domingo, 4 de novembro de 2007

Cheque ensino

Se calhar não me expliquei bem. Aqui – onde foram inventados e estão a ser implementados - os cheques ensino não são para os filhos dos pobres. São para os filhos dos que vivem em bairros pobres e que têm boas notas. Ou seja, têm uma função precisa: contrariar as tentativas de integração social e de melhora generalizada do ensino. Servem para retirar os potenciais escriturários de terceira classe das escolas onde não se quer investir um único euro para melhorar o ensino dos pobres, do lumpenproletariat, de que todos necessitamos tanto: para o exército, para as minas, para a construção civil (para substituirem os emigrantes), etc.

Nos anos setenta implementou-se aqui em alguns estados um sistema que encorajava a mistura de miúdos de bairros pobres (sobretudo minorias) com os miúdos de bairros ricos (maioritáriamente brancos) e investir no ensino por forma a utilizar TODAS as escolas como instrumentos de integração.

Os cheques ensino são uma reacção a esta política: pretendem ser um mecanismo que ajude a retirar os miúdos com melhor aproveitamento das escolas mais pobres, onde ninguém quer investir. Os cheques ensino só fazem sentido num contexto de desinvestimento no ensino público.

Isto não são coisas complicadas de imaginar. O modelo de sociedade que os neoliberais querem implementar é o do Chile (o do “milagre” chileno): uma classe alta pequena e muito rica, uma classe média de burocratas, pequena e pobre, e uma classe baixa miserável, sem protecção, dócil e sempre sob a ameaça de ir presa (por fumar ervas, por dar no pó, por se associar, por exprimir opiniões, etc.)

Os cheques ensino são para os filhos dos burocratas, que se querem pobrezinhos mas honrados. Ponto final.

Os neoliberais podem dizer o que quiserem, apresentar equações, etc., protestar o mais sincero "compassionate conservatism". Mas a visão deles é o regime de Pinochet.

7 comentários :

João Moutinho disse...

Filipe Castro considera no respeitante aos neoliberais "Mas a visão deles é o regime de Pinochet."
Então das duas uma, ou há muito menos liberais do que até aqui tem sido considerado ou então há uma grande parte da humanidade que tem uns pesamentos sinistros no repeito à consideração que os seus semelhantes merecem.
Tanto quanto sei há círculos viciosos e outros virtuosos no respeitante à progreesão social mas um dos graves problemas que temos nas nossas "zona de risco" é quem quer aprender não pode e não é injectando-se mais dinheiros nas escolas que as coisas se resolvem.

David Lourenço Mestre disse...

"Isto não são coisas complicadas de imaginar. O modelo de sociedade que os neoliberais querem implementar é o do Chile (o do “milagre” chileno): uma classe alta pequena e muito rica, uma classe média de burocratas, pequena e pobre, e uma classe baixa miserável, sem protecção, dócil e sempre sob a ameaça de ir presa (por fumar ervas, por dar no pó, por se associar, por exprimir opiniões, etc.)"

Caramba, isto é uma das coisas mais absurdas que eu li sobre o liberalismo. Isto nao é liberlismo, neoliberalismo ou seja o que for, é uma caricatura ideologicamente comprometida.

Quem escreve isto jamais, nunca, em momento algum, passou os olhos por popper, isaiah berlin, mill, hayek, kant, bastiat, etc

Hugo Mendes disse...

É fácil perceber: é porque nem os "liberais" são "neo-liberais", nem Popper, Hayek, Mill, Hayek, Kant ou Bastiat concordariam entre si em inúmeras coisas. Por exemplo, para Bastiat ou Hayek, Mill seria um perigoso socialista.

Filipe Castro disse...

O João Moutinho escreveu aqui uma frase que é um axioma de fé: "é quem quer aprender não pode e não é injectando-se mais dinheiros nas escolas que as coisas se resolvem."

Por exemplo, JFK conseguiu um milagre na educacao americana injectando dinheiro nas escolas. :o)

Filipe Castro disse...

David Lourenco Mestre acha que a minha visão do neoconservadorismo é absurda. Mas deve saber que Milton Friedman era amigo pessoal de Pinochet e que um numero significativo dos 'Chicago Boys' foi direito para o governo de Pinochet antes que o cadaver do presidente eleito, Salvador Allende, ter tempo de arrefecer.

Anónimo disse...

O Filipe Castro está a ser mauzinho, parece um daqueles políticos dotados de apanharem uma "escapadela" dos adversários.
Não pretendo defender axiomas, não defendo posições dogmáticas ou que não se invista monetariamente nas escolas. O que quero dizer é que a "injecção de Dinheiro" é utilizada muitas vezes como um argumento até à exaustão e muitas vezes funciona como descarga de consciência. E não deixa de ser verdade que haja quem queira aprender (ou ensinar) e não possa.
Quanto ao que sei o Japão é dos países ocidentais que menor percentagem do PNB gasta em educção e os resultados estão á vista.
Lá as criancinhas limpam as saulas de aula e preparam as refeições.
O Pinochet foi amigo de muita gente, até 11 de Setemebro de 1973 era muito amigo do Salvador. Dois meses antes houve uma intentona para derrubar o Presidente democraticamente eleito e lá estava ele (o Augusto) para o defender.

João Moutinho

Filipe Castro disse...

:o)

O Milton Friedman foi amigo e conselheiro do presidente Pinochet.

E é claro que as coisas não se podem resumir ao dinheiro. Mas os neoliberais não falam doutra coisa, e eu... :o)