sábado, 7 de agosto de 2010

O único sector do Estado em que não há crise

Nos últimos anos, o Estado tem exercido contenção de gastos em serviços públicos fundamentais, como a Saúde e a Educação. É a crise e tal, há que cortar aqui e acolá. E no entanto, há um sector em que o pessoal admitido aumentou 20% desde 2004: os serviços «de informações». Que serviço público prestam? Nenhum. Com várias agravantes. Primeira: ao contrário de outros serviços do Estado, em que o escrutínio dos cidadãos é efectuado sem grandes entraves, os «informaçõezinhas» eximem-se, à partida, ao controlo pelos cidadãos do seu desempenho. A existência de uma cultura de «funcionários do Estado acima da lei»,  dentro destes serviços, é inevitável, e parece evidente quando o próprio «Secretário Geral da Segurança Interna» circula a 120 km/h na Avenida da Liberdade, provocando um acidente grave, e depois declara, aparentemente sem remorsos nem problemas de consciência, que «não notou excessos por parte do motorista que o conduzia». Segunda agravante, mais delicada: alguns destes serviços praticam, ao que parece rotineiramente, crimes de escutas ilegais. E, possivelmente, tortura. O regime em que vivemos desde Abril de 1974 partiu, penso eu, do princípio de que o Estado não tortura nem vigia ilegalmente quem não cometeu crimes.

Incrivelmente, os cidadãos estão calados. Parecem achar mais grave a licenciatura ao domingo e a estética das casas que Sócrates assinou na Covilhã. Enquanto os cidadãos dormem, pode estar a criar-se um monstro. É o momento de o questionar. Como já se faz nos EUA, por exemplo.

Adenda: o orçamento SIS+SIED subiu de 22.4 milhões em 2005 para 37.1 milhões  em 2009. Um aumento de 65%. Acho que em nenhuma outro departamento do governo o orçamento aumentou tanto. E para quê?

4 comentários :

Miguel Carvalho disse...

Ricardo,
já mencionaste a tortura várias vezes, mas tal suspeita não aparece em nenhum dos links que deixaste.

Ricardo Alves disse...

Miguel,
está no domínio público que o Sofiane Laib foi retirado de Portugal a meio da noite, após ter cumprido uma pena de prisão por um delito menor (documentos falsos). Era suspeito de ser membro da Al-Qaeda, e, concretamente, próximo do «grupo de Hamburgo» (os que fizeram o 11 de setembro). Toda a forma como foi retirado de Portugal, por agentes que não é claro (na imprensa) se eram do SEF ou do SIS, a meio da noite, para ser interrogado no aeroporto de Madrid (agentes dos EUA já tinham falado com ele na prisão, em Portugal), e como foi levado para a Argélia (destino final ou não...), tudo isso parece configurar o modo de actuar típico das redes de tortura que neste momento actuam operadas por serviços «de informações» europeus e estado-unidenses. No caso dos voos da CIA, a Ana Gomes fez algum barulho, mas a acusação era que se teria dado cobertura (encoberto) casos de tortura cometidos por outrém. No caso do Sofiane Laib, foi entregue directamente por portugueses. Para tortura? Em caso afirmativo, com a participação de agentes do SIS português ou de outro serviço? As perguntas parecem seguir-se inevitavelmente...

Miguel Carvalho disse...

Ricardo,

eu estou contigo nessas críticas todas, não percebo porque repetiste isso tudo.

Apenas questionei a tua acusação da tortura. Trata-se de uma suspeição infundada, sem qualquer fonte de informação (por mais duvidosa que fosse). No teu post de Junho nem dás a entender que é uma suspeição, mas assume-la como um facto ("assumir que mandou a escumalha do Forte da Ameixoeira torturar Sofiane Laib").

Dizer que há casos semelhantes onde houve tortura não prova, nem sequer indicia seja o que for. Muito menos que as ordens de tortura partiram de Lisboa.

Ricardo Alves disse...

Miguel,
eu começo o meu comentário por «está no domínio público». Depois descrevo um evento que é semelhante a dezenas de outros que ocorreram na Europa ocidental nestes últimos nove anos, e que sabemos que terminaram em tortura. Como dizes, que nove vírgula nove em cada dez casos destes terminem em waterboarding não quer dizer que este tenha terminado dessa forma. Mas dou a minha palavra de honra em como as minhas «suspeitas» não são infundadas.