Não encontrei ainda defensores do cheque-ensino que proponham este aumento ou que justifiquem porque se há de reduzir a contribuição dos mais ricos para o ensino dos mais pobres. Mas este nem é o problema mais importante. No Blasfémias, o João Miranda escreveu:
«O cheque ensino é em primeiro lugar uma solução para o ensino público. Serve para levar mecanismos de mercado ao ensino público. Serve para forçar as escolas públicas a funcionar de acordo com as preferências dos clientes em vez de funcionarem de acordo com as preferências dos burocratas e dos professores. Serve para tornar a gestão das escolas públicas mais eficiente.»
E é esse o problema. Imaginem o cheque-saúde. Cada pessoa teria um cheque anual para as suas despesas de saúde, forçando os hospitais a funcionar de acordo com as preferências dos clientes e a tornar a sua gestão mais eficiente. Que grande treta. Os recursos médicos devem ser distribuídos em função das necessidades e não equitativamente. Os mecanismos de mercado seguem as preferências dos clientes mas dão mais peso aos clientes que pagam mais. E a eficiência não é naquilo que queremos.
O mercado favorece os tratamentos mais rentáveis e a gestão do serviço em função do retorno pelo investimento. A menos que o paciente seja rico, ganha-se eficiência deixando morrer quem tem doenças prolongadas e dispendiosas de tratar. O mais «eficiente» são tratamentos curtos a pessoas saudáveis, que têm menos riscos de complicações e de demora na recuperação. O cheque-saúde ia promover a cirurgia plástica eficiente e acabar com a saúde preventiva e os tratamentos das doenças dos pobres.
O cheque-ensino tem os mesmos problemas. Queremos escolas onde são mais necessárias e não onde dão mais lucro. Queremos um sistema de ensino para servir as necessidades dos filhos de forma equitativa. Não para servir as preferências dos pais em função do dinheiro que têm. E a eficiência do ensino está no que ajuda os que mais precisam e não no retorno médio pelo investimento.
É mais rentável educar crianças que têm um ambiente estável em casa, pais que as podem ajudar e que participam na sua educação. Mas quem precisa mais do sistema de ensino são os outros. Aqueles que, pelos mecanismos de mercado, seria ineficiente ensinar.»
Nota:voltando a aproveitar a política de ausência de direitos reservados ( ;) ), este texto é descaradamente copiado do blogue Que Treta!.
5 comentários :
SEm discordar do conteúdo, esta frase
"O cheque-saúde ia promover a cirurgia plástica eficiente e acabar com a saúde preventiva e os tratamentos das doenças dos pobres."
é um disparate a toda a frente que não merece ser repetido.
A mim parece-me disparatado é qualificar dessa forma essa frase do texto sem dar qualquer argumento.
Quanto a mim a frase faz todo o sentido. Quem discorda que explique porque o faz.
eu acho que o Filipe tem razão
A "doenca de pobre" e' a tuberculose e a "de rico" os pes-de-galinha, e' isso?
Num pais desses, todo o bom doutor dedicava-se 'a cirurgia plastica sem precisar de cheques especiais. E garanto-vos que mercado esta' longe de estar saturado.
Nao e' preciso sonhar com ladroes: nos hospitais do SNS, por exemplo, ha' quem recuse cirurgias com base na probabilidade de sucesso e nao na necessidade de sucesso. Para manter um curriculo imaculado nao ha' dinheiro que valha ao doente porque as intervencoes em privado tambem sao cadastradas. Esta e' apenas uma das muitas praticas duvidosas de uma corporacao que se julga acima do juizo publico.
As reputacoes profissionais aqui valem mais que tudo. Com elas jogam-se carreiras e poder em comparacao com os quais o rendimento e' somente um efeito secundario.
Por isto, quem manda na politica de saude, i.e., os medicos, nao tem qualquer tipo de interesse em mudar para um sistema americano.
Ensino e saude sao coisas muito diferentes e nao passa de demagogia de cafe' usar uma aberracao teorica nos alhos como alerta para um perigo inexistente nos bugalhos. Ate' porque nao vivemos nos EUA nem para la' caminhamos, gracas a deus.
Claro que ensiono e saúde são coisas diferentes, são assim as analogias. Mas se a diferença é tal que a analogia não se justifique, tem de explicar em que medida é que isso se verifica. Quanto a mim, a analogia é bem certeira.
Quanto ao resto, nem entendo a relação com o texto que citei.
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