segunda-feira, 8 de novembro de 2010

Quando será que a Helena Matos vai entender...

...que o Islão não tem a capacidade de influenciar as leis espanholas (ou portuguesas) que a ICAR tem? E que para mais não é subsidiado pelo Estado da mesma forma que a ICAR, e que não tem um «Papa» que seja recebido por chefes de Estado?

17 comentários :

JDC disse...

Não tem capacidade, por enquanto. Basta ver o que se passa em Inglaterra onde já há tribunais da sharia reconhecidos pelo Estado...
Além disso, a laicidade do Estado não é uma questão de forças: é uma questão de ideais.

Anónimo disse...

Peço que me explique, de uma vez por todas, onde está a grande ilegitimidade de uma religião tentar influenciar leis públicas.

Obrigado.

Ricardo Alves disse...

A finalidade da religião é satisfazer a espiritualidade dos indivíduos, não influenciar a política.

Ricardo Alves disse...

JDC,
essencialmente de acordo. O islamismo é um problema crescente na Europa. Mas duvido que alguma vez venha a ter a influência que a ICAR, por razões históricas (e cada vez menos demográficas) ainda tem.

Anónimo disse...

"A finalidade da religião é satisfazer a espiritualidade dos indivíduos, não influenciar a política."

Quem pode definir legitimamente a finalidade da religião?
O estado não pode. Isso implicaria que não fosse neutro em matéria religiosa, certo?

Se o Ricardo Alves é um gnóstico/maniqueísta que divide o que existe em espiritual e material, isso não é motivo válido para impor essa arbitrariedade a todas as religiões.

Ricardo Alves disse...

Uma religião, por definição, pretende assegurar conforto espiritual a quem a segue. Quem funda uma associação religiosa fá-lo para prosseguir esses fins. Não para influenciar a política.

O Estado limita-se a aceitar que uma religião é uma religião se os seus crentes assim dizem. Se chamarem «religião» à adoração de uma lâmpada ou de uma maçaneta, estão no seu direito. Se quiserem perseguir quem não adora lâmpadas ou maçanetas, já não.

Anónimo disse...

"Uma religião, por definição, pretende assegurar conforto espiritual a quem a segue."

Quem faz essa definição, o estado?
Lembre-se que a questão tem a ver com a sua posição de que a religião não se pode pronunciar sobre política. Quem faz essa distinção entre "espiritual" e "política"?
Onde está a legitimação jurídica disso?

"Quem funda uma associação religiosa fá-lo para prosseguir esses fins. Não para influenciar a política."

O Alves é que está a fazer essa disinção arbitrária. Alguém pode fundar uma religião com outros fins. Até para influenciar política. Aos olhos do estado, isso nunca pode ser visto como ilegítimo ou ilegal. O Estado é religiosamente neutro, logo não define funções da religião. Determinar que a religião não se pode pronunciar sobre "política", só faz sentido em estados confessionais, que determinam um papel oficial à religião. Aí sim, tal como os juízes têm de ser neutros, porque representam o estado; os líderes da religião oficial teriam de desempenhar as suas funções estatais religiosas, de forma isenta.

Os católicos até defendem " a César o que é de César", mas as questões políticas não são exclusivas de "César", do Estado. Existe uma coisa chamada sociedade civil, cidadania e individualidade.
A não ser em estados totalitários onde, por definição, o estado é tudo. Aí sim, há política oficial de estado e torna-se ilegal agir contra esta.

Por exemplo, se eu defender que o direito à vida é inviolável, só porque sou líder religioso não deixo de ter menos direitos para tentar influenciar leis públicas nesse sentido. Ou não vivemos numa democracia?

"O Estado limita-se a aceitar que uma religião é uma religião se os seus crentes assim dizem. Se chamarem «religião» à adoração de uma lâmpada ou de uma maçaneta, estão no seu direito.

Certo.
E o estado não é tudo. Não é o estado que distingue o que é "espiritual" do que é "político"; nem haverá neutralidade do estado se este passar a considerar que a "política" é restrita à influência do que arbitrariamente defina como "não-espirituais".

"Se quiserem perseguir quem não adora lâmpadas ou maçanetas, já não."

Quem quer perseguir quem?

Ricardo Alves disse...

Todos os Estados do mundo restringem de alguma forma a actividade religiosa. Não é por ser religiosa que uma determinada actividade passa a ser legal. Por exemplo, quem fundar uma religião que pratique sacrifícios humanos descobrirá rapidamente que essa prática está para lá da liberdade religiosa. E até nos EUA, onde existe mais liberdade religiosa do que talvez em qualquer outro país do mundo, se impede as igrejas de apoiarem candidatos políticos - porque não é essa a sua função (e a pena é justamente a retirada das isenções fiscais).

Dito isto, a pessoa X que é sacerdote ou seguidor da religião Z tem todo o direito de ter actividade política. Não o deve é fazer do púlpito/perante a congregação. E, se defender os valores políticos em que acredita, não o deve fazer a partir de argumentos religiosos. Porque a religião X (ou A ou L) só é uma referência para os seus seguidores.

O Obama, que muitos reaccionários odeiam (e com razão, do ponto de vista deles), disse-o bastante bem:

«What our deliberative, pluralistic democracy demands is that the religiously motivated translate their concerns into universal, rather than religion-specific, values. It requires that their proposals must be subject to argument and amenable to reason. If I am opposed to abortion for religious reasons and seek to pass a law banning the practice, I cannot simply point to the teachings of my church or invoke God's will and expect that argument to carry the day. If I want others to listen to me, then I have to explain why abortion violates some principle that is accessible to people of all faiths, including those with no faith at all.

For those who believe in the inerrancy of the Bible, as many evangelicals do, such rules of engagement may seem just one more example of the tyranny of the secular and material worlds over the sacred and eternal. But in a pluralistic democracy, we have no choice. Almost by definition, faith and reason operate in different domains and involve different paths to discerning truth.»

http://www.time.com/time/magazine/article/0,9171,1546298,00.html

(E neste parágrafo concordo totalmente com ele.)

JDC disse...

Ricardo Alves,

Acrescentando uma acha a esta fogueira: e se os elementos de uma religião se unirem e formarem uma associação/partido através do qual tentariam influenciar a política? Já é aceitável? Já é aceite? Se sim, então esta discussão é apenas sobre o vector através do qual a religião influencia a política. Se a reposta é não, então estamos a limitar a acção política dos que pertencem ou professam um credo.

Ricardo Alves disse...

JDC,
a questão é se formam um partido ou associação para defenderem rigorosamente os pontos de vista da sua religião *e* argumentando a partir da sua religião. Eu diria que se defenderem os valores em que acreditam, mas argumentando a partir de referências laicas, não haverá problema.

Note-se que houve um caso desses em Portugal: o «Partido da Gente» foi criado a partir de uma confissão religiosa, e aparentemente para defender os valores e temas dessa confissão. Mas confesso que não prestei a atenção suficiente à fugaz presença pública desse partido para poder dizer como argumentavam...

Ricardo Alves disse...

Já agora:
http://www.cne.pt/dl/lpartidos2003.pdf

(Ver o artigo 12º).

JDC disse...

Obviamente que a argumentação política nunca poderá ser "porque está escrito no livro XYZ". Mas nem todas as argumentações políticas são assentes em argumentos científicos, especialmente as questões sociais. Aí há sempre uma zona cinzenta cuja justificação é, em última análise, uma questão de ideologia, seja ela laica ou não.

Anónimo disse...

"O estado laico não se baseia na característica "religião" para conceder direitos ou impor deveres. Quando os neo-ateus exigem que a característica "religião" seja oficialmente reconhecida pelo estado, impondo-se um dever de silêncio à dita "argumentação religiosa", isso resulta de imaginarem que o estado tem de ter política oficial imune à religião. Não estão a defender o estado laico, mas precisamente o oposto: o ateísmo de estado"

http://neoateismoportugues.blogspot.com/2010/11/neo-ateismo-e-estado-laico.html

João Vasco disse...

Os EUA, por exemplo, são conhecidos pelo seu "ateísmo de estado".

João Vasco disse...

Ou não...

Ricardo Alves disse...

Eu opus-me à Lei da Liberdade Religiosa (entre outras razões) porque criava uma Comissão com o poder de dizer que associações são ou não religiosas. Continuo a pensar que o reconhecimento do carácter «religioso» (para nada dizer do «radicado») de uma agremiação através daquela Comissão é perverso. Penso que bastaria os responsáveis por uma dada associação dizerem que ela é religiosa para o Estado ter que reconhecer esse facto. Foi isto que disse mais acima no exemplo da maçaneta e da lâmpada.

Devo acrescentar que não conheço nenhum Estado, em todo o mundo, que não reconheça o carácter «religioso» de uma ou mais organizações.

E, como diz o João Vasco, os EUA não são excepção: reconhecem o carácter religioso de associações. Depois, há consequências. Boas: isenções fiscais. Más: não podem apoiar candidatos a eleições.

http://www.irs.gov/charities/charitable/article/0,,id=96099,00.html

http://en.wikipedia.org/wiki/501%28c%29

Não penso que isto transforme os EUA num «Estado totalitário».

Anónimo disse...

"Devo acrescentar que não conheço nenhum Estado, em todo o mundo, que não reconheça o carácter «religioso» de uma ou mais organizações.

Para impor os deveres e direitos que o Ricardo Alves gostaria de impor, só se for algum país comunista. E foi de imposição de deveres e direitos a que me referi.

Não é estranho que veja como vantagem da isenção fiscal das religiões, o seu silenciamento.
Além de que os EUA impedem apoio de candidatos ( o que não implica que isso, por serem os EUA a fazê-lo seja aceitável), mas o Ricardo Alves exige outra coisa pior: que os líderes religiosos não se possam pronunciar sobre "política"; como se o estado democrático definisse oficialmente aquilo que é político, do que é meramente religioso. Como se um estado devesse ter ideologia política oficial imune à religião, contra as liberdades cívicas mais básicas, como a de expressão.