segunda-feira, 17 de setembro de 2007

Um pouco mais de coragem

O Henrique Raposo critica a mutilação genital feminina (MGF) e atribui-a ao islão. Ora, como sublinham a Shyznogud e o Tiago Mendes, a MGF está longe de ser exclusiva do islão. A excisão do clítoris é praticada entre cristãos etíopes, judeus da mesma região e animistas. O que não diminui a monstruosidade da prática, nem iliba o islão (ou as outras religiões envolvidas), de responsabilidade: todas estas religiões partilham a fobia (ou terror) pelo prazer das mulheres, e a MGF é útil a cada uma delas para manter a sexualidade feminina controlada. Conclusão: não é a partir de uma ou outra destas religiões que se critica a MGF, mas sim a partir de conceitos exteriores às religiões (como a liberdade individual ou o direito das mulheres ao prazer).

No entanto, se a excisão do clítoris não é um mandamento religioso, mas sim uma tradição cultural de várias etnias africanas, já a mutilação genital masculina (circuncisão) é um mandamento religioso comum ao judaísmo e ao islão. Tem a sua justificação religiosa na «aliança» mitológica estabelecida entre «Deus» e Abraão no capítulo 17 do «Génesis». Não tenho a menor dúvida de que se trata também de uma prática abjecta, quando feita a crianças e sem razões médicas, e que deveria ser condenada pela lei de qualquer país civilizado. A circuncisão pode conduzir à morte (mesmo quando realizada em países medicamente avançados), e, embora não impossibilite o prazer sexual em todos os circuncisados, limita-o para toda a vida (diminui a área do pénis de que se pode tirar prazer, dificulta a masturbação numa maioria de circuncisados, e pode causar várias disfunções sexuais, incluindo a impotência). Quem se preocupa com uma mutilação genital, deveria preocupar-se, em boa lógica, com a outra. Ou será que quem nasce numa religião abraâmica perde o direito à sua integridade física?

[Diário Ateísta/Esquerda Republicana]

3 comentários :

Shyznogud disse...

Como no outro post sobre MGF que escrevi linkei um texto em se falava também na circuncisão masculina estive quase, quase para falar disto. Acabei por não o fazer porque a conversa surgiu por achar que os "esquecimentos" do henrique raposo estão demasiado ligados a islamofobia para q se justificasse grande dispersão temática.

João Moutinho disse...

Essa da circunsição conduzir á morte achei um pouco "forçado". Na ralidade já li versões diferentes sobre o efeito desssa prática baseando-se ambas em suportes científicos.
Mas como acredito que Paulo foi um iluminado acho que o melhor mesmo é deixar as coisas como estão.
Mas gostava de deixar claro que não há nada no Alcorão ou "Hadith" que justifique a excisão feminina.
Mal comparando, não vamos acreditar que alguém por ser comunista quando lhe nasce uma filha entende não haver mal em lançá-la ao rio (triste prática na China, por exemplo).

Ricardo Alves disse...

João Moutinho,
a circuncisão conduz à morte em casos raros (infecções generalizadas). Parece-me evidente que é uma estupidez submeter crianças recém-nascidas a um risco desses por razões religiosas ou culturais. E não me importa muito que haja ou não justificação teológica para estas práticas bárbaras. O importante é que terminem.