quinta-feira, 31 de dezembro de 2009

Religião é poesia, ateísmo é palavrão

O Ricardo Araújo Pereira escreveu na Visão um texto notável a propósito da mensagem natalícia do José Policarpo. Pega no assunto pelo lado de Policarpo, ostensivamente e de forma algo provocatória, ter saudado outros monoteístas mas não os ateus. Há também a questão, quanto a mim grave, de o Policarpo estar na realidade a abusar de um formato de «tempo de antena» para entrar em polémica com os ateus e apelar à conversão de judeus e muçulmanos.
Mas vamos ao RAP. Delicioso:
  • «O ateísmo tem sido, para mim e para tantos outros incréus, a luz que me tem conduzido na vida. Às vezes fraquejo, em momentos de obscuridade e de dúvida, mas, mesmo sendo incapaz de provar a inexistência de Deus, tenho conseguido manter a fé - uma fé íntima fundada numa peregrinação que tem a grandeza e a humildade da longa caminhada da vida - em que Ele não exista. Todos os dias busco a não-existência do Senhor com renovada crença, ciente de que a Sua inexistência é misteriosa demais para que eu a tenha inventado.»
E o pedaço que me leva a escrever este artigo:
  • «Acreditar que Deus existe é uma convicção profunda, mas acreditar que não existe, curiosamente, não o é. Alguém, munido de um aparelho próprio, mediu a profundidade das convicções e deliberou que as do crente são mais fundas que as do ateu. Quando alguém diz acreditar em Deus, está a exprimir legitimamente a sua fé; quando um ateu ousa afirmar que não acredita, está a agredir as convicções dos crentes. Ser crente é merecedor de respeito, ser ateu é um crime contra a humanidade.»
E esta é uma dificuldade que nós, os que somos ateus, continuamos a ter, em alguns meios sociais: ter fé é bonito, talvez mesmo poético, enquanto afirmar-se ateu é agredir, dizer um palavrão. O que se deve ao facto de a religião significar «esperança» noutra vida, ou numa qualquer forma de contacto com entes queridos desaparecidos. Enquanto o ateísmo não tem ilusões comparáveis para oferecer. Somos uns desmancha-prazeres.

quarta-feira, 30 de dezembro de 2009

Revista de blogues (30/12/2009)

  1.  «Andaram os bispos portugueses 48 anos em paz, sem preocupações com a democracia, com direito a báculo e mitra apenas com autorização de Salazar, indiferentes aos crimes da ditadura e à guerra colonial, e tornaram-se agora os paladinos da democracia directa. Todos os dias saltam prelados a agitar a mitra contra os casamentos homossexuais, a brandir o báculo contra o aborto, a perorar sobre a família, como se disso tivessem alguma experiência. Disparam ave-marias e salve-rainhas contra os “inimigos da moral e dos bons costumes” e, finalmente, exigem um referendo sobre matéria que fez parte da campanha eleitoral e dos conselhos pios aos eleitores para se afastarem de partidos que, na sua pitoresca linguagem, são contra a família.» (Diário Ateísta)
  2. «Bom. Há uma coisa que me indigna nas discussões do casamento homossexual. Várias, aliás, mas uma em especial. Dizem que "ah, mas claro que a igreja tem de se pronunciar sobre o casamento homossexual", "ah, o casamento homossexual vai contra todos os ditâmes aceitáveis numa sociedade", e vejo aí os padres e os bispos indignadíssimos, ainda mais do que eu, a falarem e a gritarem sempre a mesma coisa: que a sociedade tem de ser ouvida e que não houve discussão suficiente. A questão é que eu não estou bem a ver por que razão acham os padres e os bispos que têm de impôr a sua opinião. Cada dia é um novo a falar e cada dia cada um fica mais indignado por não lhe serem dados ouvidos da parte do Governo. Pois bem, sabem porquê, senhores? Porque nós temos no nosso país um princípio a vigorar desde há muitos muitos anos, que se chama princípio da laicidade do Estado ou princípio da separação entre o Estado e a Igreja. Concretizando, sabem o que é que isto quer dizer? Que não interessa nada ao Governo ou à comunidade política em geral (que perceba de Direito) que os padres se oponham todos, todinhos, um por um à aprovação do casamento homossexual. Não estamos a falar de casamento homossexual pela igreja, mas sim de casamento CIVIL!» (When the Sun Goes Down...)

terça-feira, 29 de dezembro de 2009

Um pouco de futebol


Por estes dias, Barcelona e a Catalunha vivem em suspenso da decisão do Tribunal Constitucional sobre o novo Estatuto da Catalunha - que, à luz da Constituição Espanhola, só pode ser declarado inconstitucional, porque aquilo é praticamente uma declaração de independência, que faria a inveja de A. J. Jardim. Mas as coisas chegaram a tal ponto, que o próprio Zapatero torce para que o TC não veja o que todos vêem e não ouse afrontar os demónios catalães - mal adormecidos desde que, em 1640, Castela teve de optar entre opor-se à reconquista da independência portuguesa ou enfrentar o autonomismo catalão, e escolheu travar e vencer os revoltosos da Catalunha, deixando Portugal para os Braganças. Não por acaso, as reivindicações autónomas em Espanha estão directamente ligadas à riqueza das regiões: são os ricos do País Basco ou da Catalunha que querem ser independentes do poder fiscal de Madrid, para não terem de pagar impostos a favor dos pobres. Também em Itália, é o norte rico que se quer ver liberto de ter pagar a favor do Mezzogiorno, e em Inglaterra é a Escócia que quer ser independente do Midwest deprimido. A autonomia regional é quase sempre uma revolta dos ricos contra os pobres e contra o Estado central, cuja tarefa fundamental é distribuir a riqueza por todos. É por isso que eu sou ferozmente anti-regionalista, porque não tenho a mais pequena dúvida de que, ao contrário do que imaginam alguns incautos ou oportunistas, a regionalização lançaria Lisboa e o Porto contra todos os outros e ai dos alentejanos ou transmontanos, sem a República a protegê-los!
(Miguel Sousa Tavares, A Bola, 01-12-2009)

segunda-feira, 28 de dezembro de 2009

domingo, 27 de dezembro de 2009

Outro José, este xenófobo

Os imigrantes estão sujeitos à lei deste país, pagam impostos, depois de naturalizados podem votar e ser eleitos para todos os cargos à excepção de Presidente da República, mas não podem jogar na equipa da FPF. Quem o diz é um certo José Mourinho. O futebol é mesmo uma maravilha: traz ao de cima o pior tribalismo da nossa natureza humana.

À escuta de José

O Policarpo usou o seu tempo de antena natalício no canal de todos nós para responder à Associação Ateísta Portuguesa. Registe-se: «nos últimos tempos, entre nós, falou-se muito de ateísmo; exprimiram-se ateus, pessoas e organizações, defendeu-se o direito de ser ateu e de exprimir a negação de Deus».

José Policarpo, numa prova de respeito e civilidade, não se exime portanto a argumentar a existência de «Deus» com os ateus. É bem. No entanto, sabe que o diálogo é desigual e que o canal pago com os meus impostos não convida o Munir para falar no início do Ramadão, nem dará a palavra ao Carlos Esperança ou ao Ludwig Krippahl para lhe responderem como merece. E isso fica-lhe mal. Porque é abuso de posição dominante.

Quanto aos argumentos: são fracos. Concordo que «não é o facto de os crentes acreditarem em Deus que faz com que Ele exista»; e também que «não é o facto de alguém não acreditar em Deus que faz com que Ele não exista». Não acho é que haja «mistério» algum neste assunto que não tenha explicação humana. Compreendemos cada vez melhor como «Deus» foi inventado.

Finalmente, quando Policarpo quiser dar lições de humildade, que abdique do espaço na televisão de todos. Não é muito curial aproveitar um espaço numa televisão paga por todos para difundir uma mensagem tão arrogante e divisiva como a sua, centrada na crítica aos ateus e no apelo à conversão de judeus e muçulmanos. E, como já disse um comentador do Diário Ateísta, se quer fazer prova de humildade que proteste por lhe chamarem «Dom», «Eminência Reverendíssima» e outros desvarios que tais. Ah, e use menos maiúsculas. Acima de tudo menos maiúsculas, por favor.

sábado, 26 de dezembro de 2009

Playing for change

Esta ideia não é nova: as pessoas não querem saber umas das outras porque não se conhecem e não imaginam as vidas umas das outras. Juntá-las com música é sempre boa idea. Imaginem o que uma ideia destas, se se espalha, pode fazer ao complexo militar industrial americano ou ao inquérito do Sarkozi sobre o que faz os franceses franceses... :o)

quarta-feira, 23 de dezembro de 2009

Guerra de civilizações

Quem ganhou a batalha dos ídolos à janela? O pai natal ou o menino jesus?
(Algum jornal devia fazer as contas.)

terça-feira, 22 de dezembro de 2009

Cavaco e Sócrates não pensam casar; porém, se for pela igreja...

Confirma-se: Cavaco e Sócrates estão próximos do divórcio a propósito do casamento entre pessoas do mesmo sexo. O jornal que escuta as fontes de Belém nos cafés da Avenida de Roma anuncia que «o mais expectável é que vete politicamente o diploma ou o envie para o Tribunal Constitucional». Do armário para fora, Cavaco já disse que procura «nada fazer que provoque fracturas na sociedade portuguesa». Arrisca ele próprio a fracturante perda da eleição presidencial no ano seguinte.
Entretanto, acicatada por uma capa de jornal que garantia haver um «pacto de não agressão» entre Governo e ICAR a propósito da mesma questão (o que seria plausível pois o Governo publicou recentemente diplomas que garantem centenas de empregos a sacerdotes católicos - como capelães do Estado), a ICAR ensaiou ontem um YMCA em defesa do referendo, com a habitual espertalhice ambígua de dizer uma coisa e a sua contrária: segundo o bispo Ortiga, «penso que o debate deveria ser alargado e profundo e, em meu entender, um referendo, como oportunidade para a reflexão, seria bem-vindo», embora, para o caso de as coisas correrem mal, «há coisas, como esta, que, para a Igreja, não são referendáveis».
A união poderia ser abençoada aquando da visita de um ex-nazi, em Maio.
«Confused? You won't be, after next year's episode of...Soap».

Obama

Peter Schiff vinha avisando deste 2006 (os dois últimos minutos deste vídeo são importantes): Bush era um anormal e a crise que resultou do desgoverno 2000-2008 é profunda e séria e não se vai embora assim, com quase um trilião de dólares atirado aos cleptocratas que a criaram. Neste contexto, Obama tem as mãos e os pés atados e já demonstrou que não tem apoios para implementar nem uma das reformas que prometeu. Continuamos nas mãos dos cleptocratas (há dias, num jantar, um texano disse-me com a cara séria que é óbvio que Deus vai intervir e salvar os EUA).

Adenda sobre a traição de Obama

segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

Revista de blogues (21/12/2009)

  1. «Manuel Alegre e a corrente de opinião socialista estão de parabéns. Através da sua revista (www.opiniaosocialista.org) e do livro agora lançado ("Ideias para Grandes Decisões", ed. Campo da Comunicação), que compila alguns dos artigos que aí foram publicados sobre trabalho e seus direitos, escola pública, crise e política económica alternativa e corrupção e urbanismo, contribuíram para consolidar ideias válidas: da apropriação pública das mais--valias urbanísticas à defesa e à valorização dos serviços públicos, passando pela denúncia fundamentada de um Código de Trabalho que aumenta a discricionariedade empresarial e reduz os salários ou pela defesa de um Estado-estratego dotado de instrumentos para promover o sector dos bens transaccionáveis.
    Manuel Alegre defendeu recentemente que está na altura de "repor o primado da política e da solidariedade sobre os egoísmos e os grandes interesses". O combate por um socialismo que só pode ser democrático e a defesa de um patriotismo progressista e cosmopolita, ancorado numa ideia de comunidade política inclusiva, revelam uma aguda percepção de que só as ideias podem superar interesses mal orientados
    .» (Ladrões de Bicicletas)
  2. «Pacheco Pereira não participa no debate. Aliás, Pacheco Pereira nunca participa em nenhum debate. Nem neste nem noutro qualquer. Pacheco Pereira finge que analisa debates para catalogar cada um dos participantese (independentemente do que eles digam ou escrevam) e assim condicionar opiniões – é esta a confiança que tem no juízo crítico dos seus leitores. Neste caso, divide a esquerda em três: os que são socratistas (Pacheco nunca deixa de surfar na espuma dos dias) – e por isso anónimos e assessores –, os que não sendo socratistas um dia o vão ser – e por isso oportunistas e quem sabe futuros assessores e até anónimos – e a verdadeira esquerda.» (Arrastão)

A traição de Obama

Gradualmente fui-me sentindo mais e mais traído pela postura de Obama.

Não pela sua moderação, eu próprio sou bastante moderado e aprecio isso. Mas pelo facto de condicionar toda a sua actuação à defesa dos interesses corporativos instalados.

Voltando costas aos que o elegeram, preferiu tentar a sua sorte para as próximas eleições com avultadas contribuições das seguradoras, mesmo que implique uma militância democrata menos motivada. Arrisca-se a perder.

Entretanto, as grandes seguradoras sorriem. Os cidadãos dos EUA estão a caminho de ser obrigados a adquirir um seguro de saúde ao preço que elas entenderem cobrar. E se antes já eram pouco gentís na hora de fixar os preços, agora têm ainda menos razões para gentilezas.

A opção pública foi desfeita, e aqueles senadores que tiveram a ousadia de ameaçar impedir a aprovação da reforma sem esta opção foram criticados pela casa branca com uma dureza de que o mefistofélico Joe Lieberman nunca foi vítima. Há que lembrar que este senhor - que nos anos de Bush era tão radicalmente contra os bloqueios no senado, que votava repetidas vezes para desbloquear propostas do GOP mesmo quando afirmava publicamente discordar das mesmas; e que ainda há cerca de três meses, com medo da opção pública, propunha o alargamento do Medicare para os 50 anos - manteve todo o processo refém dos seus caprichos, e foi capaz - derradeira falta de escrupulos e coerência - de ameaçar bloquear o processo se fosse mantido o alargamento do programa medicare para os 55 anos - sim, iria bloquear algo menos ambicioso que aquilo que tinha proposto 3 meses antes!

No que diz respeito à reforma financeira, McCain está a fazer mais pela defesa dos interesses do contribuinte norte-americano face aos interesses dos grandes bancos do que a casa branca. Na verdade, do senado e da casa dos representantes têm vindo propostas muito interessantes, sensatas e razoáveis para impedir que uma crise como a que aconteceu se repita. A casa branca tem sido o maior adversário destas propostas. E quando Obama é mais amigo dos grandes bancos que McCain, muito está dito.

Obama começou com o pé direito. Mas neste momento não passa de um traidor.
Oxalá acorde antes que seja tarde de mais. Por agora é a maior desilusão com um político que já tive.

Há 20 anos

Ceausescu despede-se do povo romeno. Sem o saber.

Supostamente, deveria ser uma manifestação «espontânea» ao bom estilo semi-maoísta da ditadura de Ceausescu (um admirador da «Revolução Cultural» chinesa e de Kim Il-Sung). Espantosamente, a multidão começou espontaneamente a vaiar o ditador. Nos dias seguintes, morreram cerca de mil pessoas nos combates entre a facção do exército que tomou o poder e o que restava da Securitate. Ceausescu foi executado com a mulher no dia 25.

sábado, 19 de dezembro de 2009

Religião e GDP

Com excepção dos EUA e do Kowait, há de facto uma curva ao longo da qual os países se parecem arrumar muito bem: quanto mais ricos (industrializados) menos religiosos.
Quando se confronta este gráfico com o da educação vs. GDP, vê-se que as posições dos países não variam muito.
O mesmo se passa dentro dos EUA: quanto mais educadas, menos religiosas as pessoas são. Os cientistas da National Academy of Science declaram-se 97% ateus ou agnósticos. E mesmo no Sul Profundo verifica-se que a universidade (sobretudo as chamadas "artes liberais") tem um efeito adverso na religiosidade. Eu vejo aqui na universidade todos os semestres que montes de miúdos deixam de acreditar nas superstições que lhes foram empurradas pela boca abaixo quando ainda não tinham idade para se defenderem.

Religião e qualidade de vida

O gráfico fala por si:



Obrigado, Ludwig.

Contra a Burca

O debate sobre a burca chega à imprensa portuguesa.
  • «(...) O ministro explicou: as correntes islâmicas que defendem a burka argumentam que as mulheres exercem a sua liberdade em querer andar assim, certo? Pois era exactamente o argumento dos patrões das discotecas onde anões ganhavam a vida deixando-se ser lançados contra redes: perguntem aos anões, eles gostam! Porém, em 1995, o Conselho de Estado francês proibiu o lançamento de anões por ser contra a dignidade humana. As mulheres islâmicas são menos que os anões? Como a pergunta do ministro não foi feita a certos xeiques, mas a deputados de uma democracia em 2009, talvez a burka seja banida de Paris.» (Ferreira Fernandes)

sexta-feira, 18 de dezembro de 2009

Dois passos à frente, um passo atrás

A aprovação pelo Governo do casamento entre pessoas do mesmo sexo, é, paradoxalmente, um avanço e um recuo para a igualdade de direitos. Um avanço porque há a possibilidade de os casais do mesmo sexo se poderem casar já em 2010; um recuo, porque ficam excluídos da adopção. Trata-se, em boa verdade, de um casamento de segunda categoria.
Evidentemente, mesmo este projecto governamental pode ser travado. Na Assembleia da República, bastará o voto contra de doze deputados do PS (e há pelo menos duas que ninguém imagina a votarem a favor). Depois, há o possível veto de Cavaco (o Tribunal Constitucional não parece ser um obstáculo). Sendo possível que o Parlamento seja dissolvido na Primavera, o veto de Cavaco seria suficiente para adiar o assunto casamenteiro.
Enfim. Os homossexuais não sabem no que se estão a meter. Mas esse problema é deles.

quinta-feira, 17 de dezembro de 2009

Mais sobre o «climategate»

Sapatos, tomates e igrejas...

Concedo que atirar um calhau à cabeça de um político é um acto de violência condenável. Mas quando a democracia se torna uma anedota e os empresários nos dão a escolher, cada vez mais, entre os fantoches "da esquerda" e os fantoches da direita, parece-me difícil evitar que os empresários e os fantoches passem a ter medo dos cidadãos. Já é assim na América Latina e em todas as ditaduras do mundo.

Nunca pensei acabar a citar o Mao, mas é verdade que não se pode culpar o rio por ser tormentoso e ignorar as margens que o apertam.

Há 10 anos eram tartes: Bill Gates, Jean Chretien, Jacques Delors, Gerrit Zalm e tantos outros políticos e figuras públicas levaram com tartes na cara.

Parece-me sintomático que hoje os protestos sejam mais duros. Muntadar al-Zaidi, o homem que atirou os sapatos a George W, Jeremy Paul Olson, o homem que atirou os tomates a Sarah Palin (hoje o supermercado Costco de Salt lake City tirou os tomates dos escaparates durante a visita dela) e agora este homem, que atirou uma igreja a Berlusconi, são imediatamente aclamados heróis por tanta gente.

A pergunta que me parece lógica no contexto político em que vivemos é quando é que a pobreza e o desemprego vão transformar os sapatos e os tomates em balázios. Os assassinatos políticos do princípio do século XX foram o resultado lógico da miséria e da injustiça social das décadas de desregulamentação, arrogância e enriquecimento indecente que caracterizaram o final do século XIX.

Os oligarcas que compram e vendem os recursos naturais do planeta têm tido uma vida óptima, mas parece-me lícito perguntar se este sistema é sustentável. A maioria parece estar convencida que basta controlar os jornais e as televisões e, como se dizia nos anos Bush, fazer a própria realidade. Mas eu não sei. Os oligarcas que apoiaram a ascensão de Hitler também estavam optimistas nos anos trinta. O avô de George Bush fartou-se investir na Alemanha (inclusivamente na IG Farben). Há uns anos li que o pai de George Bush que tem um projecto para derreter três glaciares no Chile e escavar o ouro que lhe subjaz. E destruir a vida a quem depende dos rios que o glaciar alimenta (70 mil famílias). Os banqueiros da Wall Street continuam a pagar-se milhões de dólares e a advogar a desregulamentação... eu acho que se corre o risco de um dia acordarem num mundo cheio de Gavrilos Princeps, Costas e Buiças.

quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

Duas ou três coisas sobre o “caso Berlusconi”

Não posso de forma nenhuma apoiar acções como a de que o primeiro ministro italiano foi vítima. Mas o facto de ter sido vítima deste acto tresloucado não faz de maneira nenhuma de Berlusconi um herói, ao contrário do que afirma Ferreira Fernandes. Herói teria sido se enfrentasse uma multidão adversa. Mas o acto de Silvio Berlusconi ao exibir a sua face ferida e deformada àquela multidão (mesmo se esta lhe fosse maioritariamente adversa) não é um enfrentamento: o ataque de que Berlusconi foi vítima foi, claramente, um acto isolado, de uma pessoa. Não foi nenhum linchamento popular. Berlusconi não se esconder, repito, não tem nada de heróico.
O autor deste lamentável incidente foi identificado e, dentro da sua (in)imputabilidade, foi ou vai ser responsabilizado pelo seu acto. Entretanto parece que o autor já tem mais de 30000 “amigos” no Facebook. Quantos destes “amigos” eram capazes de praticar e dar a cara por um acto destes? Tornar-se amigo no Facebook, escrever em blogues, comentar em jornais é muito fácil. Diz-se que o governo de Berlusconi foi o responsável pelo esmagamento dos protestos de Génova, em 2001. Como tal, quem lá estava “sorri” ao ver Berlusconi “esmagado”. Eu não estava em Génova em 2001, mas estava na Assembleia da República em 1993 (com muitos colegas de curso de membros deste blogue), quando o governo de Cavaco Silva também esmagou brutalmente, sem justificação, protestos contra a lei das propinas. Os subscritores portugueses deste grupo do Facebook também estariam dispostos a atirar uma réplica da Catedral de Milão, ou do Centro Cultural de Belém, a Cavaco Silva, assim que o vissem? (Este não é um apelo à violência, que eu condenaria. É uma questão de retórica.)
Muito interessantes os debates que têm ocorrido sobre o assunto no Cinco Dias e no Arrastão (vale a pena ler os textos e os comentários), nomeadamente sobre o papel do Estado como agente da luta de classes (que eu recuso – o Estado deve ser neutro) e monopolizador da violência. Não se pode “acabar” com a violência, por isso ser “contra” ela não tem muita utilidade prática. Pode ser-se contra a violência indiscriminada e irresponsável – o recurso à violência tem de ser mesmo o último recurso, mas por não podermos acabar com a violência não podemos exluir este recurso. sendo assim, o importante é que quem recorre à violência o faça mandatado pela sociedade, seja sempre identificado e possa ser responsabilizado (ou os seus superiores hierárquicos) pelos seus actos perante a sociedade.

Uma semana depois, vale a pena ler o artigo (premonitório) de José Saramago sobre o "no B-day":

Itália não merece o destino que Berlusconi lhe traçou com criminosa frieza e sem o menor vestígio de pudor político, sem o mais elementar sentimento de vergonha própria. Quero pensar que a gigantesca manifestação contra a "coisa" Berlusconi, na qual estas palavras irão ser lidas, se converterá no primeiro passo para a libertação e a regeneração de Itália. Para isso não são necessárias armas, bastam os votos.

Peso do estado na economia abaixo da média europeia

«O último relatório da Eurostat sobre as contas do Estado, contraria mais uma vez uma visão errada que existe por aí que diz que o Estado português tem um peso acima da média da economia.
Tanto do lado das receitas como das despesas (a nossa posição relativa não depende portanto do nível do défice) os valores para Portugal em % do PIB estão abaixo da média comunitária nos dados já apurados de 2009 e nos dados de 2008.»


Aqui, no Fado Positivo.

Tem de se repetir muitas vezes os factos, porque há quem repita muitas vezes os mitos...

E depois do pior, há ainda pior

  • «Os portugueses estão cada vez mais longe do estilo de vida dos europeus. O poder de compra das famílias é 76% da média da União Europeia e há mais de uma década que Portugal não descola na escala do bem-estar. Países como a Grécia evoluíram e mesmo os checos e os eslovenos ultrapassaram o nível de vida dos portugueses. (...) Enquanto a República Checa, Malta, Portugal e Eslováquia fazem parte do grupo que está 20% a 30% abaixo da média, a Polónia, Estónia e a Hungria estão entre os países 30% a 50% distantes do nível médio de vida dos europeus. Um terceiro pelotão de países está na cauda da Europa dos 27. Roménia e a Bulgária têm menos de metade do poder de compra dos europeus (...) Nos próximos 17 anos - de acordo com um cenário de médio prazo - prevê-se que Portugal volte a crescer, anualmente, abaixo da Zona Euro. Se assim suceder, nas próximas duas décadas os portugueses não conseguirão fazer progressos na convergência rumo ao estilo de vida europeu.» (Diário de Notícias)

De mal a pior

  • «Portugal e a Grécia correm o risco de estar a entrar num ciclo de baixo crescimento económico e dívida cada vez mais insustentável, que faz com que nem o facto de pertencerem à zona euro lhes sirva de protecção, avisou ontem a agência internacional de notação financeira Moody"s.  (...) Para a agência, os dois países, mesmo tendo atravessado sem danos muito graves a crise financeira, poderão vir agora a enfrentar dificuldades maiores do que os seus parceiros do euro. "Apesar de o euro os ter protegido durante a crise de liquidez, não irá agora ajudar estes países a recuperar. Pelo contrário, poderá mesmo constituir uma perturbação", afirma o relatório, assinalando que "o risco agora é que possa vir a ocorrer uma lenta mas inexorável erosão da vitalidade económica, semelhante à que pode acontecer nos casos das cidades pequenas e sem competitividade dos grandes países".» (Público)

segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

Revista de blogues (14/12/2009)

  1. «Se eu e outros como eu consideram que o Prémio Pessoa 2009 foi atribuído a Manuel Clemente mais como uma ofensiva catolicista que nos prepara um 2010 beato, com papa e circunstância, e que corroa o laicismo constitucional, do que um reconhecimento isento e prestigiante de méritos próprios, isso não diminui nem ofende o premiado, se ele for eucuménico e com uma tolerância tamanha que abranja os incréus, os jacobinos, os blasfemos e até os carbonários do tempo presente, todos cidadãos com direito à vida.» (ÁguaLisa)
  2. «Jogos de aritmética parlamentar levaram a que o orçamento rectificativo autorizasse um aumento de 79 milhões de euros no limite de endividamento da Madeira – uma das regiões nacionais com mais elevado índice de desenvolvimento - com os votos favoráveis do PS, contra do BE e a abstenção dos restantes grupos parlamentares.
    Enquanto este negócio se consumava, o Ministro das Finanças denunciava o
    regabofe despesista nessa região.
    Alguma descoordenação política e uma visível inexperiência começa a vir à tona nestes processos negociais…
    » (Ponte Europa)

Berlusconi

Se calhar não devia alardear aqui as minhas fraquezas, mas ver a cara de Berlusconi, depois de levar com uma igreja nos dentes (ironia deliciosa) deu-me um prazer enorme.

Depois de ter escrito aqui duas linhas sobre o ignóbil Blair, que nos vendeu o ambiente, a economia e a paz à indústria americana e agora se passeia pelo mundo com dezenhas de milhões de libras dos energúmenos a quem ele nos vendeu o futuro, ver este boçal, este mafioso aliado dos fascistas e da extrema-direita religiosa, levar com uma igreja na cara, deu-me um prazer enorme. Pode não ser um prazer civilizado, mas é um grande prazer. :o)

Camus contra Sarkozy

O ateu Michel Onfray toma posição contra o projecto de Nicholas Sarkozy de transferir o cadáver de Albert Camus para o Panteão francês.
  • «Camus parlait en effet dans L'Homme révolté de la nécessité de promouvoir un "individualisme altruiste" soucieux de liberté autant que de justice. J'écris bien : "autant que". Car, pour Camus, la liberté sans la justice, c'est la sauvagerie du plus fort, le triomphe du libéralisme, la loi des bandes, des tribus et des mafias ; la justice sans la liberté, c'est le règne des camps, des barbelés et des miradors. Disons-le autrement : la liberté sans la justice, c'est l'Amérique imposant à toute la planète le capitalisme libéral sans états d'âme ; la justice sans la liberté, c'était l'URSS faisant du camp la vérité du socialisme. Camus voulait une économie libre dans une société juste. Notre société, Monsieur le Président, celle dont vous êtes l'incarnation souveraine, n'est libre que pour les forts, elle est injuste pour les plus faibles qui incarnent aussi les plus dépourvus de liberté. (...)» (Le Monde)

Se a justiça fosse cega...

Blair ainda se tramava. Mas infelizmente para nós, os ricos estão acima da justiça.

sábado, 12 de dezembro de 2009

Ainda a assistência espiritual nos hospitais

Fernanda Câncio sobre o recuo do Governo PS face às exigências do clericalismo:
  • «(...) Mas o burburinho surtiu efeito: o pré-diploma foi, como disse na altura Carlos Azevedo, bispo auxiliar de Lisboa, "metido na gaveta". Dois anos passaram. E eis que em Setembro último, em plena campanha para as legislativas, era publicado um novo regulamento, desta vez sem arrufos nem alarde. À primeira vista, parece ter mudado pouco. A extinção do cargo de capelão mantém-se; o direito a assistência religiosa de qualquer confissão está estatuído, assim como o direito a recusá-la; as unidades de saúde devem ter local específico para essa assistência (sem símbolos religiosos específicos de qualquer confissão) e local de culto misto. Só que, se os pacientes podem requerer a assistência de qualquer confissão, nem todos os assistentes têm direito a remuneração - só os que se encontrem vinculados à unidade "por contrato". E que contrato é este? É "um regime de contrato de trabalho em funções públicas" ou "contrato de prestação de serviços". E o critério? Um assistente por 400 camas - e "respeitando a representatividade de cada confissão religiosa". Tradução: as unidades de saúde vão continuar a contratar assistentes católicos em exclusivo e em permanência e os pacientes de outras confissões poderão continuar a fazer o mesmo que antes: a pedir que lhes chamem a sua gente, que virá de graça e é se quiser. Igualdade religiosa, faz de conta. Quanto à moral da história, é muito boa. Mentira, chantagem e cobiça não só não são pecado como dão lucro. E o governo laico socialista tem dias.» (Diário de Notícias)
Em rigor, a situação é pior do que a explicada por Fenanda Câncio: 1) a ICAR mantém a gestão das capelas que já tem em estabelecimentos do Estado; as outras confissões ficam com um gabinete; 2) o modelo encontrado para os hospitais foi também aplicado às forças armadas e prisões, e estendido para as forças de segurança, onde anteriormente não existiam «capelanias».
Realmente, como «laicos» como os do PS de Silva Pereira - que foi quem realmente negociou estes diplomas- o clericalismo tem a porta aberta no governo.

quinta-feira, 10 de dezembro de 2009

Tudo como dantes, bloco central em Abrantes

Está encontrada a solução: PS+PSD+CDS>115. Com as abstenções do PSD e do CDS, o PS aprova o orçamento rectificativo. Fica tudo bem. Depois de uma viragem eleitoral à esquerda, uma viragem governamental à direita. Povo de esquerda, governo de direita. O BE agradece.

quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

Revista de blogues (9/12/2009)

  1. «O ateu, aquele que nega a crença na existência de deuses, seja um, seja mais de um, não parte do princípio que tem de provar cientificamente e racionalmente que não existe um deus ou que não existem vários deuses.
    Pelo contrário, o ateu constata que não há nada de racional e de científico na crença que afirma, precisamente, a existência de tais divindades. Como facilmente se compreende, o ónus da prova não é do ateu, mas de quem afirma a existência de seres transcendentais.» (Jugular)

  2. «O facto de nunca ter votado em Cavaco Silva nem no seu partido não belisca a consideração pela legitimidade que ele teve para governar e agora possui para nos presidir. Como não diminui o meu direito à indignação, laica, perante o anúncio de que Sua Excelência, o Presidente da República, durante a visita papal, vai utilizar a força do seu cargo institucional, obtida por eleição numa república laica e democrática, para funcionar como diácono coadjuvante da Eminência dos católicos, em todos os passos, incluindo os de natureza religiosa, que este der. Esse papel de presidente-sacristão não o dignifica nem dignifica os portugueses. Será apenas mais uma fraqueza catolicista de reverência bimba e beata do actual inquilino provinciano de Belém.» (Água Lisa)

PS+CDS+...>115

Anunciada a abstenção do CDS no orçamento rectificativo (abstenção e não voto a favor), o PS ainda precisa de mais qualquer coisita para passar entre os pingos de chuva sem se molhar (as abstenções do BE ou do PSD chegam, a da CDU não).
Enfim. O momento é da teoria de jogos. Vários dilemas do prisioneiro em perspectiva. Como se sabia desde as eleições de Setembro.
Seja como for, isto não pode durar. A fronteira final é a eleição presidencial. Depois, aconteça o que acontecer, muda-se de jogo.

A nação e a tropa

Têm razão Fernando Rosas e o BE: as forças armadas portuguesas só devem sair para o estrangeiro com a autorização prévia do Parlamento. Atribuir à prerrogativa do Governo e do PR a movimentação de tropas em tempo de paz é colocar um poder excessivo nas mãos do poder executivo.
A nação é representada pelo Parlamento, não pelo Governo, e é aos representantes da nação que cabe decidir se e quando as forças armadas saem do país. Mas eu iria mais longe do que o BE e exigiria dois terços dos votos dos deputados.

terça-feira, 8 de dezembro de 2009

A morte do vegetarianismo?

A carne artificial vai chegar em 2014. Contorna a maior parte das objecções éticas geralmente levantadas ao consumo de carne: não exige que se mate um animal para comer a sua carne; reduz as emissões de metano devidas à criação de gado. Será que o vegetarianismo se vai transmutar em artificialismo? Ou vai desaparecer enquanto filosofia de vida?

Glenn Beck

Acho que foi Bertrand Russel que escreveu que os cientistas estão sempre cheios de dúvidas e os ignorantes de certezas. Ver o vídeo abaixo deu-me vontade de rir porque pensei em pessoas com Bill Maher, que não têm deixado de sublinhar a estupidez demente e criminosa dos comentadores da extrema direita. Um dos anormais que tem aparecido na televisão a defender as vantagens da poluição e a inventar teorias conspirativas completamente anormais é um ex-alcoólico completamente ignorante, chamado Glenn Beck, que convida os amigos do Ku-Klux-Klan para o programa e chora porque acha que o Obama é um Hitler que quer dar seguros de saúde a todos os americanos.

Bill Maher descreve-o com muita sensatez aqui:

segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

Aquecimento Global - Aqueles mails

Muito se tem escrito a propósito dos e-mails que vieram a lume.
Aconselho qualquer um que se queira volta a pronunciar a esse respeito (como os Ricardos que aqui escrevem*) a ver este pequeno video sobre esse assunto:



* ;)

Existem coincidências!

  • «José Sócrates também trocou de telemóvel no mesmo dia em que Armando Vara e outros arguidos do processo ‘Face Oculta’ mudaram de aparelho.» (Sol)

Aquecimento Global

Aqui nos EUA as empresas poluidoras têm conseguido baralhar a mensagem, acusar os cientistas de alarmismo, estupidez e incompetência, e penso que já bloqueram qualquer boa intenção da administração Obama. Apesar da emissão de CO2 per capita dos EUA ser 8 vezes maior que a da China, os chineses estão a ser culpados nos media pelos problemas todos do planeta (mesmo o aquecimento global que, segundo as empresas, é um problema que não existe).

O costume. Os americanos do campo (a maioria) são umas crianças grandes, mas devem ter percebido que alguma coisa se passa, porque as sondagens mostram que uma percentagem crescente não quer falar disso, levanta a voz quando se fala no assunto e desata a insultar os cientistas e a ciência com invectivas irracionais.

Contudo, se se lhes pergunta se apoiariam subsídios às energias "verdes", mais de 90% diz que sim.

Excepto aqui no Texas, bem entendido. Como Deus é texano e fez a natureza para nós a destruirmos, o pessoal despreza os maricas e os comunistas que dizem palavras incompreensíveis como "sustentabilidade" e continua a comprar carros do tamanho de casas e a deixar o motor a trabalhar quando vão ao supermercado (com o ar condicionado no máximo). E o nosso governador anda há dois anos a tentar implementar, com um entusiasmo evangélico, mais centrais térmicas a carvão.

domingo, 6 de dezembro de 2009

«Aquecimento global»

Parece que amanhã vai haver barulho. Em estereofonia.

Do antidemocratismo: autoritarismo e desigualdade

O Ludwig Krippahl tem razão: uma associação de ateus que divide os sócios em escalões, dando dez votos aos fundadores e um aos recém-inscritos, dá mau nome ao ateísmo. Uma associação de ateus que não defenda os valores de liberdade e igualdade, e sim os de autoritarismo e desigualdade, não me representa enquanto ateu.
Felizmente que me demarquei, em devido tempo, da «Associação Portal Ateu». A Associação Ateísta Portuguesa, pelo contrário, continuará a merecer o meu apoio de ateu democrata que sou, enquanto continuar a ser dinamizada por pessoas como o Carlos Esperança e o Ludwig Krippahl, entre outros.

Jesus causa problemas no Alabama

Toda a gente conhece a América de Hollywood, da NASA, do Frank Lloyd Wright, de Nova Iorque, do John Coltrane, do Miles Davis e do Woody Allen. Mas há outra: a que votou no Bush, que acredita que o mundo tem seis mil anos e que vê os 'talk shows' da FOX. :o) A história de hoje é de uma senhora chamada Dorothy Killingworth que mudou o nome para Jesus Christ e foi expulsa de um juri em Birmingham, Alabama... :o)

quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

Uma mentira, repetida em muitos blogues, acaba por se tornar verdade?

Alguém me pode explicar o raciocínio deste texto? De onde é que se conclui, das suas afirmações, que o deputado do PS conhece o teor das escutas? Ricardo Rodrigues está admirado, obviamente, por Manuela Ferreira Leite falar como se soubesse o conteúdo das escutas (não por "o primeiro ministro estar a mentir"). São coisas diferentes. Mas a má interpretação de um texto pega-se e repete-se. Esta gente não tem um mínimo de sentido crítico? A falta que faz a matemática obrigatória até ao 12º ano!

quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

Perdoai-lhes homens, que elas não sabem do que falam






(Dedicado à Ana Vidigal; a propósito de uma discussão sobre excisão e circuncisão.)

Os ex-comunistas (não) são um perigo

Segundo um colega de blogue de Mário Lino:
  • «(...) sublinhe-se a ordem de valores que Mário Lino preserva da militância comunista (disciplina, honestidade e sentido da responsabilidade) inteiramente compatíveis com o desempenho de quaisquer funções. É algo que sempre me impressionou nas reivindicações públicas de alguns ex-comunistas. Neles permanece o que melhor se pode aproveitar no convento, no seminário ou numa academia militar. Entrega, disciplina, acatamento das consignas superiores. Quanto à base programática e ideológica, zero. Fica-se às vezes com a impressão que o mundo entretanto deu uma volta e a natureza do capitalismo se alterou. Socialistas de esquerda, bloquistas e comunistas teriam perdido por completo a razão quando apontam a fundamental imoralidade do desprezo pelos trabalhadores e pelo trabalho que parece ter feito escola nos últimos tempos. Sobre o capitalismo, nem uma palavra. Até parece que estamos cá todos, felizes e contentes, a gerir como nos mandam uma sociedade que não pode mudar.» (PuxaPalavra)
E assim se conclui que a direita nada tem que temer dos ex-comunistas quando chegam aos respeitáveis governos da lusitana social-democracia. Do PCP não terão guardado nada da ideologia, e tudo do espírito de corpo militar.

    terça-feira, 1 de dezembro de 2009

    Os que dão mau nome à ciência

    Delgado Domingos:
    • «(...) O que sucedeu em 1967 em Lisboa e se repete cada vez mais agravado por esse mundo fora não é devido a emissões de CO2eq ou alegado aquecimento global.
      É devido simplesmente ao facto de fenómenos climáticos naturais, que sempre existiram, terem efeitos cada vez mais catastróficos porque as acções humanas sobre o território criaram as condições para isso ao desflorestarem as cabeceiras de rios (que agravaram o seu assoreamento e as consequentes inundações), ao aumentarem os riscos de deslizamento das encostas (porque eliminaram a vegetação que as estabilizava), ao construírem cada vez mais em leitos de cheia, e ao provocarem alterações cada vez mais extensas e profundas no uso do solo. 
      (...)

      ###

      Em termos científicos, o que os emails revelam são os esforços concertados dos seus autores, junto de editores de revistas prestigiadas, para não acolher publicações que pusessem em causa as suas teses ou os dados utilizados pelo grupo, recorrendo mesmo a ameaças de substituição de editores ou de boicote à revista que não se submetesse aos seus desígnios.
      Propuseram-se mesmo alterar as regras de aceitação das publicações para consideração nos Relatórios do IPCC de modo a suprimir as críticas fundamentadas às suas conclusões. Em resumo, procuraram subverter, em seu benefício, toda a ética científica da prova, da contraprova e de replicação de resultados que está no cerne do método científico, controlando o próprio processo da revisão por pares.
      Em conjunto, conseguiram impedir que fossem publicados a maioria dos dados e conclusões que pusessem em causa e com fundamento o seu dogma do aquecimento global devido às emissões de CO2eq. 
      (...)
      O comportamento escandaloso e intolerável de um grupo restrito de cientistas que atraiçoaram o que de melhor a Ciência tem só foi possível porque um grupo de políticos, sobretudo europeus, criou as condições para o tornar possível.
      (...)
      Seria também irresponsável agir como se as consequências da variabilidade climática e da utilização desbragada de combustíveis fósseis tivesse desaparecido com a revelação do escândalo. Muito pelo contrário. (...)» (Expresso)

    Suíça: um recuo para a laicidade

    Há quem (por exemplo, em Itália), não perceba por que é que remover crucifixos de salas de aula é muito diferente de proibir a construção de minaretes. Algumas razões.
    1. Proibir torres de uma religião e não de todas é discriminar negativamente uma religião; remover crucifixos das salas de aula põe fim à discriminação positiva de uma religião e deixa as religiões em igualdade na escola. Todas as discriminações positivas de uma religião são negativas para as outras; todas as discriminações negativas de uma religião são positivas para as outras.
    2. Uma escola (pelo menos, se for pública) existe para difundir o conhecimento; uma igreja ou uma mesquita existem para difundir a respectiva religião. É por servirem funções diferentes que não se exige para os templos religiosos o que se exige para a escola pública.
    3. Uma escola pública é um espaço onde os alunos são obrigados a estar; ninguém é obrigado a passar por uma mesquita, e muito menos a entrar nela (já mudei de caminho para não passar em Finsbury Park).
    4. Os crucifixos foram colocados nas escolas (portuguesas ou italianas) por decisão, estatal, de ditaduras defuntas. Compete ao Estado tirar o que mandou pôr. Construir templos é da competência das comunidades religiosas, dentro dos limites legais que devem ser iguais para todos.

    Os suiços e os minaretes

    Acho que o Ricardo tem toda a razão: a proibição dos minaretes na Suiça é xenofobia pura. E é natural que estes actos se repitam à medida que a demografia vai influenciando a guerra entre o laicismo e o islão.

    Não me admirava muito se dentro de uns anos não estivéssemos aqui a pedir actos semelhantes aos oligarcas da EU. Como escreve o Ricardo, também com muita razão, a democracia sem laicidade é perigosa para as minorias. Parece-me natural que nos círculos eleitorais europeus onde o islão ganhar terreno se comece a sentir a pressão e se instale o mal estar.

    Como aqui nos EUA, no sul profundo, onde a maioria evangélica impõe a sua vontade aos outros e torna os "pecados" ilegais, ou distorce a lei para perseguir as minorias.

    domingo, 29 de novembro de 2009

    Sobre o 25 de Novembro

    Quanto mais leio sobre o 25 de Novembro, mais me convenço de que os pára-quedistas de Tancos fizeram um enorme favor a toda a gente (mesmo aos extremos aparentemente mais sedentos de sangue), ao possibilitarem que tudo se «normalizasse» nas Forças Armadas sem desastres de maior. Até talvez lhes devessemos fazer uma estátua por terem aliviado, cirurgicamente, a tensão que se acumulava e poderia facilmente descambar. Este ano, o texto mais interessante sobre o 25 de Novembro apareceu no Público e lê-se ali. Conclusão:
    • «Apesar de todos os mistérios que persistem, visto de hoje o 25 de Novembro parece antes de tudo uma imensa encenação, em que, tacitamente, todos, da extrema-esquerda à extrema-direita, conspiraram para o mesmo desfecho. Como se estivessem cansados, e optassem pela paz.»
    Evidentemente, à direita (e a alguma esquerda) interessa usar a tese do «golpe da esquerda radical a 25 de Novembro» como argumento para excluir do espaço do poder as forças à esquerda do PS. À medida que os anos passam e as provas do pretenso «golpe» tardam em aparecer, o argumento perde força. E, se um dia se descobrir que boa parte da direita conspirou, depois da «normalização» do 25 de Novembro, para fazer algo semelhante ao «23-F» espanhol, quero ver como vão descalçar a bota.

    Não se defende a liberdade destruindo a liberdade

    Sou anticlerical e, em certa medida, anti-religioso. Mas não me regozijo com o resultado do referendo sobre os minaretes na Suíça: a liberdade não é liberdade sem igualdade. Se se entende que os minaretes serem um símbolo de poder (que são, sem dúvida) é razão suficiente para os proibir, então deveriam ter-se proibido também as torres das igrejas cristãs (que têm exactamente o mesmo significado). Interditar a construção de edifícios de uma determinada confissão religiosa, mas não de outra, chama-se discriminação.

    O voto suíço contra os minaretes (57%) não é, portanto, uma expressão de laicismo. Quando muito, será de xenofobia ou, talvez, de rejeição (mal dirigida) do fundamentalismo islâmico. E se há sem dúvida um enorme debate a fazer sobre o islamismo, a submissão-humilhação das mulheres nessa religião (e noutras), os casamentos forçados, a ausência de liberdade religiosa nos países de população muçulmana, e a tibieza com que os responsáveis muçulmanos «moderados» se exprimem sobre o terrorismo de inspiração islâmica, todavia construir locais de culto com forma exterior de templo não deixa de ser um direito das comunidades religiosas, e proibir minaretes é restringir a liberdade religiosa, ou seja, a laicidade (se a volumetria é excessiva ou o mau gosto muito gritante, há as autoridades municipais; que falham). Mais facilmente defenderei a proibição do véu islâmico ou da burca, que são sinais de fundamentalismo, do que a proibição da construção de minaretes ou de mesquitas, que atinge por igual todos os muçulmanos, civilizados ou fundamentalistas.

    Posto isto, não deixa de ser verdade que uma boa parte dos muçulmanos sonha  em ver-nos agachados no chão na direcção de Meca, e que o seu sector fundamentalista constitui uma ameaça à liberdade. Mas a solução não é proibi-los: é mandá-los estudar Darwin e Voltaire (de preferência, sem véu).

    • «A Religião Católica Apostólica Romana continuará a ser a Religião do Reino. Todas as outras Religiões serão permitidas aos Estrangeiros com seu culto doméstico, ou particular, em casas para isso destinadas, sem forma alguma exterior de Templo.» (Carta Constitucional, em vigor até 1910)
    • «É também livre o culto público de qualquer religião nas casas para isso destinadas, que podem sempre tomar forma exterior de templo (...)» (Lei de Separação, 1911)

    Democracia sem laicidade, ou laicidade sem democracia?

    O dilema dos países de população muçulmana:
    • «Entre la Turquie, le Maroc, l’Algérie et la Tunisie, on voit bien que ceux qui s’en sortent bien, sont ceux qui ont sécularisé avant de démocratiser. Si vous démocratisez sans séculariser, comme l’Algérie en 1991, vous donnez les clefs à un régime totalitaire qui ne les rendra jamais. A l’inverse, si vous sécularisez sans démocratiser, comme en Turquie ou en Tunisie, vous nourrissez aussi une alternative religieuse… Mais elle est moins dangereuse qu’en Algérie. L’AKP au pouvoir, ce n’est pas le FIS au pouvoir. Le gouvernement tunisien devrait comprendre qu’il est temps de démocratiser… Pendant ce temps, l’Algérie, qui n’a ni démocratisé ni sécularisé, se trouve dans une impasse totale.» (Caroline Fourest na ReSPUBLICA)

    Duplicidade de critérios

    O mesmo Ministério da Administração Interna que multa os cidadãos que estacionam o carro em cima do passeio auto-atribuiu-se o direito de estacionar em cima do passeio na Baixa de Lisboa. Até colocaram uma plaquinha para se auto-autorizarem a fazer o que eu presumo que seja uma ilegalidade. Ver no blogue Passeio Livre.

    sábado, 28 de novembro de 2009

    O país dos doidos

    Portugal é um país cheio de doidos que se orgulham de conduzir depressa, de violarem as regras de trânsito e de se colocarem a si próprios e aos outros em risco. Uma sub-casta de doidos, por conduzir veículos do Estado que costumam carregar os que «fazem as leis», acha-se «acima das leis» e não hesita em fazer ralis em plena Avenida da Liberdade.

    quinta-feira, 26 de novembro de 2009

    Os mesmos valores, prioridades diferentes

    De leitura indispensável esta entrada do Arrastão. Da minha parte, não só por causa do texto do Daniel Oliveira em si, mas sobretudo por causa da discussão que se segue (no que diz respeito à Alemanha - o caso francês referido parece ser mais um fait-divers sarkozyano). Sobretudo com o comentadores Bossito e JP, com quem estou de acordo. Valores como a igualdade básica e a liberdade de imprensa não podem ser relativizados. Ao pé desta discussão fundamental - como deve a Europa tratar os seus imigrantes? - , a do véu islâmico (onde mais uma vez defendo a não relativização da igualdade básica) parece marginal. Mas sempre a vi como fundamental, pois evidencia as diferentes concepções sobre integração de imigrantes e diferentes culturas em vista. Esta é uma questão a que, cada vez mais urgentemente, a esquerda não pode fugir. Quanto mais tempo esta discussão demorar, mais a extrema direita subirá.
    "Quem fala assim certamente nunca perdeu o emprego para mão de obra mais barata vinda do estrangeiro. O perigo da esquerda continuar a alimentar estas visões completamente irrealistas, alienadas e sem qualquer possibilidade de aplicação prática sobre as questões da imigração, está precisamente em deixar para as mãos da direita o exclusivo do tratamento do tema. Isso sim, assusta-me."

    "O que se defende aqui (e reparará que a maioria defende uma solução de “bom senso”) é que a abertura é bem vinda desde que, pela sua quantidade, não degrade as condições de vida, e pela sua qualidade, não ponha em causa os direitos liberdades e garantias que tanto custaram a conquistar. (...)O argumento (do nosso lado digamos assim) é que quem defende o mesmo que o Daniel geralmente vive em locais pouco afectados por aquilo que defende (acontece o mesmo com a localização dos bairros sociais ou com a co-incineração. São óptimos mas niguém os quer ao pé de casa.)."

    Entretanto, num café da Avenida de Roma...

    ...Parece que Fernando Lima não tomou um café a mais. Pelo contrário, até parece que alguém lhe pagou o café. E não foi o jornalista do Público.

    quarta-feira, 25 de novembro de 2009

    Comunista homenageia Cerejeira

    Parece que já nem os comunistas se recordam do que foi o Estado Novo e do papel que desempenhou a ICAR e um certo cardeal Cerejeira: um vereador CDU da Câmara Municipal de Almada esteve presente na inauguração clericalista de um busto do cardeal fascista Cerejeira, junto ao horrendo «Cristo-Rei». E teve palavras simpáticas: «este é um momento importante para a nossa terra. Portugal está mais rico e a nossa cidade também».
    Ainda hei-de ver o Jerónimo de joelhos em Fátima. Ou os comunistas ao lado da ICAR contra os ricos, os homossexuais e a burguesia. Tudo é possível.

    terça-feira, 24 de novembro de 2009

    On the Origin of Species

    Foi publicado há precisamente 150 anos!

    Os ingleses fizeram um filme a comemorar os 150 anos da publicação deste livro (hoje) e os 200 anos do nascimento de Darwin (em 12 de fevereiro de 1809).

    Nos EUA não vamos poder vê-lo porque não há distribuidor.

    Dawkins, em 2007: "I'm a biologist, and the central theorem of our subject: the theory of design, Darwin's theory of evolution by natural selection. In professional circles everywhere, it's of course universally accepted. In non-professional circles outside America, it's largely ignored. But in non-professional circles within America, it arouses so much hostility -- (Laughter) -- that it's fair to say that American biologists are in a state of war. The war is so worrying at present, with court cases coming up in one state after another, that I felt I had to say something about it."

    «A Ideia de República: de 1910 aos nossos dias», conferência no dia 28 de Novembro

    Estarei na Biblioteca-Museu República e Resistência(*), no dia 28 de Novembro às 16 horas, para apresentar uma conferência sobre «A Ideia de República: de 1910 aos nossos dias» (em representação, evidentemente, da Associação República e Laicidade).
    (*)  Espaço Cidade Universitária da Biblioteca Museu República e Resistência: Rua Alberto de Sousa, 10A, Zona B do Rego (Metro: Cidade Universitária).

    Notícias

    Uma das coisas mais irritantes do jornalismo é a falta de diversidade de opiniões. Chego a casa, passo os olhos pelo Guardian, o Monde, o El País e o Huffington Post, e o ponto de vista é sempre o mesmo: o dos magnatas que controlam os jornais politicamente.

    sábado, 21 de novembro de 2009

    Gostos discutem-se, sim senhor

    Eu acho o trabalho do arquitecto Troufa Real horrível. Acho que, como dizia um pintor que conheci, ele 'tem muito gosto, mas é do mau'. Pessoalmente estou-me nas tintas para a nova igreja (é para ficar vazia como as outras), até porque não se vê do Texas, onde vivo, e Lisboa cada vez parece menos a cidade onde vivi e me diverti tanto.

    Quando andava no Técnico fartei-me de experimentar grupos de pessoas e uma vez frequentei um curso na Gulbenkian com um título como 'ver a arte' ou coisa que o valha. Nesse curso lembro-me de o Eduardo Nery dar uma aula sobre o 'mau gosto' com uma sensatez enorme. A definição dele, que mais tarde li em muitos livros e artigos diferentes, era que 'mau gosto' queria dizer desadequado. Ou seja, uma coisa de mau gosto era uma coisa mal pensada, um macaquear de um modelo erudito mal compreendido, uma imitação barata.

    Acho que muitos de nós já sofremos a experiência de vermos no teatro uma peça encenada por um encenador que não a percebeu: um exemplo típico de 'mau gosto'.

    O pós-modernismo português foi isso mesmo: um macaquear de experiências eruditas de arquitectos com talento (na maior parte falhadas, até porque pretendiam basear-se num olhar erudito que parodiava, ironizava e reutilizava outras linguagens, portanto sempre muito próximo do mau gosto por definição).

    Os pós-modernos portugueses eram confrangedores na simplicidade tonta com que imitavam os gurus da moda e deixaram-nos um sem número de edifícios sem pés nem cabeça, com pilares em frente das janelas, cantos esconços onde não se pode viver, fachadas horríveis, materiais e tintas baratas que o sol queimou imediatamente, torres, chaminés e janelas torcidas, mal colocadas, que não fecham, jardins que nos projectos eram verdejantes e alegres e depois de construídos nos lembram Beirut Oriental, normalmente com montes de lixo das obras onde ao fim de cinco ou seis anos começaram a crescer ervas. Um horror terceiro mundista, onde cada edifício gritava "olhem para mim!" e transformava a cidade e o país ainda mais num caos de mau gosto, triste, sujo e disfuncional.

    Depois de um curto período em que encheu as capas das revistas, o pós-modernismo morreu. Há muitos anos. Passou de moda, ficou esquecido como um beco da história da arquitectura que não levou ninguém a lado nenhum.

    Mas parece que se esqueceram de dizer isto ao arquitecto Troufa Real. E agora Belém vai ter uma igreja com um minarete e um barco e uma onda no telhado - referências um bocado óbvias, para não dizer boçais, ao sítio e ao tema. Porque não um pastel de Belém gigante (em cima do barco)?

    Pour épater le bourgeois. Pessoalmente, preferia que ele tivesse metido um padre e um menino de coro, nus. Mau gosto por mau gosto, acho que era mais divertido...

    Mas enfim, levamos com o barco e o minarete e a onda. Até aquilo cair, daqui a uns anos. Até lá é um mamarracho horrível cuja única função é ser fotografado por turistas chocados.

    Mais um mamarracho, menos um mamarracho... Lisboa tem sido projectada por desenhadores da construção civil e por arquitectos da E.S.B.A.L. (entretanto elevada inexplicavelmente a Fac. Arquitectura, onde os arqueitectos da E.S.B.A.L. depois se 'doutoraram' uns aos outros). Vá o diabo e escolha.

    Acima de tudo acho que este projecto é triste porque é triste ver uma pessoa sem talento a tentar fazer-se engraçada. Este 'enfant terrible raté' só conhece um tipo de traquinices: pinceladas de tinta.

    Troufa, Taveira e Graça Dias são só isso: eternos rapazes traquinas com ambições artísticas. A tragédia deles é que para se ser artista não basta fazermo-nos artistas...

    :o) estava a pensar reler isto e contar os francesismos... de mau gosto? provavelmente! mas agora não vou corrigir isto.

    Israelitas e palestinianos

    A religião é uma coisa fantástica: este grupo de pessoas (israelitas e palestinianos) etnicamente tão próximas, está dividido em duas facções que interpretam a mensagem do mesmo deus de maneiras diferentes.

    Há poucas semanas vi um documentário sobre Joseph Campbell em que ele defendia que a religiosidade era uma forma das pessoas se relacionarem com coisas que não têm explicações simples, como o facto de morrermos, a necessidade de termos que matar para comermos e, enfim, os conflitos entre as nossas paixões e as nossas necessidades. Nesse sentido, não tinha dúvidas sobre a importância da religiosidade, que tentava explicar ideias por metáforas, para podermos tenter percebê-las melhor, mas deplorava a religião, que resultava da incompreensão das pessoas que tomavam essas metáforas como factos.

    Segundo ele, no original (a filosofia da primeira metade do primeiro milénio antes da nossa Era, na India), a "terra prometida" não era um projecto imobiliário. E a virgindade da Nossa Senhora não era um facto ginecológico.

    São metáforas escritas por pessoas inteligentes, sobre a necessidade de tentarmos compreender a nossa condição com as imagens que o conhecimento que temos do mundo, em cada geração, nos permitem.

    E estes idiotas - israelitas e palestinianos - agarram-se a duas versões de uma mesma religião, que foi concebida por pastores da Idade do Bronze num mundo que era um quadrado com 250 Km de lado, e matam-se uns aos outros com um ódio racista e fanático difícil de conceber.

    Tenho amigos israelitas formidáveis, razoáveis, generosos, bons. Excepto quando se lhes fala de árabes. Há uns tempos li, não me lembro aonde, que em 1947 ou 48 Martin Bubber (um homem adorável e um filósofo que advogava a paz e a coexistência) se mudou para a casa dum poeta palestiniano que foi despejado para o efeito.

    Esta recusa em ver 'os outros' como seres humanos - Thomas Friedman descreveu eloquentemente em 'From Beirut to Jerusalem' os arrepios que sentia quando os israelitas diziam 'arranja-se um árabe para fazer isso' - transformou o Médio Oriente num inferno de estupidez e brutalidade indiscritíveis.

    E, por favor, não me venham dizer que uns são piores do que os outros. A estupidez e a brutalidade sociopata são atributos igualmente abundantes entre estes dois grupos de selvagens, racistas e sociopatas.

    quinta-feira, 19 de novembro de 2009

    Como se deslocam os portugueses nas cidades europeias?

    Há um mito – talvez seja mais correcto falar-se numa desculpa – para o hábito errado (pelo menos por parte de quem habita nas áreas metropolitanas de Lisboa ou Porto) dos portugueses se transportarem sempre de carro, para onde quer que vão. Não importa se os transportes públicos estejam cada vez melhores, pelo menos em Lisboa. O Metro está cada vez mais eficiente e com melhores ligações. Já se podem fazer transferências gratuitas entre autocarros. O serviço nocturno da rede de autocarros foi melhorado e ampliado. Os comboios suburbanos estenderam o seu serviço pela madrugada nas vésperas de fim de semana e feriados. Mas os portugueses – sendo que os lisboetas sem qualquer desculpa – insistem que o serviço de transportes públicos “não é adequado”. Dado que outros povos da Europa não exibem este comportamento e utilizam correntemente os transportes públicos, poderíamos ser levados a pensar que, apesar de tudo o que enumerei, o problema estaria nos transportes portugueses. Dado que “lá fora” se anda de transporte público, se tivéssemos transportes como “lá fora” talvez os usássemos. Quem continua a defender esta ideia (ou mais correctamente a usar esta desculpa) que explique este exemplo (a que cheguei via o Menos um Carro).

    O horror islâmico

    Desemprego vai continuar a subir

    Quem o diz é a OCDE:
    • «O desemprego ultrapassará os 10 por cento em 2010. (...) Em 2011, com a economia a crescer 1,5 por cento, a taxa de desemprego voltará para níveis de apenas um dígito, ainda assim, deverá ser de 9,9 por cento.» (Público)
    Não vou discutir os curiosos critérios de arredondamento dos economistas, porque o que me preocupa é que continuaremos com 550 mil ou mais desempregados. Não ter havido ainda uma explosão social só reflecte que Portugal tem hoje mais defesas do que em 1983 (rendimento mínimo, por exemplo). Mas esta percentagem de desempregados reflecte uma fraqueza da economia portuguesa que não é agradável.

    Mamarracho católico isento de taxas municipais

    A igreja-em-forma-de-caravela-em-vermelho-laranja-dourado-verde do Alto do Restelo ficou isenta de taxas municipais. No total, 198 mil euros. Ora bem. Com os 234 mil euros que a autarquia já assumidamente ofereceu, já vamos em 532 mil euros de contribuição da CML, por omissão ou acção, para o mamarracho do Alto do Restelo. Fora o terreno, que dada a zona e a área, deve ser mais ainda. E depois digam que o Estado não financia a ICAR...
    P.S. Movimento de opinião contra o mamarracho: assina-se aqui.

    Ainda sobre o aquecimento global

    Segundo o melhor autor de divulgação científica no youtube:



    Se não viram, vejam estes: os melhores videos a que já tive acesso a explicar a questão do aquecimento global, a teoria dos proponentes da teoria do efeito de estufa, e os argumentos dos cépticos sérios.

    Também sobre este assunto e pelo mesmo autor podem ver este e este.

    quarta-feira, 18 de novembro de 2009

    Nos EUA: Rape and the U.S. Chamber of Commerce

    In 2005, Jamie Leigh Jones was working for a private contractor in Iraq when she was brutally gang-raped by coworkers. Four years later, Jamie is still being denied justice. Jamie can't file U.S. criminal charges because the rape took place overseas, and a fine-print clause in her contract takes away her right to file a lawsuit in the U.S. Why? Because big corporations, led by the U.S. Chamber of Commerce, have worked for years to prevent workers from suing their employers in almost any circumstance, even sexual assault.

    Nem bom senso nem bom gosto

    Toda a gente tem o direito de subir ao cimo da montanha e gritar que é o rei do mundo. Não faz mal a ninguém e até deve fazer bem aos pulmões. Também é natural que as confissões religiosas rivalizem para construir o edifício mais alto, mais vistoso, mais espampanante - e há males maiores (como cortar o prepúcio das crianças ou assustá-las com o «inferno»). É por isso que votaria «não» se fosse suíço e me fosse colocada a questão «a construção de minaretes deve ser proibida?».
    As confissões religiosas têm o direito de construir edifícios com aparência exterior de templo e fachada virada para a rua. Já houve tempo, em Portugal, em que não tinham esse direito. Depois da «tenebrosa» Carbonária e do «5 de Outubro» de 1910, passaram a tê-lo. Faz parte da liberdade religiosa ter casas para fins religiosos, e o serem facilmente identificáveis não me aquece nem me arrefece.
    E no entanto, compreende-se perfeitamente que os minaretes que assustam os suíços são símbolos de poder. Ostensivos. Como as torres das igrejas e os sinos tocados a meio da noite são também para recordar que determinada comunidade religiosa existe e se faz ouvir. Ou o «Cristo-Rei» de Almada - não é por acaso que ficou virado para Lisboa e para o poder, bem visível e impositivo.
    Mas, lá está. Temos o direito de subir ao cimo da montanha e gritar inanidades.
    Agora, e já que o bom senso não abunda, seria de pedir (nem digo exigir...) que houvesse um pouco mais de bom gosto na igreja católica portuguesa. É que um mamarracho em verde, laranja, dourado e vermelho, em forma de caravela e com uma torre de cem metros de altura (mais de trinta andares...) plantada no Alto do Restelo, é um «nadinha» demais. É que a coisa é horrenda. E não o digo por ser anticlerical (que sou).
    Como se não bastasse, a Câmara Municipal de Lisboa é a (infeliz) doadora de cerca de 25% do milhão de euros já reunido (e cedeu o terreno, com uma permuta pelo meio). Coisas do tempo do modestíssimo e nada católico Santana Lopes. Mas há-de doar mais. É para os pobres, dirá a ICAR. Pois. Pobres dos pobres. E pobres de nós.

    terça-feira, 17 de novembro de 2009

    Os arrependidos do islamo-fascismo

    Johan Hari é um excelente jornalista britânico que entrevistou alguns dos arrependidos (britânicos) do islamismo terrorista. A amostra será pequena para tirar conclusões muito gerais, mas há alguns pontos interessantes: foram isolados da sociedade britânica quer pelo fechamento natural das suas comunidades de origem, quer pelas pressões exteriores (o racismo da direita e o paternalismo «multiculturalista» da esquerda); sentiram-se alienados do «Ocidente» devido ao imperialismo, às detenções arbitrárias e à tortura; desiludiram-se do islamismo por descobrirem que este, onde detinha o poder, não tinha criado o paraíso, mas o inferno; e sentiram-se atraídos de volta à «normalidade» das democracias europeias por descobrirem que mesmo quem não concordava com eles estava disposto a garantir que tivessem direito a um julgamento justo, e que muitos europeus se opunham, por exemplo, à guerra do Iraque.
    A minha conclusão é óbvia: não são as aventuras militares nem a tortura que colocarão um fim ao islamismo. Será o melhor do iluminismo europeu: a igualdade perante a lei, a oposição à injustiça e ao abuso de poder,  a liberdade e o tratar todos como adultos. Todos. Até os que têm ataques de histeria por causa de umas meras caricaturas. Ou sobretudo esses.

    Desemprego

    • «A taxa de desemprego em Portugal atingiu os 9,8 por cento no terceiro trimestre de 2009, o que representa o valor mais elevado desde que há registos. O Eurostat, Gabinete Europeu de Estatística, tem dados sobre Portugal desde 1983 e nunca a taxa de desemprego ou o número de desempregados chegou ao nível actual: há actualmente 547,7 mil pessoas sem emprego, segundo o Instituto Nacional de Estatística (INE).» (Diário de Notícias)
    • «Assim, no espaço de três meses, passou a haver mais 40 mil desempregados em Portugal, sendo o acréscimo anual de cerca de 114 mil. Com este resultado, é ultrapassado o máximo de 9,2 por cento para a taxa de desemprego que se registou no primeiro trimestre de 1986, na sequência da crise económica que atravessou o país durante a primeira metade dos anos 80.» (Público)

    segunda-feira, 16 de novembro de 2009

    «Portugalex»

    Entre entrevistas à televisão, à rádio e aos jornais, admito que alguma coisa me tenha escapado e que possa ter ido longe demais aqui e ali. Mas não me lembro de dar esta entrevista à Antena 1. Nem de ter revelado o meu plano secreto para impedir as pessoas de chamarem Lúcia Jacinta Francisco Ratzinger aos filhos, e para armar os alunos da escola pública com kalasnhikovs. Pois é. Desta vez é que me apanharam. Vou protestar. Com veemência.

    As escutas são boas ou más, depende?

    Alberto Costa defendeu, enquanto Ministro da Justiça, que se fizessem escutas sem mandado judicial. E pior: que fossem serviços directamente controlados pelo governo a fazê-las. Não me recordo de alguém se indignar com isso, no PS ou na oposição, nos jornais ou nos blogues.
    Agora, anda tudo indignadinho porque se gravaram conversas entre Sócrates e Armando Vara. Ai-ai. Conversas, note-se, gravadas no âmbito de uma investigação judicial, decidida por um poder (teoricamente...) independente do poder político.
    Talvez seja o momento para parar para pensar no monstro que foi criado quando: a) se organizaram serviços «de informações» sob a alçada directa do governo; b) se lhes deu «carta branca» para fazerem escutas ilegais; c) se colocou a «controlar» os ditos serviços um entusiasta de destruir as garantias constitucionais de privacidade dos cidadãos; d) se começou a defender publicamente que se alterasse a Constituição para legalizar o que serviços na dependência directa do Governo já fazem e não deveriam, constitucionalmente, fazer.
    A actual legislatura permite uma revisão constitucional. Os cidadãos que se mantenham atentos. Como se vê pelos acontecimentos dos últimos dias, se já é mau ter escutas autorizadas pelo poder judicial no contexto de um processo judicial, tê-las sem processo aberto e «legalmente» decididas pelo poder político seria péssimo.

    domingo, 15 de novembro de 2009

    Do jornalismo enquanto forma de manipulação

    Um encontro inter-religioso é apresentado no telejornal da RTP2 (e no Expresso), como um encontro de «ateus, agnósticos e religiosos». E no entanto, trata-se de um encontro numa mesquita em que os entrevistados para a respectiva peça jornalística televisiva são o islâmico wahabita Abdul Vakil, o sacerdote católico Peter Stilwell, e o mais «religiosamente correcto» dos agnósticos portugueses: Mário Soares. Só por curiosidade: quem era o ateu dos títulos das notícias? Estava clandestino? Incógnito? Ou não existia?

    Umberto Eco sobre Saramago

    Até um escritor tão «religiosamente correcto» como Umberto Eco começa a estender uma orelha amigável para os argumentos dos ateus anti-religiosos.
    • «(...) Talvez Ratzinger pensasse naqueles sandeus de Lenine e Estaline, mas esquecia-se que nas bandeiras nazis estava escrito "Gott mit uns" (que significa "Deus está connosco"), que falanges de capelães militares benzeram os arruaceiros fascistas, que inspirado em princípios religiosíssimos e apoiado por Guerrilheiros do Cristo-Rei era o massacrador Francisco Franco (independentemente dos crimes dos adversários, foi sempre ele que começou), que religiosíssimos eram os Vandeanos contra os Republicanos, que até tinham inventado uma Deusa Razão, que católicos e protestantes se massacraram alegremente durante anos e anos, que tanto os Cruzados como os seus inimigos eram impelidos por motivações religiosas, que para defender a religião romana se puseram os leões a comer os cristãos, que por razões religiosas se acenderam inúmeras fogueiras, que religiosíssimos são os fundamentalistas muçulmanos, os autores do atentado das Twin Towers, Osama e os talibãs que bombardearam os Budas, que por razões religiosas se opõem a Índia e o Paquistão, e por fim que foi a invocar God Bless America que Bush invadiu o Iraque. Por isso me punha a reflectir que talvez (se por vezes a religião é ou foi o ópio dos povos) com maior frequência tem sido a sua cocaína. Creio que esta é também a opinião de Saramago e ofereço-lhe a definição - e a sua responsabilidade. (...)» (Umberto Eco no Diário de Notícias)

    sexta-feira, 13 de novembro de 2009

    Tomás da Fonseca reeditado

    Tomás da Fonseca (1877-1968), republicano e anarquista, foi talvez o mais importante escritor ateu em língua portuguesa. Infelizmente, os seus livros são dificílimos de encontrar (até em bibliotecas públicas...), e as edições originais tornaram-se raridades nos alfarrabistas.
    É portanto uma excelente novidade que a editora Antígona tenha decidido reeditar algumas das obras clássicas de Tomás da Fonseca, nomeadamente «Na Cova dos Leões» e «O Santo Condestável - Alegações do Cardeal Diabo». Dois temas que, infelizmente, continuam connosco: o fatimismo e a instrumentalização católica de Nuno Álvares Pereira.


    Espero que esteja para breve a reedição de «Sermões da Montanha», uma defesa simples e lúcida do ateísmo enquanto forma de vida.
    Haverá uma apresentação pública amanhã às 16 horas na FNAC do Chiado (em Lisboa), com a presença do Carlos Esperança, da Associação Ateísta Portuguesa.