sexta-feira, 29 de junho de 2012

Últimas sobre os submarinos de Portas

Fisco perdoa luvas dos submarinos

Pedro Nuno Santos

Já neste blogue se escreveu sobre Pedro Nuno Santos. A última entrevista que prestou ao jornal i mostra que tenta travar as batalhas que, a meu ver, merecem ser travadas.

Creio que merecem particular destaque as seguintes declarações:

«Tinha a expectativa que o PS fosse mais afirmativo?

O que eu achava era que nalguns momentos – na discussão do Orçamento do Estado, do Código do Trabalho e do Pacto Orçamental – podíamos ter tido uma posição diferente. E a partir do momento em que não estava a conseguir influenciar algumas dessas posições entendi não continuar na direcção do grupo parlamentar.[...]

Os militantes do partido compreendem as sucessivas abstenções do PS em temas como o Orçamento ou o Código do Trabalho?

Admito que há uma parte considerável da militância do partido que acha que o PS devia ser mais interventivo na forma como faz oposição. E eu próprio. [Infelizmente o discurso que se segue aqui pretende justificar as abstenções em causa][...]

Uma posição mais dura com a troika é uma das ideias que une a esquerda num congresso que vai realizar-se a 5 de Outubro. O actual momento cria condições para uma aliança entre o PS e os partidos à sua esquerda?

Primeiro, estamos longe disso. Nem acho que neste momento faça sentido falar de coligação entre os partidos de esquerda, porque há muito trabalho para fazer antes. Portugal é praticamente o único país da Europa em que a esquerda não consegue trabalhar em conjunto.

O PS quando precisou de se aliar procurou sempre o PSD ou o CDS...

quinta-feira, 28 de junho de 2012

Acabou a alienação, voltemos às telenovelas

Acabou a participação de Portugal no europeu, que alívio! Os portugueses vão poder a voltar concentrar-se no que interessa, nas telenovelas e nos romances que envolvem dirigentes desportivos (confiram as grelhas dos principais canais em horário nobre). Vão poder voltar às estimulantes aventuras de personagens de novela que não trabalham, que passam a vida em casas e lugares sofisticados e cuja única atividade a que se dedicam é a cochichar sobre a vida alheia. Para os que não gostam há sempre alternativas, as aventuras sexuais de Pinto de Costa, conspirações de árbitros e belas reportagens sobre o treino do dia de um dos três grandes. Aleluia, estava a ver que não!  

As três asneiras de Michael Seufert

Michael Seufert tem uma proposta arrojada. Quando a defende, tomamos conhecimento dos vários pressupostos nos quais se baseia para considerá-la pertinente. Tratam-se de verdadeiros «mitos urbanos»: afirmações que muitos tomam como verdadeiras pela quantidade de vezes que já as ouviram repetidas, mas que são contrariadas pelos factos. Quis portanto aproveitar as declarações deste deputado do CDS, no contexto da notícia sobre a sua proposta, para desmistificar estas mentiras:

Primeira asneira
«Para jovens com menos de 30 anos ou para quem procura o primeiro emprego, os contratos deviam ser "mais flexíveis"». Deviam?
Será que elevado desemprego jovem é devido ao facto do mercado laboral em Portugal ser particularmente rígido, em particular o mercado associado à mão de obra jovem? O que acontece é que o contrário é verdade: «Portugal tem um dos mercados de emprego mais flexíveis da UE», flexibilidade essa que está concentrada nos segmentos associados à população mais jovem.

Segunda asneira
«Palavra de quem faz do empreendedorismo – um dos pilares do programa – um dos temas de trabalho preferidos na Assembleia da República.» É o que faz falta em Portugal - mais empreendedorismo, certo?
Só que não. Trata-se de propaganda importada da direita norte-americana, com pouca aplicação à realidade nacional. Nenhum indicador mostra que existe falta de empreendedorismo em Portugal, mas existem vários indicadores que dão indícios em sentido contrário, desde a estrutura empresarial portuguesa demasiado fragmentada, até valores de auto-emprego que são mais do triplo dos norte-americanos e muito superiores aos da generalidade dos países desenvolvidos.

Terceira asneira
«"mas também é verdade que a licenciatura, o mestrado e o doutoramento não são um passaporte para o emprego"». Ninguém acredita que sejam. Mas será que a formação superior, ao contrário do que a frase anterior sugere, ajuda a encontrar emprego? E melhor pago? Ou será Portugal, como muitos dizem, um «país de doutores»?
Quando comparado com os países mais desenvolvidos, Portugal não tem licenciados a mais - tem licenciados a menos. A taxa de desemprego entre licenciados é significativamente menor que entre não-licenciados. Em Portugal, um licenciado ganha, em média, muito mais que um não licenciado, e o investimento em educação superior é dos mais rentáveis que um indivíduo pode fazer.

Bónus: a asneira irónica
A justificação que Michael Seufert dá para o facto da sua proposta poder comprometer a sustentabilidade da Segurança Social: «A ideia de ficar fora do sistema social não é coisa que o assuste: "É provável que a reforma que vou ter quando chegar aos 60 ou 65 anos, se é que vou ter, seja insignificante."».
É provável pois: se deixarmos políticos como Michael Seufert destruírem o sistema de Segurança Social, é razoável esperar que ele não exista daqui a umas décadas. E mais não digo.

O debate sobre a circuncisão na Europa

A circuncisão é praticada por pessoas de duas comunidades religiosas originárias do Médio Oriente. Por ser dogma dessas duas religiões, aceita-se na Europa que cortar parte da pele do pénis das crianças do sexo masculino, sem razões médicas, não seja crime. Nunca compreendi porquê: a paternidade (ou a maternidade) não podem, em qualquer sociedade civilizada, dar o direito aos pais de cortar partes dos corpos dos filhos. E se se trata de um dogma religioso tão importante, que esperem que as crianças tenham idade para dar o seu consentimento informado (lá para os dezasseis anos, por exemplo).

Felizmente, o assunto começa a ser debatido. Na Alemanha, um Tribunal de Colónia deliberou que o direito de uma criança à sua integridade física era mais importante do que os direitos dos pais. Na Noruega, discute-se a proibição pura e simples, e na Holanda há um apelo nesse sentido de uma associação médica.

Evidentemente, não vão tardar os gritos de «islamofobia» e «anti-semitismo» daqueles que acham que a «religião» e a «cultura» têm direitos sobre os corpos de crianças que nem idade têm para compreender o que lhes estão a fazer.

[Esquerda Republicana/Diário Ateísta]

quarta-feira, 27 de junho de 2012

É a economia livre, estúpido!

Mais uma vez foi muito interessante o Prós e Contras da passada segunda feira, subordinado ao tema “A nação posta à prova”, após um ano de governo de direita. No centro do debate esteve a política de austeridade, como não podia deixar de ser. Boa prestação tiveram os opositores desta política: não eram "políticos", mas académicos, e não tinham um discurso formatado. Foram capazes de jogar ao ataque, coisa muito rara na esquerda, e marcaram muitos pontos. Particularmente bem esteve António Hespanha, ao questionar que benefícios trouxeram até hoje as privatizações e as parcerias público-privadas. Do lado dos apoiantes da austeridade, o André Azevedo Alves foi a surpresa mais agradável do debate. Estou à vontade para o reconhecer pois foi das pessoas com quem mais polémicas tive na blogosfera. Ao contrário do que é (ou pelo menos era) costume no seu blogue, a alternativa liberal não foi apresentada como o "único caminho". Embora o André tenha frisado que alternativas como o não pagamento da dívida e a ruptura simples com a troika implicavam, para serem sustentáveis, a curto prazo défice zero. O André não abordou todas as possibilidades de renegociação da dívida, mas pelo menos neste ponto comportou-se como um académico e não como um propagandista. Bem ao contrário da sua companheira de bancada, Maria do Carmo Marques Pinto, para quem estava "fora de questão" o país não pagar a dívida nem cumprir os seus compromissos, sem sequer questionar quais desses compromissos eram efetivamente culpa do país e do povo. Quem tem mais dinheiro, como a Alemanha, deve poder fazer o que quiser com ele e, como tal, ditar as regras, no seu papel de mais forte; aos mais fracos, só resta cumprir. "Ouça, isto é uma economia livre!", argumentava a senhora, para defender a lei dos "mercados". Conceito curioso de liberdade, este.

Mais uma iniciativa para unir a Esquerda

O Congresso Democrático das Alternativas realiza-se no dia 5 de Outubro, e pretende unir todos aqueles que estão contra o extremismo das políticas que são agora impostas, com o objectivo de transferir riqueza dos menos para os mais poderosos.
Pelo Arrastão tive oportunidade de conhecer o texto da convocatória:

terça-feira, 26 de junho de 2012

Vergonha para o PS

Ricardo Rodrigues foi considerado culpado dos crimes de atentado à liberdade de imprensa e atentado à liberdade de informação (o célebre caso do «roubo dos gravadores»). E todavia, o PS mantém-no como vice-presidente da bancada parlamentar. Vergonha. 

PPPs, o que devia ser feito, e a realidade

No Correio da Manhã, Paulo Morais escreve com muito acerto a respeito daquilo que deveria ser feito quanto às rendas excessivas das PPPs (destaques meus):

«Parcerias? Extinção!

Os contratos de parceria público-privada constituem acordos calamitosos. Neste modelo de negócio, os riscos correm sempre por conta do Estado, mas os lucros estão inevitavelmente garantidos aos privados.

Quando a troika chegou a Portugal, há já mais de um ano, exigiu a sua renegociação, e, ao tomar posse, Passos Coelho prometeu a redução drástica das rendas a pagar aos concessionários. Volvido um ano, parece que afinal o governo já desistiu desta redução. Em legislação recente, de 23 de Maio, que regulamenta esta matéria, Vítor Gaspar garante aos privados que "da aplicação do presente diploma não podem resultar alterações aos contratos de parcerias já celebrados, ou derrogações das regras neles estabelecidas, nem modificações a procedimentos de parceria lançados até à data da sua entrada em vigor." Com esta legislação, o governo coloca-se numa posição frágil e à mercê duma improvável generosidade dos concessionários. Já não vai haver renegociações.
De forma sintomática, o primeiro--ministro veio ao Parlamento prometer uma redução de trinta por cento em rendas que orçam em 40 mil milhões de euros, o que significaria uma poupança de 12 mil milhões. Mas, no mesmo discurso, admitiu que a diminuição será apenas de 4 mil milhões, uns míseros 10%. De novo, os "parceiros" foram poupados…
Já que esgotou a possibilidade da renegociação, o governo deverá agora extinguir as parcerias. Deve proceder à expropriação por utilidade pública dos equipamentos ou até, em alternativa, modificar o modelo de contrato.
A determinação do valor de expropriação obtém-se através duma avaliação independente do valor das infra-estruturas. As rendas pagas aos financiadores da nova operação serão certamente da ordem de metade das que hoje são pagas aos concessionários.
Outra opção, a alteração do modelo de contratação, consistiria em converter as concessões em contratos de exploração. Sem quaisquer garantias para os privados, estes deverão partilhar as receitas, de forma justa, a troco do alargamento do período de concessão. Desta forma, o Estado ainda teria lucro.
Há pois alternativas incontestáveis que defendem o interesse público. Só falta agora que a negociação em nome do Estado seja competente e séria.»

Tomar tal acção pressuporia que os responsáveis políticos estão dispostos a usar estas e outras ferramentas políticas e jurídicas («contrato leonino») para defender o interesse público. Devo notar que para que o Estado saia beneficiado elas nem precisam de ser utilizadas: a própria disposição de a elas recorrer, se genuína, corresponde a uma ameaça credível que pode ser usada para que as coisas sejam resolvidas por simples renegociação, com o acordo de ambas as partes.

Isso não acontece porque existe uma enorme promiscuidade entre o poder político e os interesses privados - afinal, foi essa a razão pela qual muitos destes contractos perniciosos foram realizados em primeiro lugar. A este respeito o PS teve uma enorme culpa, mas existem fortes indícios de que o PSD e o PP conseguem fazer muito pior.
A promiscuidade entre o poder político e os interesses privados tem sido excessiva, e hoje mesmo surgiu mais uma notícia a este respeito no jornal i, da qual cito:

«O escritório de advogados CSM Rui Pena & Arnaut – de que é sócio José Luís Arnaut – tem como cliente a Rede Eléctrica Nacional (REN), ou seja, a mesma empresa onde o ex-secretário-geral do PSD ocupará o cargo de membro não executivo do conselho de administração. Contactado pelo i, José Luís Arnaut não quis fazer qualquer comentário sobre esta situação.

Além da ligação que existe entre a sociedade de advogados de Arnaut e a REN, há ainda um outro factor que deixa dúvidas à deputada Catarina Martins, do Bloco de Esquerda: a influência que o mesmo escritório tem na legislação estruturante do sector energético.

A situação foi admitida pelo próprio sócio principal, Rui Pena, numa newsletter daquela sociedade: “Temos tido, desde os anos 90 do século passado, uma intervenção privilegiada na construção do edifício legislativo do sector energético.”»

Uma vergonha.

A aliança islamo-trotsquista

No 5 Dias, o Renato Teixeira não falha no seu inquebrantável apoio ao islamofascismo. Note-se que Mohamed Morsi, eleito presidente do Egipto, era o candidato da Irmandade Muçulmana (lema: «Deus é o nosso objectivo, o Corão a nossa Constituição, o Profeta o nosso líder, a jihad o nosso caminho, e morrer por Deus a mais elevada das nossas aspirações»). Morsi defende que os cristãos devem «converter-se ao Islão, emigrar ou pagar o imposto [preconizado pela chária]».

segunda-feira, 25 de junho de 2012

Revista de blogues (25/6/2012)


  • «(...) Defendi, quando se discutia a reformulação da Alta Autoridade para a Comunicação Social, que a entidade reguladora fosse composta por dois representante eleitos pelos jornalistas, um representante das empresas de comunicação social, um eleito por dois terços do Parlamento e um nomeado pelo Presidente da República. Uma maioria de representantes dos regulados (com maior peso dos profissionais), um nome aceite por uma maioria qualificada do Parlamento e uma figura escolhida pelo Chefe de Estado. Considerava que uma composição deste género, tendo vários defeitos, teria, pelo menos, o mínimo de credibilidade junto de quem deve acatar as suas decisões. Como era de esperar, os dois principais partidos não quiseram deixar passar a oportunidade de determinar quem controlaria os jornalistas. E transformaram a ERC num miniparlamento, onde tratam das suas pequenas guerras. Assim foi no tempo de Sócrates, assim é no tempo de Passos. Nem as pessoas que lá se sentam, mesmo quando são jornalistas, merecem o respeito dos profissionais que pretendem regular, nem as suas deliberações têm qualquer credibilidade no conjunto da sociedade. Defendi então que a tentativa de instrumentalizar a ERC seria inútil: um órgão regulador que não é levado a sério não regula ninguém. Assim tem sido. 

domingo, 24 de junho de 2012

Deriva de direita em caras

Há algum tempo atrás mostrei um conjunto de imagens que ilustravam a deriva de direita que tem ocorrido em Portugal no que diz respeito aos programas dos partidos políticos com assento parlamentar (Deriva de direita em imagens, Deriva de direita em imagens - parte II, e o texto mais recente, tendo em conta sugestões e melhoramentos: Deriva de direita em imagens - parte III). No contexto dessas imagens, o Miguel Carvalho sugeriu que fizesse uma imagem análoga relativa a políticos conhecidos, ao invés de partidos.

Como a ideia me pareceu bastante interessante, meti mãos à obra. Escolhi apenas pessoas que já estavam envolvidas no mundo político em 1977 (o que exclui grande parte dos membros do actual Governo, incluindo o próprio primeiro-ministro), e que ainda estão vivas. Na verdade, a deriva seria mais acentuada se não fossem estas exclusões (e talvez nenhuma das categorias estivesse vazia...).

Sem mais demoras, aqui fica a imagem:


As diferenças nos tamanhos das figuras são meramente acidentais. As pessoas representadas são, para a primeira linha da esquerda para a direita, as seguintes: Durão Barroso, Francisco Louçã, Garcia Pereira, Carlos Carvalhas, Zita Seabra, Manuel Alegre, Jorge Sampaio, Victor Constâncio, Paulo Portas, Pacheco Pereira, Marcelo Rebelo de Sousa, Helena Roseta, e Basílio Horta.

sábado, 23 de junho de 2012

sexta-feira, 22 de junho de 2012

Ciganos nossos

Um interessante documentário da Mundi Romani sobre a realidade das comunidades ciganas do distrito de Coimbra. Ainda há muita coisa a melhorar e muitos problemas a resolver, mas neste documentário é evidente que há um antes e um depois da intervenção das redes de apoio social, contrariando em larga medida o habitual paleio de café sobre os ciganos. Participa no documentário o amigo Bruno Gonçalves, um mediador social que tem feito um excelente trabalho no distrito.


A Troika, o Coelho e os sapos engolidos II

Os 4 maiores países da Zona Euro anunciaram há minutos um plano de 130 mil milhões de euros para estimular o crescimento e a criação de emprego.
Espera-se a qualquer momento uma forte reacção crítica de Passos Coelho que certamente, dado a sua coerência intelectual, manterá a sua posição de sempre: é um erro crasso gastar dinheiro na economia, contraindo para isso dívida. Vítor Gaspar acrescentará que Portugal realizará todos os esforços possíveis para vetar este plano, por ele ser inerentemente errado.
Ou será que vão engolir mais este sapo?

Duarte Lima andou de submarino

O famoso negócio dos submarinos de Paulo Portas tem um novo protagonista: Duarte Lima, que terá recebido um milhão de euros do contra-almirante Rogério d´Oliveira. Como já passaram dez anos, imagino que prescreva antes de chegar a tribunal...

Aparentes percalços na política que serve os poderosos

«Gaspar abre porta a derrapagem do défice este ano»

quinta-feira, 21 de junho de 2012

A grande lição do Euro 2004

Os produtos internos brutos da Polónia e da Ucrânia, somados, são mais de quatro vezes superiores ao PIB português. E no entanto, em 2004 Portugal organizou, sozinho por estúpido orgulho nacionalista, o torneio bianual(*) de futebol da UEFA. Ainda hoje os elefantes brancos de 2004 desequilibram as contas de autarquias. Isso sim, foi vivermos «acima das nossas possibilidades». Convém não esquecê-lo nos próximos dias.

(*) Correcção: o torneio que agora está a decorrer realiza-se de quatro em quatro anos.

A ERC a tentar branquear a escumalha das secretas

Nos pontos 170 e 171 do relatório da ERC há uma total falha de lógica: afirma-se que porque o facto da vida privada da jornalista «poderia ser» (sic) «do conhecimento do seu círculo pessoal de familiares, amigos, vizinhos, conhecidos», então «[torna-se] infundada a suspeita de ter sido facultado pelos serviços de informação».

Bom. Em primeiro lugar, uma suposição («poderia ser»...) não autoriza uma conclusão. Em segundo lugar, mesmo que não se trate de um «poderia ser» mas que seja efectivamente, nada permite concluir que o dado da vida privada não tenha vindo do arquivo do ex-director do SIED, ou do arquivo actual do SIS ou do SIED sobre a vida pessoal dos jornalistas. Vou frisar o óbvio: se não fosse conhecido de ninguém, então é que o SIS ou o SIED não poderiam mesmo saber. Só sendo conhecido de alguém pode ter chegado às fichas do SIS/SIED...

1 ano de (des)governação

O XIX Governo Constitucional de Portugal faz hoje um anoEis o meu balanço:

O ambíguo:

A ministra Paula Teixeira Cruz tem cometido várias asneiras, mas também tem tomado algumas medidas acertadas. Destaco a alteração dos prazos de prescrição dos processos judiciais (passam a ser suspensos após a primeira sentença condenatória), e o reforço dos quadros de pessoal para realizar investigação. Tudo isto está claramente muito aquém das necessidades do país em matéria de Justiça, cuja lentidão é um dos maiores entraves ao nosso desenvolvimento.
O Ministro Paulo Macedo tem sido responsável por cortes verdadeiramente criminosos na área da saúde, mas significativas poupanças têm sido conseguidas à custa da indústria farmacêutica e outros prestadores privados


O péssimo:

Podemos começar pelos ministros Miguel Macedo e Miguel Relvas, que simbolizam o desrespeito que este Governo tem pelos direitos civis dos Portugueses. Enquanto um é responsável pela detenção de elementos de um grupo que se limitava a distribuir panfletos («Duas pessoas são uma manifestação»), pela infiltração de polícias com atitudes violentas e provocadoras numa manifestação (que se saiba), e pelo manietar da Comissão Nacional de Protecção de Dados, entre outras situações de igual gravidade, o outro parece dedicar o seu tempo a censurar programas e ameaçar jornalistas
O fim do feriado do 5 de Outubro, decretado por este Governo, tem realmente um lado simbólico: este é um Governo inimigo da Liberdade.

No domínio da Educação e da Ciência a palavra de ordem é destruição. Quando Portugal finalmente começou a criar uma indústria moderna assente na inovação (muito do aumento das exportações se deve à feliz aposta na Ciência e na inovação), os cortes da ordem dos 40% para a Fundação para a Ciência e Tecnologia, o agravamento da situação de sub-financiamento das Universidades e Laboratórios, o controlo burocrático kafkiano que gera desperdícios e ineficácia, garantem a destruição de um sistema científico com qualidade que estava a dar um contributo essencial para o desenvolvimento do país.
Enquanto isso, Nuno Crato prefere - contra o que estava estipulado no memorando com a Troika - pagar mais às escolas privadas.

No que diz respeito às Finanças, a prática corrente tem sido a delapidação do erário público para favorecer os poderosos a todo o custo. Nunca deixa de me surpreender que se fale em austeridade quando o Governo se dá ao luxo de não negociar qualquer contrapartida pelo fim das Golden Shares. O Estado português deve ter dinheiro para deitar ao rio. Ou quando o Governo opta por favorecer em 30 milhões a AEP, certamente não fazem falta. Quando se realizam as privatizações de forma obscura e duvidosa ou mesmo ilegal, ninguém no Ministério das Finanças se parece importar com o que isso custa aos cofres do Estado. Há dinheiro para contratações desnecessárias, e até para não exigir as contrapartidas devidas a quem quer extrair petróleo no Algarve. E a generosidade destes «mãos-largas» não acaba por aqui: mesmo no que diz respeito à renegociação das PPPs, as instruções parecem vir no sentido de deixar continuar o saque
No domínio da Economia, tudo se tem feito para destruir os direitos dos trabalhadores, o que tem contribuído para alcançar níveis de desemprego sem precedentes

Por fim, não posso deixar de mencionar toda a hipocrisia e traição ao processo democrático que estas políticas têm representado. Antes das eleições Pedro Passos Coelho fez uma campanha contra os sacrifícios que José Sócrates impunha ao país, alegando que eram excessivos. As mentiras que levaram esta pessoa ao poder merecem ser denunciadas, e é por isso que não posso deixar de voltar a divulgar um vídeo que várias vezes tenho colocado neste blogue, pela enorme importância que tem:



Fazendo o balanço da governação até hoje, é verdade que o Pedro Passos Coelho não foi capaz de aproveitar o «estado de choque» do país para assumir a vontade explícita de desmantelar o SNS e o Sistema de Educativo, substituindo o segundo por um sistema de «cheque-ensino», e o primeiro pela lógica do «salve-se quem puder».
Ter-lhe-á faltado a coragem política para o fazer de forma rápida e irreversível, e ainda bem.

Mas infelizmente o grau de corrupção e compadrio neste governo superou as minhas piores expectativas, e a carga de autoritarismo parece-me, além de perigosa, particularmente hipócrita, tendo em conta toda a luta do PSD contra a «asfixia democrática» no governo de Sócrates, que em comparação mais parecem travessuras de um menino de coro.

Considerando a minha expectativa pré-eleitoral, posso afirmar que a acção deste (des)Governo não foi menos catastrófica do que previa.

Outras lições destas eleições

Em França, um partido com menos de 40% dos votos expressos tem maioria absoluta no parlamento. Já na Grécia, os dois primeiros partidos são separados por 3% dos votos e 20% dos deputados. Parafraseando a Shyznogud, quanto mais eu conheço outros sistemas eleitorais mais gosto do português.

quarta-feira, 20 de junho de 2012

Uma mentira de Relvas cabalmente provada

No ponto 103 do relatório da ERC, é descrito um telefonema (o das 18h03m) entre Relvas e Leonete Botelho. O registo das comunicações telefónicas (ver ponto 107) comprova que o telefonema existiu. E no entanto, o ministro negou verbalmente à ERC e depois por escrito (ver ponto 105), que o telefonema tenha existido. Ah, e curiosamente esse segundo telefonema não foi testemunhado pelos assessores que garantiram à ERC que no primeiro telefonema não se falara da vida privada da jornalista...

Também curioso é que Relvas estivesse tão «irritado» (isso, até os assessores admitem) com algo que o Público chegou a considerar não publicar. Ou ferve em pouca água, ou temia que aquele caminho levasse a descobrir muito mais sobre as suas ligações à escumalha das secretas.

«Relvasgate»: PSD 3 - PS 2

A Entidade Reguladora da Comunicação Social (ERC) decidiu por três votos contra dois que as pressões de Relvas sobre o Público existiram mas não foram «ilícitas». A favor: os três elementos do PSD. Contra: os dois do PS. Fiquei esclarecido quanto à ERC.

Mais sondagens




Será que esta tendência se irá manter com a mesma solidez? Qual será o impacto do Campeonato Europeu, dos incêndios, dos efeitos económicos do fim do subsídio de férias aos funcionários públicos, e de tudo o que aí virá?
Será que o descontentamento dará lugar à mobilização popular, a um maior envolvimento político?

Também merece a pena ver estes gráficos no Margens de Erro, que distinguem (não só em Portugal) que oposição é que está a capitalizar os erros deste (des)Governo de direita. E não é surpreendente...


terça-feira, 19 de junho de 2012

Economismo - um vivo debate

O texto que aqui partilhei do Ludwig Krippahl parece ter dado lugar a um vivo debate. No Blasfémias o Rui Albuquerque respondeu-lhe com este texto, que aqui resumo:


segunda-feira, 18 de junho de 2012

À atenção do comité central do PCP

"A Chinese Foreign Ministry spokesman says Beijing is hopeful Sunday's election in Greece can help stabilize the economic situation in the European Union. Hong Lei told reporters Monday that China welcomed the results, which pave the way for the formation of a pro-austerity government, and hopes it will bode well for the 17 nations sharing the euro currency." Fonte CBS.

Eu nem comento...

Economismo

Quando li no Blasfémias o texto «economia capitalista e “economia” parasitária» estive para responder, nos comentários ou neste blogue, denunciando os vários erros factuais e confusões enganadoras do texto. 
Seria importante fazê-lo por serem erros e sofismas tão comuns, e perfeitos exemplos da propaganda mentirosa que pulula quer na blogosfera, quer na comunicação social, induzindo tantas pessoas em erro. No entanto, a falta de disponibilidade e paciência fez com que essa intenção não fosse concretizada.

Felizmente, o Ludwig Krippahl escreveu um texto que me parece melhor do que aquele que eu escreveria. Cito parte, mas encorajo o leitor a lê-lo integralmente (hiperligações e negrito acrescentados):

«A ciência exige que as opiniões sejam formuladas com rigor e avaliadas de acordo com evidências e não por critérios ideológicos. É este o segredo do progresso científico e tecnológico. Infelizmente, na economia isto parece difícil de fazer. [...] O Rui Albuquerque dá um bom exemplo disto num post recente, que começa alegando que «Impostos elevados sobre o rendimento das pessoas e das empresas são a fórmula necessária e suficiente para a destruição de qualquer economia». 

[...] isto é demonstradamente falso. Nos EUA, o imposto máximo sobre rendimentos variou entre 28% e 92% nos últimos 60 anos. A média do crescimento anual do PIB quando o escalão máximo não ultrapassava os 35% foi pouco mais de metade do que quando o escalão máximo estava acima dos 75%. Esta correlação não permite concluir que impostos elevados promovem o crescimento mas permite rejeitar a hipótese de que impostos elevados destroem a economia. Até é fácil perceber porque é que a regra do Rui é falsa. Nos rendimentos mais elevados, o dinheiro não incentiva tanto como nos rendimentos mais baixos. Se um operário tiver de pagar 90% do seu salário em impostos o mais provável é preferir o fundo de desemprego. Mas é pouco plausível que o Mourinho desistisse da carreira por pagar 90% de impostos sobre os 22 milhões que recebe por ano, na premissa de que 200.000€ limpos por mês não chegam para persuadir alguém a treinar futebolisas.

[...] o Rui Albuquerque descreve «O pressuposto da utilidade tributária» como «o estado e o governo podem criar riqueza e prosperidade com o dinheiro retirado aos seus legítimos proprietários». [...] O que acontece é que um Estado exige recursos para ser mantido e um Estado é necessário para se poder gerar riqueza e prosperidade. Não se presume que é o Estado quem vai criar riqueza mas sim que sem um Estado – sem leis, defesa, educação, infraestruturas, governo, etc – não se consegue criar tanta riqueza e prosperidade. Além disso, a tributação tem também a função de redistribuir a riqueza para compensar a instabilidade do mercado.

[...] Ao contrário do que o Rui tenta tornar real por definição, quem pode aproveita-se sempre da riqueza que outros geram. A diferença é que quando o Estado redistribui não são apenas os ricos a ter essa possibilidade.

[...]

Como os agentes económicos visam obter riqueza, é verdade que a economia privada gera riqueza. No entanto, há três pontos que importa não esquecer. Primeiro, esta “riqueza” é simplesmente um somatório de preços. Não é necessariamente o mais importante. Não implica saúde, nem cultura, nem justiça nem liberdade, por exemplo. Em segundo lugar, para que os agentes económicos possam gerar riqueza num mercado livre é preciso uma data de coisas que só o Estado pode garantir. Finalmente, a economia privada só é sustentável se houver redistribuição que compense a sua tendência para agravar desigualdades. Para descrever correctamente a realidade é preciso não descurar estes factores. Nem mesmo quando causam desconforto ideológico. Por isto, entre outras coisas, é que é preferível aumentar os impostos dos mais ricos em vez de diminuir os apoios aos mais pobres

Três eleições


  1. Na Grécia, ganhou a direita pró-austeridade. É mesmo isso, e toda a esquerda deveria reflectir tanto na derrocada histórica do PASOK como na incapacidade do SYRIZA de mobilizar e vencer, contra a tróica, o austeritarismo e a Alemanha de Merkel e Westerwelle (e é dos gregos que falamos!). Falar em «grande vitória» neste contexto é absurdo. Pior ainda é o lunático comunicado do PCP (que esconde o pior resultado do KKE desde... 1932, numa situação que chegou a ser descrita como «pré-revolucionária» por alguns irrecuperáveis obcecados com 1917).
  2. No Egipto, o pior de dois mundos: o candidato islamista venceu a eleição presidencial, e os militares parecem querer recuperar o poder. Entre uma ditadura dos militares e uma «democracia» dominada por  islamistas, os democratas laicos são afinal uma pequena minoria.
  3. Melhor notícia da noite, e talvez a mais importante para os próximos meses em Portugal: em França, os socialistas terão maioria no Parlamento, depois de Hollande ter sido eleito Presidente. O PSF é o mais à esquerda dos partidos socialistas europeus. Merkel hoje deita-se mal disposta, apesar da Grécia. François Hollande é a verdadeira esperança da esquerda europeia para os próximos meses...

domingo, 17 de junho de 2012

Intoxicação

Quem esteve atento à imprensa internacional de hoje, leu as múltiplas de declarações de instituições financeiras e de partidos com elas comprometidos a prever todo o tipo de catástrofes possíveis para a Grécia, a Europa e o Mundo, caso ganhe o Syriza. A intoxicação dá como certa a saída da Grécia do euro. Juntos, os partidos gregos que defendem a saída do euro vão ter menos de 15%. Como é que a Grécia vai sair do euro? Só se for empurrada. Vão ser os bancos e o sistema financeiro a empurrar a Grécia para fora do euro, eles que curiosamente participaram no saque? Ou vai ser a CDU de Merkel?  Estou curioso para ver quem serão os protagonistas que vão tentar ter mais legitimidade do que a expressão dos eleitores gregos nas urnas.

Individualismo não é Egoísmo

O individualismo é uma posição moral, filosofia política, ou perspectiva social que frisa «o valor moral do indivíduo», fazendo do indivíduo o seu foco de análise. O individualismo valoriza a luta pela liberdade, em particular as liberdades individuais.
Já o egoísmo é o hábito ou a atitude de uma pessoa colocar seus interesses em primeiro lugar, em detrimento dos outros.

A confusão entre ambos é frequente, mas errada. Quer o colectivismo, quer o individualismo são geralmente posições de quem tem alguma preocupação moral relativa à comunidade em que se insere. Geralmente, a atitude mais comodista e egoísta é a total despreocupação em relação a estas questões.
Por outro lado, a luta pelas liberdades individuais muitas vezes implicou e implica algum altruísmo, alguma preocupação pelas vítimas do seu desrespeito. Para dar um exemplo, lembro a Amnistia Internacional, que tem um papel central na defesa destas liberdades, uma instituição à qual não creio que faça sentido associar egoísmo, mas sim dedicação, empatia, coragem e serviço ao próximo - altruísmo.

É verdade que a defesa do individualismo é muitas vezes usada como forma de advogar agendas convenientes aos mais poderosos. Estes, ou aqueles que os servem, podem defender o individualismo por razões egoístas. Mas haverá também quem possa defender o colectivismo por razões egoístas: o que me parece problemático é assumir automaticamente a má fé de quem advoga uma determinada ideia.

Outra fonte de confusão prende-se com a existência de uma corrente filosófica denominada «egoísmo ético», a qual defende que as pessoas deviam comportar-se de forma egoísta. Esta ideia, sendo parte integrante do «objectivismo», foi muito popularizada por Ayn Rand. Como os defensores desta ideia absurda e inconsistente também se caracterizam como defensores do individualismo, isso pode contribuir para criar associações erróneas ao conceito de individualismo.
Por outro lado, o «egoísmo psicológico» - a crença de que os seres humanos são sempre motivados pelo seu próprio interesse, e de que todo o altruísmo é apenas aparente, e motivado pelo egoísmo do indivíduo - também é uma ideia frequentemente associada ao individualismo. Esta associação tem tão pouca razão de ser como a contrária: trata-se de uma crença descritiva (e profundamente errada, a meu ver, que o ser humano é muito mais complexo), mas o individualismo é do foro normativo.

Por fim, creio que importa lembrar que muitos daqueles que se auto-intitulam defensores do «individualismo» efectivamente não o são. Perante ataques sérios às liberdades individuais como os que estão a ocorrer nos EUA, ou em Portugal, o silêncio destes supostos «"individualistas"» é quase total. Se só se lembram dos direitos individuais quando os interesses dos poderosos estão em causa, então já se torna razoável assumir que existe alguma dose de egoísmo...

sexta-feira, 15 de junho de 2012

Syriza, uma bela resposta dos gregos

Depois da crise estalar, a reação nas urnas foi, grosso modo, a de castigar o boneco que estava no poder. Outra reação frequente foi votar no candidato-palhaço. Em Portugal tivemos essa versão em José Manuel Coelho sem grande sucesso, mas em Reiquiavique o palhaço ganhou e governa desde 2010. Depois houve a reação mais clássica que é votar na constelação de partidos ultra-conservadores e nacionalistas, partidos que não têm programa político a médio e a longo prazo, onde tudo se baseia na culpabilidade de uma certa faixa da população por todos os males do país (ciganos, desempregados, imigrantes, judeus, muçulmanos, etc.). Outro clássico é o discurso anti-políticos muito do agrado dos principais culpados da crise, setor financeiro e banca, para sacudir a água do capote. Foi deste discurso anti-políticos, por exemplo, que surgiu a Forza Italia de Berlusconi em meados dos anos 90, depois da operação Mãos Limpas. Eram todos maus e corruptos, exceto ele Berlusconi, aliás como o tempo veio a demonstrar...
Se recuarmos um pouquinho na máquina do tempo, até aos anos 30 do século XX, descobrimos o maravilhoso futuro que este cocktail de nacionalistas, palhaços e políticos anti-políticos reservou à Europa. Foi só a pior catástrofe de sempre. Nunca se destruiu tanto e nunca se morreu tanto na Europa em tão pouco tempo.

Durante as últimas décadas houve algumas famílias políticas que sempre se recusaram a compactuar com uma economia onde o estado e os cidadãos estivessem reféns dos mercados financeiros, que preferiam um modelo onde os mercados estivessem ao serviço dos cidadãos, das empresas e da qualidade de vida. E por isso foram frequentemente ostracizados.  
Exemplos conhecidos são a família dos Verdes Europeus, esquerdas alternativas (a que pertence o BE e o Syriza), alguns partidos socialistas e sociais-democratas que não se deslumbraram com os mercados e, à direita, alguns partidos democratas-cristãos genuínos que não venderam a alma ao diabo. Estes partidos raramente governaram nas últimas décadas de devaneio financeiro, é natural. 
Dada a gravidade da sua situação, a Islândia foi um dos primeiros casos em que os eleitores perceberam que era preciso escolher os que sempre se bateram contra o tipo de economia que destruiu o país e elegeram a Aliança Social Democrata (partido da família do BE). Em toda a Europa, partidos desta mesma família esquerdista e europeísta (a favor do euro e de mais integração) como o Front de Gauche em França, o Syriza na Grécia, o Partido Socialista na Holanda e partidos da família dos Verdes estão a aumentar consideravelmente a sua representatividade. Os Verdes já governam em Baden-Württemberg. Na Holanda e na Grécia tudo indica que estes partidos poderão discutir a vitória nas próximas eleições. Se forem governo não é garantido que os respetivos países se transformem num mar de rosas, mas uma coisa é certa, os mercados por muito que lhes custe vão começar a trabalhar mais ao serviço do Estado, dos cidadãos, das empresas e dos produtores. A expressão da vontade de mudança dos gregos, aderindo massivamente ao Syriza, é de louvar. O mais fácil seria exprimir a vontade de mudança aderindo aos nacionalismos, aos populismos anti-políticos e aos palhaços cujo programa político é nulo a médio e a longo prazo e que só iria agravar o caso das gerações seguintes. A escolha dos gregos pelo Syriza até poderá revelar-se uma desilusão, mas por muito má que seja essa desilusão esta escolha comportará consigo sempre mais futuro e mais esperança para as próximas gerações do que todas as outras opões, aliás já mais do que batidas.

Boa sorte Syriza!

DN - o jornal dos senhorios?

Razão tinha o Nuno Ramos de Almeida quando, em tempos, escreveu sobre o significado de os jornais terem deixado de ter uma secção "trabalho" para passarem a ter uma de "economia". A secção "trabalho" era dedicada a trabalhadores; a secção "economia", com o espaço dedicado às "cotações da bolsa", a trabalhadores é que não deveria ser dedicada. No caso particular do "Diário de Notícias", há uns anos reparei que não era destinado a ser lido por comunistas, que eram designados por "eles" (tendo mesmo participado o caso ao então provedor dos leitores). Esta semana, descobri que é um jornal para senhorios. Pelo menos o seu suplemento de economia, que providencia um simulador, dedicado a quem se dedica ao louvável ofício de "investir em casas para arrendar" (que julgam? há gente que vive disto!), para saberem "que renda podem cobrar". Não sei que leitores almeja um jornal que dá conselhos destes, mas não será a esmagadora maioria da população, com certeza. Depois não se queixem de não os terem. De resto, para dar "conselhos de poupança e investimento", prefiro o arquiteto Saraiva. Tem muito mais piada.

quinta-feira, 14 de junho de 2012

Revista de imprensa (14-06-2012)

O endividualismo é o resultado da última metamorfose do indivíduo moderno, do processo da sua afirmação e expansão ilimitadas. É o produto da sua profunda cumplicidade com o "paradigma do ilimitado" que marcou todo o século passado, sobretudo a segunda metade, garantindo a todos uma energia inesgotável, um consumo interminável e um crédito sem fim. O endividualismo representa o apogeu jubilatório do indivíduo que se realiza pelo crédito, isto é, pela dívida. Ele tornou-se, no mundo de hoje, no pilar mais generalizado - e talvez no mais resistente! - deste paradigma em crise. Ele decorre da afirmação sem limites dos direitos dos indivíduos, da progressiva identificação do direito com a proteção da esfera do privado e da rasura sem precedentes das referências a valores ou convicções de ordem coletiva. As chamadas agendas fraturantes têm aqui a sua mais do que óbvia origem, bem como a principal razão do seu frenético elã. O endividualismo foi contudo viabilizado e estimulado - ao contrário do que se diz e por mais paradoxal que tal pareça a muitos - pela poderosa afirmação de um Estado social que, libertando pela primeira vez na história os indivíduos da necessidade de terem de preparar o seu futuro e o dos seus (garantindo-lhes reformas, educação, saúde, etc.), o tornou um soberano cada vez mais centrado em si próprio. O endividualismo acelerou, por isso, o processo de desarticulação interna das democracias, cavando um abismo cada vez maior entre a afirmação da liberdade individual dos cidadãos e a sua capacidade de ação cole- tiva: mais livres, sim, sempre - mas também mais impotentes!
(Manuel Maria Carrilho, DN)

quarta-feira, 13 de junho de 2012

Futebol chinês: um exemplo para Portugal

Não deixa de ser curioso que uma ditadura como a chinesa consiga combater mais eficazmente a corrupção futebolística do que a democracia portuguesa: com penas efectivas de prisão (pesadas, dez anos), para dirigentes (incluindo ex-presidentes da federação local) e jogadores da selecção. Seria possível em Portugal esta mão pesada com a gente do jogo do pé-na-bola? Creio que não, infelizmente.

Ainda existem dinossauros em Portugal

Lá para os lados de Pombal, existe um presidente de Câmara que compara a homossexualidade ao alcoolismo e à toxicodependência. Chama-se Narciso Mota. Pertence a uma espécie em vias de extinção.

Teria sido mais simples

Rui Rio propôs que autarquias muito endividadas deveriam ser geridas por uma comissão administrativa (mais tacho para António Borges?) e não ter eleições. Tendo em conta que o seu partido é um dos principais responsáveis pelo endividamento das autarquias teria sido mais simples se propusesse que o seu partido não concorresse às câmaras que endividou, em vez de impedir o concurso de partidos e de independentes que defendem outras formas de gestão local, menos agarrados a negociatas que envolvem muito betão e a alterações selvagens de PDM's.

segunda-feira, 11 de junho de 2012

iFixit

Nos anos 60, um engenheiro da República Democrática da Alemanha foi apresentar a um salão internacional de eletrodomésticos uma lâmpada que segundo o próprio não se fundia. Orgulhoso da sua invenção, o engenheiro alemão estranhou a falta de interesse que a invenção despertou entre os seus concorrentes. Um deles chamou-o à parte e disse-lhe que se comercializasse essa lâmpada nos EUA todos iriam perder uma margem considerável de lucro. Desde 1925 que os principais fabricantes de lâmpadas (Phoebus, Osram, Philips, e General Electric) tinham chegado a um acordo para estabelecer uma longevidade de 1000 horas em vez da média de 2500 horas que eram registadas nos testes.
A longevidade programada de eletrodomésticos e aparelhos eletrónicos não é um problema de hoje, mas está a tomar proporções sem precedentes à medida que aumenta o número de multinacionais que aderem à filosofia de produtos não reparáveis associados a esquemas em que é estabelecido propositadamente um tempo de vida limitado a um componente basilar de funcionamento do aparelho. Empresas como a Epson e a Apple foram recentemente objeto de denúncias públicas significativas deste tipo de práticas. A Epson começou a equipar impressoras onde um dos chips que controlava a execução da impressão era programado de raiz para funcionar até às 18000 cópias. A partir desse número, o software da impressora deixa de transmitir a ordem de impressão (vale a pena ler a desculpa da Epson). No caso da Apple, desde 2003 telefones e leitores de música começaram a ser equipados com baterias integradas de curta longevidade (cerca de dois anos) que não permitem uma substituição trivial.
Um grupo de admiradores dos produtos Apple e de ex-trabalhadores da empresa, desiludidos com a política da longevidade programada criaram a empresa iFixit dedicada à reparação de eletrodomésticos e aparelhos eletrónicos objeto de longevidade programada. No seu sítio explicam como reparar em casa alguns desses aparelhos.
Podemos descobrir aí os métodos perversos da Apple para impedir a substituição das baterias (colas, parafusos incompatíveis com as chaves de fendas, armadilhas mecânicas), obrigando o cliente a dirigir-se às lojas Apple para resolver o problema onde os custos da substituição da bateria são de cerca de 70% do valor do produto. Na prática o cliente é forçado a trocar o seu modelo pelo novo modelo lançado no mercado. Como resultado de protestos, processos em tribunal e do ativismo de variados grupos de cidadãos, a Apple começou a alterar alguma da sua política de longevidade programada.
Entretanto, em Livermore, Califórnia, no quartel dos bombeiros locais existe uma lâmpada acesa em contínuo desde 1901 (na foto).

Revista de blogues (11/6/2012)

  • «No domingo entre as 8 e as 9 da manhã liguei a rádio, Antena 1 (a estação que quase sempre ouço). Estavam a transmitir a missa, desliguei.
    Virei-me para a televisão. Na RTP 2 estavam a transmitir o programa Eclesia sobre atividades da Igreja Católica. Mudei de canal, na RTP 1 estavam a transmitir também a missa.
    Concluo que ao domingo entre as 8 e as 9 da manhã as principais estações emissoras do Estado estão todas entregues à difusão católica.
    Eu aceito que essas estações transmitam programas dedicados às religiões en geral, à católica em particular. Até aceito que transmitam a missa - se bem que, num país onde, anormalmente, a Igreja dispõe de uma estação de rádio só para si, pudesse ser muito bem ser essa estação, e só ela, a transmiti-la. Mas não aceito este enfeudamento simultâneo de todos os canais públicos de mídia à religião católica. (...)» (Luís Lavoura)

A Troika, o Coelho e os sapos engolidos I

A Irlanda já veio, com toda a justiça, exigir as mesmas condições que a Espanha, aparentemente, vai ter no seu resgate. Passos Coelho também, mas o PM português não especifica o que quer dizer com condições "mais vantajosas".
Melhores taxas de juro não será certamente, porque o PM se tem mostrado convictamente contra o projecto de Eurobonds, por este baixar os juros da dívida pública de países incumpridores.
Menos austeridade tão pouco, o PM garante-nos que apoia todas as medidas em causa, e orgulha-se de ir para lá do pedido.
Um maior prazo para o ajustamento não será, o PM repete até à exaustão que seria um erro aliviar esta exigências.

O que falta? Não falta nada.
À medida que a solução imposta por Berlim se desmorona, o seu fã número um está apenas a ganhar espaço de manobra, para engolir vários sapos e voltar atrás nos dislates que tem defendido no último ano.

França: vitória do PSF


A primeira volta das legislativas francesas traduziu-se por uma clara vitória do PSF, confirmando o resultado da eleição presidencial. Não é impossível uma maioria absoluta do PSF no próximo domingo, ou que necessite apenas do apoio parlamentar de aliados tradicionais como o PRG e o MDC (falhando isso, os deputados ecologistas ou do Front de Gauche garantem uma maioria de esquerda).

Nota muito negativa, o resultado da herdeira Le Pen, com 14%. A direita democrática, desta vez, não conseguirá impedir a entrada no parlamento de deputados da extrema direita. E no futuro, talvez se veja um cenário semelhante ao da Itália, com ministros «pós-fascistas» no governo.

Uma Europa com um governo de esquerda na França poderá ser mais difícil de governar para Merkel. Isso celebra-se.

O projeto político do Pingo Doce (4)

O sociólogo António Barreto confessa que não se identifica com o Presidente da República, Cavaco Silva, embora manifeste respeito pelo seu cargo e “pela pessoa que é”. (...) Barreto, que este domingo será [foi] condecorado por Cavaco Silva com a Grã-Cruz da Ordem Militar de Cristo, diz que para se identificar com o Presidente da República “teria que partilhar com ele o estilo, a maneira, as opções políticas ou a sua estratégia de acção”. “Nestas áreas, há muita coisa que não partilho com ele”, admite o também presidente da Fundação Francisco Manuel dos Santos. António Barreto refere-se ainda ao ministro das Finanças, Vítor Gaspar, elogiando a sua competência e seriedade: “A sua falta de perícia política e de perícia para tratar com as pessoas, associações, empresas, e sindicatos não é a mesma coisa que incompetência ou mentira.”

sábado, 9 de junho de 2012

sexta-feira, 8 de junho de 2012

Aprígio Santos

Li no jornal que o empresário Aprígio Santos foi condenado a reconstruir os habitats que destruíu no Algarve e fiquei a pensar que esta deve ser a primeira vez que um empresário não faz vingar a política do acto consumado.  Mesmo que seja só por uma vez, Portugal está de parabéns.  Era fantástico se os tribunais começassem a funcionar e Portugal pudesse vir a ser, um dia, um estado de direito.

Fim de 42 colunas semanais

A minha última coluna no i saiu no dia 23 de Maio. Durante 42 semanas, escrevi sobre o que me parece evidente mas que sentia simultaneamente que ficava por dizer assertivamente na opinião publicada: que a União Europeia tem uma disfunção entre instituições democráticas impotentes e tecnocratas poderosos mas indiferentes aos cidadãos; que os portugueses não podem continuar observadores da UE, mas que devem ser protagonistas; que a austeridade tem castigado injustamente pensionistas e trabalhadores do privado, e poupado os poderes fácticos habituais; que olhar para o mundo laboral com o paradigma do funcionalismo público é um enviesamento grave; que a complacência perante os serviços secretos deve terminar; que os desentendimentos das esquerdas portuguesas desequilibram a República à direita; que o catolicismo tem uma influência política exagerada face ao seu real peso social; que Alberto João Jardim, se alguma vez teve piada, já não nos devia fazer rir. E que o mundo muda todos os dias.

Para encerrar, e em jeito de balanço, fica o «Top 10» das colunas que tiveram maior impacto nas redes sociais.
  1. «Um paradoxo agravado» (144 pontos).
  2. «Solstício» (140 pontos).
  3. «Um homem invulgarmente oco» (108 pontos).
  4. «Republicanos só de lapela» (95 pontos).
  5. «Geração SEF» (75 pontos).
  6. «E depois do empobrecimento?» (74 pontos).
  7. «Os gordos e os magros» (63 pontos).
  8. «República desequilibrada à direita» (46 pontos).
  9. «Orwell em Cuba» (40 pontos).
  10. «Obviamente» (40 pontos).

E cai a maior peça do dominó...

Espanha pedirá ajuda financeira amanhã. E agora, Europa?

Sondagens na Grécia


Mais sobre os vários partidos, sondagens, outros aspectos destas eleições aqui.

Correlação entre religiosidade e racismo?

Segundo uma sondagem da Universidade de Tel-Aviv, 52% dos judeus (de Israel) concordam que os imigrantes africanos são «um cancro no corpo do Estado de Israel» (45% não concordam, 3% «não sabem»). Dado muito interessante da sondagem: 81,5% dos ultra-ortodoxos («haredim») concordam, 66% dos ortodoxos também, mas apenas 38% dos «judeus seculares» (o que vai desde judeus crentes mas não praticantes até ateus). Conclusão: a irracionalidade do racismo parece acompanhar (em parte) a da religiosidade. Pelo menos, no caso dos judeus israelitas.

[Diário Ateísta/Esquerda Republicana]

quinta-feira, 7 de junho de 2012

TIAC pede "sindicância urgente" às secretas

De acordo com o Diário de Notícias:

«Em comunicado hoje divulgado, a Transparência e Integridade anunciou que escreveu segunda-feira a Cavaco Silva e à presidente da Assembleia da República, Assunção Esteves, "pedindo a instauração urgente de uma sindicância" ao Serviço de Informações Estratégicas de Defesa (SIED) e ao Serviço de Informações de Segurança (SIS).
[...]
Na carta dirigida ao Presidente da República, o presidente da TIAC, Luís de Sousa, defende que as "práticas de abuso de poder por parte dos serviços secretos que têm vindo ao conhecimento público constituem uma séria ameaça ao Estado de Direito democrático e às liberdades dos cidadãos".»

Concordo com esta iniciativa da TIAC e com o diagnóstico que fazem da situação, mesmo que preferisse uma prescrição menos tímida.
É justo que se olhem para os recentes episódios associados às «secretas» como algo absolutamente inadmissível em Democracia, como verdadeiros ataques ao estado de direito. Nesse aspecto, esta iniciativa merece o meu vivo aplauso.
Mas o ideal seria encarar estes episódio como ponto de partida para questionar o papel do SIS e da SIED no actual regime. Será que estas instituições têm poderes excessivos? Será que deveriam existir?

Debater com um neonazi


Hoje de manhã, ocorreu um debate televisivo no canal ANT1, com convidados de vários partidos, entre os quais o KKE, SYRIZA, ND, Aurora Dourada (neonazi).
A representante do partido SYRIZA questionou o representante do partido Aurora Dourada sobre o processo em tribunal que este tem por agressão a um estudante universitário, apoio em assalto e posse e uso ilegal de armas. Em reacção (ilustrativa), o membro do partido Aurora Dourada atirou água à represetante do SYRIZA. Logo de seguida, como a representante do KKE exigiu que saísse da sala, esbofeteou-a.
Foi colocado numa sala, aguardando a chegada da polícia. Antes que isso acontecesse, destruiu a porta e fugiu. Encontra-se neste momento a ser procurado pelas autoridades.

Infelizmente o vídeo que se segue não tem legendas, mas no essencial não são necessárias:



Dois anos de casamento para todos

A Teresa e a Helena casaram-se há dois anos, no que foi o primeiro casamento para pessoas do mesmo sexo em Portugal.
Ainda estou à espera do desmantelamento da instituição do casamento, e do tecido familiar e social da sociedade portuguesa que me tinham prometido.

Revista de blogues (7/6/2012)

  • «Aconteceu no Verão passado. Num dia de Agosto. Num hotel de luxo de Lisboa. Encontrei-me com Jorge Silva Carvalho. Só bebi uma água com gás. Mas ele pagou a conta. É possível que esteja tudo nas suas agendas, telemóveis e computadores. Incluindo a água.
    O encontro ocorreu a pedido de Silva Carvalho. (...) E de lá saí mais esclarecido: o antigo superespião tinha-se em alta consideração e todas as dúvidas que lhe manifestei sobre a empresa em que trabalhava, a Ongoing, geraram respostas que adensaram as minhas suspeitas. Por isso, se algo me surpreende em tudo o que temos vindo a saber, é o número de pessoas (incluindo muitos jornalistas) que tinha em alta consideração o antigo director do SIED.
    O que temos vindo a descobrir – sobretudo devido a uma investigação judicial ordenada por este Governo, é bom não esquecer – é tão grotesco como inquietante. Parece hoje claro que a Ongoing contratou Silva Carvalho para montar um centro de informações privado. Tal como parece claro que este utilizou as suas ligações não só para recrutar outros ex-espiões, como para continuar a tirar partido, em benefício próprio e da sua empresa, dos recursos dos serviços de informação do Estado. Mais: relatórios como o produzido sobre Francisco Pinto Balsemão – o grande inimigo de Nuno Vasconcellos, o patrão da Ongoing – mostram não só uma mentalidade inquisitória e pidesca, como revelam, ao misturarem factos públicos com boatos demenciais, uma mistura de preconceito, ignorância e incompetência que não se sabe se é exclusiva de quem os produziu na Ongoing, se é comum aos serviços de informações de onde aquela gente veio.
    Desde que, há quase um ano, começaram a ser conhecidas as ligações e actividades dos ex-espiões da Ongoing que tenho vindo a defender algumas medidas de profilaxia mínima. A primeira passa pela modificação das normas que hoje permitem aos agentes dos serviços de informações transferirem-se de armas e bagagens para empresas privadas, levando consigo ficheiros e dossiers. (...)

quarta-feira, 6 de junho de 2012

As declarações de Januário são de louvar?

Pelo pouco que conheço, simpatizo pessoalmente com a figura de Januário Torgal (a ausência do termo reverencial «Dom» deve-se ao fim dos títulos nobiliárquicos em Portugal, faz já mais de cem anos). Parece-me um indivíduo com empatia pelos mais desfavorecidos, e com vontade de afrontar as injustiças e abusos dos poderosos.
Portanto, quando faz críticas severas a este terrível Governo, e estas terríveis políticas, desde as mais recentes («No fim ainda aparece um senhor, que pelos vistos ocupa as funções de primeiro-ministro, dizendo um obrigado à profunda resignação de um povo tão dócil e tão bem amestrado que até merecia estar no Jardim Zoológico.») até às muitas outras que tem vindo a fazer, apelando à mobilização cívica, à defesa da Democracia, a minha primeira reacção é de aplauso.

Mas depois percebo o meu erro. Pelo papel que tem, Januário não deveria fazer esse tipo de declarações. Eu não gosto quando o Bispo da Madeira fala no «Dragão do Comunismo», tentando condicionar os votos dos madeirenses usando para tal o seu papel de autoridade religiosa. E esta situação é uma de muitas, reais ou hipotéticas. A lei actual limita a liberdade de expressão dos sacerdotes para se imiscuírem nas questões político-partidárias. Pelos vistos considerou-se que o poder de dizer, de forma credível para muitos devotos, «se votas no partido X vais para o Inferno, se votas no Z Deus recompensar-te-á», é um poder excessivo e que a lei tem de proibir o seu abuso. É um debate interessante saber se a lei deveria ser desta forma ou não.
Mas enquanto for, creio que não deveria aplaudir quem a viola, mesmo que concorde com as suas palavras e as considere bem intencionadas.

Custo por aluno no secundário é 50% maior que no superior

Soube disto através das declarações de António Cruz Serra, reitor da UTL:

«O custo por aluno no ensino superior está 30% abaixo da média dos países da OCDE. Com menos dinheiro que Portugal, estão a Bulgária, Roménia e Turquia. Os dados são revelados pelo reitor da Universidade Técnica de Lisboa, que critica o desinvestimento no ensino superior.
[...]
“O financiamento do ensino superior é muitíssimo baixo sob qualquer padrão, nacional ou internacional. Em particular estamos a ser financiados bastante abaixo, por aluno, do ensino secundário em Portugal. É algo que não dá para acreditar.”»

Quando fui à procura de mais detalhes sobre esta realidade, encontrei a notícia do Diário Económico que dá título a este texto (negrito acrescentado):

«O investimento do Estado por cada aluno do ensino básico e secundário é superior em mais de 50% àquele que é feito por cada estudante universitário. Este é apenas um principais indicadores que os reitores identificam para demonstrar a situação de sub-financiamento do ensino superior, que não hesitam em classificar como "uma vergonha." Contas feitas, o investimento público no sector estará hoje 45% abaixo do que se verificava em 2006.
Um aluno do superior representa hoje menos 1.957 euros de financiamento anual por parte do Estado do que um aluno do básico ou secundário. De acordo com o Orçamento do Estado de 2012, em média, um universitário custa 3.461 euros por ano. Já um aluno do 2º ciclo do básico ou do secundário, seja no público ou no privado, é financiado em 5.418 euros, segundo dados publicados pelo Conselho Nacional de Educação (CNE) no estudo "O Estado da Educação", de 2011.»

Encontrei também este recorte da notícia completa:


terça-feira, 5 de junho de 2012

Revista de imprensa (5/6/2012)

  • «Desde os eventos da Primavera Árabe que temos assistido a uma interessante reflexão no campo das Esquerdas Democráticas e Progressistas, em especial das desligadas da partidocracia dominante. (...)
    E é essencial, a meu ver, que projectos ligados a esta(s) nova(s) esquerda(s) (como o «Manifesto para uma Esquerda Livre» ou o «M12M», para citar alguns) tenham oportunidade de se desenvolverem e de ganhar alicerces na sociedade portuguesa. Não só porque representam a esperança de re-conectar as instituições democráticas e os cidadãos da República, como pretendem alavancar neste processo os fundamentos de novas fórmulas de interacção entre o sistema político e as colectividades que dele dependem e nele intervêm, instaurando novas formas de cidadania vinculativa e proporcionando neste processo respostas para a evidente falência dos modelos partidários contemporâneos e para a constatação da quebra da relação de confiança entre os partidos e a sociedade que dizem representar.
    Tal falência e constatação é para mim evidente em virtude dos partidos políticos, hoje dedicados quase em exclusivo à obtenção e manutenção de Poder, promoverem dinâmicas intra-partidárias dominadas e controladas por sindicatos de voto bem organizados e conscientes da sua influência, e que apenas ambicionam a auto-representação institucional; desta forma conservando um modelo que valoriza o cacique, que mantêm as oligarquias (bem) instaladas, e que naturalmente repele a sociedade civil e a academia do seu funcionamento interno, quebrando desta forma o laço entre o partido e a sociedade.

Passos e Portas de pedra e cal

Pouca relevância tem que a «esquerda» (51%) surja nas sondagens à frente da «direita» (42%), e que PS e PSD estejam separados pelo valor da margem de erro (3%). Resguardada pelo primeiro Presidente de direita da história da 2ª República, a maioria está de pedra e cal. Durará até 2015, a menos que Portas sinta que teria  mais a ganhar do que a perder com eleições imediatas.

Entretanto, a destruição das garantias sociais (e cívicas) que estabilizaram a democracia desde 1975 prosseguirá a bom ritmo, gerando uma inevitável fractura social. A seguir ao Verão, senão antes, a espiral da contestação, desesperada porque sem saída institucional à vista, e agravada pela insensibilidade social do governo, dará mais umas voltas. A situação deste país pode ficar mesmo muito feia.

Um ano depois

Um ano depois da mudança de ciclo político em Portugal, vale a pena recordar como tudo se passou. Por muito que se discordasse da via que estava a ser então seguida, é justo dizer que José Sócrates fez tudo praticamente até ao fim para que Portugal não pedisse auxílio ao FMI. O seu último erro foi não demitir Teixeira dos Santos imediatamente, assim que o ministro das finanças anunciou este pedido. Rendeu-se aos banqueiros. Quem exigiu o resgate financeiro foram os banqueiros, que tinham em Teixeira dos Santos o seu homem-de-mão. A fatura estamos nós a pagá-la, e vai pagá-la o PS por vários anos. O dia em que Sócrates pediu a Cavaco para o salvar da troika, por Cristina Ferreira

segunda-feira, 4 de junho de 2012

Revista de twitter/facebook (04/06/2012)

"Esta demissão da Maria José Oliveira deve encher os jornalistas portugueses de vergonha. Parte disto é nossa exclusiva responsabilidade. A apatia com que foi recebida a acusação do público a Relvas, a incapacidade de reacção dos jornalistas, foi um sinal de que isto se pode fazer." (Fernanda Câncio) (Notícia: Maria José Oliveira demite-se do Público)

Incertezas

Na China, no Chipre, e em Espanha.
E na Grécia, claro está.

No discurso do executivo alemão, a mesma falta de pudor em atacar a soberania dos parceiros europeus. Não se trata de um discurso federalista, mas sim de um discurso imperialista, a lembrar a «piada de Trichet».

Tempos imprevisíveis e, talvez por isso, algo assustadores.

domingo, 3 de junho de 2012

A oposição madeirense une-se finalmente?

  • «“O défice democrático que se vive na Madeira foi, porventura, a principal causa da situação catastrófica a que a região chegou. A ausência de soluções e a persistência nos atropelos graves ao bom funcionamento da democracia revelam que são indispensáveis acções concertadas e sistemáticas de modo a trazer para o quotidiano regional a ética democrática e os valores da liberdade e da livre expressão”, lê-se no documento que será assinado, à tarde, pelos representantes do PS, CDS-PP, PTP, PCP, MPT, PND, PAN e BE. Os partidos subscritores comprometem-se, em nome dos eleitores, a colocar na ordem do dia “as exigências que decorrem de uma democracia parlamentar”, com a salvaguarda das instituições que a suportam. (...)  No âmbito do pacto, as oposições madeirenses vão agendar contactos conjuntos com órgãos de soberania, em articulação com os seus partidos na Assembleia da República, dando prioridade à audiência com o Presidente da República. Vão suscitar, em bloco, a inconstitucionalidade do actual regimento da Assembleia regional e propor a sua alteração, de modo a “exigir uma fiscalização efectiva ao executivo”, a presença regular do presidente e do governo regional no parlamento e garantir a pluralidade nas comissões, acabando com a hegemonia do PSD nas coordenações e funcionamento das mesmas.» (Público)

Manifesto para uma Esquerda Livre: a caminhada continua

Infelizmente, não pude estar presente no encontro de 2 de Junho para continuar a «caminhada» que se iniciou com o Manifesto para uma esquerda livre. Soube que foi um sucesso em termos de participação: apesar ter sido alterado o local de encontro para acomodar muitas mais pessoas interessadas em dar o seu contributo, o espaço foi ainda insuficiente.

Aqui estão alguns vídeos que foram tirados no encontro:





Mercado e Desemprego, uma ilustração

Em Carmenia existem dois grandes proprietários de terras: o Abel e o Joel. Existem também 110 camponeses.

O Abel tem minas de cobre, e alguns terrenos pouco férteis.
O Joel tem vinhas de elevada qualidade, e um vasto lago, mas com poucos peixes. À volta destas terras existem montanhas estéreis, e a povoação mais próxima fica muito distante.

Por cada trabalhador nas suas minas de cobre, Abel consegue ganhar 25 moedas (sempre por ano). Mas não é possível manter mais de 40 pessoas a trabalhar nas minas: acima deste valor, novos trabalhadores atrapalham os restantes, sem qualquer produção adicional.
Nos terrenos pouco férteis Abel consegue ganhar 2 moedas por pessoa, e podem trabalhar lá até 300 pessoas.
Abel também está interessado em comprar os serviços de 2 pessoas: um bobo (pagaria até 30 moedas por umas boas gargalhadas) e alguém para efectuar algumas tarefas domésticas (consideraria preferível pagar 35 moedas para não as fazer ele próprio).

Joel consegue ganhar 15 moedas por cada pessoa que trabalhe nas suas vinhas. Até 50 pessoas podem trabalhar nestas vinhas. No lago podem trabalhar até 20 pessoas, mas o máximo que cada trabalhador consegue pescar pode ser vendido por 2 moedas. Joel também está disposto a pagar os serviços de um guarda costas, pelo que estaria disposto a pagar até 100 moedas.

Assumamos que 2 moedas é o suficiente para que um camponês sobreviva com dificuldade, sem dinheiro para poupar para a velhice ou para se precaver para a doença. Imaginemos que 5 moedas é o suficiente para conseguir sobreviver e deixar alguma - quase nenhuma - riqueza aos descendentes, tendo em conta os gastos associados à doença e à velhice.

O que é que acontecerá em Carmenia se os camponeses não se organizarem? Tendo em conta que existem mais camponeses do que trabalhos lucrativos, Abel e Joel não têm de competir pela mão de obra. O primeiro pode oferecer 3 moedas pelo trabalho doméstico, pelo trabalho como bobo e na mina, e o segundo pode oferecer a mesma quantia pelo trabalho de segurança e pela labuta nas vinhas. Contratarão todos os camponeses que desejarem, e ainda sobrarão 17 à procura de emprego pior pago. Estes receberão pouco menos de 2 moedas, e todos terão emprego. Ninguém terá uma vida segura e próspera, a não ser Abel e Joel que terão lucros muito elevados.

E se os camponeses fossem capazes de se organizar, o que aconteceria? Eles poderiam acordar entre si exigir um mínimo de 7 moedas para prestarem qualquer serviço, impondo esta exigência a todos.
Abel contrataria 42 pessoas, pois todos estes serviços valeriam para ele mais do que as sete moedas exigidas. Joel contraria 51 pessoas pelas mesmas razões. Se cada um dos 93 contratados pusesse uma moeda de parte para pagar às 17 pessoas por contratar, estas poderiam receber 5 moedas, e ainda sobraria dinheiro. Abel e Joel continuariam a ter lucros generosos, mas ligeiramente menores.

Claro que, se fossem gananciosos, Abel e Joel amaldiçoariam o acordo dos camponeses, culpando-o pelo suposto ócio remunerado das 17 pessoas por contratar. Mas se o seu objectivo de destruir este acordo fosse alcançado, em Carmenia viver-se-ia muito pior.

Serve esta história para ilustrar o perigo de acabar com as leis que colocam restrições à contratação.