segunda-feira, 5 de março de 2012

Sahida


No que se define hoje como território nacional já se falou celta, latim, árabe, galego-português e apenas no reinado de Afonso II se escreveu o primeiro documento oficial em português. Em 1882, no ano em que foi colocada esta placa junto ao Elevador do Bom Jesus de Braga era assim que se escrevia saída: sahida. O primeiro acordo ortográfico (ao qual se opôs Fernando Pessoa) entre a Academia das Ciências de Lisboa e a Academia Brasileira de Letras entrou em vigor em 1911, tendo eliminado o h em posição medial do verbo sair, no seu capítulo III:

III - [letra h em posição medial]
É eliminada a letra h do interior de todos os vocábulos portugueses, com execpção do seu emprêgo, como sinal diacrítico, nas combinações ch, lh, nh, com os valores que as seguintes palavras exemplificam, e únicamente para êles: chave, malha, manha. Portanto, escrever-se hão, sem o h, inibir, exortar, etc., e, semelhantemente, sair, coerente, aí, proìbir, etc.


O novo acordo começou a ser trabalhado em 1985, há mais de 25 anos. Neste acordo mudam de grafia 2 703 palavras. No Brasil mudam 1254 (~ 1% do total das palavras) e perde-se um acento: o trema. Nos restantes países de expressão portuguesa mudam 2 264 palavras (cerca de 1,75% do total).
Já escrevo e escreverei segundo as regras do novo acordo ortográfico. Ouvi e li especialistas, uns contra outros a favor. A favor ouvi argumentação bem fundamentada e contra o acordo ouvi sobretudo muita descarga de fígado contra o multiculturalismo, o "dantes é que era bom" e histórias de sofisticada intriga internacional. Pessoalmente preferia que a nossa língua adotasse regras semelhantes ao castelhano, italiano, alemão e línguas eslavas, em que não há ambiguidades entre a escrita e a fonética. Demos um passo nessa direção mas ainda estamos longe. Do ponto de vista estético tenho mais reservas, faz-me confusão escrever ótimo em vez de óptimo, apesar de já ter interiorizado quando escrevo em língua italiana - a herdeira direta da nossa língua mãe, o latim - a escrita de ottimo e de Egitto. Dou razão a um amigo italiano especialista em latinas, quando me relembra que o português e o romeno são as línguas latinas mais conservadoras.

6 comentários :

São Canhões? Sabem mesmo a manteiga... disse...

em 1923 ainda a clássica editora
de A.M teixeira& filhos

se escrevia cyclopicos kalifas mouros
sugestivos apuntos
polychromias immensas d'uma corôa heraldica e bronchitica d'hombros

anno apoz anno

bibliotheca e restaurant theatro d'outr'ora
gente mazomba exhaustante

affonsinho como ella
typo..crenspe lisad

Maquiavel disse...

Pois é, Rui, eu mais depressa escreveria "ottimo" do que "ótimo". Os italianos foram bem inteligentes, as consoantes "mudas" simplesmente foram duplicadas, e assim continuaram a sua funçäo de acentuar a vogal precedente... eliminando também a necessidade de acentos!

Com efeito, em termos de correspondência fonética-ortografia o italiano é a 2.a do mundo, só atrás do... finlandês! Relativamente às línguas eslavas, só se falares do serbo-croata, porque no russo imensos "O" säo lidos como "A", p. ex.o.

A minha opiniäo sobre o AO é que se ele servisse para algo mais que chatear eu apoiá-lo-ia. Como näo é assim, retiro daqui:
http://abibliotecadejacinto.blogspot.com/2009/08/o-acordo-ortografico-e-o-futuro-da.html

J.Silva disse...

Duas notas;

1º em 1911 não tivemos um acordo ortográfico, tivemos uma alteração profunda e unilateral da ortografia em Portugal feita à revelia do Brasil. Durante mais de 20 anos, no Brasil, continuou a ser usada a ortografia clássica;

2º A reforma de 1911, ao contrário do que diz, correspondeu a uma profunda castelhanização do português. Uma dessas evidências (entre outras) foi esta coisa de deixar de usar os "ez" finais para aproximar do "és" final em espanhol. E assim, escrever inglez, que era identitatário e ajustado à pronúncia, hoje daria mt jeito pq evitava dois toques extra no teclado para escrever palavras com este sufixo, fora as vezes em que não pode ser usado o assento e a palavra fica com um "aspeto estranho".

Miguel Carvalho disse...

Rui, estou contigo no que toca à crítica aos críticas do AO. A crítica do Pessoa (poderias ter posto no texto a citação) ao AO antigo deve calar quem agora fala em assassinato da língua. Se daqui 50 anos houver novo debate, esses mesmos estarão a defende o AO que agora criticam, por amor "ao antigamente, quando tudo era bom".

Mas este AO nem sempre ajuda a aproximar a ortografia da fonética, criando ambiguidade em muitos casos. É verdade que não lemos o C em ArquiteCtura, mas o C indicava onde estava a sílaba tónica. Em termos de ambiguidade aproximámo-nos do inglês, onde não basta saber como se escreve, é preciso saber como se lê. Arquitetura não se lê Arquitetura, mas sim Arquitétura.

J.Silva disse...

Miguel, está confuso.
O "c" em arquitectura não assinala a sílaba tónica. A sílaba tónica é a penúltima.
Pretensamente o "c" assinala que aquele "e" átono é aberto. Na verdade, esta assunção é falsa, o português está cheio de átonas abertas que não têm nenhuma consoante muda para as abrir.
Exemplos: especular, invação, etc.
Foi mais um erro reforma de 1911.

Miguel Carvalho disse...

Silva, claro! Eu queria dizer aberta, e escrevi tónica. Obrigado.

Quanto às átonas abertas, não tinha reparado que já existiam casos anteriores.