Passos Coelho apresentou uma proposta de revisão constitucional que dizia demais, demasiado cedo: ficámos a saber não apenas o seu programa de governo, mas até o regime político que desejaria. Em parte, o passo em falso resultará de excesso de confiança, também de ânsia de polarização face ao PS. Mas evidencia compromissos ideológicos e até corporativos reveladores.
A proposta tem sido sobretudo criticada, à esquerda, pelo conteúdo ideológico neoliberal (o fim da gratuitidade dos serviços públicos essenciais, ou a ainda maior flexibilização laboral). É uma agenda política quase desconhecida no país que não lê a blogo-esfera ou certas revistas da Católica. E Passos Coelho, sem nunca ter ido a votos, quer impô-la verticalmente, pela Constituição. Ora, eu não me recordo de Manuela Ferreira Leite ter proposto algo parecido.
A revisão de PPC tem ainda outras excentricidades, que têm sido pouco comentadas, como a equiparação de certos direitos e garantias das «pessoas colectivas» aos das pessoas singulares (incluindo o «direito ao bom nome» e direitos de privacidade que são desnecessários numa actividade económica). Ou ainda a constitucionalização de direitos para as empresas privadas de segurança (Ângelo Correia é o guru do ramo), e de poderes ao bastonário da Ordem dos Advogados (quem?). Sem esquecer a supressão do artigo 292º (punição dos agentes da PIDE/DGS).
Tudo considerado, creio que se tem subestimado o facto de a «eminência parda» da actual liderança do PSD ser Ângelo Correia (responsável por episódios sangrentos de repressão policial quando «Ministro do Interior»), e de a equipa de Passos Coelho incluir algumas figuras históricas da extrema-direita dos anos 80, como Paulo Teixeira Pinto e Carlos Blanco de Morais. Com Passos Coelho, o PSD está liderado por uma direita que ainda não fez as pazes com o regime democrático. E isso vê-se cada vez melhor.
6 comentários :
Excelente artigo.
Há maneira de bloquear este anormal - Ed Harris - que vem para aqui vender roupas?
Não, não há maneira de bloquear comentadores. Tenho estado a apagar os comentários dele um a um.
o ppc é demasiado novo para ter ficado ressabiado (até o ptp o é) com o 25 de abril. por isso mesmo, o diagnóstico afigura-se-me bastante pior: ideias destas brotarem do maior partido da oposição e não de um movimento marginal de malucos sugere que décadas de convivência e assistência europeia e pós-modernidade não purgaram o caudilhismo do nosso código genético.
aterrador.
Dorean,
o PTP é um «retornado». Esteve envolvido em movimentos de extrema-direita desde 1975 até ao final dos anos 80 (senão mesmo depois). E é monárquico em 2010, o que é o supra-sumo do ressabiamento. ;)
Aliás, o ressabiamento centenário dos monárquico é a prova provada de que não é necessário viver acontecimentos históricos para os ressentir...
dizes bem, que em 1910 ainda eu andava de cueiros e não é por isso que deixo de vos fazer um manguito e ao vosso centenário :))
mas, uma pergunta e um comentário.
que movimentos foram esses? (a opus dei não conta, já sabemos)
o comentário é que ser "retornado", principalmente na adolescência, nem é juízo de valor que se apresente nem é determinante para futuras parvoíces. aliás, no ano do "retorno", em 1975, e segundo a omnisciente wikipédia, o rapaz ainda andava no liceu...
(só tu para me fazeres entrar em defesa do ptp!)
Caríssimo Dorean,
no liceu, como dizes, o jovem Teixeira Pinto pertenceu à «Mocidade Patriótica», e depois, a partir de 1980, liderou a estrutura de juventude da «Ordem Nova». Tudinho aqui, pelos próprios:
http://pt.metapedia.org/wiki/Ordem_Nova_portuguesa
O contexto mais detalhado é dado neste artigo de 1983, onde PTP ainda é referido como «destacado quadro fascista»:
http://www.causanacional.net/index.php?itemid=375
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