sábado, 14 de novembro de 2020

O Presidente mais impopular de que há registo

Apesar de poderem existir excepções pontuais num momento ou outro, quando consideramos a globalidade do primeiro mandato (o único que podemos comparar), pelo menos desde 1945 que nenhum Presidente dos EUA foi tão impopular como Donald Trump. 

Acrescente-se que antes de 1945 os EUA foram presididos por uma das figuras mais populares de sempre (Franklin D. Roosevelt), a afirmação anterior apenas se restringe ao período posterior a 1945 porque é desde essa altura que existem registos da popularidade de cada Presidente. De facto, se subtrairmos à "taxa de aprovação" de cada Presidente a sua "taxa de desaprovação" iremos verificar a tremenda impopularidade de Donald Trump:




Estes resultados podem ser consultados aqui. Os resultados são ainda mais evidentes se nos limitarmos à "taxa de desaprovação", embora sejam ligeiramente menos claros se nos limitarmos à "taxa de aprovação". A meu ver, é o diferencial entre ambos que nos dá mais informação sobre a popularidade ou impopularidade de um governante. 

Muitas pessoas ficam impressionadas com a quantidade de votos que Donald Trump conseguiu conquistar nos EUA, e essa é de facto uma realidade perturbadora que merece reflexão. Mas muitos acreditam que se Trump foi, ao longo do seu mandato, uma figura popular nos EUA. Os dados desmentem esta afirmação com muita clareza. 

E se é verdade que tem existido um enviesamento sistemático nas sondagens (que tem sido explicado com o facto da atitude geral de desconfiança face aos outros membros da sociedade, que se correlaciona com a probabilidade de recusar responder a sondagens, também se ter começado a correlacionar com a identificação política da pessoa), a verdade é que os resultados são tão claros e evidentes que se torna pouco razoável negar a extraordinária impopularidade de Trump. 

As pessoas que acreditam que a terra é plana e Trump ganhou as eleições ainda estão longe de ser a maioria. 





terça-feira, 3 de novembro de 2020

A "impostura liberal" e a saúde

Há algum tempo atrás comentei um mapa de um cartaz da "Iniciativa Liberal" que me pareceu particularmente desonesto e bastante exemplificativo de uma forma de comunicar desse partido. 

Não tinha grandes intenções de voltar tão cedo a falar da IL até porque agora é altura de preparar o champanhe que a humilhação eleitoral de Donald Trump se aproxima. 

Mas eis senão quando, começo a ver várias partilhas de uma página da IL explicando que os liberais não querem acabar com o SNS. A página está bem feita: o grafismo está bom, a linguagem é adequada para comunicar com pessoas pouco politizadas, e o conteúdo em geral é persuasivo para quem confie minimamente nos autores. E aí é que está o problema: é que os autores não merecem nenhuma confiança. 




Vale a pena destacar o mapa apresentado. Aqui já parecem reconhecer que quase todos os países "liberais" no mapa anterior afinal têm um sistema "estatista". Portugal, que era apresentado como o único país socialista da Europa (o que revela alguma falta de pudor...) afinal está agora na mesma lista que a maior parte dos supostos países liberais europeus (países nórdicos, Reino Unido, Irlanda, etc.). Mas esqueçamos as outras dimensões de "liberalismo" e foquemo-nos apenas na saúde. 

A imagem diz que, de acordo com o ranking EHCI 2018, Portugal aparece apenas em 13º lugar. Podemos fazer melhor! 

Mas demos uma vista de olhos no EHCI 2018, e logo por acaso eles têm também um mapa. 

Portugal aparece no grupo a verde, no grupo dos melhores. Isso não é usual. Estamos à frente da Espanha, da Itália, do Reino Unido, da Irlanda e de toda a Europa de Leste. Nada mau!

Curioso também é que, de acordo com este índice, parece muito difícil de argumentar que os sistemas defendidos pela IL ajudem o que quer que seja: os países nórdicos com sistemas públicos de saúde estão também no topo, enquanto Grécia, Bulgária, Hungria, Roménia e Croácia, todos com sistemas como a IL defende, estão na pior das categorias (duas abaixo de Portugal). 

Portanto, em resumo, com tanta coisa para mudar profundamente neste país, a IL propõe-se desmantelar uma das poucas em que temos resultados acima da média europeia (de acordo com a avaliação que eles próprios referenciaram!). E argumentam a favor disso numa página onde esclarecem não querer acabar com o SNS, apenas transformá-lo num sistema onde países com um desenvolvimento económico comparável ao nosso têm muito piores resultados!

Mas isto nem é uma crítica à proposta da IL. É uma crítica a esta forma de comunicar politicamente, desinformando as pessoas menos politizadas. Dando a entender que é mau aquilo que é bom, escolhendo quem é "liberal" ou "socialista" de forma arbitrária conforme as conveniências. 

Claro que a crítica mais profunda a estas propostas prende-se com o financiamento. A IL propõe uma enorme redução das receitas fiscais e alega não querer diminuir o financiamento dos serviços públicos, mas também não defende o aumento da dívida pública. Nessa questão, todos os outros partidos de direita são mais honestos. 

Não costumo chamar "impostura liberal" à IL, mas neste post, escrito depois de ter lido aquele conteúdo tão enganador, achei por bem fazê-lo.