Não é fácil escrever sobre as revoluções em curso nos países árabes. Ou tudo corre bem e se constituem democracias laicas na Tunísia e no Egipto (eventualmente alhures), e então recordaremos 2011 como o 1989 árabe, ou esses países caem no precipício islamista, como aconteceu em 1979 no Irão. Não me parece que haja solução intermédia.
As revoltas em curso não foram desencadeadas por forças islamistas organizadas (que, todavia, existem), e muito menos por partidos marxistas clássicos (mas há sindicatos). São, em grande parte, a obra de jovens socializados e politizados pela internet (incluindo o twitter e o facebook), que partilham a cultura política libertária globalizada. Dificilmente se imagina estes jovens voltados para Meca, mas o final de uma revolução não se descortina facilmente no seu início. Em qualquer caso, até ao final de 2011 saberemos se são válidas alguns dos pressupostos que dominaram o debate político sobre o islamismo, desde há mais de uma década (como «a democracia é impossível em países islâmicos», «a maioria dos muçulmanos apoia o jihadismo» ou ainda «a democracia exporta-se pela ocupação militar»).
Não acredito na capacidade preditiva de ideologia alguma. Prefiro olhar para a demografia, por detrás das multidões na rua. Tanto o Egipto como a Tunísia são países muito jovens: um em cada quatro dos tunisinos e um em cada três dos egípcios têm quinze anos ou menos. Na Tunísia, 94% dos jovens (15-24 anos) já estão alfabetizados, e a taxa de natalidade está em queda, já nos dois filhos por mulher. Dois terços da população está urbanizada. No Egipto, a taxa de natalidade ainda está nos três filhos por mulher, e só 43% da população está urbanizada. Parece mais fácil acreditar numa democracia laica na Tunísia do que no Egipto. E há ainda outra razão para ser mais optimista quanto à Tunísia.
O homem no filme é Habib Bourguiba, presidente da Tunísia a partir da independência, em 1956. Proibiu a poligamia, autorizou o divórcio e legalizou a IVG. Mais importante, promoveu fortemente o ensino público gratuito, obrigatório e não religioso. Em 1964, bebeu um sumo de laranja em público, em pleno Ramadão. Foi deposto por Ben Ali em 1987.
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