quarta-feira, 28 de abril de 2010

fare il portoghese

Em Itália a expressão "fare il portoghese" (passar por português) é empregada quando se usufrui de um serviço e não se paga, por exemplo quando se viaja de comboio sem bilhete. Esta expressão decorre de uma historieta do século XVIII em que o embaixador de Portugal em Roma autorizou a entrada num teatro a todos os portugueses a viver em Roma. Nessa noite entraram de borla no teatro muitos romanos que se passaram por portugueses (fare il portoghese).

A tolerância de ponto e as mordomias para comitivas e devotos fiéis durante a próxima visita do Papa será um raro momento em que Portugal em peso farà il portoghese. Este momento de puro esbanjamento económico em período de crise a troco de uma massagem espiritual colectiva realizada por um clero que pouco fez para combater a pedofilia entre os seus, é um momento patético e desajustado à realidade de um regime democrático e laico. Compreende-se ainda menos esta atitude vinda de um governo socialista. Compreende-se ainda menos quando existe um debate na Europa (França e Bélgica, por exemplo) sobre a necessidade de salvaguardar laicidade da sociedade, a laicidade da escola e a laicidade dos espaços públicos. Por enquanto, ainda não conhecemos por cá fenómenos comunitaristas que impõem indumentária e práticas abusivas às mulheres e às adolescentes. Seria pois o momento ideal para blindar a nossa legislação a tentativas futuras de abusos espirituais. Mas não, preferimos piscar o olho ao velho Portugal dos três éfes.
Deixo aqui a ligação de uma intervenção exemplar (aos 22min e 40s) de uma voz que está longe de ser uma voz jacobina, a voz de um católico que defende a laicidade: Pedro Mexia. Oiçam bem as suas palavras sobre o papel do estado, dos feriados religiosos, etc.

6 comentários :

Ricardo Alves disse...

Bem vindo.

Filipe Moura disse...

Conhecia muitas variações dessa história (até porque tenho vários bons amigos italianos), mas nunca tinha ouvido a original. Mesmo assim, "português" continua a ser sinónimo de "borlista". O que é significativo.

Mas creio que a história original também tinha a ver com o Papa. As entradas para os portugueses eram gratuitas por ordem do Papa, não era? Em vez de "portugueses residentes em Roma" não era antes uma comitiva que ia de Portugal ao Vaticano visitar o Papa? (E para eles o Papa ordenou que fosse de graça?)

Rui Curado Silva disse...

Também me contaram a versão do papa, mas não encontrei nada que a sustentasse até ver. No entanto parece-me ser uma daquelas histórias muito mal contadas.

António Parente disse...

Espero que essa imensa de vontade de trabalhar não lhes passe depois da visita do Papa.

Ricardo Alves disse...

Filipe,
a versão dessa história que eu ouvi é realmente que o que aconteceu foi que muitos italianos se fizeram passar por portugueses para conseguir borlas. O que não abona a favor dos italianos (se alguém quiser formar estereótipos nacionais a partir daqui...).

vonseka disse...

No ano de 1514, mandou o rei D. Manuel uma enorme embaixada ao papa Leão X, com o aparente objectivo primário de reiterar formalmente a homenagem e a obediência devida ao sucessor de S. Pedro.

Na sequência da eleição do papa Leão X, aproveitando a tradicional embaixada de obediência, para fazer desfilar pela ruas de Roma o exotismo dos diferentes mundos que estavam sujeitos ao domínio português.
Mostrava-se assim como um paladino da fé cristã, mostrando-se à Europa como o soberano que melhor servia os desígnios de Deus, levando a mensagem de Cristo a toda a parte.

Um faustoso cortejo ao som de trombetas e tambores surpreendendo, sobretudo, pela exótica encenação a que não faltou um magnífico cavalo persa, duas onças de caça e de um elefante que fazia diversas habilidades.

O embaixador era Tristão da Cunha um prestigiado navegador vencedor de infiéis noutros lados do Mundo.

Mas, para Leão X, o mais importante da embaixada esteve, com certeza, nas riquezas oferecidas, que somavam um valor entre 300 000 a 500 000 cruzados. Tristão da Cunha – que dirigia a embaixada – teve a sua primeira audiência com o papa a 20 de Março de 1514, mas seguiram-se outros encontros que concretizaram quase todos os objectivos de D. Manuel.