segunda-feira, 20 de fevereiro de 2012

A gritaria do “Prós e Contras” dos engenheiros

Finalmente vi (e tenho tempo de escrever sobre...) o “Prós e Contras” de há uma semana, sobre a política energética (e a eletricidade em particular). Ex-colegas de governo (de Cavaco Silva) agora em lados opostos da barricada: a favor da aposta nas energias renováveis, Nuno Ribeiro da Silva, Carlos Pimenta e Oliveira Fernandes; contra os encargos que tal aposta tem representado, e que se têm refletido na fatura do consumidor, Mira Amaral, Clemente Pedro Nunes e o inevitável Patrick Monteiro de Barros. Seis convidados. Seis engenheiros; pelo menos quatro deles do Técnico. Antigos alunos e antigos professores. O resultado foi uma gritaria e uma agressividade entre os convidados como nunca me recordo de ter visto, nem mesmo em programas com temas muito mais “fraturantes” como sobre o aborto ou o casamento de pessoas do mesmo sexo.
É provavelmente o resultado de se ter um debate entre tantos engenheiros. Embora a discussão fosse à partida política, resvalou muitas vezes para aspetos técnicos. Ora em ciência, e mesmo em ciência aplicada como a engenharia, não há lugar à mera opinião pessoal, baseada em valores, como em política. Se um cientista (e aqui incluo também os engenheiros) afirma algo que vê como um facto científico e é desmentido, então para ele o seu interlocutor só pode ser ou ignorante ou desonesto. Daí as discordâncias serem vistas como ataques pessoais. Daí tanta agressividade.
Eu diverti-me imenso a ver.
Analiso agora as prestações dos diversos intervenientes, começando pelos “Contras”.


Mira Amaral revelou o pior da academia portuguesa antes do 25 de Abril, hierarquizada, autoritária e profundamente avessa à investigação e à inovação. É exatamente o mesmo Mira Amaral de vistas curtas que conhecemos do tempo em que era ministro de Cavaco Silva: para ele a melhor, ou mesmo a única, solução para um problema é sempre a mais barata a curto prazo (mesmo que a longo prazo o barato saia caro). Mira Amaral, ele próprio, é uma boa síntese do cavaquismo. A forma como se tentava superiorizar recordando a Carlos Pimenta o que lhe ensinara (enquanto assistente nas aulas práticas – Mira Amaral nunca se distinguiu como académico) e acusando Oliveira Fernandes de “não perceber nada de eletricidade” levou-me a desejar que alguém lhe pusesse um lápis à frente e exigisse que ele escrevesse as equações de Maxwell (ou pelo menos dissesse quantas são as equações de Maxwell). Aposto que não saberia.
Clemente Pedro Nunes teve uma atitude semelhante, e com uma agravante: chegou ao ponto de afirmar que estava ali a “representar o Instituto Superior Técnico”! Isto é gravíssimo por três motivos: quem pode representar o Instituto Superior Técnico é a sua direção; e isto é somente em assuntos académicos: o IST enquanto instituição não tem opinião sobre política energética. Acresce que Pedro Nunes nem sequer pertence ao quadro do IST: é professor convidado. Mas, tal como Mira Amaral, foram apresentados no programa enquanto “professores do Instituto Superior Técnico”, algo que para eles deve ser um biscate (curiosamente, ainda ontem, menos de uma semana depois, Mira Amaral era apresentado como presidente da comissão executiva do banco que adquiriu o BPN numa entrevista ao Diário de Notícias). Nunca vi ninguém promover-se à custa do Instituto Superior Técnico como estes dois senhores fizeram. A meu ver desprestigiado, neste debate, saiu o Instituto Superior Técnico, e mais desprestigiado ainda ficará se não reagir.
O nível de Patrick Monteiro de Barros vê-se quando, na última intervenção do programa, que lhe cabia encerrar, tentou promover a energia nuclear, quando mais ninguém lhe poderia responder (e depois de nunca ter abordado o assunto no programa). Claro está que foi logo interrompido (aos berros) por Carlos Pimenta. O populismo do mesmo senhor Barros nota-se por se autodesignar como aquele que falava sempre “em nome do Zé e da Maria que queriam pagar eletricidade mais baixa”, ao mesmo tempo que falava naturalmente em “carpaccio” para dar um exemplo. Talvez o Giovanni em Itália consuma o carpaccio, mas não será certamente o Zé português. Nem todos vão ao Cosa Nostra, senhor Barros.
Quanto aos “prós”, Oliveira Fernandes e Nuno Ribeiro da Siva defenderam as posições, o primeiro de uma forma mais apagada, o segundo de uma forma mais tecnocrática, mas não excessivamente. Esteve bem, embora tenha tido uma saída profundamente infeliz, nestes tempos de crise, ao afirmar que para as pessoas mesmo que a eletricidade só custasse um cêntimo seria sempre cara (foi o único a ser vaiado). Finalmente... Carlos Pimenta. Eu já tinha boa impressão do senhor; depois deste debate, passei a adorar o homem.

3 comentários :

Rui Curado Silva disse...

"Finalmente (...) tenho tempo de escrever sobre"

eu ainda nao cheguei aos finalmentes. Ja comecei, mas ainda nao acabei de escrever sobre o assunto. Publicarei tambem aqui

Maquiavel disse...

Percebeste mal... o senhor disse "gaspacho"!

(...)

Patrick Monteiro de Barros naquilo que se chama um "momento Susaninha".

Luis Rainha disse...

Olha que o Casa Nostra não é bem o Tavares :-)