sexta-feira, 8 de janeiro de 2010

Erros do liberalismo de direita - II

No que diz respeito à ideia de que a menor intervenção do estado na economia traz prosperidade, existe toda uma escola de pensamento que a justifica com base numa série de modelos que o demonstram dedutivamente.
Como é próprio dos modelos, existem simplificações que são assumidas. Em concreto, assume-se que, em grande medida, o homem se comporta de forma racional e coloca o interesse próprio acima do interesse alheio (o Homo Economicus).

Querendo contrariar as conclusões destes modelos, a esquerda faz notar que estas assunções não correspondem à realidade. Notam - e bem - que vários estudos demonstram de forma definitiva que em muitas circuntâncias as pessoas não tomam decisões de forma racional, e que em muitas circunstâncias as pessoas colocam o interesse alheio acima do interesse próprio.
Se as premissas estão erradas, as conclusões estão por provar, são uma questão de convicção política, fim da história.

Nem por isso.

Em ciência é comum fazer aproximações. Galileu considerou modelos em que a força de atrito ou a pressão do ar eram desprezados. Se alguém tivesse dito "mas o atrito existe, logo não vou tormar em consideração nada daquilo que dizes", teria revelado insensatez, e perderia razão.

Mas é verdade que por vezes a disparidade entre as aproximações e a realidade coloca mesmo em causa as conclusões. Galileu concluiu que os corpos demoravam o mesmo tempo a cair, mas todos sabemos que uma pena demora mais tempo que uma pedra.

O juiz, claro está, deve ser a realidade. O cientista propõe um modelo, no qual considera determinadas aproximações. Depois, o modelo permite fazer previsões, que são comparadas aos resultados das medições que forem efectuadas. Se as previsões não corresponderem aos resultados empíricos, as assunções de partida não são adequadas ao problema em estudo.

E esta é a razão fundamental pela qual não podemos confiar nas conclusões simplistas da escola de Chicago, as que alegam que a diminuição do peso do estado tende a resultar em maior prosperidade: a realidade não lhes dá razão. Os dados empíricos mostram que estas conclusões são falsas.

Nos próximos textos irei dar alguns exemplos concretos desta situação.

Por fim, mostrarei como a diminuição do peso e papel do estado (a partir da situação típica de um país da OCDE) tende a criar outros problemas ao bem estar das pessoas, independemente do seu efeito na prosperidade.

4 comentários :

Filipe Moura disse...

"Notam - e bem - que vários estudos demonstram de forma definitiva que em muitas circuntâncias as pessoas não tomam decisões de forma racional, e que em muitas circunstâncias as pessoas colocam o interesse alheio acima do interesse próprio."

Estás com isto a dizer que colocar o interesse alheio acima do interesse próprio não é uma decisão racional? (Responde "sim" ou "não" por favor - és um gajo de ciências... :) .)

João Vasco disse...

Não, não estou a dizer isso. São duas coisas separadas.

Há estudos que mostram que as decisões podem não ser racionais E há estudos que mostram que as decisões podem não ser egoístas.

Miguel Madeira disse...

"Querendo contrariar as conclusões destes modelos, a esquerda faz notar que estas assunções não correspondem à realidade. Notam - e bem - que vários estudos demonstram de forma definitiva que em muitas circuntâncias as pessoas não tomam decisões de forma racional, e que em muitas circunstâncias as pessoas colocam o interesse alheio acima do interesse próprio."

Sinceramente, não me parece que a maior parte dos criticos "de esquerda" do liberalismo económico (ou, pelo menos, os que são eles próprios economistas) contestem muito, quer o principio que os individuos procuram maximizar a sua utilidade, quer o principio que os individuos tomam as suas decisões racionalmente em função da informação disponível (no máximo, argumentam que há muita informação que os individuos não têm e por isso têm que tomar decisões com base em palpites e afins, mas, mesmo assim, continua a ser a decisão mais racional possivel dentro das circunstancias).

João Vasco disse...

Miguel Madeira,

Já várias vezes deparei com essa crítica por parte da esquerda.
A última foi neste conjunto de seminários em que participei:

http://u-ni-pop.blogspot.com/2009/04/seminario-pensamento-critico-economia.html

E é mesmo verdade que muitas decisões não são racionais.

Assim de repetente lembro-me de quatro estudos sobre esse assunto.
Um sobre doações de sangue em função da recompensa monetária, outro sobre multas por atraso e o seu efeito nos atrasos, outros sobre 3 escolhas em que uma delas é objectivamente melhor que uma das outras, e ainda outro sobre o jogo do ultimato, e a forma como os resultados variam com as culturas (só existindo um único resultado racional).

Mas estes são aqueles de que me lembro agora. Existem muitos mais.

Ah! Lembrei-me de outro. Um estudo em que, para certas actividades, a performance diminui à medida que a recompensa atribuída aumenta.