quinta-feira, 15 de junho de 2006

Da esquerda e da direita blasfémica

O Blasfémias anda a pensar sobre a direita numa série de recentes posts do Rui A. e do CAA. (1, 2, 3, 4). O primeiro desta série é inspirador não pelo valor do post em si, mas pelo seu cáracter sintomático primeiro do diagnóstico errado que a direita faz tantas vezes sobre a sua condição histórica, e segundo pela defesa cocha das maravilhas do liberalismo absoluto. Se pode resumir o que ali se diz nos seguintes pontos:
  • Historicamente a direita foi reduzida, e em geral aceitou ser reduzida, pelo discurso de esquerda a uma força de tirania e opressão dos mais fracos.

  • A corrente de direita que primeiro buscou sair desta redução foi a da democracia cristã europeia, incorporando no seu discurso parte do discurso socialista de esquerda.

  • As formas de política social de Estado circuladas pela esquerda (e por parte da direita conservadora) são, sempre e intrinsecamente, ineficientes e contra-producentes, gerando mais pobreza que aquela que pretendiam reduzir ou acabar.

  • O liberalismo econômico é a forma mais justa e eficiente de distribuição de riqueza e justiça social.

  • O liberalismo econômico é, portanto, o melhor caminho para a direita sair da redução realizada sobre ela pela esquerda.
###Os dois primeiros pontos pertencem ao que poderíamos chamar o pensamento histórico, enquanto os pontos seguintes pretendem ser uma defesa das qualidades do liberalismo econômico tal qual. Se pensamos mais detentivamente sobre a questão histórica percebemos que se escapam ao autor muitas coisas importantes. Primeiro, o discurso da esquerda tem dois momentos fundamentais da sua construção, o iluminista e posteriormente o socialista. Com o iluminismo o discurso de esquerda surge precisamente para organizar ideologicamente a luta contra a opressão e a tirania de facto, e não se realizou aqui redução nenhuma. Foi a direita, sempre e quando não se afastou dos valores autoritários, que se reduziu a si mesma, e não apenas em termos de discurso, à tirania. Aliás grande parte da legitimação ideológica da direita como discurso possível, e não apenas como força autoritária, é possibilitado pela definição, mais ou menos rigorosa, de um discurso de esquerda ao qual criticar. No momento socialista a esquerda reformula ou aperfeiçoa o seu discurso como resposta ao pensamento econômico que conceituava o sistema capitalista em nascimento. Se era natural que a esquerda, coerente com o seu pensamento original de justiça social e combate à opressão, pensasse as desigualdades ainda presentes no sistema capitalista, terá cometido o erro na sua forma mais radical de identificar todas as desigualdades, em geral endêmicas às sociedades humanas, como fruto exclusivo do sistema capitalista. A social-democracia e o socialismo europeu moderado surgem precisamente em grande parte como correcção a estes erros cometidos pelo discurso socialista da esquerda radical. Hoje em dia quase todos os discursos da esquerda ocidental incorporam, de forma mais ou menos completa e coerente, estes elementos de correcção inseridos pela social democracia.

A direita liberal que, com maior ou menor sucesso, se desvinculou dos valores conservadores autoritários, e que já estava presente no pensamento econômico dos primeiros pensadores não socialistas do capitalismo, afirma a sua total confiança nas benesses do capitalismo. Pelo menos na sua forma mais radical defende que o mercado distribui naturalmente a riqueza e executa a justiça social de forma espontânea, graças às suas regras internas de competição. O pensamento de direita do laissez faire tendo parte de razão, na sua forma absoluta ganha contornos de pensamento mítico, e termina por manter traços do autoritarismo ideológico passado, ao negar o direito de crítica e correcção do mercado por parte das maiorias sociais ao avaliar o seu desempenho. Por outro lado dizer que os Estados sociais actuais são totalmente falhados, e geraram mais pobreza que a que pretendiam corregir, é absurdo e falso. A maior parte dos Estados sociais europeus geraram mais bem estar geral do que nunca se sonhou em nenhum momento da história mundial, e esta é uma percepção generalizada das sociedades destes Estados. Que situações demográficas e de economia mundial criem actualmente conjunturas econômicas que obriguem estes Estados a repensar em parte as suas regras e revisar a sua dimensão em algumas áreas, não anula que, para a maior parte dos cidadãos destes Estados, a ideologia que os levou onde estão continue a ser a que, juntamente com o bom senso, serve de base para o modelo social desejado.

O Estado não é em si mesmo bom, e pela sua natureza não participa em geral de um sistema que o obrigue estructuralmente de forma eficiente a maximizar o seu rendimento. A esquerda na sua maior parte já reconhece esta situação, mas reconhece também que é o Estado o único agente que de forma sistemática e democrática pode definir uma política de justiça social que para a esquerda é essencial. A direita não conseguirá reconquistar status moral duradouro por via do marketing liberal, neste aspecto é seguro que terá muito menos sucesso que a tão criticada, por ela própria, corrente da democracia cristã. Para provar de forma credível estar realmente preocupada com a justiça social, a direita tem que necessáriamente incorporar no seu discurso instrumentos para a levar a cabo, e não outorgar a um mercado impessoal a sua responsabilidade. Quando o faça provavelmente se descubrirá social-democrata, mas isso seguramente é motivo suficiente para que os indefectíveis do liberalismo econômico estejam agora a dizer-me "então o melhor é não fazer".

18 comentários :

rui a. disse...

Apenas dois reparos:

- Não existe «liberalismo económico» ou «absoluto» (o que pressuporia um curioso «liberalismo relativo»), mas liberalismo, enquanto sistema filosófico complexo e, admito, susceptível de várias interpretações;
- Situar historicamente as origens da esquerda política e ideológica no iluminismo é um erro de palmatória. recomendo-lhe a (re) leitura da «Sociedade Aberta» do Popper.

Cumprimentos,

Rui Fernandes disse...

Amigo eu li o livro não te preocupes e ainda assim mantenho o momento iluminista como fundamental para a definição do discurso da esquerda moderna. As palmatórias já não se usam... Assim não chegam lá.

Pedro Viana disse...

Bom post, Rui. Para mim a diferença entre Esquerda e Direita consegue-se reduzir a um aspecto essencial, que não só se encontra quando se recua até ao iluminismo mas "desde a alvorada da espécie humana": o modo como o Poder (de todo o tipo, "político, económico, social") deve estar distribuído.

A Direita defende que o Poder deve estar nas mãos daqueles que o merecem.

A Esquerda defende que o Poder deve estar igualmente distribuído.

Há obviamente inúmeras posições intermédias, e inúmeras diferentes justificações para cada posição, e ainda mais políticas diferentes preconizadas para atingir esses objectivos. Mas os objectivos são esses, e não encontrará ninguém na Direita que lhe diga que não há pessoas que merecem mais (Poder) do que outras: por nascimento, por serem mais fortes, por serem da religião certa, por serem mais competentes no mercado, por serem mais inteligentes, por serem mais bonitos. Na óptica da Direita há sempre quem mereça mais do que outro, nem que seja porque sim.

Rui Fernandes disse...

As origens estão desde as alvoradas dos tempos não tenho dúvida, mas aquilo que me refiro é à sistematização do discurso da esquerda moderna. Por isso a situei no Iluminismo, que pela sua importância e amplitude me parece destacável frente a todos os inevitáveis antecessores. Já agora obrigado por achares que é um bom post. Mas olha que um bom post não deveria ser um com o qual se concorda, e tão pouco um mal post deveria ser um com o qual se discorda... :) Abraço!

cãorafeiro disse...

lamento bastante que este blog agora esteja a dar voz ao blasfémias, em vez de reflectir sobre os valores da esquerda republicana sem cair na tentação de fazer comparações, como antes sucedia.

além disso, para quem abre o blog mas não carrega na secção »ler mais» apenas encontra as ideias dos blasgfemos.

péssima táctica, é a minha opinião. além disso, o post está cheio de frases caras que o tornam quase ininteligível, e sobretudo, desadequado para a linguagem própria dos blogs.

inclui ainda elementos falaciosos como o uso da expressão moderados e radicais para qualificar as diferentes correntes da esquerda, o que reflecte uma mentalidade dominada por um binário: nós/moderados/bons eles/radicais/maus.

como ate´calha que fui classificada como pertencendo a um blog de esquerda radical, não posso deixar de alertar para o simplismo excessivo de tal categorização.

e sobretudo, não traz nenhum elemento de reflexão sobre a profunda crise em que a esquerda europeia se encontra. não é assim que se defende a superioridade da esquerda.

Pedro Viana disse...

Rui, eu disse que era um bom post não necessariamente porque concordo com tudo que nele é dito, até porque estou de acordo com o que o cãorafeiro diz. Em particular, parece-me que o Rui muitas vezes está mais interessado em atacar a Esquerda Radical do que em desmascarar os propósitos da Direita, exactamente numa lógica de "nós/moderados/bons eles/radicais/maus". Nesse aspecto este post é "equilibrado", e por isso o considerei bom.

Já fui leitor regular do Balsfémias, e assíduo nas caixas de comentários. Julguei que lá encontrava uma Direita Liberal (não necessariamente moderada) com quem seria possível dialogar, ao contrário de outros sítios como o Insurgente. Enganei-me. Na sua grande maioria, com algumas excepções (como o Gabriel), são completamente surdos à argumentação de com quem dialogam, não sendo capazes de admitir quaisquer erros ou inconsistências no seu pensamento. Não têm dúvidas, principalmente o João Miranda. E com fundamentalistas não vale a pena dialogar, no sentido intelectual do termo.

Acho que é mais importante e proveitoso as pessoas que partilham diferentes sensibilidades e ideias à Esquerda dialogarem, porque o seu objectivo é (genericamente) comum, apenas diferindo no modo de o atingir, do que tentar dialogar com a Direita. Não quer dizer que não se ouça, ou consteste, o que a Direita diz, e nesse aspecto este post é importante, é apenas uma questão de prioridades.

Continuando no tema do post, um dos resultados da diferente atitude Esquerda/Direita perante onde o Poder deve residir, é a intrínseca aversão da Direita ao conceito de Democracia. Numa Democracia plena todos temos igual poder político, independentemente de qualquer tipo de "mérito", porque o voto vale o mesmo. E a decisão maioritária tomada através do voto é soberana. Só por si, tal estado de coisas é uma anátema para a Direita. Mas ainda pior se torna pelo facto de através do poder político ser possível redistribuir o poder económico e social. Se é leitor regular do Blasfémias já deve ter encontrado várias ocasiões onde se torna claro que o neo-liberalismo ali dominante explicitamente afirma que não são aceitáveis certas decisões tomadas democraticamente, porque vão contra uns certos "direitos naturais" que só eles têm capacidade para decidir quais são.

Ricardo Alves disse...

«cãorafeiro»,
de vez em quando também se pode criticar a direita. Sempre se varia... ;)
Quanto aos «direitos naturais», acho que merecem um «post». É essa a raiz do autoritarismo daquela gente.

Rui Fernandes disse...

O problema é tanta gente pensar em termos tácticos... Não estou para aqui a escrever manuais de guerrilha nem a fazer comentários de futebol! Em vez de falar-se do conteúdo do post se fala como se estivessemos em uma reunião partidária ou como se fossem donos do livro branco de estilo dos blogs todos, pfffff...

Rui Fernandes disse...

Já agora, Pedro, eu quando critico alguma esquerda (chaves, etc) não o faço para a direita me ouvir, mas para ti, o cão rafeiro, etc (falo em sentido figurado...) O mesmo quando critico o Hamas... Afinal estou precisamente a dialogar com a esquerda. Para a direita o que digo nestas ocasiões é demasiado brando para lhes interessar. Algumas vezes sinto que há por aí tanta gente para dar porrada na direita que a maior parte das vezes termino prefirindo não chover sobre o molhado. Simplesmente. O que escrevo termina sendo um trabalho sujo, eu sei. Mesmo para muitos dos que concordando comigo prefeririam que não desse armas ao inimigo, mas será que eles não percebem que o que tento é destruir as armas que o inimigo já tem contra a esquerda.
Mas não me mitifico, é um trabalho sujo que dá gozo fazer.

cãorafeiro disse...

ricardo, criticar a direita é um dever de cidadania. só não sou favorável a que se faça uma comparação nestes moldes, porque isso só favorece a direita, embora indirectmamente.

a esquerda tem quilos de problemas, precisamente porque se deixou levar pela direita. como se fosse uma dança, em que de repente a esquerda passou a permitir que apenas a direita conduzisse o par.

isto não significa que não tenha achado este post um exercício interessante. simplesmente, parece-me que faz, involuntariamente, por via da comparação esquerda direita, um elogio à direita.

nem toda a direita é blasfémica. a direita que escreve ou se revê no blasfémias não é democrática. a direita neo-liberal não é democrática.

RUI, é fundamental termos sempre presente os aspectos tácticos quando queremos fazer passar uma mensagem, caso contrário, podemos estar a subverter involuntariamente o próprio conteúdo da nossa mensagem.

o que convém é não confundir a táctica com a estratégia, e a estratégia com os objectivos.

Pedro, precisamente: a direita blasfémica não é democrática.

ricardo, os direitos naturais são o nome politicamente correcto para mascarar as teorias que antigamente se chamavam do direito divino.

basta ver que os maiores defensores de tais direitos naturais são também quem mais guerra faz às noção de UNIVERSALISMO, o qual assenta não em qualquer coisa extra-humana, mas na presunção de igualdade da dignidade de todos os seres humanos. e a direita tem horror à igualdade.


quanto ao meu estilo, espero que não tenha ofendido pela agressividade.

cãorafeiro disse...

sobre o liberalismo económico: sempre que se lhe apontas falhas, tens como resposta que AINDA NÃO FOMOS SUFICIENTEMENTE LONGE, logo, a solução passa por mais liberalização... onde é que eu já ouvi isto?

(pois, na URSS)

""#$ disse...

"sistematização do discurso da esquerda moderna"

Sem pretender ofender alguém, mas isto acima é o quê?
Esquerda moderna?????
Isso existe onde?
Pessoalmente sou um simplista. Existe esquerda democrática e direita democrática.
Embarcar na multiplicidade de definições apenas pelo prazer imenso da masturbação intelectual é um jogo sexualmente agradável ao nível da química do cerebro, mas ,desculpem lá, mas é jogar o jogo dos "teologos de direita liberais" que se desmulttiplicam em teorias novas a cada 24 horas.

Sem pretender ofender ninguém ,mas nem toda a direita é estilo blasfémico porque aquilo não é direita nem é coisa nenhuma.
Para lá disso é um blog com ideias anti democracia e logo ai, pessoalmente nem os considero como de "direita" porque a direita "normal" é a favor da democracia.
Tem um fundo comum de valores com os democratas de esquerda.
O blasfémias e a corrente de chicos espertos que está por detrás deles é outra coisa.

Quanto a uma afirmação do cãorafeiro acerca de o blog "armadilha" ser de esquerda radical, o "culpado" é o ricardo alves... Lavro o meu veemente protesto...por isso.
Até porque este ano atravessei sempre em passadeiras e nunca fui a nenhuma manifestação.

Rui Fernandes disse...

Eh pá... ca granda confusão!!! Eu nunca disse que a direita do blasfemias era a unica direita... Pelo contrario! Alem do mais nao existe uma direita blasfemias, já que andam por ali pelo menos uns tres tipos de direitas distintos.
Na volta o JPP vai ter razao e isso de esquerda e direita é uma dor de cabeça desnecessaria...
O que é certo e concordo com o Pedro Silva é que me sinto muito mais proximo de varias pessoas de direita que de outras de esquerda precisamente pela questao democratica.
Quanto a masturbações, olhe que nem tanto. Pelo menos andamos aqui umas cinco pessoas em sensualidades mutuas. Isto esta virando uma grande orgia ideologica. Quando começar a cheirar demasiado a suor paro.

Ricardo Alves disse...

1. Lamento muito se magoei alguém com as classificações que fiz na coluna da direita. Já me chamaram a atenção para isso umas quatro ou cinco vezes, geralmente por email. Nesses casos, mudei a classificação dos blogues em questão.

2. No «Blasfémias» existe pelo menos um democrata sincero (o CAA). E existem algumas pessoas (CL, LR, Gabriel Silva)que escrevem tão pouco ou tão obliquamente (estão no seu direito) que não sei dizer. Depois existe um defensor do Estado Novo que considera a nossa Constituição «totalitária e repugnante» (o Rui), e o João Miranda (que só vê «teoria liberalista» à frente).

""#$ disse...

Ricardo alves:
eu estou profundamente magoado pela classificação do armadilha.
Já me vergastei dentro duma banheira só por causa disso. Quando muito na barra direita doesquerdarepublicana deveria lá existir um unico "letreiro " a dizer "esquerda inclassificavel" ou " esquerda difícel fora do comum" e por baixo "armadilha para ursos conformistas - mas ainda ao lado a palavra "talvez".

Ou então um "letreiro" com "estes gajos".
Assim sim, estariamos mais ou menos classificados. ::::)

""#$ disse...

Ricardo alves:
Quanto ao blasfémias
Cocnordo com a apreciação do CA,apesarde o tipo ser um pouco grunho(pouco???) ,e parcialmenet do gabriel silva.
Dos outros dois não.Parecem-me totalitários até Às orelhas,à mesma.
O que assina rui tresanda a salazarismo recalcado até Às orelhas e o miranda é do mais demagógico ,arrogante e pseudo liberal que se pode mandar fazer...

""#$ disse...

Rui fernandes:

""O que é certo e concordo com o Pedro Silva é que me sinto muito mais proximo de varias pessoas de direita que de outras de esquerda precisamente pela questao democratica. ""

Este é O GRANDE PROBLEMA.
A esquerda "normal" está cheia de pessoas que não acreditam uma grama em democracia.
E hostilizam, por exemplo, pegando no assunto de outra maneira, este blog - esquerda republicana, que, sob um certo ponto de vista considerado é um pessimo blog para essa gente de "esquerda".
Porque, mesmo sendo "pequeno" faz sombra e fala, normalmente de alguns temas que são mesmo de esquerda.
Enquanto que blogs "oficialmente" de esquerda e cheios de "figurinhas" de esquerda
tem um discuso e uma pose anti democracia e anti esquerda notórias, pelo menos para quem tem atenção. Embora à primeira impressão pareçam democratas com alvará( dois exemplos: blogs bicho carpinteiro e canhoto...).

E isto caro rui fernandes coloca outra questão: porque é que o caro amigo se sente mais próximo de pessoas de direita, às vezes, em termos de democracia do que de pessoas de esquerda(a mim sucede-me o mesmo)?
Como o defeito não é obviamente seu,(nem meu) porque o rui está correcto ao achar que se deve ser democrata e defender a ideia de demcoracia, então o problema estará no facto de essas pessoas "estarem" à esquerda e terem conseguido nicho de mercado lá.
Logo impõe-se a questão: Porque é que a esquerda proporciona nichos de mercado a este tipo de gente?

Não será porque o conceito de "tolerancia à esquerda" e de democracia e do que ele deve ser está completamente errado e desajustado da realidade?

Tomemos o caso do ps como exemplo: em idos dos anos 90 receberam de braços abertos as folhas secas do pcp.
Ninguém veio acresentar nada de substantivo ao ps, daquela fornada de psudo génios reciclados em democracia.
Actualmente, em menor escala e com as respectivas diferenças temporais e de situação política, o ps está a abraçar pessoas que sairam do bloco de esquerda.

Mas um partido que se proclama de "esquerda" pode viver com isto?
E pior, para mim, é o facto de ,em ambos os "fenómenos" de transição,as pessoas novas,os récem chegados, terem adoptado um discuso e uma pratica ainda mais "papistas que o papa".
E seguirem a pseudo corrente de esquerda do PS actual, que tresanda a liberalismo até ao pescoço.
E estas pessoas apenas se comportam como caçadores de poder.
Um partido de esquerda à sério tolera isto?
E julga que isto não lhe causa problemas na percepção dos cidadãos em relação a estes recrutamentos?

Mais, caro rui: Cada vez que vou a alguns blogs de esquerda oficiosa, regara geral ,quando o discurso nao é idiota e desajustado da realidade, é completamente protofascista.
Quando não é protofascista, é "maleável" e "adaptável" ao nicho de mercado do momento da espuma dos dias.

Lamento muito, mas como "eleitor de esquerda", que só uma vez na vida votou no psd,e por razões muito especificas derivadas da eleição em questão, esta cambada não me inspira confiança nenhuma.

Existem demasiados arrivistas e acima de tudo, existe gente que não tem quaisquer valores de esquerda nem sabe o que isso é.

O problema, caro rui, é o seguinte: estando o caro rui certo acerca de achar que a democracia é um valor a defender, porque é que, nota (tal como eu) que existem pessoas de direita que são mais apegadas a valores democráticos do que pessoas de esquerda?
Isto é desconfortável, e muito incomódo.
Mas significa,que a esquerda foi capturada por neoliberais e por escroques.
A esquerda oficial. Diga-se.
Porque é que foi capturada por escroques?

cãorafeiro disse...

ricardo:

não me ofende, e, pelo contrário, lisongeia-me o facto de o meu blog ter sido classificado como esqureda radical, sobretudo porque olho para a secção esquerda moderada, e não queria ver o meu blog que publico com tanto carinho misturado com os blogs ditos de esquerda moderada.

em algumas coisas, sou radicalmente moderada, noutras sou radicalmente radical. o meu lema é »tudo com moderação, principalemnet a moderação« (plágio de uma máxima zen que diz tudo com moderação, incluindo a moderação.

o problema está em que o uso das palavras radical e moderado revela em geral uma manipulação baseada na capacidade de catalogar.

por exemplo: o musharraf do Paquistão é um líder moderado, porque é apoiado pelos EUA. o mesmo para o presidente do Egipto...

o Sadam era moderado quando andava a gasear os curdos e passou a radical quando invadiu o Kuwait.

O Milosevic era moderado quando negociou Dayton, e passou a radical quando a NATO decidiu bombardear a Sérvia.

muitos outros exemplos poderiam ser dados.

ou seja, quando classificamos alguém como radical ou moderado estamos sempre a dar poder a alguém, uma vez que a moderação é um valor socialmente aceite e o radicalismo condenado.

os radicais geralmente alinham neste jogo, porque têm nisso o seu nicho de mercado. o que seria do Bloco de Esquerda se agora passasse a ser visto como moderado? assim sendo, alinham com o jogo que os empurra para as margens, para corresponder ao desejo de um certo eleitorado de ter a ilusão de que não faz parte da grande massa indiferenciada, desejo este que é satisfeito pelo voto no BE, embora não se traduza, na maioria das vezes, por uma atitude perante a vida em que ponham em prática os ideais a que fazem menção de aderir.