Os políticos, muitas vezes, crêem-se omnipotentes (ou tentam-nos convencer de que o são). Estou tão habituado que ao ouvir falar dos «alertas» (sic) do Presidente sobre o «inverno da natalidade», ou de medidas avulsas (mas talvez valorosas) dos autarcas, só sorrio. Porque a queda da natalidade é uma tendência com já meio século de duração: o último alto pico de nados vivos em Portugal foi em 1962 (220 mil); desde aí, tem sido o que se vê do lado direito do gráfico (em 2011, baixámos até aos 97 mil). Note-se bem: há 50 anos havia guerra colonial, ditadura e o palerma de Santa Comba Dão. Depois, houve uma revolução, acabou a guerra, morreu o Cerejeira, instaurou-se a democracia, vieram os «retornados», entrou-se na CEE, passámos de país de emigrantes a país de imigrantes e, finalmente, chegámos à crise do euro. Não deve ter havido primeiro ministro (na ditadura, na revolução ou na democracia) que não tenha prometido «apoiar a natalidade». Foram dezanove e, sinceros ou não, com boas ou más ideias, pouco puderam fazer para inverter a tendência de algo que resulta de um somatório de dezenas de milhar de decisões individuais nada fáceis e muito íntimas.
Todavia, a natalidade não é completamente indiferente à política: do lado esquerdo do gráfico vêem-se bem os dois anos da pneumónica e os anos em que a segunda guerra mundial realmente afectou Portugal (porém, acontecimentos bem para lá do controlo dos políticos nacionais). E, por outro lado, o pico do ano 2000 (que tem o seu lado cómico) não seria possível sem a (relativa) prosperidade da viragem do século. Se realmente os nascimentos este ano caírem para os 90 mil ou para os 80 mil (!), será um sinal (mais um) da crise económica. Mas também «apenas» o agravamento de uma tendência que é de muito longo prazo.
Todavia, a natalidade não é completamente indiferente à política: do lado esquerdo do gráfico vêem-se bem os dois anos da pneumónica e os anos em que a segunda guerra mundial realmente afectou Portugal (porém, acontecimentos bem para lá do controlo dos políticos nacionais). E, por outro lado, o pico do ano 2000 (que tem o seu lado cómico) não seria possível sem a (relativa) prosperidade da viragem do século. Se realmente os nascimentos este ano caírem para os 90 mil ou para os 80 mil (!), será um sinal (mais um) da crise económica. Mas também «apenas» o agravamento de uma tendência que é de muito longo prazo.
7 comentários :
Este gráfico é falacioso, Ricardo. Tens que subtrair o efeito da mortalidade infantil, que era elevadíssima antes de 1974. Se subtraísses as crianças que morrem, esse gráfico teria um aspeto muito diferente.
Tens que comparar com a esperança média de vida, que só tem vindo a subir. E no entanto a população recentemente começou a decrescer. Este é um fenómeno recente.
Não Filipe, não me parece que o gráfico seja falacioso. Em 1960 a mortalidade infantil era 80 por mil, hoje é 3 por mil. O que significa que a subtracção que sugeres iria baixar o pico de 1962 de 220 mil para 202 mil. Sendo relevante, o gráfico não teria um aspecto muito diferente: os planaltos do lado esquerdo seriam um pouco mais baixos...
E não, a população não está a decrescer. Do censo de 2001 para o de 2011 crescemos de 10,36 milhões para 10,56 milhões.
Independentemente de a tendência ser, de facto, de longo prazo, ela não deixa de ser perturbadora. Por um lado, pela escala da imigração que seria necessária para manter estável a população do país, e para manter a sua juventude. Por outro lado, porque a queda demográfica implica uma queda no crescimento económico, o que leva a que as dívidas se tornem impagáveis.
Sim, é perturbante. E tem variadas consequências. Na segurança social, por exemplo. E não é exclusiva de Portugal.
Entre ~1964 e ~1974 a taxa de mortalidade infantil cai de uma forma apróximadamente linear de cerca de 70 por mil para cerca de 38 por mil. Nesse periodo, a queda anual desta taxa é práticamente linear. Contudo, a distribuição da taxa de mortalidade desde 1960 até ao presente pode ser descrita apróximadamente por uma exponencial decrescente, com "vida média" de ~9,6 anos o que quer dizer que ao fim deste período a taxa de mortalidade se terá reduzido para metade.
Assim, e especialmente para o período em que a taxa de mortalidade infantil cai "linearmente", a taxa de natalidade deve ser corrigida pela taxa de mortalidade infantil para podermos ter uma ideia mais clara do efeito da taxa de natalidade na população. O gráfico do Ricardo não é falacioso, apenas não conta a história toda.
referência para os números acima em : http://www.pordata.pt/Portugal/Taxa+bruta+de+mortalidade+e+taxa+de+mortalidade+infantil-528
Patrícia, a «história» que eu queria contar era mesmo a do número de nascimentos. Não era a dos nascimentos subtraídos da mortalidade infantil, que já é outra história.
Quando se fala em «inverno demográfico» ou «quebra de natalidade», é mesmo da diminuição do número de nascimentos que se está a falar. Que é um fenómeno bem real em Portugal, como se vê no gráfico...
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