Há um aspecto romântico em tudo aquilo. Questionar tudo, acreditar que podemos contruír algo diferente, ser parte da mudança (radical?) que queremos ver. E não gosto do cínico que há em mim, com as suas mil e quinhentas reservas a toda cegueira desses sonhos - não foram esses velhos sensatos quem fez as revoluções que mudaram o mundo para melhor, muitas vezes foram sonhadores imprudentes.
Mas também estão lá todas as sementes para que este processo não gere nada de concreto e positivo, não sei. O tal cínico que há em mim também tem boas razões desconfiar, e até temer, aquilo que possa resultar daqui, na improbabilidade de ser algo transformador. Nem todas as revoluções foram o 25 de Abril...
Eu apelaria aos curiosos a passarem lá, e serem parte da construção daquele movimento, que tanto pode ser uma coisa patética como uma coisa linda, dependendo do sentido que tomar. É uma experiência que vale a pena.
9 comentários :
Aprovar em assembleia o "fim da globalização", numa manifestação que começou em Madrid e se pretende espalhar pela Europa é de facto bastante ingénuo...
Se nos próximos tempos o sentido de manifestação não cristalizar num desejo concreto e tangível, só se vai ouvir tambores e frases feitas.
(Atenção: cinismo elevado)
Tal como o 12 de Março, o benefício que vejo nisto é exactamente pôr muita gente a questionar tudo e a pensar.
Contudo é engraçado ver que muitos que ali estão nunca participaram nos mecanismos democráticos do sistema actual, e agora reclamam um "aprofundamento da democracia". Para pedir aprofundamento é preciso perceber o sistema que existe.
Não me espantaria que os grupos de trabalho de aprofundamento da democracia, (re)-inventassem a democracia representativa...
E o que se vê por lá, JV? Para além da festa e da insatisfação com a democracia como funciona?
"tanto pode ser uma coisa patética como uma coisa linda"
Pelo que se vê nas imagens, 'tá a puxar mais pr'ó patético, Ó João Vasco.
Ricardo,
Aquilo que vi no sábado durante a noite foi mais do que a mera insatisfação, pelo contrário.
Pareceu-me que uma parte significativa das pessoas que lá estavam eram "dinamizadores" , "líderes" ou "activistas experientes" de diferentes grupos (ruptura/FER; Precários Inflexíveis, Gaia, etc..), depois também estavam lá alguns anarquistas, e depois então algumas pessoas simplesmente insatisfeitas solidárias com aquilo tudo.
Os objectivos do protesto eram de facto a grande discussão, nesse sentido havia pouco em comum, mas não porque cada um não tivesse ideias de quais os objectivos que o protesto deveria ter - pelo contrário.
Uns falavam na dívida, em como era necessário ser contra o plano da Troika, e iam mais longe falando nos partidos "do costume" que sempre se têm mantido no poder (PS, PSD, PP) e na necessidade de mudar. Outros desdenhavam estes pela sua insistência em evocar partidos, ou porque alegavam que a actual democracia é uma democracia de fachada (os anarquistas), ou porque alegavam que este protesto deveria ser mesmo apartidário, e mencionar partidos ou intenções de voto/não voto era constrário ao espírito do acto.
Também se discutia no plano estratégico. Havia quem acreditasse que se tinha de definir um discurso concreto que reflectisse os objectivos dos presentes, e que com base nestes objectivos concretos deveria ser pensado tudo o resto. Havia quem acreditasse, por outro lado, que o discurso deveria ser vago (como o do 12 de Março) de forma a permitir que aquele processo crescesse, e depois, uma vez com mais gente ali, se encontrassem os objectivos comuns a todos os presentes, com uma discussão mais alargada, e se permitisse que os objectivos fossem definidos também pelos que chegassem no futuro, e não apenas pelos que deram início ao processo.
Pelo comunicado que recebi, sempre escolheram ser concretos na oposição ao plano da Troika, mas não mais que isso.
Será que coloco o comunicado como um post aqui no ER?
Nuno,
Realmente o vídeo não faz completa justiça ao que lá se passava, mas foi o melhor que encontrei.
JV,
tu publicas o que quiseres, mas pela descrição parece-me mais que a extrema-esquerda se juntou toda para se despedir de uma época que sabem que está a terminar. Não vejo nada de concretamente útil a sair dali. E lamento dizê-lo.
E eis que ao ?? dia, houve um comunicado:
"A Assembleia Popular do Rossio apela a todos para participarem na
Acção PAGUEM-NOS O QUE NOS DEVEM! . Quarta-feira, dia 1 de Junho, às
18 horas, serão lançados no caixote do lixo, em frente ao Banco de
Portugal, os seguintes contratos e medidas que o Estado fez, usando
para tal os nossos impostos, e que consideramos ilegítimos:
BPN
Parcerias Público-Privadas
Despesas militares
Impostos sobre o consumo (IVA)
Transferência de dinheiro do SNS para os serviços privados de saúde
Subsídios ao ensino privado
Subsídos aos donos das auto-estradas
Recusamos hipotecar o futuro por uma Dívida que não é nossa!"
Não sei o que é mais grave, se é não perceberem que o BdP nada tem a ver com a dívida pública; não perceberem que a dívida pública se chama dívida pública por alguma razão, ou seja somos nós que devemos aos credores e não ao contrário; não perceberem que aquelas despesas estavam nos programas eleitorais (excepto BPN) de governos democraticamente eleitos e que foram feitos para benefício da população (o facto de não concordarem com elas, mostra apenas que não sabem o que é a Democracia); confundirem o que é uma despesa e o que é uma receita... porque raio está ali o IVA?; etc.
Já agora, quem serão o "ELES" e o "NÓS" na frase "PAGUEM-NOS O QUE NOS DEVEM!"?
Miguel:
Concordando com muitas das tuas críticas, devo dizer que esse não foi o primeiro comunicado...
Entretanto muitas pessoas sairam dali, desiludidas com o rumo que aquilo tomou.
Desta vez o cínico em mim teve razão. É por estas e outras que a idade lhe dá força.
João, só uma coisa: o meu cinismo era dirigido à assembleia, não a ti :)
Eu percebi que estavas de pé atrás.
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