sexta-feira, 31 de outubro de 2008

Guerra ao Halloween

Fala-se na guerra secularista ao Natal, ou na forma como o consumismo e o comércio tiraram lugar às verdadeiras razões pelas quais o Natal é celebrado. Mas todos se esquecem do Halloween, vítima dos mesmos problemas. O The Onion aborda o assunto:

quinta-feira, 30 de outubro de 2008

Os últimos ratos abandonam o barco...

Francis Fukuyama, no American Conservative:

"I'm voting for Barack Obama this November for a very simple reason. It is hard to imagine a more disastrous presidency than that of George W. Bush. It was bad enough that he launched an unnecessary war and undermined the standing of the United States throughout the world in his first term. But in the waning days of his administration, he is presiding over a collapse of the American financial system and broader economy that will have consequences for years to come. As a general rule, democracies don't work well if voters do not hold political parties accountable for failure. While John McCain is trying desperately to pretend that he never had anything to do with the Republican Party, I think it would a travesty to reward the Republicans for failure on such a grand scale.


McCain's appeal was always that he could think for himself, but as the campaign has progressed, he has seemed simply erratic and hotheaded. His choice of Sarah Palin as a running mate was highly irresponsible; we have suffered under the current president who entered office without much knowledge of the world and was easily captured by the wrong advisers. McCain's lurching from Reaganite free- marketer to populist tribune makes one wonder whether he has any underlying principles at all.

America has been living in a dream world for the past few years, losing its basic values of thrift and prudence and living far beyond its means, even as it has lectured the rest of the world to follow its model. At a time when the U.S. government has just nationalized a good part of the banking sector, we need to rethink a lot of the Reaganite verities of the past generation regarding taxes and regulation. Important as they were back in the 1980s and ’90s, they just won’t cut it for the period we are now entering. Obama is much better positioned to reinvent the American model and will certainly present a very different and more positive face of America to the rest of the world. "

quarta-feira, 29 de outubro de 2008

As crianças não querem "medicina socialista"

As sátiras do The Onion costumam ser excelentes.

Esta notícia relata um estudo que demonstra que as crianças, devido às suas convicções ideológicas favoráveis ao mercado e contra o socialismo, querem o fim da protecção do estado no que respeita à sua saúde:

terça-feira, 28 de outubro de 2008

Novos tempos. Novas vias?

  • Manuel Alegre: "Que fazer agora? Os defensores do Estado mínimo, ideologicamente derrotados, pedem a intervenção do Estado. Para quê? Suspeita-se que para manter o que está e socializar as perdas. O problema é que, se tudo ficar na mesma, as mesmas causas produzirão os mesmos efeitos. (...) A esquerda tem de integrar e debater, no seu pensamento próprio, os princípios e os instrumentos possíveis de regulação da globalização: o combate à predação das multinacionais que localizam e deslocalizam investimentos a seu bel-prazer, a taxação das transacções financeiras internacionais, a abertura dos mercados dos países desenvolvidos às exportações oriundas dos países em vias de desenvolvimento, a travagem da proliferação dos off-shores, o combate à economia 'suja' dos tráficos de pessoas, drogas e dinheiro, o combate à exploração de mão-de-obra infantil, escrava ou sem quaisquer direitos sociais, e à degradação ambiental. (...) Uma nova esquerda só poderá nascer de várias rupturas das diferentes esquerdas consigo mesmas. Ruptura com as práticas gestionárias e cúmplices do pensamento único. Ruptura com a cultura do poder pelo poder e com o seu contrário, a cultura da margem pela margem, da contra-sociedade e do contrapoder."
  • Mario Soares: "Como já escrevi nesta coluna, não basta injectar dinheiro, muito dinheiro - como tem sido feito - para a crise ser debelada. Porque a especulação continua e há gente a ganhar muito dinheiro com a crise. A crise é sistémica - é preciso que as pessoas tomem consciência disso - foi o neoliberalismo que entrou em falência e a globalização desregulada, os paraísos fiscais e a especulação desenfreada que daí decorrem e continua. Portanto, não é voltando a encher os bolsos aos maiores responsáveis que podemos resolvê-la. É preciso uma mudança também global do sistema, mudar o modelo económico - o capitalismo na sua fase financeira e especulativa, de tipo virtual - para voltarmos à economia real, com os pés fincados na terra, lutando contra as desigualdades sociais, a pobreza e em defesa do planeta, ameaçado. (...) O socialismo democrático, que trouxe à Europa a paz - e os "30 gloriosos" anos de crescimento económico, em liberdade e bem-estar para todos -, foi de algum modo "colonizado" pelo neoliberalismo. Está hoje sem rumo e sem lideranças. É por isso que precisa de ser repensado - e está a sê-lo, por toda a esquerda europeia, social, sindical e partidária. Poderá ser uma luz ao fundo do túnel, para as nossas angústias, se houver diálogo, espírito de tolerância e de bom senso, entre todas as correntes que se reclamam da esquerda, moderada e radical."

segunda-feira, 27 de outubro de 2008

Queremos saber

  • "A Associação Ateísta Portuguesa recorreu na quinta-feira ao primeiro-ministro para obter esclarecimentos sobre a participação de militares portugueses numa "peregrinação militar internacional" a Lourdes, após não os ter obtido, desde Junho, do ministro da Defesa Nacional.
    Na carta enviada a José Sócrates, a que a Agência Lusa teve acesso, o presidente da Associação Ateísta Portuguesa (AAP), Carlos Esperança, recorda os pedidos de esclarecimento enviados a 2 de Junho ao ministro da Defesa Nacional, Nuno Severiano Teixeira, e que por este nunca terão sido prestados.
    Com base numa notícia difundida pela agência Ecclesia, a AAP ficou a saber que "Portugal levou 700 peregrinos [militares] ao Santuário de Lourdes (França) para participarem numa Peregrinação Militar Internacional".
    No entender da AAP, "num Estado laico, as Forças Armadas não devem apoiar oficialmente a devoção a uma religião".
    Acresce que, para a AAP, "o facto de um cardeal austríaco ter presidido à peregrinação e dado instruções aos militares portugueses configura uma grave interferência na soberania de um país laico e uma usurpação de funções que cabem ao Ministério da Defesa Nacional ou, por delegação, aos chefes dos estados-maiores".
    Pergunta assim a AAP se "os militares peregrinos viajaram a título particular ou oficial" e se "usaram as férias normais ou tiveram uma semana suplementar para este propósito".
    Quer ainda saber a AAP se "as Forças Armadas colaboraram na despesa da expedição eucarística" e "no caso de ter havido custo para o Erário Público, qual a disposição legal aplicada e o cabimento orçamental previsto".
    Finalmente, Carlos Esperança interroga, em nome da AAP: "Por se tratar de uma missão militar no estrangeiro, foi autorizada pelo Comandante Supremo das Forças Armadas, o senhor Presidente da República?"
    " (Lusa)

Educação - III

Assumindo que a instrução deve ser gratuita e universal, qual será o melhor sistema de ensino para esse fim? A solução do cheque-ensino é justa e eficaz?

Neste blogue citei um artigo que explicava porque é que não.

Assumindo agora que existe um sistema de ensino público robusto, complementado por algumas escolas privadas cujo programa curricular é escrutinado (pelas razões expostas nos textos anteriores), interessa lançar outras questões.

A escola deve limitar-se a instruir, deixando outros aspectos da educação para os progenitores?

Alguns dos que o defendem temem que o estado use o sistema de ensino como uma ferramenta de propaganda. A ideia está longe de ser disparatada. A promoção de ideais nacionalistas, de regimes ditatoriais, de valores anacrónicos, tudo isso aconteceu em diferentes escolas pelo mundo fora. Se o estado tem legitimidade para veicular valores, o que nos garante que são os valores certos e não a propaganda conveniente?

O problema desta argumentação está apenas na ausência de alternativas. Se todos os aspectos educativos à excepção da instrução estão nas mãos dos progenitores, o que nos garante que ao educando não está a ser vedado nenhum aspecto educativo fundamental? Há certos sistemas de valores que mesmo que não adopte é importante que tome contacto. Acrescente-se que este contacto não favorece apenas o indivíduo como também a comunidade em que o mesmo está inserido. Isto é ainda mais importante numa democracia, em que os educandos acabam por se tornar eleitores, cujas decisões, mais ou menos responsáveis, afectam toda a comunidade.

E é desta mesma democracia que nos temos de valer para evitar que a educação escolar se torne uma ferramenta de propaganda política. É preciso alguma vigilância para garantir que o sistema educativo da comunidade não se limita à instrução, mas não chega à endoutrinação. Ninguém disse que a democracia era fácil.

Educação - II

Existem três razões pelas quais a sociedade deve garantir instrução gratuita e universal:

1- É um imperativo de justiça. Ninguém merece ficar sem acesso à instrução porque os pais o decidiram, quer porque não dispunham de recursos, quer porque os preferiram alocar de outra forma. Esta questão está explorada no texto anterior.

2- A sociedade tende a ficar mais próspera se a instrução for mais generalizada. E a gratuitidade da instrução contribui para a sua generalização.

3- É uma forma de redistribuição eficaz, conducente a uma maior igualdade de oportunidades, não diminuindo o incentivo ao trabalho.

As razões são tão fortes e claras que nenhum país desenvolvido abdica de um sistema de ensino gratuito e universal. No entanto, em alguns países a instrução gratuita não inclui o ensino superior. Em Portugal vai-se caminhando nessa direcção à medida que as propinas têm um peso cada vez maior no orçamento das Universidades.

Pelas razões acima expostas, isso é uma asneira.

Educação - I

A educação de um indivíduo deve ser da exclusiva responsabilidade dos seus familiares?
Claro que não.

Os pais devem ter alguma liberdade para decidir como educam os seus filhos, mas não toda.
Nós associamos a liberdade à responsabilidade, assumindo que quando um indivíduo está disposto a sofrer as consequências de uma decisão deve geralmente poder fazê-lo livremente. Mas quando a decisão afecta terceiros, muitas vezes a sua liberdade terá de estar balizada, pois pode ser ilegítimo impôr-lhes as consequências de uma decisão alheia.
Assim se passa em relação à educação de menores - se o pai decide que o filho não precisa de aprender a ler e escrever, quem vai sofrer as consequências da decisão é o filho.

Podemos assumir que os pais fazem todas as escolhas que afectam os seus descendentes no melhor interesse destes, mas esta assunção tem dois problemas.
O primeiro é que é uma assunção falsa: há casos de pais que prostituiram ou mataram os seus filhos, e não creio que tivesse sido sempre no melhor interesse destes... Podemos assumir que estes casos extremos são uma situação anormal, mas não podemos encolher os ombros e dizer "azar". É importante dar mínimas garantias a um menor cujos pais não velem pelo seu bem.
O segundo problema é que quando uma decisão afecta terceiros, ela pode ser ilegítima mesmo que feita nos melhores interesses destes. Se um pai acha que o filho não precisa de aprender a ler, e crê que está a fazer o melhor para o filho, esta crença não legitima automaticamente a decisão do progenitor. Afinal, não é este que sofre as consequências.

Se os filhos forem encarados como membros de uma comunidade com direitos próprios, e não como "propriedade" dos seus progenitores, torna-se claro que estes últimos não poderão "decidir o que quiserem" em relação à educação de seus descendentes. Mas também se torna claro que o fardo da instrução e educação deve ser parcialmente partilhado pela comunidade.

sexta-feira, 24 de outubro de 2008

Neoliberalismo RIP

  • "O antigo presidente da Reserva Federal norte-americana Alan Greenspan reconheceu ontem, numa audição no Congresso, que falhou na regulação do sistema financeiro. "Cometi um erro ao confiar que o livre mercado pode regular-se a si próprio sem a supervisão da administração", afirmou o homem que esteve 18 anos ao comando da Fed. (...) Admitiu, depois, o grave erro em que incorreu quando se opôs à regulação do mercado de derivados. "Presumi, erradamente, que o interesse próprio das organizações, nomeadamente dos bancos, era suficiente para que eles protegessem os seus accionistas."" (PUBLICO)

quinta-feira, 23 de outubro de 2008

Fascistas, homossexuais e amantes

  • "O sucessor do líder populista Joerg Haider, Stefan Petzner, chocou a conservadora Áustria ao afirmar que mantinha uma relação amorosa com o falecido líder do BZOe, que morreu no dia 11 de Outubro num desastre de automóvel. Numa entrevista radiofónica, o novo líder, de 27 anos, confessou que Haider era “o homem da sua vida”. (...) depois do acidente de automóvel que o vitimou, foi revelado que não só o líder populista – que foi durante muitos anos a face da extrema-direita austríaca – ia em excesso de velocidade, como tinha níveis de álcool no sangue quatro vezes superiores ao permitido. Ficou igualmente a saber-se então que Haider tinha passado as suas últimas horas de vida num bar “gay” em Klagenfurt, capital do estado do qual era governador." (PUBLICO)

Eu sempre desconfiei...

O sermão é uma arma

Quem se arroga a faculdade de enviar ingénuos para o «inferno» ou para o «paraíso» também, facilmente, se auto-atribui o direito de os induzir a votar num candidato ou noutro.

A eleição presidencial nos EUA não escapa a esta regra. Os relatos não param de chegar: ou é um bispo católico que escreve aos seus diocesanos aconselhando a votar contra o «abortista» Obama, ou uma igreja cristã que afixa um cartaz terrorista aconselhando o voto nos conservadores, ou ainda um pastor protestante que apela ao voto em McCain. Os exemplos abundam, até porque existe quem defenda activamente que as igrejas devem fazer política.

Deveria ser óbvio que a liberdade de expressão não inclui a prerrogativa de abusar do poder que se detém («espiritual» ou não), para influenciar a votar num ou outro sentido. A Associação República e Laicidade explicou isto mesmo há uns anos, e foi violentamente criticada. Mas estes sacerdotes eleiçoeiros, com tanto desespero em apelar ao voto em vez de confiarem em «Deus» para a vitória dos seus valores, parecem mais ateus do que eu...

[Diário Ateísta/Esquerda Republicana]

segunda-feira, 20 de outubro de 2008

Outra vez?!?

Nalguns estados dos EUA as votações já começaram. E os problemas também...

"When I touched the screen for Barack Obama, the check mark moved from his box to the box indicating a vote for John McCain," said Matheney, who lives in Kenna.

Em 2000 as eleições foram roubadas. E este ano, como será?

Os problemas descritos na notícia foram detectados, porque era possível identificar o voto efectuado. Mas existem vários sistemas electrónicos em que tal não é possível. No mapa que se segue, estão pintados a vermelho os estados em que todos os sistemas de voto são assim: não permitem verificação. Os estados pintados a vermelho e rosa correspondem a estados em que existem sistemas deste tipo, bem como sistemas em que o voto pode ser confirmado. Os dados são daqui:

sexta-feira, 17 de outubro de 2008

Título surpreendente

Portugal é o país da UE onde a pobreza mais caiu

Cartograma

Mapa em que a área de cada estado é proporcional ao número de membros do colégio eleitoral correspondentes:



Dados daqui.

quarta-feira, 15 de outubro de 2008

Timor e a Fé

«O diferendo teve início quando o Governo anunciou que irá remeter para as várias confissões religiosas o ensino da disciplina de religião, pagando aos professores que a leccionem. Uma disciplina do ensino primário até agora obrigatória, mas que o Executivo quer tornar facultativa e retirar peso na avaliação final dos estudantes.»

O texto acima faz parte de uma notícia de 2005 que relata o que aconteceu quando o governo em Timor teve a ousadia de não obrigar as crianças a serem catequizadas a expensas do estado.

O que se passou a seguir foi impressionante, tendo dado origem ao título noticioso «Igreja Católica quer que o caos passe ao Poder em Timor-Leste».

No meio da confusão dois portugueses foram sujeitos a um julgamento popular, onde foram insultados e espancados, com a permissão e cumplicidade do padre Domingos Soares. O DN relatou as suas declarações:

«O porta-voz do Episcopado, o padre Domingos Soares, que, segundo testemunhas contactadas pelo DN, acompanhou todo este incidente, acabaria por reconhecer tudo isto numas declarações impressionantes ao jornalista da RTP/Antena 1 em Díli "Todas as pessoas de quem desconfiamos, e cuja atitude é diferente, são levadas para o centro de investigação para esclarecer as suas atitudes, para que não possa acontecer o mesmo outra vez." Ou seja, admite que há em Díli, por sinal na casa do bispo (uma casa que foi reconstruída pela cooperação portuguesa), um tribunal popular que interroga quem entra em território designado agora como dos manifestantes contra o Governo.»

«o padre Domingos Soares terá dito que "também temos aqui jovens timorenses que não se portaram bem, não são só os portugueses".»

A comunicação social quase não deu importância ao caso. Dois portugueses espancados em casa do Bispo, tal como vários timorenses, porque o governo ousou acabar com a catequese obrigatória. Deviam ter sido notícias de primeira página, mas foram notas de rodapé.

Depois o governo cedeu, e tudo acalmou.

Uns anos depois, três mulheres foram mortas em Timor acusadas de feitiçaria.

Hoje o governo de Timor, mais mansinho, assina uma concordata com o Vaticano. É interessante prestar atenção a algumas declarações:

«O bispo de Baucau, Basílio do Nascimento, costuma dizer aos colegas europeus em Timor-Leste que "os princípios de Descartes não se aplicam aqui".
"Os pensamentos lógicos cartesianos não são inteiramente aplicados", explicou o bispo de Baucau à Agência Lusa este fim-de-semana, em Soibada, distrito de Manatuto (centro).»


«José Ramos-Horta manifestou o seu total apoio à concordata com a Santa Sé e adiantou que "os valores do Vaticano são os valores de Timor-Leste".
"Não há timorenses que não sejam religiosos", frisou também o chefe de Estado sobre reacções adversas à assinatura da concordata.»

11 de Setembro (1973)


Vale a pena recordar. Não porque seja agradável, mas para retirar lições.

Vozes da direita dura

Christopher Buckley demitiu-se da National Review e acha o seguinte: "While I regret this development, I am not in mourning, for I no longer have any clear idea what, exactly, the modern conservative movement stands for. Eight years of "conservative" government has brought us a doubled national debt, ruinous expansion of entitlement programs, bridges to nowhere, poster boy Jack Abramoff and an ill-premised, ill-waged war conducted by politicians of breathtaking arrogance. As a sideshow, it brought us a truly obscene attempt at federal intervention in the Terry Schiavo case."

terça-feira, 14 de outubro de 2008

Na Itália

Fantasma de Mussolini volta a assombrar

Hoje a conversa está animada

O João Miranda voltou a responder às minhas palavras.

Perguntou se o princípio de igualdade se deve aplicar às famílias ou indivíduos. A resposta é simples: aos indivíduos.
Se umas famílias fossem discriminadas face a outras, a discriminação dos indivíduos seria óbvia. Não sendo esse o caso, ela é discutível - que foi o que escrevi.

Depois o João Miranda diz-me que não existem indivíduos do mesmo sexo, chamando-me à atenção para o lapso.
Eu fiquei espantando com a afirmação: desconhecia a existência de tantos sexos quantos indivíduos.

Depois usa um argumento muito interessante:

«As leis do casamento não discriminam indivíduos porque todos os indivíduos podem casar e as regras são iguais para todos. [...] Os homossexuais não podem casar com uma pessoa do mesmo sexo, mas os heterossexuais também não.»

Este argumento aparenta ser ridículo.
Mas será que do ponto de vista formal é um argumento sólido?

Certamente que é dos melhores que já vi serem usados.
Geralmente os argumentos usados para justificar a discriminação são piores.

Uma resposta intuitiva possível para este argumento corresponde a lembrar o caso da proibição de casamentos inter-raciais. A lei que proibia o casamento inter-racial aparentava, sob o ponto de vista do João Miranda, respeitar o princípio da igualdade - mas não deixava de ser uma lei racista.



Porquê?
Uma resposta formal ao argumento do João Miranda também responde a essa pergunta. Os argumentos estão expostos aqui. A leitura é morosa, mas acaba por dar razão à nossa intuição quando esta nos diz que o argumento do João Miranda não colhe.

PS- A leitura daquilo que o Ricardo Alves escreve aqui também nos dá umas pistas.

A origem do casamento

As discussões sobre o casamento prestam-se a confusões tremendas que baralham em vez de esclarecer.

Ponto de ordem: o casamento foi instituído, pelo Estado, para organizar a transmissão da propriedade. Antes, o que havia era a união sexual, nem sempre voluntária, nem sempre «para a vida» (particularmente no que concernia ao homem) e ambiguidades sobre a quem entregar a propriedade do defunto (aos filhos da viúva? aos da anterior? à outra?).

O casamento (união registada) resolveu o problema criando a «esposa legítima» e os seus «filhos legítimos». Fico pasmado quando vejo quem queira «separar o casamento do Estado» ou, pior ainda, «voltar ao casamento anterior ao Estado» (ver aqui ou aqui). É que um casamento sem reconhecimento estatal não serve rigorosamente para nada. É um papel assinado entre amigos, e ser na igreja ou na mesquita só deveria fazer diferença para esses amigos. E o «casamento anterior ao Estado» era uma forma de aquisição de propriedade em que o homem comprava a mulher e a sua «garantia» (julgava ele) de descendência genuína (quando as igrejas se apossaram do casamento, fizeram-no porque ofereciam uma cultura de enquadramento que, supostamente, reforçava essa «fidelidade»).

Evidentemente, nos últimos 200 anos densificaram-se bastante os atributos do casamento (pensões estatais, «substituição» do cônjuge para efeitos legais, tutela na invalidez, partilha de responsabilidades legais, obrigação legal de apoio na doença e na pobreza...). E o casamento passou a ser uma designação da pessoa com quem se quer ser feliz e partilhar obrigações legais de protecção. Quanto aos filhos «legítimos», agora até podem ser fora do casamento (e para as dúvidas, há exames de ADN).

Felizmente, o casamento passou a ser uma relação de igualdade, embora recentemente (em Portugal, há trinta anos). O que os homossexuais agora querem (penso eu...) é que lhes seja reconhecido o direito a designarem, através de um contrato reconhecido pelo Estado, com quem querem procurar a felicidade. E eu não entendo por que lhes havemos de recusar esse direito.

Outra resposta

A propósito da minha resposta à pergunta do João Miranda, este último comentou no Blasfémias:

É interessante que a propósito do casamento se defenda que a lei deve ser cega à etnia, orientação sexual, sexo, religião, etc. Eu tenho uma sugestão: e porque não leis cegas ao estado civil. Leis que não favoreçam um estado civil em detrimento de outro: fiscalidade igual, direito de sucessão igual etc e tal …

Em primeiro lugar é importante lembrar que não é a propósito do casamento que se defende o princípio da igualdade perante a lei, como se pode ler pelo que escrevi aqui e aqui.

No que diz respeito à sugestão do João Miranda, é possível argumentar que não existe qualquer favorecimento. Que o direito de sucessão de aplica às famílias sem discriminação alguma, e o casamento apenas permite incluir alguém na família. O mesmo para a fiscalidade, etc...

É uma discussão interessante, mesmo que não exista nenhum movimento de solteiros indignados com a alegada discriminação. Mas será que faz sentido desculpar uma discriminação alegando outra?

Não creio.

Independentemente do facto da lei discriminar ou não consoante o estado civíl, a verdade é que discrimina hoje quanto à orientação sexual. A constituição diz explicitamente que as leis da República não podem discriminar quanto à orientação sexual, portanto é ilegal vedar o casamento a pessoas do mesmo sexo.

A questão aqui não é lembrar o princípio da igualdade dos cidadãos perante a lei apenas a respeito da questão dos casamentos entre pessoas do mesmo sexo - é não esquecer este princípio quando convém.

Paul Krugman

O economista que disse que o Partido Republicano se estava a transformar no partido dos estúpidos ganhou o Nobel da Economia.

Vale a pena ver Bill O'Reilly, o herói dos trailer parks, convidado pelo republicano suspiroso Tim Russert para discutir com Paul Krugman. Tim Russert, um propangadista republicano feroz que se fazia passar por um jornalista decente, convidou um anormal, ordinário e mentiroso, para insultar Krugman.

Para se ter uma ideia de quem é O'Reilly, vale a pena vê-lo a culpar os democratas por esta tragédia de 8 anos.

segunda-feira, 13 de outubro de 2008

Resposta

No Blasfémias o João Miranda pergunta:

«Porque é que os gays consideram que uma união civil que confere os mesmos direitos que o casamento (mas não se chama casamento) é inferior ao casamento?»

Se o estado desse outro nome às cartas de condução dos judeus, mesmo que para todos os efeitos legais fossem iguais, consideraríamos - e bem - que isso seria uma descriminação indesculpável.
Porquê?

Porque as leis que devem ser cegas à etnia, orientação sexual, sexo, religião, etc., afinal não o seriam. Tanto que contratos ou documentos com a mesma natureza teriam uma denominação diferente fundamentada nestes factores.

Isso seria a prova visível de uma lei descriminatória.

sábado, 11 de outubro de 2008

Obama?

As coisas aqui nunca são simples, mas falando com as pessoas que vêem televisão e ouvem telefonia (os mil e um programas da extrema-direita) parece-me que entre os republicanos a ideia de deixar Obama limpar esta confusão e fazer-lhe a vida negra durante os próximos quatro anos vai ganhando alguma aceitação.

Os media baixaram os braços e já não se atrevem a repetir só os 'talking points' que o Partido manda a todos os jornais e televisões diariamente.

Julgo que lhes começa a faltar a lata e a convicção, até porque o apoio dos jornalistas ao Partido assenta fundamentalmente em contratos de muitos milhões de dólares por ano. E como o dinheiro vale menos cada semana que passa e as fortunas deles foram roubadas e desbaratadas pelos oligarcas que mandam no Partido...

O problema são os calvinistas do campo. Os menos educados e mais pobres não acreditam que 'ninguém' assassine Obama. Dá-me calafrios ouvir estas coisas, sobretudo porque são ditas com um sorriso confiante por pessoas de quem gosto e que vejo quase todos os dias.

sexta-feira, 10 de outubro de 2008

Democratas, Republicanos e Economia

Consideremos os Estados Unidos da América, e os anos que vão desde 1948 até 2005. Contabilizemos os aumentos de rendimento das diferentes classes sociais. Depois, associemos cada ano aos Democratas ou Republicanos, consoante quem ocupasse a presidência, mas dando um ano de atraso (a situação económica no primeiro ano de mandato dependerá mais das políticas do mandato anterior do que do próprio). Foi isto que foi feito no livro Unequal democracy: The political-economy of the new gilded age (Princeton, 2008). Aqui estão as contas:



Ah e tal, mas os Democratas cobram mais impostos, lá se vai o rendimento. Então consideremos os anos entre 1980 e 2005, e façamos a mesma coisa para a evolução do rendimento líquido:



Coincidência? Não creio.

Identificamos que as políticas dos Democratas foram muito mais redistributivas, conduzindo a uma maior coesão social, a menores injustiças. Mas não só isto não foi feito à custa de menor crescimento económico, como pelo contrário isto levou a um maior crescimento económico - exactamente ao contrário do que Reagan defendia.
Até mesmo as classes mais altas, descontados os impostos, enriqueceram mais com os Democratas que com os Republicanos. Certas políticas redistributivas (como a aposta na educação, por exemplo) enriquecem toda a sociedade, até os mais ricos.

O parlamentaredo

O nosso parlamento envergonhou-nos a todos, mais uma vez, com mais esta prova de estupidez lapuz e medieval que se chama homofobia.

Não há, portanto, razões para admiração. Mas a questão da adopção deixa-me perplexo! A sociedade (que aceita que as crianças sejam brutalizadas em orfanatos sem pestanejar) acha que um homem ou uma mulher, sózinhos, podem perfeitamente educar uma criança, mas acha que dois homens ou duas mulheres juntos não têm, por definição, capacidade.

E eu acho que em vez de religião e moral se devia dar às crianças aulas de lógica, para elas, quando crescerem, não serem como os nossos depudados. :o)

Um mundo perigoso...

Não resisto a repetir aqui o que escrevi agora no meu blog: Os calvinistas (aqui do partido de jesus) têm muitas coisas em comum com os wahabis, entre as quais uma religião dura, com um deus sem misericórdia nem estabilidade emocional, um puritanismo exacerbado e disfuncional, uma atitude negativa, de recusa do mundo e das coisas que não percebem (como a Evolução, que é uma metáfora da ciência nas lutas deles), uma obsessão pela ordem, pela uniformidade e pela autoridade, e um ódio mesquinho aos que vivem sem medo dum ditador que vive no céu e os pune só a eles.

Tanto os wahabis como os calvinistas constroem a realidade com as coisas que vêem e têm à mão. Os wahabis rezam cinco vezes por dia e vêem deus dar o dinheiro e a liberdade aos americanos; os calvinistas tiveram o presidente, o senado e o congresso durante a maior parte dos últimos 8 anos e estão pobres, perdidos e no meio de uma corrupção inaudita.

Eu acho esta situação perigosa e estava a falar disso a uma amiga minha esta manhã. Ela mandou-me este ‘link’ ao NRC holandês. Parece que não sou só eu.

Registe-se (eleições daqui a um ano)

Projecto do PEV (casamento sem adopção): votos a favor do PCP, do PEV, dos PS´s Pedro Nuno Santos e Manuel Alegre (este, sem autorização da bancada) e do PSD Pereira Coelho; abstenções do BE e de oito deputados do PSD; votos contra do PS e do PSD (salvo as excepções mencionadas) e do CDS (sem excepções).

Projecto do BE (casamento com igualdade plena de direitos): votos a favor do BE, dos PS´s Pedro Nuno Santos e Manuel Alegre (sem autorização da bancada...); abstenções do PCP, PEV e Pereira Coelho (PSD); votos contra do PS e do PSD (salvo as excepções mencionadas) e do CDS (sem excepções).

Lusa 1; Lusa 2; Lusa 3; Público.

Laicidade (ou laicismo)

Reuni, num arquivo em formato de blogue, os textos mais longos dos meus últimos seis anos de activismo laicista: Laicidade (ou laicismo). O arquivo pode ser consultado por categorias (União Europeia, multiculturalismo, História...) ou a partir do índice.

Os textos reunidos andavam dispersos por vários sítios, e incluem um inédito, de Setembro de 2004, sobre o véu islâmico: Símbolos e liberdade.

Duas linhas? :o)

Parece que metade dos cidadãos americanos têm um QI de 100 ou menos. E parece que metade dos cidadãos americanos são republicanos. Eu não queria, de forma nenhuma, sugerir que estas duas linhas coincidem, mas este vídeo... :o)

quinta-feira, 9 de outubro de 2008

Curiosidade

Gostava de saber se a máquina sinistra do Partido Republicano vai deixar Obama ser eleito e depois culpá-lo pelos últimos 8 anos de desgoverno, ou se vai fazer um esforço sério para ganhar.

Quando vejo o Goebels (Karl Rove) na televisão a dizer que o Obama é bom homem e que McCain fez mal aqui e ali, parece-me evidente que eles não querem governar nos próximos 4 anos.

Mas com esta mafia nunca se sabe o que vai na cabeça dos 'capi'. Se Obama ganhar não vai ser possível parar certos inquéritos e muita gente desta administração vai ter de se sentar no banco dos réus...

Um com consciência?

David Brooks, um homenzinho horrível que escreve regularmente um monte de tolices no New York Times, disse recentemente que era perigoso que a dona Sarah Palin (e o presidente) não tivessem percebido que a retórica anti-intelectual não era a sério. Era parte de uma estratégia da direita contra o espírito liberal das melhores universidades do país.

Ou seja, uma coisa é ser-se populista e dizer que o país deve ser governado por pessoas comuns, outra é acreditar-se que qualquer idiota tem competência para ser presidente. Apesar de Brooks ser um chato e ter defendido Bush todos os dias na televisão durante os últimos 8 anos, vale a pena ler o artigo de mais este hipócrita.

Esquerda e direita

A propósito da simpatia natural do Vaticano (incluindo Pio XII) pela ordem e pela autoridade, acho que vale a pena ver o vídeo de Jonathan Haidt sobre a esquerda e a direita no TED.

Sobre as coisas que os conservadores estão dispostos a sacrificar em nome da ordem e da imutabilidade do ambiente em que gostariam de viver.

Pio XII teve a coragem de ficar paralizado pelo medo

É aquilo que ainda falta Bento XVI dizer no seu esforço de interpretar a história por forma a que Pio XII não pareça um vilão conivente com o nazismo, mas sim um heroi com a coragem de não denunciar os horrores do regime de Hitler.

«Afrontou a tragédia bélica como nenhum líder do seu tempo fez. Ainda diante da monstruosa perseguição dos judeus, num silêncio consciente e sofrido, voltado para a eficiência de uma obra de caridade e socorro indiscutível» diz Bento XVI.

Pois é! Enquanto Churchill, e mais tarde Estaline e Roosevelt, lideravam os seus exércitos contra a tropas do eixo, Pio XII tinha a coragem de seguir o exemplo de Cristo e dar a outra face como, vá, poucos, líderes o fizeram. Mas depois foi mais caridoso que qualquer outro, tendo sido criado o "corredor Vaticano" para deixar os nazis fugirem à justiça dos aliados.

Entre concordatas negociadas (mesmo antes de ser Papa), e o assinalar do aniversário do Fuhrer no Vaticano, Pio XII mostrou a sua determinação na forma como sugeriu o apoio ao regime de Ante Pavelić, quando pelos vistos abominava o nazismo, demonstrando em todas estas acções uma hipocrisia heróica.

Observe-se melhor este heroísmo, na mensagem de parabéns que era dirigida a Berlim sempre que Adolf Hitler fazia anos:

«As mais calorosas felicitações ao Fuhrer em nome dos bispos e dioceses da Alemanha. Fervorosas as orações que os católicos alemães enviam dos seus altares ao céu.»

Vale a pena reler esta mensagem, e considerá-la (mais) um forte argumento para a beatificação de Pio XII que a Igreja pretende consumar. Alguns judeus sentem-se quiçá ofendidos com a ideia, mas todos sabem que foi essa a raça que crucificou Cristo.

quarta-feira, 8 de outubro de 2008

Steven Weinberg: «Without God»

  • «(...) I do not think that the tension between science and religion is primarily a result of contradictions between scientific discoveries and specific religious doctrines. (...) The first source of tension arises from the fact that religion originally gained much of its strength from the observation of mysterious phenomena—thunder, earthquakes, disease—that seemed to require the intervention of some divine being. There was a nymph in every brook, and a dryad in every tree. But as time passed more and more of these mysteries have been explained in purely natural ways. (...)

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  • Of course, not everything has been explained, nor will it ever be. The important thing is that we have not observed anything that seems to require supernatural intervention for its explanation. There are some today who cling to the remaining gaps in our understanding (such as our ignorance about the origin of life) as evidence for God. But as time passes and more and more of these gaps are filled in, their position gives an impression of people desperately holding on to outmoded opinions. (...) The problem for religious belief is not just that science has explained a lot of odds and ends about the world. There is a second source of tension: that these explanations have cast increasing doubt on the special role of man, as an actor created by God to play a starring part in a great cosmic drama of sin and salvation. We have had to accept that our home, the earth, is just another planet circling the sun; our sun is just one of a hundred billion stars in a galaxy that is just one of billions of visible galaxies; and it may be that the whole expanding cloud of galaxies is just a small part of a much larger multiverse, most of whose parts are utterly inhospitable to life. As Richard Feynman has said, "The theory that it's all arranged as a stage for God to watch man's struggle for good and evil seems inadequate." (...) A third source of tension between science and religious belief has been more important in Islam than in Christianity. Around 1100, the Sufi philosopher Abu Hamid al-Ghazzali argued against the very idea of laws of nature, on the grounds that any such law would put God's hands in chains. (...) There is a fourth source of tension between science and religion that may be the most important of all. Traditional religions generally rely on authority, whether the authority is an infallible leader, such as a prophet or a pope or an imam, or a body of sacred writings, a Bible or a Koran. Perhaps Galileo did not get into trouble solely because he was expressing views contrary to scripture, but because he was doing so independently, rather than as a theologian acting within the Church. Of course, scientists rely on authorities, but of a very different sort. If I want to understand some fine point about the general theory of relativity, I might look up a recent paper by an expert in the field. But I would know that the expert might be wrong. One thing I probably would not do is to look up the original papers of Einstein, because today any good graduate student understands general relativity better than Einstein did. We progress. (...) We have our heroes in science, like Einstein, who was certainly the greatest physicist of the past century, but for us they are not infallible prophets. (...) I have been emphasizing religious belief here, the belief in facts about God or the afterlife, though I am well aware that this is only one aspect of the religious life, and for many not the most important part. Perhaps I emphasize belief because as a physicist I am professionally concerned with finding out what is true, not what makes us happy or good. For many people, the important thing about their religion is not a set of beliefs but a host of other things: a set of moral principles; rules about sexual behavior, diet, observance of holy days, and so on; rituals of marriage and mourning; and the comfort of affiliation with fellow believers, which in extreme cases allows the pleasure of killing those who have different religious affiliations. (...) The various uses of religion may keep it going for a few centuries even after the disappearance of belief in anything supernatural, but I wonder how long religion can last without a core of belief in the supernatural, when it isn't about anything external to human beings. (...) Living without God isn't easy. But its very difficulty offers one other consolation—that there is a certain honor, or perhaps just a grim satisfaction, in facing up to our condition without despair and without wishful thinking—with good humor, but without God.» (Steven Weinberg na New York Review of books)

Uma Europa com cem bandeirinhas

Portugal vai ter uma embaixada na capital europeia dos traficantes e dos islamistas. Depois de oito meses de tergiversações, o Amado diz que a Rússia perdeu a razão quando saiu em defesa da Ossétia, e que estávamos a ficar sozinhos com os europeus que têm Repúblicas turcas do Chipre, Países Bascos e outras minorias territorialmente homogéneas. Muito bem. Então perdemos também a razão, e agora teremos que reconhecer a independência das Ossétias, Abcásias, Transnístrias, Repúblicas sérvias da Bósnia, húngaros da Roménia, turcos da Bulgária, húngaros da Eslováquia, ciganos daqui e de acolá, mais os bascos, os catalães e os galegos; sem esquecer a Córsega e a Alsácia-Lorena, a Escócia e o Ulster, mais os valões e os Saami, os do sul da Itália e os do norte, e, sobretudo, os Ruténios.
A primeira guerra da Jugoslávia foi só há dezassete anos. Por este andar, em 2025 teremos uma Europa com cem Estados «reconhecidos». Uma Europa, cem bandeiras. E duas bandeiras a rirem-se: a dos EUA e a da Alemanha.

terça-feira, 7 de outubro de 2008

Propriedade

É, na minha opinião, o que melhor separa a esquerda e a direita. O valor que é dado à propriedade privada, a protecção que se pensa que esta merece.

Quem vê a propriedade privada como um valor absoluto não tem problemas em considerá-la uma extensão do indivíduo tão válida quanto o mesmo. Furtar algo a alguém não será fundamentalmente diferente de uma agressão física a essa pessoa, visto que um ataque à sua propriedade é um ataque a si própria. E isto é afirmado sem vergonha, como se fosse natural equiparar uma pessoa às suas posses.
Que não me revejo nesta visão é tão óbvio quanto o facto de escrever neste espaço.

Também não me revejo no extremo oposto. Acredito que deve existir, e merecer alguma protecção, propriedade privada. Passo a explicar porquê.

Os seres humanos em geral são algo egoístas, e algo altruístas - uns mais do que outros. O "algo egoístas" é suficiente para que fenómenos como a "tragédia dos comuns" tenham uma importância social muito grande.
Se a propriedade for partilhada, e as opções forem livres, a prosperidade será diminuta. Existirá pouca motivação para trabalhar, visto que aquilo de que se usufrui depende pouco do esforço e dos sacrifícios feitos.
Por isto só foram viáveis sociedades com propriedade quase totalmente partilhada quando as opções individuais deixaram de ser livres.
O que se passou na Rússia, na China, na Coreia, em Cuba, etc.. não foi um acidente. A ditadura não foi uma subversão infeliz dos ideais marxistas. Foi uma consequência natural da partilha da propriedade, sendo a sua alternativa a insolvência do regime.

Se as pessoas não são obrigadas a trabalhar, e aquilo que recebem não vai depender do seu esforço, muito poucas vão esforçar-se devidamente, passado o estado nascente (que explica o sucesso das comunidades Anarquistas na catalunha durante a guerra civíl espanhola).

Para muitos o exemplo da URSS não é mais do que aquilo que precisam para afirmar o capitalismo selvagem como superior à "esquerda". Tosca argumentação.
Em primeiro lugar porque esquece as inúmeras possibilidades políticas que existem entre os dois extremos. Isto é tanto mais cómico quanto todos os regimes políticos europeus se situam confortavelmente longe desses extremos (mesmo que caminhando em direcção a um deles com passos preocupantemente largos).
Em segundo lugar porque a comparação entre os extremos não é assim tão favorável ao capitalismo selvagem. Sim, a URSS era horrível, a ditadura, a opressão e o diabo. Mas a Rússia de Ieltsin que se seguiu não foi muito melhor. A miséria, a insegurança, a injustiça... É uma comparação interessante porque ao invés de comparar duas sociedades diferentes, comparam-se dois momentos no tempo, não assim tão distantes.

Para quem tem barriga cheia, a escolha pode parecer fácil. Liberdade, claro! Mas é difícil usufruir da liberdade com a barriga vazia e medo das máfias ao lado, e os russos parecem não ter achado assim tanta piada ao "mercado livre". Aos poucos e poucos o regime vai ficando cada vez mais parecido com o que era antes da Perestroika. E entre os russos parecem haver mais aplausos que assobios.

Longe de mim defender Putin e a sua cleptocracia opressora. E muito menos o imperalismo soviético anterior à queda do muro. Apenas quero deixar claro que, se limitarmos as nossas opções aos extremos (em si simplista e infantil), o extremo da esquerda não fica a perder. E nem preciso de chamar Pinochets ou Mussolinis ao barulho.

As vantagens do laicismo para os crentes

  • «What can religious people gain from living in a secular world? Well, for one thing, the fact that we have a community around us that is not dominated by our co-religionists allows us, if we ever decide that our religion is wrong or confused, to change it or become secular. The existence of a realm to which we don’t need to bring our religious commitments allows us to examine those commitments freely, and alter them if we think necessary. The secular world provides a break from religion, a place in which one can, if only metaphorically, stop and catch one’s breath from one’s religious passions, and assess them in a cooler fashion.
  • This break will enable some to stop being religious, or become a more liberal member of their religion, or convert from one religion to another. Others will at most allow consider doing these things, and then return to the religious commitment they had with renewed fervor. But the mere fact that this opportunity is available, the mere fact that one can, if one wants, drop one’s religious commitments or alter them or convert, reassures us that the commitments we have, when we are not dropping or changing them, are freely chosen. The secular world thus guarantees the freedom of my own religious beliefs - which makes them more truly religious, less a product of fear or ignorance or habit.
  • (...) There are also a number of cognitive advantages, for the religious project, of living among secular people. Just as it is always helpful to get the advice of an uninvolved outsider when trying to figure out what to do in a charged personal situation, so it can be helpful to get factual information, even on matters relevant to one’s religious beliefs, from people who are not caught up in one’s religious passions. I want to learn about the physics and chemistry and biology of our world, and about human history, from people who are not committed to a religion (at least in their work on those subjects); I trust them to be more objective than I or my co-religionists would be about such matters. On subjects other than metaphysics, and the question of what, overall, our lives are for, religious people seek information in ways that we share with all other human beings, whether or not they share our religious commitments, and in ways that are best pursued by abstracting from ethical commitments, by striving for objectivity.» (Sam Fleischacker)

domingo, 5 de outubro de 2008

Hoje é dia 5 de Outubro

E para comemorar, nada como ir à wikipedia em inglês eliminar alguma da propaganda católica a respeito da primeira república.
Depois, é manter um olho atento.

No bom caminho



Dados daqui.

Agora esperemos que não aconteça nenhuma grande reviravolta.

sábado, 4 de outubro de 2008

Uma questão política

Tenho imensa vergonha de Portugal ter demorado 30 ou 40 anos a descriminalizar o aborto e ainda não ter querido discutir publicamente os crimes da Inquisição, da guerra colonial, do anti-semitismo e do racismo e xenofobia que envenenam a democracia e a vida das minorias no nosso triste país.

Os políticos, geralmente trogloditas sem coluna vertebral, deixam essas discussões para o foro privado, entre grupos de sociólogos obscuros que aparecem na televisão às duas da manhã, nos programas dos últimos jornalistas civilizados que ainda resistem à invasão neo-liberal.

E eu, que ontem vi um grupo de desgraçados sem mais nada que os próprios braços aplaudir a piedade lapuz da dona Sarah Palin (depois dela jurar na televisão defender os ricos e só os ricos), lembrei-me duma coisa que li uma vez, talvez do Saint Exupéry, sobre os miseráveis que só sobrevivem na miséria.

Desculpem-me a franqueza, mas acho que depois do dia 10 teremos de concordar todos com uma coisa: os homossexuais filiados ou eleitores do P'S' ganham o direito a serem desprezados e tratados como semi-cidadãos pela direita católica.

Identificados com os opressores, incapazes de compreenderem conceitos elementares como liberdade e tolerâcia, renunciando a lutar pelos próprios direitos, passam a merecer-me o mesmo respeito que os hipócritas do PP e da ICAR, que preferem passar a vida escondidos, miseráveis, culpados de um crime que não devia ser crime, promotores duma mentira abjecta, defensores passivos da brutalidade e da repressão dos babuinos da extrema-direita. A partir do dia 10 estou-me completa e absolutamente nas tintas para os direitos deles.

sexta-feira, 3 de outubro de 2008

Não há fascismo sem violência

São estranhas algumas reacções à condenação a prisão efectiva do líder nazi Mário Machado. Certas pessoas parecem não entender que não há fascismo sem violência, e que portanto não há organizações fascistas sem a prática de crimes. Sendo certo que ter ideias fascistas não é crime, é impossível tentar levá-las à prática sem transpor a fronteira da legalidade. O fascismo necessita da milícia, da glorificação da violência e da designação de grupos a abater (judeus, comunistas, negros, gueis...). Portanto, os crimes de Mário Machado (ofensas corporais, ameaças, porte de armas ilegais) não são simples crimes de delito comum. São consequências necessárias da ideologia que promove.

quinta-feira, 2 de outubro de 2008

PSD ultrapassa PS pela esquerda

O PSD dará liberdade de voto aos seus deputados na votação do casamento entre pessoas do mesmo sexo, o que garante, desde já, mais votos a favor no PSD do que no PS. Eis um sinal claro de como o PS se está a deixar ultrapassar. Dentro em pouco, até o CDS será menos «prudente» nesta questão.

Actualização: confirmando a mariquice do PS, apenas um deputado (ex-JS) será livre. O resto da bancada votará disciplinadamente contra. Desconfio que, nesse dia 10, o BE garantirá um resultado de dois dígitos para daqui a um ano.

Obama à frente

Barack Obama parece próximo de se tornar o próximo presidente dos EUA: segundo as últimas sondagens, tem uma vantagem de 8% a 15% em Estados-chave como a Florida, o Ohio e a Pensilvânia. Conforme o João Vasco explicou aqui, a eleição presidencial estado-unidense será decidida na meia dúzia de Estados populosos que flutuam entre democratas e republicanos. Nesses, Obama vai à frente.

Será o PS um partido maricas?

É hoje que vamos saber se o PS disciplinará os seus deputados no voto sobre o casamento entre homossexuais. Parece que será imposto o voto contra, com uma ou duas excepções simbólicas para «salvar a face» à JS.

A argumentação é curiosa. Depois do «não estava no programa do PS» (que não funcionou, porque também não estava o voto contra) e do «não houve debate público» (que é ridículo, pois esta tornou-se a «clássica» discórdia de «costumes» no pós-IVG), chegámos a um incrível «não votaremos contra o casamento entre homossexuais, mas contra o oportunismo político do Bloco de Esquerda», ao qual dá vontade de responder: se dá votos, votem a favor.

Por detrás de tudo isto, evidentemente, está um anacrónico temor ao presumido conservadorismo do «país profundo». Acontece que Portugal, nos comportamentos, já não é conservador: o casamento civil ter-se-á tornado maioritário, pela primeira vez, em 2007; uma em cada três crianças nascem de pais que não estão casados; e há um divórcio para cada dois casamentos. Estes indicadores mostram um Portugal real menos conservador do que a vizinha Espanha, onde os socialistas são, no entanto, mais corajosos. O diferencial entre os dois Estados ibéricos não se explica pelos comportamentos sociais, mas sim pelas mentalidades, e provavelmente pelas mentalidades das elites, que parecem imaginar um Portugal mais conservador do que realmente é.

Na minha escola primária, distinguia-se um «maricas» de um homossexual. Um maricas era pouco corajoso, tinha medo do escuro, do padre, das pessoas diferentes, etc; um «homossexual» fazia com os homens «coisas» que ninguém explicava bem. No PS, a esmagadora maioria dos deputados não serão homossexuais. Mas parecem (no sentido da minha escola primária) um bocadinho maricas.

quarta-feira, 1 de outubro de 2008

Blogues à esquerda

«Santa Aliança» é um raio de um nome para um indexador de blogues de esquerda. Mesmo assim, este reduto de ateus anticlericais aderiu. Vão lá ver, que descobrirão uma ferramenta muito útil para se manterem a par do que o lado esquerdo da blogosfera vai escrevendo...

O Tejo é propriedade privada

O governo vai discutir com os senhores da Lusoponte quanto lhes paga se o Estado construir um tabuleiro rodoviário na terceira travessia do Tejo. É assim mesmo: o Tejo é propriedade privada, um feudo da nova aristocracia que circula do governo para os negócios, e o papel do governo é indemnizar os aristocratas sempre que constrói novas vias para o povo. Significativamente, do lado da Lusoponte encontram-se dois ex-ministros: Jorge Coelho e Ferreira do Amaral (o homem que privatizou as travessias do Tejo nos «bons velhos tempos» do cavaquismo). Quem se senta do lado do governo tem uma especial responsabilidade neste negócio: se não prejudicar a Lusoponte, talvez ganhe um lugar no conselho de administração daqui a cinco ou dez anos...

O islamismo, o laicismo, o anti-imperialismo e o resto

O testemunho de uma feminista iraniana sobre a esquerda que, a pretexto do anti-imperialismo, se torna complacente com o islamismo.

  • «(...) Le débat faisait rage : socialisme ou système islamique ? D’après nos interlocuteurs islamistes, l’islam permettait de réaliser le bien que procurerait le socialisme, mais, en plus, grâce à la foi en Dieu et au Prophète, on connaîtrait aussi la sérénité ! Tous ceux qui se disaient athées ou de gauche ne croyaient pas un mot de ces discours répétitifs. Mais, les événements prirent un cours accéléré en faveur des mouvances islamistes, quand Khomeini arriva à Neauphle-le-Château, le 8 octobre 1978. Mes copines, qui jusqu’ici avaient résisté au voile, ont succombé les unes après les autres. Je leur disais: « Ne faites pas ça, vous allez le regretter. Aujourd’hui vous le portez volontiers, mais demain, s’ils arrivent au pouvoir, vous ne pourrez plus l’enlever ». Elles répondaient que ce n’était pas vrai, que ce n’était qu’un signe de solidarité contre le shah et sa politique pro-américaine, et qu’une fois la démocratie établie, elles pourraient vivent comme elle l’entendraient. Elles étaient ensorcelées, même plus : enivrées. Rien ne les ramenait à la raison. Après la victoire de Khomeini, son premier combat fut contre les droits des femmes, pour l’obligation progressive du port de voile en particulier.
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    En 1991, l’année où je suis arrivée en France, je m’étonnais toujours, mais cette fois à cause de l’attitude de mes camarades français de gauche face aux militants de l’islam politique. Leur tolérance et leur silence, de mon point de vue, n’étaient qu’une démission intellectuelle prenant l’excuse de la démocratie. Je leur expliquais bien qu’il fallait débattre avec les islamistes mais dénoncer leurs idéaux, et qu’il ne fallait pas les laisser séduire les gens exposés, surtout pas les femmes, bref que c’est vraiment dangereux. (...) La totale étrangeté, pour moi, c’était de constater que, mis à part de quelques petits groupes de gauche, la gauche européenne, disons la gauche réellement à gauche, dans son ensemble, appréciait « l’anti-impérialisme » des ayatollahs. Or, cette opposition entre mollah et Américains n’est parfois qu’une parodie de dispute car tous soutiennent le principe essentiel du capitalisme et se comportent, au pire, en impérialismes rivaux. (...)» (Azam Devisti na Gauche Républicaine)

Criminalidade e Imigração

A taxa de criminalidade nas comunidades estrangeiras é exactamente a mesma que entre os portugueses: onze casos em cada mil homens.

Convém repetir - a taxa de criminalidade nas comunidades estrangeiras é exactamente a mesma que entre os portugueses: onze casos em cada mil homens.