sexta-feira, 28 de julho de 2006

O cúmulo da incoerência

Encontrei no Glória Fácil uma entrevista da Esther Mucznick absolutamente incrível. A entrevista é muito boa, mas as oscilações de Mucznick entre assumir o judaísmo como religião, «racializá-lo» ou subsumi-lo no vínculo político a Israel, tornam a entrevista algo alucinante. A esse respeito, uma passagem eloquente (entre muitas...) é esta:
  • «(...) ser judia é essa complexidade de relações, não se define só pela religião. Se fizesse um inquérito encontraria quem lhe dissesse que é ateu e judeu... NM- E um judeu católico, é concebível? EM- Não, porque opta por outra religião. NM- Ser ateu também é uma opção religiosa. EM- É completamente diferente. Optar pelo ateísmo não é optar por outra religião. Do ponto de vista da lei judaica, é judeu quem é filho de mãe judia...»
Portanto, quem for judeu e quiser passar a ser ateu tem que fingir primeiro que se converte a uma religião qualquer. Mesmo assim, talvez o continuem a considerar judeu por uma questão de «linhagem». Para complicar ainda mais, como há judeus etíopes e até, ao que consta, chineses e butaneses, a linhagem não é genotipicamente uniforme: é-se judeu por causa da opção espiritual da avózinha, e não se pode escolher abandoná-la. É uma opção espiritual transmitida geneticamente que dá direito a ser cidadão de um Estado do Médio Oriente. Mas o mais incrível é isto:
  • «É um Estado laico no sentido em que não há uma religião oficial, cada um escolhe a religião que bem entende
A afirmação é incoerente quer com a declaração de independência («Israel é um Estado judeu») quer com as palavras da própria Mucznick:
  • «Ao abrigo da Lei do Retorno, de 1952, todo o judeu — entendido como filho de mãe judia — pode adquirir a nacionalidade israelita. E houve vários padres católicos, filhos de mãe judia, que requereram a nacionalidade ao abrigo dessa lei. Aí os tribunais israelitas acrescentaram a condição de não conversão a outra religião
Portanto, no conceito de laicidade de Esther Mucznick inclui-se um Estado que decide a nacionalidade por critérios de religião. E onde o Estado não reconhece casamento civil. Se eu tivesse alma, ela estaria parva.

Pronto a pensar

  1. Israel só existe por vontade do poder imperialista dos EUA, e quem não se revolta é neocolonialista.
  2. O Hezbollah é um mero peão da Síria e do Irão, e quem não o compreende é islamófilo e anti-americano.
  3. Israel é um Estado tão laico e democrático como Portugal, os EUA ou a França, e quem tiver dúvidas é anti-semita.
  4. O Hezbollah é um movimento de libertação tão respeitável como qualquer OLP ou Fretilin, e quem não concorda é anjinho.
  5. Temos que apoiar a democracia israelita, mesmo que sacrificando qualquer hipótese de haver uma democracia no Líbano.
  6. Temos que compreender o bombismo suicida, faríamos o mesmo contra os espanhóis.
  7. Do outro lado não há crianças.

quinta-feira, 27 de julho de 2006

Pena de Morte no Irão

Hoje a BBC passou uma história sobre a execução pública (por enforcamento) de uma miúda de 16 anos, chamada Atefeh Rajabi, a 15 de Agosto de 2004.

Quando estes energúmenos tiverem armas nucleares vai ser bestial. E para nos proteger deles? Bush e Blair!

Os dois embrulhos gizam a estratégia e Israel trata das relaçoes públicas com o mundo Arabe e com a ONU!

quarta-feira, 26 de julho de 2006

Israel não é um Estado laico

O Estado israelita é, desde a sua fundação, confessional. A própria declaração de independência contém numerosas referências religiosas e estabelece Israel como um «Estado judeu». Infelizmente, uma fatia importante e muito influente da população judaica continua a encarar Israel como um Estado criado por razões religiosas e para finalidades religiosas, mesmo apesar da grande diversidade religiosa de Israel (pelo menos um em cada cinco israelitas são muçulmanos ou cristãos) e da secularização dos descendentes de judeus (dos quais metade serão não religiosos). Israel permanece assim a única democracia do mundo em que não existe casamento civil, e o único Estado do planeta que outorga a nacionalidade (um vínculo público e estatal) a quem se converta a uma religião (uma opção privada e espiritual). São ainda generalizadas, particularmente entre os judeus, as mutilações sexuais impostas a menores do sexo masculino sob pretextos religiosos, uma violação grave do direito da criança a preservar a integridade do seu corpo.

segunda-feira, 24 de julho de 2006

Anticlericalismo, impostos sem representação, etc.

Eu sei que estas coisas às vezes não são simples de ver a partir de Portugal e que podem demorar tempo a explicar, sobretudo a quem não leu o famoso livro de Max Weber sobre os católicos e os protestantes, a Reforma e a Contra-Reforma...

Mas as coisas a que me refiro são óbvias para quem vive fora do país e eu atrevo-me a trazê-las para aqui mais uma vez: até porque estou na Holanda este mês, meio em férias, meio a trabalhar, e as coisas me parecem ainda mais claras vistas de um país rico, organizado, limpo e planeado com bom senso e sentido crítico.

Com menos recursos naturais do que Portugal e um império que durou, na chamada Idade de Ouro, mais ou menos 50 anos até ser destruído pelos ingleses, a Holanda soube poupar, investir e colher os frutos. E porquê?

Na sexta-feira passada, durante um jantar, estava a pensar para onde é que foi o dinheiro da costa de Africa, do Estado da India, do Brasil, de Angola e até o dos contribuintes alemães, que entrou a rodos com o advento da UE.

A resposta é, infelizmente, muito simples. A maioria foi enterrada em igrejas, catedrais, fundos para suportar orações perenes, eleições de bispos e cardeais, embaixadas aos papas, uma população de clérigos gigantesca e absolutamente inútil, que mendigava pelo país, suja e ignorante, ou se enchia de comida em centenas de conventos onde nunca se produziu uma ideia.

E o que é que a ICAR nos deu em troca? Medo do inferno, superstições, missas, procissões, milagres e autos de fé, o Index e as sebentas de Coimbra, estirpadas do iluminismo.

Mas acima de tudo a ICAR foi a melhor e mais zelosa defensora dos direitos da aristocracia rural, também ela maioritariamente inútil, suja e ignorante (que o diga o marques de Pombal), contra os interesses das cidades, da classe média, dos comerciantes, das profissões liberais, do racionalismo e da revolução industrial.

Em Portugal a vontade de melhorar a nossa vida, de ascender socialmente é um pecado mortal, chamado “arrivismo”.

A ICAR tem sido uma força de bloqueio – daquelas que Cavaco Silva costumava lamentar – até aos nossos dias. Até 1974, apoiando aberta e desavergonhadamente o Estado Novo, os presos políticos, a tortura e a guerra colonial, contra todos os ensinamentos do Novo Testamento. A partir daí, sem quorum e sem o apoio aberto do exército e da polícia política, de forma menos escandalosa, tem sabido ser uma forca constante de reação contra o progresso e a justiça social.

Hoje como no tempo em que Eça escreveu “O crime do padre Amaro”:

“– Muita pobreza por aqui, muita pobreza! Dizia o bom abade – Ó Dias, mais este bocadinho de asa!
– Muita pobreza, mas muita preguiça – considerou duramente o padre Natário. Em muitas fazendas sabia ele que havia falta de jornaleiros, e viam-se marmanjos, rijos como pinheiros, a choramingar padre-nossos pelas portas. – Súcia de mariolas! – resumiu.
– Deixe lá, padre Natário, deixe lá! – disse o abade – Olhe que há pobreza deveras. Por aqui há famílias, homem, mulher e cinco filhos, que dormem no chão como porcos e não comem senão ervas.
– Então que diabo querias tu que eles comessem? – exclamou o cónego Dias lambendo os dedos depois de ter esburgado a asa do capão. – Querias que comessem peru? Cada um como quem é!
O bom abade puxou, repoltreando-se, o guardanapo para o estômago, e disse com afecto:
– A pobreza agrada a Deus Nosso Senhor.
– Ai, filhos! – acudiu o Libaninho num tom choroso – se houvesse só pobrezinhos isto era o Reininho dos Céus!
O padre Amaro considerou com gravidade:
– É bom que haja quem tenha cabedais para legados pios, edificações de capelas...
– A propriedade devia estar na mão da Igreja – interrompeu Natário, com autoridade.
O cónego Dias arrotou com estrondo e acrescentou:
– Para o esplendor do culto e propagação da fé.”

Eça de Queiroz

Guerra no Líbano

Estava a ver as notícias sobre a guerra no Médio Oriente e a pensar que as pessoas que mandam hoje no mundo acreditam mesmo que a violência se pode estancar com violência.

Não é só a direita israelita (sempre obtusa, abrutalhada e supersticiosa) que pensa assim. Depois de seis anos de desastres miseráveis, à escala planetária, a Casa Branca e o governo Blair ainda acham que isto se resolve com tiros e com bombas (e continuam a defender a vingança irracional como um direito fundamental e uma prática moralmente justificável). Como o taxista israelita que disse a Tom Friedman nos anos oitenta que achava que Israel devia bater nos árabes até eles deixarem de os odiar (em From Beirut to Jerusalem).

A maioria das pessoas que eu conheço acredita que os governantes em geral sabem melhor que nós, ou pelo menos estão mais bem informados. Eu acho que se eles acreditam que se pode reprimir dois biliões de muçulmanos como se reprimiram os cátaros (com uma guerra religiosa decarada) é porque são estúpidos e estão mal informados.

Hoje os israelitas alvejaram uma ambulância e a BBC referiu a possibilidade de terem utilizado bombas de fósforo. Para se defenderem (com toda a razão) de um ataque terrorista e de um rapto perpetrado por uma organização criminosa – o Hezbolah é uma organização criminosa que devia ser destruída – os israelitas resolveram desatar a matar crianças, alvejar ambulâncias e destruir um país inteiro. Como estratégia parece-me um desastre absoluto, no curto, médio e longo prazos.

Aliás, acho que se hoje Israel é um estado religioso sem eira nem beira, cheio de psicóticos violentos e onde não há uma réstia de bom senso, é em resultado da receita bíblica que utilizada contra os palestinianos: olhos por olho, dente por dente, nós fomos escolhidos por Deus e os palestinianos são todos iguais. Assim desejo-lhes sorte.

Claro que estou contra

Ah, e claro que estou contra Israel. E contra o Hezbollah. E a favor do direito de Israel à segurança. E a favor do direito do Líbano à segurança.

Pronto, assim os amantes de dicotomias fáceis que cá venham choramingar que a sobrevivência de Israel está em perigo (não está) ou que o Hezbollah é uma reacção aceitável dos árabes (não é) já ficam com lenha para me queimar.

Ah,a guerra...

Ainda não escrevi sobre a nova guerra no Líbano (e na Faixa de Gaza...) porque, honestamente, parece-me que não temos toda a informação relevante.

Que a guerra começou a pretexto de provocações dos islamofascistas, e com uma reacção desproporcionada que seria mais consentânea com uma ditadura, todos sabemos. Que ambas as partes a desejavam, parece razoavelmente claro. O que têm a ganhar, não compreendo. Israel não conseguirá destruir um partido armado que é por definição civil. O objectivo, desse lado, será reaver a «zona tampão» do sul do Líbano, se possível patrulhada por europeus ou estado-unidenses. O «Partido de Deus» poderá querer prestígio e influência para si ou (para quem acha que este é um mero fantoche da Síria e do Irão) fazer uma manobra de diversão.

Entretanto, quem morre são os civis libaneses (e, numa décima parte, os civis israelitas) e, a longo prazo, arruina-se qualquer hipótese de um Líbano democrático ou minimamente próspero. Para quê?

Christopher Hitchens: «Aqueles que se intitulam como radicais, contestadores, precisam redefinir o debate em torno de uma sociedade secular»

«Veja – Qual o significado da nova ofensiva israelense contra o Líbano?


Hitchens – Quando se discutia a criação de um Estado judeu no Oriente Médio, uma das vozes contrárias vinha de dentro do próprio judaísmo. Esses radicais consideravam que um Estado desse tipo na Palestina implicaria uma injustiça com as populações árabes. Em linhas gerais, é o meu ponto de vista: Israel foi, do começo, um erro. Não acredito que Jerusalém possa redimir o sofrimento histórico dos judeus. Para mim, Israel não é o fim da diáspora – é parte dela. Não tenho nada em comum, no entanto, com aqueles que consideram os judeus uma praga, uma raça de conspiradores que planeja governar o mundo. Se for forçado a escolher entre Israel e os terroristas libaneses do Hezbollah, é claro que fico do lado de Israel. O Hezbollah é um inimigo da civilização. Não posso ficar neutro. Mas tomo partido com relutância, e com um sentimento trágico de que essa situação poderia ter sido evitada.
###
(...)

Veja – O senhor já afirmou que não acredita mais no socialismo. Mas então o que restou para os contestadores defenderem?

Hitchens – É uma boa pergunta, e eu creio que muitas pessoas se aferram hoje a posições antigas porque não querem responder a ela. Não entendem como podem continuar na oposição se não há mais o socialismo para defender. E devo admitir que tampouco foi fácil para mim abandonar essa idéia. Mas isso não significa, de modo algum, que a vida dos radicais chegou ao fim. Ainda temos muitas tarefas importantes, e a maior de todas é derrotar a nova forma do totalitarismo: a teocracia. Aqueles que se intitulam como radicais, contestadores, precisam redefinir o debate em torno de uma sociedade secular, que é uma aspiração iluminista, e devem combater as ditaduras teocráticas. O fato de eu estar afastado da esquerda tradicional nunca significou uma abstenção da solidariedade política – nem mesmo da solidariedade revolucionária. Não estamos em um beco sem saída.

Veja – Então o seu ideal ou utopia hoje é uma sociedade plenamente secular?

Hitchens – Sim. Meu próximo livro, que já concluí mas ainda não foi editado, vai se chamar God Is Not Great (Deus Não É Grande). O título contraria abertamente um princípio conhecido da fé muçulmana, mas o livro não é apenas uma crítica ao Islã. É contra a crença em Deus.

(...)
Veja – Há quem argumente que a humanidade não pode viver sem algum tipo de fé – que a educação moral das pessoas não se sustenta em uma base puramente secular.

Hitchens – A utilidade de uma ilusão é irrelevante para avaliar seu conteúdo moral. E há milhões de pessoas em todo o mundo que conduzem sua vida de forma ética sem acreditar em Deus. De outro lado, não creio que alguém possa indicar um só país em que as pessoas se comportem melhor por acreditar em Deus. Podemos, ao contrário, apontar países em que as pessoas se comportam de forma pior por causa da fé.

Veja – E o senhor incluiria os Estados Unidos entre os países onde a religião piora o comportamento das pessoas?

Hitchens – Sem dúvida. Posso dar exemplos. As pessoas que hoje desejam impedir as crianças de aprender sobre as novas descobertas da biologia evolutiva – o que tornará essas crianças incapazes de funcionar no mundo moderno – são cristãs. E em todas as igrejas encontramos quem afirme que a aids é ruim, mas não tão ruim quanto os métodos contraceptivos. Os programas americanos contra a aids na África são baseados nessas idéias – e vão levar milhões de pessoas a uma morte horrível.

Veja – No livro Cartas a um Jovem Contestador, o senhor mostra algum ressentimento por ser considerado apenas como o sujeito que atacou Madre Teresa de Calcutá. Por quê?

Hitchens – O que me irrita é quando me descrevem como um sujeito que está sempre em busca de alguém para atacar. Meus livros sobre George Orwell, Thomas Jefferson e Thomas Paine provam que sou, sim, capaz de escrever sobre figuras que admiro. Mas ainda tenho orgulho de ter exposto Madre Teresa como uma fraude e uma fundamentalista fanática. A Igreja, depois disso, decidiu aceitar como verdadeiro um milagre fajuto na Índia: uma mulher teria se recuperado de um tumor usando uma medalha de Madre Teresa. Não é assim que se curam tumores. Temos os testemunhos de médicos e até do marido dessa mulher para documentar o tratamento que a fez melhorar. A Igreja, no entanto, considera que houve uma cura milagrosa promovida por ela. É uma mentira irresponsável que encoraja os indianos a procurar charlatões no lugar de médicos de verdade.»

(Christopher Hitchens em entrevista à Veja. Recebido por e-mail.)

sábado, 22 de julho de 2006

A ICAR e os contribuintes

O texto de Ricardo Alves levanta um conjunto de questões muito pertinentes. Parece consensual que o Partido “Socialista” é ainda hoje o mesmo coito de snobs e de católicos “progressistas” que era antes do 25 de Abril de 1974, e para quem a ICAR é uma parte da paisagem que não se deve questionar ou importunar.

Esta promiscuidade é grave porque em Portugal nunca se sabe nada de nada. E dada a posição desproporcionadamente privilegiada da ICAR, penso que era bom sabermos quantos católicos praticantes há e quanto é que custam ao país, ou seja, aos contribuintes.

Numa era em que os neo-liberais, dentro e fora do governo, passam os dias a contar feijões e a fechar serviços prioritários em nome duma “eficiência” económica criminosamente hipotética, que nunca ninguém conseguiu demonstrar no mundo real, era bom sabermos quanto custam as centenas de igrejas vazias, de padres ociosos por falta de paroquianos, ou de bispos cuja única função é dar-nos opiniões não solicitadas e benzer pontes e calçadas.

É um facto incontestado que a ICAR faz parte das nossas vidas há mais de 1000 anos, que nem sempre teve o papel manhoso e sinistro que tem hoje na vida política, e que por vezes contribuiu enormemente em reflexões importantes sobre questões éticas fundamentais, como a escravatura.

Mas acho que em tempo de vacas magras, quando os políticos nos avisam que desbarataram mais uma vez o produto do nosso trabalho e que por isso vamos ter de apertar o cinto ainda mais, parece lícito perguntar porque é que se continua a desbaratar fortunas com uma instituição moribunda, reacionária e largamente inútil.

Bem sei que as pessoas gostam de rituais e que as fatiotas e as alfaias dos sacerdotes católicos enchem o olho e distraem a mente. Em Inglaterra há hoje apenas um milhão de praticantes anglicanos (1/60 da população, ouvi esta semana na BBC) e o estado paga o forróbódó da igreja tal como paga o forróbódó da monarquia, sem pestanejar, como quem subsidia a indústria do lazer.

E bem sei que ao pé dos evangélicos os católicos são um exemplo de civilização, temperança, inteligência, cultura e bom senso.

Quando a ICAR implodir vamos levar com os calvinistas em cima. E eles acreditam que os ensinamentos do Novo Testamento são efeminados e que o Antigo Testamento é uma receita muito melhor para o mundo: olho por olho, dente por dente, matai quem se levantar contra nós antes que eles tenham tempo de nos prejudicar, Deus deu-nos o mundo para poluir a matar os animais todos que nos apetecer, os ricos são ricos porque Deus os abençoou, os pobres são pobres porque merecem, morte aos homossexuais, aos heréges, às mulheres adúlteras, quando acabar o mundo nós vamos para o céu(portanto tomara já), etc.

Mas mesmo assim acho que temos o direito de saber quanto custa a ICAR por ano, quem paga as contas e quem usufrui os serviços, as festas e os rituais.

Na imprensa libanesa: a medida certa de tempo

Editorial do L´Orient-Le Jour.
«(...)
La guerre va durer longtemps, avertit ainsi l’ennemi israélien qui s’apprête à monter à l’assaut du réseau de galeries souterraines dont disposerait le Hezbollah dans la région frontalière. Ce n’est encore que le début, renchérit Hassan Nasrallah, qui affirme conserver un arsenal largement intact, et qui se refuse à libérer les deux soldats israéliens qu’il détient autrement que dans le cadre d’un troc. Pour l’unique superpuissance américaine qui a jeté tout son poids aux côtés d’Israël, il n’y a guère d’urgence, en tout cas, pour un cessez-le-feu. La raison officielle, déclinée hier encore par Condoleezza Rice, en est qu’un arrêt des affrontements ne servirait à rien s’il ne faisait que rétablir le statu quo alors qu’il faut, au contraire, créer les conditions d’une stabilité durable en s’attaquant à la racine du problème: à savoir le soutien de l’Iran et de la Syrie au Hezbollah. En clair, Washington continue d’accorder du temps et une large liberté d’action à Ehud Olmert: assez pour ramollir sensiblement, à défaut de l’annihiler, le Hezbollah; et pas assez cependant, délicate attention, pour provoquer l’effondrement du Liban tout entier et celui du gouvernement Siniora.
(...)»

sexta-feira, 21 de julho de 2006

O protocolo de Estado e as implantações presumíveis

Foi ontem aprovada em comissão parlamentar a lei de protocolo de Estado. O PS cedeu no articulado final, que terá a seguinte passagem: «as autoridades religiosas, quando convidadas para cerimónias oficiais, recebem o tratamento adequado à dignidade e representatividade das funções que exercem, ordenando-se conforme a respectiva implantação na sociedade portuguesa». Só a inclusão da ordenação segundo a «implantação» satisfez o membro do Opus Dei Mota Amaral, que ao longo de todo o processo legislativo se bateu valorosamente por um lugar de destaque para a confissão religiosa a que pertence.

Sendo clarificador e positivo que o Cardeal Patriarca de Lisboa da ICAR deixe de ter um lugar específico no protocolo de um Estado separado dessa e de outras comunidades religiosas, a avaliação da «implantação» que as «autoridades religiosas» representam anuncia problemas novos que se me afiguram irresolúveis. Em primeiro lugar, as convicções religiosas são individuais, íntimas e inconstantes. Afirmar que, num dado momento, a autoridade religiosa A representa a convicção religiosa de mais cidadãos do que a autoridade religiosa B, é uma suposição que para ser confirmada exigiria controlar os pensamentos de dez milhões de pessoas. Em segundo lugar, para além da impossibilidade física de saber o que pensam as pessoas existe a interdição constitucional de lhes perguntar («ninguém pode ser perguntado por qualquer autoridade acerca das suas convicções ou prática religiosa»). Finalmente, não podendo inquirir os cidadãos, o Estado terá que confiar às ditas autoridades a avaliação sincera e exacta da sua «implantação». E aí, imagino já o José Policarpo de punhos erguidos para o céu, naquela posição de futebolista que julga que acaba de marcar um golo: «nove milhões, novecentos e noventa e nove mil...». (Recorde-se, no entanto, que em 2001 a ICAR contou, confessadamente, um milhão e oitocentos mil praticantes, o que a torna apenas a maior das minorias religiosas...)

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Implicitamente, ficou decidido que a ICAR será a primeira das confissões religiosas «implantadas» no protocolo. O problema é quem se segue na fila. Pessoalmente, estou convencido de que a Sociedade Torre de Vigia é a segunda confissão religiosa em número de praticantes, mas as Testemunhas de Jeová cultivam o distanciamento face ao Estado e à política, o que me parece uma atitude saudável para uma comunidade religiosa (embora a doutrina das transfusões de sangue seja nada saudável), e por isso deixarão a cadeira vazia. Em terceiro e quarto lugar, a menos que a Aliança Evangélica Portuguesa consiga que as dezenas de comunidades que federa se decidam por um representante único, virão o apóstolo Jorge Tadeu da Igreja Maná ou o representante da Igreja Universal do Reino de Deus, qualquer uma das quais terá dezenas de milhar de seguidores. Em quinto lugar, se contarmos os imigrantes ilegais, virá o sheik Munir ou um qualquer banqueiro wahabita. E depois virá a multidão de representantes hindus, budistas, da IOG, da IJCSUD e (porque não?) o delegado português da Federação Pagã Internacional, o representante da Federação Espírita Portuguesa, o dos rastafaris, o da Igreja Portuguesa de Cientologia e o da Associação Portuguesa de Satanismo, sem esquecer o professor Karamba, os simpáticos Bahá'ís e finalmente a senhora da Comunidade Israelita de Lisboa (uma religião com nome de país e com menos praticantes do que o jogo da laranjinha).

O espectáculo que se perspectiva é cortesia desse partido suposto laicíssimo que é o PS, e que, ao contrário dos seus congéneres espanhol ou francês, jamais afronta a ICAR, mesmo na mais pequena das questões. Efectivamente, o deputado Vera Jardim não hesita em sublinhar que existem dois regimes legais para os cidadãos portugueses no que concerne à liberdade de consciência, a Concordata e a Lei da Liberdade Religiosa, e que o primeiro regime legal torna os cidadãos católicos mais iguais do que os outros. No actual momento histórico, em que pelo menos dois terços dos portugueses não praticam religião alguma e em que assistimos a um processo de secularização rápido e sem precedentes, seria de esperar um pouco mais de coragem, no protocolo e em questões mais substantivas...

[Publicado originalmente no Diário Ateísta.]

quinta-feira, 20 de julho de 2006

Os que não se evidenciam por jogar à bola

Os premiados: André França  à esq.), Flávio Coelho e Rui Barbosa

  • «Dois estudantes portugueses do 12º ano ganharam medalhas de bronze na 37ª Olimpíada Internacional de Física, que decorreu em Singapura com a participação de cerca de 90 países, foi hoje revelado em Coimbra, informa a Lusa. As medalhas foram atribuídas a um aluno do Colégio Luso- Francês (Porto), Flávio de Sousa Coelho - que venceu o Prémio Público/ Gradiva este ano -, e a um estudante da Escola Secundária Carlos Amarante (Braga), Rui Miguel Soares Barbosa. Um aluno da Escola Secundária Emídio Navarro (Almada), André Filipe de França, foi distinguido com uma menção honrosa.» (Fonte: Ciência Viva; ler também na Educare.)
  • «Portugal conquistou três medalhas de bronze e uma menção honrosa nas Olimpíadas Internacionais de Matemática (OIM), que hoje terminam na Eslovénia. Este foi o melhor resultado obtido em 16 anos de participação na competição.» (Fonte: Educare.)

quarta-feira, 19 de julho de 2006

Médio Oriente

Em dezembro passado meti este texto no meu blog, que explica tantas coisas:

Living with the Holocaust
SARA ROY
Journal of Palestine Studies, Vol XXXII, No. 1, Autumn 2002, Issue 125

(…)
Despite many visits to Israel during my youth, I first went to the West Bank and Gaza in the summer of 1985, two and a half years before the first Palestinian uprising, to conduct fieldwork for my doctoral dissertation, which examined American economic assistance to the West Bank and Gaza Strip. My research focused on whether it was possible to promote economic development under conditions of military occupation. That summer changed my life because it was then that I came to understand and experience what occupation was and what it meant. I learned how occupation works, its impact on the economy, on daily life, and its grinding impact on people. I learned what it meant to have little control over one's life and, more importantly, over the lives of one's children.

As with the Holocaust, I tried to remember my very first encounter with the occupation. One of my earliest encounters involved a group of Israeli soldiers, an old Palestinian man, and his donkey. Standing on a street with some Palestinian friends, I noticed an elderly Palestinian walking down the street, leading his donkey. A small child no more than three or four years old, clearly his grandson, was with him. Some Israeli soldiers standing nearby went up to the old man and stopped him. One soldier ambled over to the donkey and pried open its mouth. "Old man," he asked, "why are your donkey's teeth so yellow? Why aren't they white? Don't you brush your donkey's teeth?" The old Palestinian was mortified, the little boy visibly upset. The soldier repeated his question, yelling this time, while the other soldiers laughed. The child began to cry and the old man just stood there silently, humiliated. This scene repeated itself while a crowd gathered. The soldier then ordered the old man to stand behind the donkey and demanded that he kiss the animal's behind. At first, the old man refused but as the soldier screamed at him and his grandson became hysterical, he bent down and did it. The soldiers laughed and walked away. They had achieved their goal: to humiliate him and those around him. We all stood there in silence, ashamed to look at each other, hearing nothing but the uncontrollable sobs of the little boy. The old man did not move for what seemed a very long time. He just stood there, demeaned and destroyed.

I stood there too, in stunned disbelief. I immediately thought of the stories my parents had told me of how Jews had been treated by the Nazis in the 1930s, before the ghettos and death camps, of how Jews would be forced to clean sidewalks with toothbrushes and have their beards cut off in public. What happened to the old man was absolutely equivalent in principle, intent, and impact: to humiliate and dehumanize. In this instance, there was no difference between the German soldier and the Israeli one. Throughout that summer of 1985, I saw similar incidents: young Palestinian men being forced by Israeli soldiers to bark like dogs on their hands and knees or dance in the streets.

(...)

$20 a barrel for oil...

"The greatest thing to come out of [invading Iraq] for the world economy ... would be $20 a barrel for oil." Rupert Murdoch, chairman of News Corporation (which owns Fox News), February 2003

Vale a pena ler o que eles nos prometeram antes da invasão do Irake :-)

No Liberal Rapture:
Monday, July 17, 2006
Paul Krugman Breaks it Down.
March of Folly
By PAUL KRUGMAN

Since those who fail to learn from history are doomed to repeat it - and since the cast of characters making pronouncements on the crisis in the Middle East is very much the same as it was three or four years ago - it seems like a good idea to travel down memory lane. Here's what they said and when they said it:

"The greatest thing to come out of [invading Iraq] for the world economy ... would be $20 a barrel for oil." Rupert Murdoch, chairman of News Corporation (which owns Fox News), February 2003

"Oil Touches Record $78 on Mideast Conflict." Headline on www.foxnews.com, July 14, 2006

"The administration's top budget official estimated today that the cost of a war with Iraq could be in the range of $50 billion to $60 billion," saying that "earlier estimates of $100 billion to $200 billion in Iraq war costs by Lawrence B. Lindsey, Mr. Bush's former chief economic adviser, were too high." The New York Times, Dec. 31, 2002

"According to C.B.O.'s estimates, from the time U.S. forces invaded Iraq in March 2003, $290 billion has been allocated for activities in Iraq. ... Additional costs over the 2007-2016 period would total an estimated $202 billion under the first [optimistic] scenario, and $406 billion under the second one." Congressional Budget Office, July 13, 2006

"Peacekeeping requirements in Iraq might be much lower than historical experience in the Balkans suggests. There's been none of the record in Iraq of ethnic militias fighting one another that produced so much bloodshed and permanent scars in Bosnia." Paul Wolfowitz, deputy secretary of defense and now president of the World Bank, Feb. 27, 2003

"West Baghdad is no stranger to bombings and killings, but in the past few days all restraint has vanished in an orgy of 'ethnic cleansing.' Shia gunmen are seeking to drive out the once-dominant Sunni minority and the Sunnis are forming neighborhood posses to retaliate. Mosques are being attacked. Scores of innocent civilians have been killed, their bodies left lying in the streets." The Times of London, July 14, 2006

"Earlier this week, I traveled to Baghdad to visit the capital of a free and democratic Iraq." President Bush, June 17, 2006

"People are doing the same as [in] Saddam's time and worse. ... These were the precise reasons that we fought Saddam and now we are seeing the same things." Ayad Allawi, Mr. Bush's choice as Iraq's first post-Saddam prime minister, November 2005

"Iraq's new government has another able leader in Speaker Mashhadani. ... He rejects the use of violence for political ends. And by agreeing to serve in a prominent role in this new unity government, he's demonstrating leadership and courage." President Bush, May 22, 2006

"Some people say 'we saw you beheading, kidnappings and killing. In the end we even started kidnapping women who are our honor.' These acts are not the work of Iraqis. I am sure that he who does this is a Jew and the son of a Jew." Mahmoud Mashhadani, speaker of the Iraqi Parliament, July 13, 2006

"My fellow citizens, not only can we win the war in Iraq, we are winning the war in Iraq." President Bush, Dec. 18, 2005

"I think I would answer that by telling you I don't think we're losing." Gen. Peter Schoomaker, the Army chief of staff, when asked whether we're winning in Iraq, July 14, 2006

"Regime change in Iraq would bring about a number of benefits for the region. ...Extremists in the region would have to rethink their strategy of jihad. Moderates throughout the region would take heart, and our ability to advance the Israeli-Palestinian peace process would be enhanced." Vice President Dick Cheney, Aug. 26, 2002

"Bush - The world is coming unglued before his eyes. His naive dreams are a Wilsonian disaster." Newsweek Conventional Wisdom Watch, July 24, 2006 edition

"It's time for Democrats who distrust President Bush to acknowledge that he will be the commander in chief for three more critical years, and that in matters of war, we undermine presidential credibility at our nation's peril." Senator Joseph Lieberman, Democrat of Connecticut, Dec. 6, 2005

"I cannot support a failed foreign policy. History teaches us that it is often easier to make war than peace. This administration is just learning that lesson right now." Representative Tom DeLay, Republican of Texas, on the campaign against Slobodan Milosevic, April 28, 1999

Where have you gone Richard Perle, Paul Wolfowitz, Doug Feith, et al?

Gosto imenso de ler este blog. E este artigo vale imenso a pena, juntamente com o texto de Gary Hart que menciona.

segunda-feira, 17 de julho de 2006

«A laicidade como princípio fundamental»

São frequentes as confusões sobre aquilo de que se fala quando se fala de laicidade. Muitos católicos confundem frequentemente laicidade com anti-religiosidade, por exemplo. O filósofo nosso contemporâneo que, na minha opinião, melhor tem explicado o sentido moderno do laicismo é Henri Peña-Ruiz. Está traduzido para português, na Associação República e Laicidade, o texto «A laicidade como princípio fundamental da liberdade espiritual e da igualdade», cuja leitura recomendo a todos os que queiram, sem preconceitos, compreender o que defende a Associação República e Laicidade.
  • «Alguns homens crêem em Deus. Outros não. A liberdade pressupõe o carácter facultativo da religião ou do ateísmo. Por isso se usará aqui o termo genérico «opção espiritual», que não favorece nem uma nem a outra versão da espiritualidade. A igualdade pressupõe a neutralidade confessional do Estado e das instituições públicas, para que todos, crentes e não crentes, possam ser tratados sem privilégio nem estigmatização. Assim se alcança a maior justiça no tratamento das diversas opções espirituais. A separação do Estado e de qualquer igreja não significa luta contra a religião, mas sim, simplesmente, vocação para a universalidade, e ao que é comum a todos os homens para lá das suas diferenças. As diferenças não são negadas, mas podem sim viver-se e assumir-se livremente na esfera privada, quer se expresse a nível individual ou a nível colectivo (a confusão entre dimensão colectiva e carácter juridicamente público é um sofisma, pois confunde o que é comum a certos homens e o que é de todos). (...)» (Ler a continuação em «A laicidade como princípio fundamental da liberdade espiritual e da igualdade».)

Aconselho também a leitura do Glossário essencial da laicidade, adaptado de um livro de Étienne Pion, para uma discussão do uso de termos como laico, leigo, laicidade, anticlericalismo ou tolerância.

Publicação simultânea [Diário Ateísta/Esquerda Republicana]

sábado, 15 de julho de 2006

Bento Benze os Ferraris

No passado dia 12 o papa lá fez a tradicional benção anual dos Ferraris, na Praça de S. Pedro. Coisas importantes como estas devem ser tratadas com o devido cuidado.

Cinco semanas em Portugal

Acabaram-se-me as férias em Portugal. Cinco semanas. Tenho de confessar que me senti um bocado português e um bocado turista americano. Afinal, há já nove anos que estou no Texas!

Fez-me impressão a ausência absoluta de sentido de classe das pessoas, que se deixam enganar e roubar pelo Partido “Socialista”. Todas as noites o telejornal dava conta de mais um ataque do governo contra à população. Em resposta os portugueses iam para a rua dançar embrulhados na bandeira nacional...

Sabe-se há muito que a classe alta tem boa memória e que as classes média e baixa não percebem nada de nada e acabam sempre a lamber as botas a quem as rouba e as oprime.

Mas mesmo assim é dificil – pelo menos para quem já não está habituado – assistir a isto tudo.

Ao menos nos EUA as pessoas sabem que quem tem poder tem o direito de abusar e acham bem. E embora os talibans do campo façam barulho a Constituição sublinha o facto de os governos emanarem do povo, fala em liberdade e na conquista da felicidade na Terra...

Em Portugal são todos os anos os mesmos abusos da administração pública, a mesma atitude autoritária nas mais pequeninas coisas, sem nunca mudar, como no tempo do Eça, sem que as pessoas estranhem, se rebelem, se indignem.

sexta-feira, 14 de julho de 2006

O choradinho de Madaíl por não darem uma esmolinha aos seus jogadores

É absolutamente delicioso o parágrafo final do comunicado da FPF sobre a não concessão de isenção de IRS aos prémios de jogo.
  • «Apesar de tudo, estes fenómenos têm uma virtude. Permitem identificar, com uma clareza ofuscante, os hipócritas que, quando lhes convém, se associam às vitórias desportivas dos “heróis nacionais”, mas que se apressam a adoptar um tom grave e sisudo quando é mais cómodo fustigar “os príncipes da bola”.»

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(Silva Pereira é o homem por trás de Madaíl. Foi ele quem negou a isençãozinha. Madaíl agora chama-lhe hipócrita.)

Como qualquer pessoa com dois dedos de testa compreende, os convites feitos aos políticos para irem aos estádios trazem água no bico. Os Sócrates e os Rebelos de Sousa, que aproveitam os jogos da equipa da FPF para aparecer, deveriam sabê-lo. Agora, com a educação que todos lhe reconhecem, Madaíl chamou-lhes hipócritas...

(Já agora, considerar «heróis nacionais» os campeões mundiais de mergulho na relva e de faltas sobre os adversários, é de uma presunção atroz...)

quinta-feira, 13 de julho de 2006

Com certeza

Só é pena não se alargar já para os quatro meses, com carácter de obrigatoriedade (medida que provavelmente resolveria as desigualdades remuneratórias mulheres-homens mais rapidamente do que qualquer «lei de quotas» em listas eleitorais).

Joseph Stiglitz: «Who owns Bolivia?»

«(...)
Morales’ actions are widely supported by Bolivians, who see the so-called privatizations (or “capitalizations”) under former President Gonzalo “Goni” Sanchez de Lozada as a rip-off: Bolivia received only 18% of the proceeds! Bolivians wonder why investments of some $3 billion should entitle foreign investors to 82% of the country’s vast gas reserves, now estimated to be worth $250 billion. While there has not yet been full disclosure of returns, or an audit of the true value of investments, it appears that investors would, at the old terms, have recouped all their money within just four years.
###
Bolivians also ask why foreigners reap all the benefits of today’s high prices for oil and gas? It costs no more to extract oil or gas today than it did when prices were one-third of their current level. Yet, the foreign oil companies get 82% of the increase – in the case of oil, this would amount to a windfall for them of $32 a barrel or more. No wonder that Bolivians thought they were being cheated and demanded a new deal. On May 2, Morales simply reversed the percentages, pending renegotiation of the contracts: the companies operating in the two largest fields would get 18% of the production for themselves. As part of this new deal, Bolivia should also get a larger share when prices increase. (Bolivia may, of course, not want to bear the risk of a fall in the price, so it may strike a deal to transfer some of the downside risk to foreign companies, giving them in exchange more of the upside potential.)
(...)
If the Bolivians do not get fair value for their country’s natural wealth, their prospects are bleak. Even if they do, they will need assistance, not only to extract their resources, but also to improve the health and education of all Bolivians – to ensure long-term economic growth and social welfare.

For now, the world should celebrate the fact that Bolivia has a democratically elected leader attempting to represent the interests of the poor people of his country. It is a historic moment
(Joseph Stiglitz; ler na íntegra.)

quarta-feira, 12 de julho de 2006

Marx e a religião (2)

No Terceiro Manuscrito Económico e Filosófico (concretamente no capítulo «Propriedade Privada e Comunismo»), Marx é ainda mais claro sobre o carácter secundário da alienação religiosa.
  • «A alienação religiosa como tal, ocorre somente no campo da consciência, na vida interior do homem, mas a alienação económica é a da vida real, e por isso, a sua substituição afecta ambos os aspectos.»

Fica explícito, no trecho anterior, que a «alienação económica» é o caso geral, enquanto a «alienação religiosa» é o caso particular. Marx parecia acreditar que a segunda decorria da primeira.

Marx e a religião (1)

A passagem de Karl Marx em que se afirma que «a religião é o ópio do povo» é frequentemente citada como prova de que o pensamento marxista (e o comunismo, por extensão) seria anti-religioso. No entanto, essa passagem é mal compreendida, talvez por raramente ser citada na sua totalidade.
  • «A miséria religiosa é, de um lado, a expressão da miséria real e, de outro, o protesto contra ela. A religião é o soluço da criatura oprimida, o coração de um mundo sem coração, o espírito de uma situação carente de espírito. É o ópio do povo.»

Note-se que a referência ao ópio, que na época de Marx era uma droga de aristocratas e burgueses ricos, significa apenas que a religião é o escape, a fuga possível à «miséria real» das classes «oprimidas». Ao designar a religião como um «protesto» contra essa miséria e como «coração de um mundo sem coração», Marx demonstra até alguma compreensão pelo fenómeno religioso (senão mesmo simpatia). Nitidamente, se se tivesse que completar a série de metáforas usadas por Marx, facilmente se escreveria que a religião não é causa de problemas, mas sim consequência, que não é a doença, mas sim o seu sintoma.

Continuemos com a Introdução à Crítica da Filosofia em Hegel.

  • «A crítica arrancou as flores imaginárias que enfeitavam as cadeias, não para que o homem use as cadeias sem qualquer fantasia ou consolação, mas para que se liberte das cadeias e apanhe a flor viva. A crítica da religião desengana o homem para que este pense, aja e organize sua realidade como um homem desenganado que recobrou a razão a fim de girar em torno de si mesmo e, portanto, do seu verdadeiro sol.»

Na sequência do seu raciocínio (perfeitamente lógico atendendo às premissas) Marx defende que a crítica da religião não é um fim em si próprio, mas apenas um primeiro passo para que o homem se liberte das suas «cadeias». De certo modo, pode dizer-se que Marx subordina a crítica anti-religiosa à luta política socialista, não reconhecendo à primeira mais do que um valor instrumental.

terça-feira, 11 de julho de 2006

Azar Majedi: «Anti-Islamism does not justify racism! (Open Letter to Oriana Fallaci)»

«Dear Oriana Fallaci,

As a veteran activist of women's rights, for liberty and equality, as a first hand victim of political Islam, and a veteran fighter against it, as an atheist who is a staunch believer in a secular state and secular education system, as a woman who has fought against hejab in any form and shape, as a secularist who has defended the latest French secular law to ban bearing of any conspicuous religious symbols in public schools, as a campaigner for banning the veil for underage girls and banning religious schools, as a campaigner against honour killings, Sharia courts in Canada, against Islamism and Islamic terrorism, as a staunch defender of unconditional freedom of expression and criticism who defended the right of those who ridiculed Mohammad in the row over the caricatures, I share some of your beliefs and find some very offensive, and let me make it clear, not to Islam, but to human values, egalitarian and libertarian values which are also part of "European culture".

###

(...)

Your justified hatred against Islam and Islamism has been extended to all Moslems and everyone living under Islam. I am sure you do not need anyone to remind you that this is racism. I am bewildered when I read your comments against immigrants and immigration from countries under the rule of Islam, and find this in contrast with the justified pride you take in your history for fighting against Nazi-Fascism.

It seems to me that the hate against Islam has pushed you towards Christianity. You have even visited the Pope asking him to take a stronger stance against Islamism. This I find puzzling. How does an atheist in hate of one religion take refuge in another? Your hate against Islamism and political Islam finds expression in Euro centrism. Your disapproval for multiculturalism and cultural relativism has led you to defend "western culture", instead of universal rights and secular, humanitarian and libertarian values.

(...)

All these become so ironic when one looks deeply into the root of political Islam. When one remembers how the Western governments unleashed this monster on the people of the region, how they created the Mojahedin in Afghanistan in the cold war era, and then helped the Taliban, how in the fear of a leftist revolution in Iran dumped Khomeini on us and helped bring about an Islamic state, when one remembers these recent historical facts, one cannot help but discern a profound sense of hypocrisy and double standard. Sadly the saga of helping political Islam and Islamic terrorism by the Western governments is an ongoing effort. Just look at Iraq! The US and Britain, by invading Iraq, helped Islamists grow monstrously therein. Have you forgotten who the friend of Bin laden was? The tragedy is that as long as this monster was strangling the "native" people, our rage could stay under control, our passion not moved. Those people were not worthy of our passion and compassion!

The Western academia and journalists invented and nurtured the concept of cultural relativism, so that on its basis they could justify compulsory veiling, stoning, maiming and torturing of the people under the rule of Islam. That gave justification for turning one's head while one's government made deals with those Islamic states. This concept was invented so under the guise of "respect for other cultures" the brutal crimes and violation of human rights will be brushed aside "respectfully". We have witnessed how European courts have resorted to cultural relativism in defending deportation of immigrants fleeing the rule of Islam. They have gone as far as stating that the prison conditions in those countries are suitable for those people.

I must state that these arrogant, hypocritical and racist attitudes and policies are an important tool to foster political Islam. If one does not distinguish between the Islamic movement, a reactionary and brutal political movement, and ordinary Moslems who are the first hand victims of this, if one does not distinguish between the oppressor and the oppressed, one becomes an accessory to Islamic brutality.

(...)

I was enraged by reading your racist comments. I was indignant by sensing your Euro centrism, by your lack of human compassion for millions who fled the rule of Islam and took refuge in the West in the hope of a better life. I share your despise and indignation for the Islamic movement. But I denounce categorically the racism that is openly expressed by you. And last but not least I must state that I defend the unconditional freedom of expression, and condemn the court which is to try you for what you have expressed in your books. One must be free to express any opinions. This is the pillar of a free society

(Azar Majedi no blogue da ProChoix; ler na íntegra.)

Revista de blogues (11/7/2006)

  1. «Navarro-Valls criticou Zapatero» no Ponte Europa: «A anunciada ausência de Zapatero à missa papal, devoção que não pratica, foi o pretexto para as declarações hostis do porta-voz do Vaticano cuja ingerência na política interna de Espanha tem sido frequente. Bento XVI não fez apenas uma viagem apostólica, prestou-se a presidir a comícios do Partido Popular organizados em conjunto com o Opus Dei e outros grupos religiosos de extrema-direita tendo como pretexto do 5.º Encontro Mundial das Famílias, um acto de proselitismo inventado por um dos seus antecessores
  2. «Nacional-futebolismo» no Canhoto: «O discurso de Chirac simbolizou a fusão entre a nação e o jogo, a transformação do hino nacional em cântico de torcida de estádio e da bandeira nacional em estandarte de guerra desportiva. Foi muito além do apoio ao mérito de um colectivo excepcional de jogadores. Transformou a equipa numa questão nacional. A tendência não é monopólio francês. (...) Os políticos por vezes têm a palavra demasiado fácil. Mas a relação entre a pátria e o futebol está a reganhar uma intimidade excessiva.»
  3. «O Diamante Vermelho» no Renas e Veados: «o símbolo do Diamante Vermelho deveria ser adoptado universalmente por todas as organizações em todas as acções desta federação humanitária uma vez que a proliferação de símbolos pode comprometer a protecção de que gozam. Não só evita confusões no terreno dos conflitos evitando que os agentes da ajuda humanitária sejam confundidos com as forças beligerantes em caso de conflitos armados, como essa ajuda deixa de ser instrumentalizada para discórdias religiosas».

Madaíl apresenta a conta

Hoje de manhã, ouvi na rádio que o presidente da federação de colectividades do jogo da bola pediu ao governo que isentasse de IRS os prémios de presença que vai atribuir aos seus jogadores (uns modestíssimos 50 mil euros por cabeça). Portanto, o espertalhão Madaíl decidiu, muito patrioticamente, apresentar a conta do espectáculo que entreteu as massas durante o último mês. E quem a paga é o contribuinte.
Como se não bastasse, um senhor doutor em leis(*) acrescentou, em declarações à TSF registadas por estes meus ouvidos aperfeiçoados por milénios de selecção natural, que «os portugueses nunca ficariam tão satisfeitos se algum cientista português ganhasse um Prémio Nobel da Física ou da Química». Portanto, já sabeis: ide e dizei aos vossos filhos para deixarem de estudar e irem jogar à bola. É esse o caminho do futuro nesta nação de prestígio e competidores.
(*) Parece que se chama Diogo Leite de Campos. Para que conste.

segunda-feira, 10 de julho de 2006

Kenan Malik: «Bad bargain made in the mosque»

«(...)
The starting point in any discussion about terrorism and extremism seems to be that Muslims constitute a community with a distinct set of views and beliefs, and that, for them, real political authority must come from within their community. Mainstream politicians, so the argument goes, are incapable of engaging with them; only authentic Muslim leaders can. So there has to be a bargain: the Government acknowledges Muslim leaders as crucial partners in the task of rooting out terrorism and building a fairer society; in return Muslim leaders agree to keep their own house in order. The argument this week was really about who was, or was not, keeping their side of the bargain.
But the trouble is the bargain itself. Not only is it rooted in a picture of the Muslim community and its relationship with the wider British society that is false, but also the cosy relationship between the Government and Muslim leaders exacerbates the problem it was meant to solve.
###
(...)
The Government has long since abandoned its responsibility for engaging directly with Muslim communities. Instead it has effectively subcontracted its responsibilities to so-called community leaders. When the Prime Minister wants to find out what Muslims think about a particular issue he invites the Muslim Council of Britain to No 10. When the Home Secretary wants to get a message out to the Muslim community, he visits a mosque. Rather than appealing to Muslims as British citizens and attempting to draw them into the mainstream political process, politicians of all hues prefer to see them as people whose primarily loyalty is to their faith and who can be politically engaged only by other Muslims.

The consequences of this approach are hugely damaging. “Why should a British citizen who happens to be Muslim have to rely on clerics and other leaders of the religious community to communicate with the Prime Minister?”, asks Amartya Sen, the Nobel prize-winning economist, in his new book
Identity and Violence. Far from promoting integration, government policy encourages Muslims to see themselves as semi-detached Britons. After all, if the Prime Minister believes that he can engage with them only by appealing to their faith, rather than their wider political or national affiliations, who are Muslims to disagree? If politicians abdicate their responsibility for engaging with ordinary Muslims, is it surprising that those Muslims should feel disenchanted with the political process? Or that disenchantment should take a radical religious form?
The policy of subcontracting political responsibility allows politicians to wash their hands of the alienation of sections of the Muslim community. And it allows self-appointed community leaders with no democratic mandate to gain power both within Muslim communities and the wider society. But it does the rest of us — Muslim and non-Muslim — no favours. It is time that politicians dropped the pretence that there is a single Muslim community and started taking seriously the issue of political engagement with their constituents, whatever their religious faith
(Kenan Malik no The Times; ler na íntegra.)

sexta-feira, 7 de julho de 2006

Um ano depois das bombas de Londres, a Al-Qaeda assume a autoria dos atentados

Foi ontem divulgado um vídeo em que aparece Shehzad Tanweer (o bombista originário de Leeds) ameaçando que «o que acabaram de testemunhar» (o ataque em que ele morreu) «foi o primeiro de uma série de ataques». Pede a retirada das tropas no Afeganistão e no Iraque como condição para o fim das acções terroristas. No mesmo vídeo, Al-Zawahiri afirma que Sidique Khan e Shehzad Tanweer foram treinados no uso de explosivos em campos da Al-Qaeda. A viagem de ambos ao Paquistão, sete meses antes dos ataques, sempre foi causa para especulações.
Entretanto, uma sondagem mostra que 81% dos muçulmanos britânicos se vêem primeiramente como muçulmanos, enquanto apenas 7% se vêem primeiro como britânicos. Na França, as percentagens correspondentes são 46% e 42%.

Gilles Kepel: «Fin du Londonistan, fin du communautarisme?»

«(...)
Au fur et à mesure que les héros en ligne du djihad accomplissaient leurs attentats aux quatre coins de la planète, à partir du 11-Septembre, les idéologues du Londonistan, à aboyer sans mordre, perdirent leur valeur et leur influence dans les franges les plus radicales qui n'avaient cure de leur bien-être londonien. Les mesures juridiques qui les frappent aujourd'hui ont surtout, en ce sens, un effet symbolique a posteriori.
En revanche, la question reste entière du soubassement intellectuel qui a permis le Londonistan, à savoir un multiculturalisme, où ce qui différencie les communautés ­ religieuses, ethniques, etc. ­ proclamées comme telles à l'intérieur d'une société donnée, est considéré comme essentiel, alors que ce qui unit les individus, par-delà la race ou la foi, comme citoyens d'une même société, est tenu pour secondaire.
###
Toute société est différenciée, notamment, par les conflits incessants entre des groupes sociaux qui la meuvent. Il n'existe de société sans conflit que dans les utopies totalitaires. Mais la spécificité du multiculturalisme est de considérer que les individus sont déterminés par une essence culturelle immuable, propre à chaque communauté, et que l'ordre politique, voire juridique, doit les prendre en compte d'abord à travers le prisme communautaire qui leur est assigné.
Les tenants de cette théorie se trouvent aussi bien chez les partisans avoués ou non de l'apartheid que chez les libéraux ou les libertaires. Au Royaume-Uni, le multiculturalisme a fait l'objet d'un consensus implicite entre l'aristocratie sociale issue des public schools se retrouvant dans les clubs fermés, et la gauche travailliste : le développement séparé des musulmans permettait aux uns de gérer au moindre coût la main-d'oeuvre ouvrière pakistanaise immigrée, aux autres d'en capter les suffrages à travers les leaders religieux au moment des élections.
C'est ce consensus que les attentats de juillet ont fait voler en éclats. Car le multiculturalisme n'a de sens que s'il aboutit à une forme de paix sociale, où les dirigeants communautaires contrôlent leurs ouailles à qui ils inculquent des valeurs religieuses ou morales particulières, mais qui aboutissent à la soumission à l'ordre public global. En ce sens, le traumatisme de la société britannique est plus profond que celui de la société américaine après le 11-Septembre. Aux Etats-Unis, les dix-neuf pirates de l'air étaient des étrangers. Au Royaume-Uni, les huit personnes impliquées dans les attentats sont des enfants de la société multiculturelle.
(...)»
(Gilles Kepel em Agosto de 2005; ler na íntegra no Observatoire du Communautarisme.)

quinta-feira, 6 de julho de 2006

Eurodeputado polaco elogia Salazar e Franco

A brava rapaziada católica da Liga das Famílias Polacas tem um representante no Parlamento Europeu (embora não inscrito em grupo parlamentar algum). Durante um debate sobre os 70 anos da Guerra de Espanha, o clericalíssimo eurodeputado polaco Maciej Giertych falou com sinceridade ao «povo europeu»:

Felizmente, o Presidente do principal órgão consultivo europeu contrapôs:

Não será fácil unificar esta Europa, onde as visões de acontecimentos históricos recentes são tão divergentes, até mesmo antagónicas. Note-se que o partido deste eurodeputado fascista está no Governo polaco.

(Nota adicional: curiosamente, só encontro no Google jornais brasileiros a reportarem este incidente. Será que os jornalistas portugueses não vêem interesse em noticiar elogios a Salazar em pleno Parlamento Europeu?)

quarta-feira, 5 de julho de 2006

Salva-nos, Zidane!

Zidane Todo Poderoso que estás na Alemanha
Salva-nos da opressão da futebolite aguda
Das notícias sobre futebol na TV, na rádio, nos jornais, nas revistas cor-de-rosa e nos blogues
Do bloqueio informativo que nos impede de saber o que se passa no mundo
Dos noticiários de 90 minutos em que 85 são sobre a equipa da FPF
Das reportagens sobre a equipa da FPF
E sobre os balneários da equipa da FPF
E sobre as bonecas que lá estão
E sobre os treinos que fazem
E sobre a papa que comem
E sobre os entreténs que têm
E sobre as coisas que dizem (e que não interessam nada)
E sobre as nódoas negras que têm (e que não são assim tão negras)
E sobre as bandeiras nas janelas
E sobre os adeptos no aeroporto
E sobre os adeptos nos autocarros
E sobre os adeptos nos estádios
E sobre os adeptos nos cafés
E sobre os adeptos nas praças
E sobre os adeptos em casa
E sobre os adeptos no Porto
E sobre os adeptos em Lisboa
E sobre os adeptos no Funchal
E sobre os adeptos em Paris
E sobre os adeptos lá no raio que os parta
E salva-nos dos políticos que aproveitam para aparecer
E dos debates sobre a teoria da bola e os humores dos árbitros
E dos debates sobre o árbitro bom e o árbitro mau
E sobre os jogadores que foram
E sobre os jogadores que não foram
E sobre a bola que entrou
E sobre a bola que não entrou
E sobre o que foi
E sobre o que não foi
Salva-nos, Zidane!

Salman Rushdie: «I'm a hard-line atheist»

«(...)
BILL MOYERS: But the believers say, well, that it's sacrilegious what you're doing, and it's against God.
SALMAN RUSHDIE: Yes. Well, unfortunately that's something that they may have to deal with. It seems to me that when there is conflict between the liberty of speech and the beliefs of private individuals the liberty of speech must always take precedence. Because otherwise every other liberty, including freedom of religious observance, is put into question. It's no accident I think that freedom of religious observance and freedom of speech are jointly protected by the First Amendment, you know. It's as important to have one as to have the other. And indeed in my view you can't have one without the other.
(...)
BILL MOYERS: But wait a minute--are you looking to define what you call a spiritual life only as a writer, or are you ever seduced, tempted--
SALMAN RUSHDIE: No, no, no.
BILL MOYERS: --into thinking that for yourself?
SALMAN RUSHDIE: No, no. Oh, no.
SALMAN RUSHDIE: I'm a hard-line atheist I have to say.

###
(...)
BILL MOYERS: How do you think the fundamentalists see an atheist? How do you think you are seen in their eyes?
SALMAN RUSHDIE: As somebody entirely without a moral sense. You know, I mean, that's to say, it is, in a way, one of the weaknesses of religious argument. That they argue that you cannot have a moral life unless you accept the moral code, which is defended by an ultimate arbiter. You know, of whatever god it might be. Or godhead it might be, in the case of polytheisms. My view has been, quite simply, that religion has been one of the ways in which human beings, throughout history, have tried to codify and organize their moral sense of the world. But that's to say, I would argue, that our sense of good and evil, our sense of right and wrong, our moral sense precedes religion. It's not created by it. It is, in fact, what creates our need for religion. So if we can accept that, as human beings, there's something intrinsic in us, which wishes to have an understanding of right and wrong, you know, and that religion is an expression of that, then of course, you can find other expressions of that, which are not formal religions. You know, and I think the history of the last couple hundred years will show there's been much philosophy, much thinking, precisely about this. How do you base a moral view of the world on a non-religious platform?
(...)
BILL MOYERS: What is morality?
SALMAN RUSHDIE: Well, it's as I see it, I think, something intrinsic in us, which wishes to distinguish between right and wrong. And I think we are hard-wired to it. You know, in the way that scientists now believe that language is an instinct. That we're hard-wired to develop it. You know. And I think that morality is somewhere in there in the DNA. That we are created, born as creatures who wish to know is it okay to do this or not okay to do this, you know. And we ask ourselves that question all the time. And religion is one of the answers.
But it's in my view only one of the ways. It's a lot of the answers. But it's perfectly possible for me to say that we can as civilized people create moral codes to live by. We do not need that ultimate arbiter. And one answer to the question is democracy. And it seems to me that what happens in a democracy is that we don't have an absolute view of what is right and wrong. We have an argument about it, you know. And the argument never ends.
(...)»
(Salman Rushdie em entrevista; ler na íntegra.)

terça-feira, 4 de julho de 2006

A equipa da FPF não representa Portugal

É recorrente a ideia, totalmente disparatada, de que a equipa da federação de colectividades dirigida por Gilberto Madaíl «representa Portugal». Recordo por isso aos mais distraídos que a Federação Portuguesa de Futebol não é uma instituição pública e muito menos um departamento do Estado. Conforme os seus estatutos reconhecem com meridiana clareza no seu Artigo 1º,
Portanto, a FPF «representa» tanto a República portuguesa como a Federação Portuguesa de Colectividades de Cultura e Recreio, a Aliança Evangélica Portuguesa, a Federação dos Sindicatos do Sector da Pesca ou qualquer outra organização privada tendencialmente monopolista na área de actividade dos seus associados.
Acrescente-se que a FPF conta entre os seus principais dirigentes personagens a quem nenhum português de bom senso compraria um carro em segunda mão, que foi frequentemente dirigida por personalidades da direita pouco ou nada democrática, e que o papel que os clubes de futebol desempenham na promoção de alguns dos piores autarcas é sobejamente conhecido.
E se mais razões não houvesse, não quero ser representado por uma estrutura que tem o seguinte artigo 55º nos seus estatutos:

segunda-feira, 3 de julho de 2006

Polly Toynbee: «This is your last chance to offend the holy zealots»

«(...)
Have you noticed how few are now ready to offend the religions and defend free speech? The government only just failed to pass the "incitement to religious hatred" bill because Blair himself accidentally failed to turn up to vote. The way some imams outrageously misused the Muhammad cartoons to stir global riots has been highly effective in paralysing mockery or even criticism of Islam. Well-meaning guidelines on hate crime, issued by the Association of Chief Police Officers, are being bizarrely interpreted by some to suggest that anyone can go to the police to say they feel offended about just about anything.
Of course an elderly couple of evangelicals shouldn't have had the police summoned by the council for expressing homophobic views. Of course Sir Iqbal Sacranie should be allowed to say homosexuality is harmful without getting a call from police under the Public Order Act: thanks to Blunkett, if a public-order breach is "religiously aggravated" it can get a seven-year sentence. Not satisfied with blasphemy laws, the Vatican wants a new offence of Christianophobia. Sikhs want the right to ban the play Behzti, militant Hindus want naked pictures of a goddess banned. At a free-speech rally recently, an Iranian dissident was charged for holding a placard with one of the Danish cartoons.
Now the Council of Europe proposes to appease religions with a "code of conduct" or even a law to protect believers' sensitivities. Only the National Secular Society doesn't blench; other rights groups have been muted. Threats against anyone are banned in every civilised country, but protection against being offended should never trump free speech.
(...)»
(Polly Toynbee no The Guardian; ler na íntegra.)

domingo, 2 de julho de 2006

O LGBTismo e eu

No debate aqui anunciado, constatei que existem, entre as organizações LGBT´s, duas posturas quanto ao casamento entre pessoas do mesmo sexo.

Há uma postura de reivindicar a igualdade de direitos, que pede que a conjugalidade guei ou lésbica seja reconhecida pelo Estado sem discriminações. É uma reivindicação algo simbólica (até porque a maior parte dos activistas LGBT não parecem muito interessados em casar-se), mas que não deixa por isso de ser legítima e justa. No entanto, penso que se exagera o efeito indirecto que o casamento entre pessoas do mesmo sexo poderia ter no combate à homofobia (que é, nitidamente, o problema que mais preocupa os LGBT´s: a discriminação no emprego, os insultos na rua, etc).

Há outra postura, talvez mais realista, que não se preocupa tanto com a igualdade formal mas sim com a aquisição dos direitos concretos associados ao casamento. Pragmaticamente, prefere-se aprofundar a lei das uniões de facto. Existe o risco, nesta abordagem, de poder terminar num «casamento de segunda categoria» ou, ainda pior, num estatuto exclusivo de pessoas do mesmo sexo.

Finalmente, o que eu disse foi muito pouco, e resumia-se a isto: nem as igrejas podem impedir o Estado de celebrar contratos entre quem entender, nem o Estado pode impedir as igrejas de conferir (ou recusar) sacramentos matrimoniais a quem entenderem.

Entre referendos

Na caixa de comentários do meu artigo sobre o (não) referendo europeu (sou dos poucos que ainda se preocupa com ninharias dessas...), apareceu uma interrogação sobre se o país que votará (novamente) em 2007 a inevitável questão da despenalização da IVG será muito diferente do país de 1998.

Não há nada melhor do que olhar para os números.

Então vejamos. Em percentagem, os casamentos civis passaram de 33% do total em 1998 para 43% em 2004 (último ano para o qual há dados disponíveis). No mesmo período, os nascimentos fora do casamento passaram de 20% do total para 29%, enquanto o número de divórcios por cada cem casamentos passou de 23 para 47. Todos estes sinais me parecem indicar um processo de secularização da sociedade portuguesa acentuado (ou seja, os comportamentos sociais são cada vez menos os recomendados pela religião dominante). Se isto terá alguma tradução ao nível da votação sobre a despenalização da IVG, já é outra questão. Mas é um facto que Portugal é cada vez menos conservador...