A liberdade de expressão é, no mínimo, eu poder pegar num cartaz e passeá-lo no centro da cidade. No máximo, é ninguém me incomodar por aquilo que lá escreva. A liberdade de expressão não é eu ser dono da TVI, director do Público, ou ter livre acesso a um qualquer órgão de comunicação social.
Portanto, não: o caso da hipotética-compra-da-TVI-pela-PT-para-afastar-uma-ex-deputada-do-CDS-e-seu-salazarista-marido não é um problema de liberdade de expressão (em sentido estrito). É uma luta de poder pelo monopólio da comunicação social de massas. Ninguém impede Manuela Moura Guedes, Mário Crespo ou José Manuel Fernandes de começarem a escrever no 31 da Armada, n´O Insurgente ou no Blasfémias (olha, o último vai fazer isso mesmo...). A sua liberdade de expressão está portanto garantida. O que a actuação de Sócrates condiciona, a confirmar-se tudo, é o alinhamento dos telejornais, as manchetes do Público e a condução de entrevistas. O que é muito e será grave. Mas manda a verdade que se diga que a interferência dos governos é apenas uma das várias pressões sobre a comunicação social. Nunca dei conta que os media fossem realmente independentes do poder económico. E não vejo como deixarão de sê-lo tão cedo.
A manifestação anunciada tem várias curiosidades: ser convocada para uma quinta-feira à hora de almoço (os patrões vão dar dispensa aos trabalhadores?); um manifesto mal amanhado e confuso; ser na Assembleia da República (seria mais adequado outro local, dados os objectivos); e o pitoresco cromatismo azul e branco (FCP?).
Enfim, se Sócrates afirma que «nunca o Governo deu nenhuma orientação à PT para comprar nenhuma estação de televisão», ou está a mentir e deve demitir-se, ou fala verdade e alguém nos anda a enganar. De qualquer modo, o parlamento vai funcionar (provavelmente sem resultados). Mas se o problema é Sócrates, a solução é Cavaco. O que deveria ser dito explicitamente.
13 comentários :
Venha agora a opinião do xuxialista Ricador Schiappa!
:-)
O argumento de "ninguem impede de" continuar a escrever num blogue ou na China é perigoso...Pode até ajudar a justificar algumas atrocidades cometidas no nosso passado recente ou em certos regimes "musculados" do nosso tempo.
Há, de facto, uma diferença entre querer controlar a comunicação social e violar a liberdade de expressão. No caso PT/TVI houve uma tentativa de controlar a com. soc. e no caso Mário Crespo a liberdade de expressão de um comentador foi condicionada e o seu artigo foi censurado. Tudo isto me parece bastante grave. E tenho pena que muito boa gente, que se diz defensora da liberdade, neste caso se dê ao trabalho de pensar em "atenuantes" ou até em questões de semântica para desculpar estes atentados aos valores mais básicos pelos quais se pautam a democracia...
É claro que Mário Crespo pode sempre ir escrever para um blogue. Poderá também escrever noutros jornais. Até, talvez, possa atirar panfletos de um avião ou escrever para um jornal francês...Parece-me é que hoje, tal como em outras ocasiões, nada justifica o que se passou...
E gastar o dinheiro do estado em compras que têm como objectivo o interesse político do partido no poder parece-me igualmente grave, independentemente de Sócrates ter mentido a esse respeito.
É realmente revoltante.
FB,
é tudo bastante grave, e é evidente que não há grande liberdade de expressão quando o Estado controla toda a comunicação social (vidé Bielorrússia).
A questão é que Mário Crespo, Manuela Moura Guedes e outros (José Manuel Fernandes) nunca foram deontologicamente irrepreensíveis, como não foram, geralmente, ideologicamente isentos.
É verdade que Sócrates, a confirmar-se tudo, fez uma canalhice das grandes.
Mas quando é que eu vou ter oportunidade de me manifestar contra a TVI, o Público de JMF, ou outros meios de cs que sempre foram francamente manipulatórios, negaram o contraditório, e fazem campanha encoberta por quem lhes paga ou por quem lhes convém?
Caro Ricardo Alves,
No caso do telejornal da TVI todos nós sabemos que nunca foi deontologicamente exemplar. E o que dizer do da RTP, que serve sistemáticamente o partido que está no poder? É claro que M.Moura Guedes fazia o seu "jogo" de forma mais aberta e mais provocatória...Mas no fundo nada disso é o que está em causa...
No caso Mário Crespo a coisa parece-me extremamente grave. É que o homem, naquele caso concreto - e muito embora saibamos que Crespo é um "opositor" ao governo de Sócrates - estava a escrever um artigo de opinião...E foi censurado!
Depois não podemos esperar isenção ideologica dos jornalistas (e muito menos dos colunistas dos jornais). Isso é um mito bem português (talvez de meados da década de noventa, arrisco dizer). Para além disso nunca ninguém foi controlado ou censurado por ser ideológicamente isento,
Acho que qualquer um se pode (e deve) manifestar contra quem quiser, quando quiser. Nos casos que referiu, até podia, como aconteceu inumeras vezes no "Público", enviar para lá uma critica ao director que, certamente, será publicada...Penso ter lido cartas a criticarem JMF na secção do "provedor" ou nas cartas ao director. Para além disso se fosse colunista de outro jornal ninguém lhe podia retirar o direito de o fazer.
Cumprimentos,
Francisco Brito
Caro Francisco Brito,
no Público tive uma história exemplar em que publicaram uma versão intencionalmente distorcida da posição de uma associação a que pertenço, recusaram-me o direito ao contraditório, negaram-se a corrigir factos errados que assinalei na parte noticiosa, e como cereja no topo do bolo ainda publicaram sete ou oito artigos de opinião baseados na montagem que tinham fabricado. O provedor nunca respondeu.
Quanto a RTP/TVI, a primeira tem programas de opinião bastante mais amplos e diversificados. Notar, por exemplo, os programas de debate em que há um representante de cada partido parlamentar, o que nunca acontece na TVI ou, sequer, na SIC (que todavia é melhor do que a TVI).
E recordo-me bem da forma indigna como o Mário Crespo tratou o Gualter Baptista (por quem não tenho a menor simpatia), ou do modo meloso como entrevista representantes do clero.
Portanto, o que está em causa, pelo menos para mim, não é apenas as canalhices e jogadas que se presumem ao tandém Sócrates/Vara/Zeinal Bava. O que está em causa, também, é que os mesmos mediocratas que têm cuspido na deontologia e na isenção se andam a fazer de virgens. E para os vestir de branco, não contém comigo. Eles fizeram, fazem e farão o mesmo que o Sócrates queria que outros fizessem no lugar deles. Só que ao poder económico desculpa-se tudo, não é?
Duas perguntas: o 31 da Armada, O Insugente ou o Blasfémias pagam salários para que esses jornalistas possam viver? O Esquerda Republicana - só por curiosidade - também contrata jornalistas a recibo-verde ou estagiários? É que isto da liberdade de expressão parece um assunto tão vago...
Sabe bem qual é a resposta, Hugo, e é mesmo esse o problema (e não a liberdade de expressão).
Caro Ricardo Alves,
Não pessoalize. Como o Ricardo Alves sabe o "Público", com todos os seus defeitos, já publicou criticas ao seu director, aos seus cronistas, à forma como foram dadas notícias, etc.
No caso da RTP, não era dos programas de opinião de que eu falava. É da maneira como se faz o alinhamento das notícias do telejornal (que, como deve calcular, tem muito mais audiência sozinho do que os dois programas "políticos" juntos que a RTP tem...). Virgens na comunicação social não os há em lado nenhum. Nem em Portugal nem lá fora. Aqui o que há (e eu acho mal) são disfarces...
Não queira comparar um "plano" para controlar a comunicação social com a falta de rigor ou de isenção de alguns (ou muitos) jornalistas. Na minha opinião, aquilo que Sócrates tentou fazer é bem mais grave e por vários motivos, que penso que nem será necessário enumerar...
O que Sócrates fez, a confirmar-se, será gravíssimo.
Mas imagine que era assim...
Um grande empresário é sistematicamente atacado por um dado órgão de comunicação social, que ameaça revelar os podres do seu grupo económico. Como não lhe agrada a situação, combina-se com uns amigos da empresa A para comprar a empresa B que detém o tal órgão de comunicação social. O jornalista que o irrita é despedido. Meses depois, sabe-se tudo através de escutas telefónicas.
Resultado: toda a gente diz que não se passa nada, que é o mercado a funcionar.
Conclusão: os grandes empresários podem fazer o que quiserem, os políticos não. E até está certo, na minha opinião, porque não foram eleitos por nós. O problema é que isto não acaba no fortalecimento da democracia. Acaba na oligarquia por interposta democracia representativa.
Realmente a relação dos grandes grupos empresariais com a comunicação social é sempre bastante complexa...
Mas será que pequenos jornais independentes sobreviveriam sem os apoios do Estado ou a publicidade de grandes grupos empresariais?
O que é importante é que o nosso Estado regule e consiga impedir negócios que tenham por objectivo calar um jornal ou jornalista (penso que isso nunca aconteceu, mas posso estar enganado) e o mesmo Estado não deve ter qualquer tipo de interferência na comunicação social (excepto a regulação)...
Confirmo: o governo não concorre com grupos privados nem tem as mesmas responsabilidades.
Os governos têm a obrigação de cumprir a constituição e assegurar a pluralidade, concorrência saudável e respeito pelas leis a todos os órgãos de comunicação social. Historicamente faziam-no através do ministério competente para o efeito e prestavam um mau serviço embora sempre tenham tido o pudor de não interferir às claras no sector privado. Hoje em dia delegaram grande parte dessas funções numa ERC que está à vista de todos que não cumpre a sua missão nem parece que tenha sequer poderes para tal. LAteralmente existe ainda a autoridade da concorrência, que se dedica a fazer estudos de 9 meses para justificar que há concorrência saudável em todo o lado.
Não havendo sistema de controlos democráticos a funcionar, resta à democracia deixar-se ficar refém de quem faz o que lhe apetece desde que "formalmente" não esteja a cometer nenhum crime.
Isto até chegar ao ponto em que tudo gangrena e só com uma bomba atómica se consegue resolver alguma coisa. É nesse ponto que estamos: a batota é evidente e foram apanhados alguns pelintras em flagrante delito. Quem tiver a bomba atómica nas mãos tem que demitir todos os flagrados ou estará a ser cúmplice.
Se eu fosse o Pinto da Costa processava os manifestantes. Usar o azul e branco para aquela palhaçada?? Isso é ofensa ao bom nome do clube!
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