociedade em que a mulher tende a ter o mesmo poder do que o homem, e só obedece a quem quer, e em que as pessoas interagem de cara descoberta e olhos nos olhos.
Ah, e o meu programa para a «libertação das mulheres» (versão minimal): escolham o que querem. É esse o meu programa. Mas há outro programa nesta conversa: o do islamismo extremista. E esse é que deveria preocupar as feministas. Porque proibir a burca e obrigar à burca não são duas faces da mesma moeda. São divisas diferentes.
Obrigar à burca em nome da versão talibã do islão, espancar as mulheres de Teerão que descobrem o cabelo, ou forçar as mulheres dos subúrbios de Paris a cobrirem-se, é tudo parte de um projecto de sociedade em que a mulher não tem os mesmos direitos do homem, nem liberdade. Multar as sauditas que desfilam de nicabe nos Campos Elísios, ou as francesas que se emburcam, é parte de um projecto de sociedade em que a mulher tende a ter o mesmo poder do que o homem, e só obedece a quem quer, e em que as pessoas interagem de cara descoberta e olhos nos olhos.