terça-feira, 21 de setembro de 2010

A «horrível perseguição religiosa» durante a 1ª República: o caso judaico

Demonstra-se até que ponto é verdade que os republicanos de 1910 laboravam para extinguir toda e qualquer forma de religião quando se analisa a forma como esses terríveis jacobinos do PRP trataram os cidadãos de religião judaica.
  • «Foi, de facto, a Primeira República que criou as condições para a legalização das comunidades judaicas. A Lei da Separação, publicada em 20/4/1911, era muito clara quanto à intenção do regime republicano em matéria de liberdade religiosa: "Artigo 2.º: A partir da publicação do presente decreto, com força de lei, a religião católica apostólica romana deixa de ser a religião do Estado e todas as igrejas ou confissões religiosas são igualmente autorizadas, como legítimas agremiações particulares, desde que não ofendam a moral pública nem os princípios do direito político português. Artigo 8.º: É também livre o culto público de qualquer religião nas casas para isso destinadas, que podem sempre tomar forma exterior de templo; mas deve subordinar-se, no interesse da ordem pública e da liberdade e segurança dos cidadãos, às condições legais do exercício dos direitos de reunião e associação e, especialmente, às contidas no presente decreto com força de lei."

    Finalmente, os judeus podiam surgir à luz do dia sem receios de perseguições, praticar livremente o seu culto, abrir as portas da sinagoga de Lisboa e pensar em construir novas sinagogas, agora com fachada para a via pública.

    A Comunidade Israelita de Lisboa (CIL) obteria a sua legalização a 9 de Maio de 1912, através de um alvará do Governo Civil de Lisboa. Como o regime republicano facilitava a reorganização da CIL, foram criadas várias instituições: o Boletim (1912); a Associação de Estudos Hebraicos Ubá-le-Sion (1912), organização cultural sionista; a Biblioteca Israelita (1914); o Albergue Israelita (1916), antecessor do Hospital Israelita; a Federação Sionista de Portugal (1920); a associação Malakah Sionith (1915), fundada por Barros Basto no Porto; a Escola Israelita (1922), obra de Adolfo Benarus; o Hehaver (1925), organização juvenil sionista, que desempenharia importante acção de apoio aos refugiados durante a 2.ª Guerra Mundial.
    » (Jorge Martins no Público)
(A sinagoga da Rua Alexandre Herculano, em Lisboa, foi construída num pátio amuralhado para evitar que a fachada desse para a rua, pois a Constituição monárquica proibia que as religiões dos «estrangeiros» fossem praticadas em edifícios com «forma exterior de templo».)

23 comentários :

Luís Lavoura disse...

É claro que os republicanos nada tinham que oprimir a religião judaica, nem qualquer outra exceto a católica.

Os republicanos combateram explicitamente a religião católica por temerem a influência política desta, e também o seu peso económico.

Das outras religiões todas os republicanos nada tinham a temer, portanto não se opuseram a elas.

Os republicanos combateram a religião católica, não porque fossem ateus militantes empenhados em destruir toda e qualquer religião, mas porque tinham contas a ajustar com essa religião em particular.

Ricardo Alves disse...

Luís Lavoura,
os republicanos «combateram explicitamente a religião católica»?

Chama «combater» exactamente a quê?

Instituir o registo civil, tornando possível nascer, casar e morrer sem dar os dados pessoais à ICAR?

Separar a Igreja do Estado, tornando possível tratar em igualdade católicos, ateus e judeus?

Instituir o divórcio?

Acabar com os juramentos religiosos nos tribunais, nas tomadas de posse e na recepção de diplomas académicos?

Dar igualdade à mulher e ao homem no casamento?

Explique-me lá o que é «combater». É que ainda hoje vejo a ICAR queixar-se de ser combatida quando se legisla sobre o casamento de pessoas do mesmo sexo.

E não tenho conhecimento de que a partir de 1910 se tenha impedido as pessoas de receberem os sacramentos da religião católica: baptismo, casamento, confissão, ir à missa, etc.

Não acredite na propaganda católica, Lavoura.

JDC disse...

Visto aqui: http://www.correiodabeiraserra.com/index.php?option=com_content&view=article&id=3305:a-questao-religiosa-na-primeira-republica-por-luis-torgal&catid=45&Itemid=91

"[...]O próprio ministro da Justiça e dos Cultos [Afonso Costa], numa «sessão branca» da Maçonaria, aberta a «senhoras» e outros «convidados», não podia ter sido mais explícito: «Está admiravelmente preparado o povo para receber essa lei» [Lei da Separação] e «a acção da medida será tão salutar que em duas gerações Portugal terá eliminado completamente o catolicismo, que foi a maior causa da desgraçada situação em que caiu».

Ora se era intenção do Governo eliminar completamente o catolicismo em duas gerações, como pode dizer que não pretenderam combater o catolicismo em particular?

João Vasco disse...

JDC:

O Ricardo Alves já escreveu neste espaço que Afonso Costa sempre negou que tenha alguma vez dito isso.
Como não sabemos que se era ele quem tinha razão ou quem lhe atribuiu tais palavras, não podemos assumir que essa frase é factual.

Claro que a desinformação não ajuda nada. Na exposição sobre os 100 anos da república na Cordoaria Nacional essa frase está exposta como se não existissem dúvidas quanto à sua autenticidade. Mas isso é desinformação.

JDC disse...

João Vasco,

Infelizmente não tenho tempo para me dedicar a estudar a História com rigor científico. Mas se há dúvidas quanto à veracidade dessa frase ficamos sem saber se houve ou não intenção de arrancar o catolicismo da vida nacional durante a 1ª República. Mas isso funciona para os dois lados, não permitindo afirmar que tal seja completamente mentira.

Porém, não me chocaria que tal fosse verdade. Afinal de contas, em cada revolução de paradigma há sempre excessos e posições extremadas. E a ICAR não é nenhuma santinha...

Anónimo disse...

Ou seja.. os republicanos foram os "bolsheviks" lusos

Luís Lavoura disse...

Ricardo Alves,

nada disso que você elencou é um combate à igreja católica.

Mas encerrar compulsivamente seminários e conventos, e expropriá-los, é. E foi isso que a Primeira República fez.

Ricardo Alves disse...

A FRASE, A FRASE, A FRASE!!!

JDC,
a frase que é atribuída a Afonso Costa foi desmentida pelo próprio em várias ocasiões.

1) Num discurso em Santarém (creio que em 1912 ou 1913).

«Os reacionários, à falta de argumentos, atribuíram-me a intenção de, servindo-me da Lei da Separação, querer acabar com a religião católica entre nós ao fim de duas ou três gerações! (...) A verdade não é que a República queira mal à religião católica ou outra, mas que aquela entrou numa fase de decadência, em Portugal e na Europa, por culpa dos seus servidores. Isto escrevi eu já em 1895 no meu livro «A Igreja e a Questão Social». A Lei da Separação, em vez de ferir a religião católica, pretende que ela viva à margem da agitação política e procure ressurgir, pura e respeitável, pela fé e bondade dos seus sacerdotes.»

2) Num discurso no Parlamento, em 1914.

3) Em correspondência em finais dos anos 20.

Que uma frase várias vezes desmentida seja tomada como símbolo da política de todo um regime, diz bem do poder da propaganda.

Finalmente, o maior desmentido provavelmente é o texto da própria Lei da Separação, que prevê o uso dos templos católicos pela ICAR durante 99 anos, bem mais do que duas gerações.

Ricardo Alves disse...

Luís Lavoura,
houve mais expropriações durante o liberalismo monárquico (principalmente em 1834) do que em 1910.

E o seminário que se encerrou em 1910 era estatal. Fazia parte da separação o Estado deixar de emitir graus académicos em teologia.

Ou o Luís Lavoura acha que as universidades do Estado devem ter licenciaturas em teologia, astrologia, etc?

JDC disse...

Ah, o próprio AC desmentiu a própria frase! Já parece o Fidel Castro a desmentir que tenha dito que o sistema comunista já não servia nem aos cubanos.

Repare que ninguém diz que isso defina todo um regime mas define (ou definiria) uma intenção que, a ser verdade, não me espantaria nada! A si espantaria?

Ricardo Alves disse...

Sim, espantar-me-ia. A política da 1ª República face à ICAR, mesmo durante o Governo Provisório, não foi uma política de «extinção». Foi uma política de separação. As pessoas que caracterizam essa política a partir de uma frase solta e apócrifa, e não a partir de legislação assinada, publicada e implementada, deveriam reflectir seriamente no que estão a fazer.

Lucas disse...

Se a I República não fosse vincadamente anti-cristã, ela não seria objecto de louvor por parte dos militantes ateus. Isso é óbvio.

Os Republicanos espanhóis foram mais bem sucedidos na sua matança de cristãos:

Não só isso, mas num único ano (1936) ateus espanhóis mataram 6,832 membros do clero Católico, “mais do dobro das vítimas da Inquisição durante 345 anos.”

Num único ano os ateus conseguiram superar – e dobrar – o número de mortes causado pelo mais horrífica matança feita por “cristãos”.



http://www.newoxfordreview.org/reviews.jsp?did=1108-gardiner

Lucas disse...

Além disso, o facto de (aparentemente) a I República ter facilitado a vida aos judeus não refuta a posição que afirma que a natureza ateísta de tal "República" via a religião em geral, o cristianismo em particular, como inimigos a combater.

Atiraram uns amendoins a religiões que provavelmente nem chegavam a 5% da população (e desde logo, não constituiam ameaça política) mas trataram de controlar a fé da esmagadora maioria dos portugueses.

Anónimo disse...

"Não só isso, mas num único ano (1936) ateus espanhóis mataram 6,832 membros do clero Católico, “mais do dobro das vítimas da Inquisição durante 345 anos.”"

A Inquisição só matou isso?? Tás brincando???

Ah... fale também dos crimes do clero

Lucas disse...

Stefano,
Sim, aparentemente a Inquisição não é bem aquilo que é propagado pela maioria dos órgãos de (des)informação ao serviço do ateísmo nos dizem.

Mas é normal entre os esquerdistas re-escrever a História como forma de validar as suas crenças.

Ricardo Alves disse...

Mats,
a sua visão quer da 1ª República quer do ateísmo é caricata. Existem muitos ateus que não querem convencer ninguém a renunciar à religião. A maior parte dos que eu conheço não defende que o Estado seja «anti-cristão», como o Mats sugere. Mas suspeito que o Mats tem um conceito um bocado abrangente de «anti-cristianismo»...

Considere o caso das igrejas protestantes. Também não consideraram a 1ª República «anti-religiosa», e até acharam que se a Lei da Separação era injusta, o era por ainda deixar a ICAR com privilégios.

Conhece o «Memorial das Igrejas Protestantes a propósito da Lei da Separação da Igreja do Estado»?

«Exmº Sr. Ministro da Justiça:-Os abaixo assinados, representantes das diferentes igrejas cristãs evangélicas, vulgarmente chamadas protestantes, estabelecidas no território da República, tendo tomado conhecimento da Lei da Separação da Igreja do Estado, de 20 de Abril último, agradecem e folgam por tudo o que aquele diploma consigna a favor da liberdade de consciência, mas pedem licença para expor respeitosamente algumas dúvidas e dificuldades que o estudo da mesma lei lhes sugeriu, esperando de V. Ex.ª os necessários esclarecimentos e providências.

A doença de S. Exª o Sr. Dr. Afonso Costa, que sentimos e cuja debelação temos pedido a Deus, fez, a par doutros obstáculos, que fossemos adiando este nosso agradecimento e exposição.

Como os prazos da lei se aproximam, julgamos não dever adiar por mais tempo este nosso memorial e por isso o passamos a fazer.


A lei visou evidentemente a estabelecer direitos iguais ou semelhantes para os crentes das diferentes confissões religiosas. Se, porém, alguns artigos não forem interpretados convenientemente, este fim, sem dúvida um dos mais belos da lei, não será atingido. Não queremos já referir-nos aos privilégios de que ainda fica gozando a Igreja Católica Romana, que entra na vigência da nova lei com milhares de templos construídos, com bens de alto valor, com recursos de toda a ordem, tudo cedido gratuitamente pelo Estado que ainda lhe garante seminários privilegiados e avultada subvenção, traduzida em pensões para o seu clero. Limitamo-nos a fazer referência aos seus direitos, que ficaram garantidos por a lei ter em vista principalmente a maneira de ser católica.

Impedida por todos os modos a nossa natural expansão e oprimidos por uma perseguição desleal, que não deixou que o país conhecesse os nossos princípios e a nossa organização, achamos natural que a lei em muitos pontos desconheça a nossa maneira de ser, mas estamos certos de que a intenção que presidiu à elaboração do decreto de 20 de Abril há-de ouvir as nossas razões e deixar tudo equitativamente esclarecido.

Vamos dar a V. Exª uma ideia rápida da nossa organização.

As igrejas protestantes, tendo como único fundamento o Evangelho puro de Cristo, são essencialmente democráticas, chegando algumas a nem ter ministério organizado.

(…)

Impedidas até agora de possuir templos próprios por falta de capacidade jurídica, as igrejas protestantes portuguesas que conseguiram reunir algum pequeno capital, edificaram-nos como sendo propriedades de particulares.»

Lucas disse...

Ricardo Alves,

a sua visão quer da 1ª República quer do ateísmo é caricata. Existem muitos ateus que não querem convencer ninguém a renunciar à religião.

Eu também não disse que todos os ateus querem convencer o resto da humanidade a renunciar as suas convicções religiosas. Mas há ateus que pensam que o mundo seria bem melhor se todos nós fossemos ateus como eles.

A maior parte dos que eu conheço não defende que o Estado seja «anti-cristão», como o Mats sugere.

Irrelevante. Não estamos a falar da maior parte dos ateus que o Ricardo conhece pensam, mas das acções e atitudes da I República em relação à fé subscrita pela maioria da população portuguesa.

Considere o caso das igrejas protestantes. Também não consideraram a 1ª República «anti-religiosa», e até acharam que se a Lei da Separação era injusta, o era por ainda deixar a ICAR com privilégios.

Mas uma coisa não se torna verdade só porque alguns protestantes o afirmam. Se é assim, e como eu também sou aquilo que vocês considerariam um "protestante", eu posso dizer que a I República era anti-cristã (para evitar desambiguidades, anti-católica).

Eu, como protestante, estou mais ou menos ciente do que era viver imerso num país fortemente católico onde o protestantismo era visto com maus olhos. Compreende-se que os protestantes de então vissem com bons olhos a diminuição da influência do catolicismo na cultura portuguesa, tal como os judeus viam com bons olhos o mesmo facto.

A questão, claro, não é o que as religiões minoritárias pensavam do que a I República estava a fazer à igreja Católica, mas sim se a I República era ou não anti-católica.

As evidências parecem suportar a segunda.

Digo mais, se os protestantes fossem uma força política suficientemente capaz de influenciar a população, garanto que a I República faria leis contra os protestantes, da mesma forma que fez leis contra o Catolicismo.

Anónimo disse...

Mats,A República não é bem aquilo que é propagado pela maioria dos órgãos de (des)informação ao serviço da igreja nos dizem.

Anónimo disse...

Mats.. sabia que a Inquisição politico-catolica matou mais de mum milhao de pessoas na Croacia de Pavelic... com as bençaos de Pio XII ?

Lucas disse...

Stefano,
sabia que a Inquisição politico-catolica matou mais de mum milhao de pessoas na Croacia de Pavelic... com as bençaos de Pio XII ?

O facto da "inquisição político católica" ter (alegadamente) morto mais de um milhão na Croácia anula o facto da I República ter sido anti-católica?

Se vamos usar essa linha de pensamento, permita-me que lhe faça esta pergunta: sabia que a inquisição politico-ateísta de Stalin matou mais de 20 milhões de seres humanos? Já ouviu falar em Holodomor e a fome que o ateu Stalin causou na Ucrânia? Sabia que o maior genocida da História da humanidade foi o ateu Mao Tse Tung? O seu "Salto em Frente" foi um total desastre que causou mortes em números assombrosos.

Mas.....nada disto anula o que a I República fez.

Ricardo Alves disse...

Mats,

«Eu também não disse que todos os ateus querem convencer o resto da humanidade a renunciar as suas convicções religiosas.»

Pois não, o que disse foi: «Se a I República não fosse vincadamente anti-cristã, ela não seria objecto de louvor por parte dos militantes ateus».

Ou seja, estabeleceu um nexo de causalidade entre ser ateu em matéria de convicção e ser politicamente «anti-cristão». Acontece que, ao contrário do que acredita, nem todos os ateus pretendem que o Estado seja anti-cristão, e muito menos são defensores dos totalitarismos estalinista ou maoísta. A maior parte, actualmente, limita-se a defender a laicidade do Estado.



«Mas uma coisa não se torna verdade só porque alguns protestantes o afirmam.»

Totalmente de acordo. ;)

«(...) como eu também sou aquilo que vocês considerariam um "protestante", eu posso dizer que a I República era anti-cristã (para evitar desambiguidades, anti-católica).»

Não foi essa a opinião dos protestantes/cristãos evangélicos que viveram nesse período. Pode ser a sua opinião cem anos depois, mas não era a opinião dos vossos nessa época.

«Compreende-se que os protestantes de então vissem com bons olhos a diminuição da influência do catolicismo na cultura portuguesa, tal como os judeus viam com bons olhos o mesmo facto.»

O que viram com bons olhos foi a liberdade de associação e de expressão: poderem difundir as vossas ideias.

« se os protestantes fossem uma força política suficientemente capaz de influenciar a população, garanto que a I República faria leis contra os protestantes, da mesma forma que fez leis contra o Catolicismo.»

Pois. E «garante» com base em quê? Na sua convicção pessoal? No que ouviu os media dizer?

Francamente, Mats. Deu-se ao trabalho de estudar o período? De entender qual era o status quo anterior? Quais eram os grupos em luta? O que foi feito e como reagiram as pessoas e os grupos?

Estude que o estudo nunca se perde...

Anónimo disse...

Na frente da "democracia" católica... que imperou a ferro e fogo em PT durantes seculos.... a República é um modelo de liberdade!!

José Gonçalves Cravinho disse...

Tanta discussão sôbre a questão da
existência da biblico-judaico-cristã Religião que afinal assenta
suas bases na invencionice na vigarice,como todas as Religiões e Deuses criados pelo Homem à sua imagem e semelhança.