É evidente que os blogues têm vantagens. À partida, a facilidade de edição de páginas (editar html não é para todos), que abre a possibilidade de construir uma colecção pessoal daquilo que se quiser: reflexões pessoais, fotografias de pessoas com quase toda a pele à mostra, tentativas literárias, linques para artigos que não se quer arquivar no disco rígido, fotografias de paisagens ou de amigos, canções pilhadas na internete, ou ainda uma mistura de alguns ou mesmo de todos os itens anteriores. Quem mantém um blogue porque persegue uma paixão estética ou satisfaz um impulso «colecionista» tem todo o meu respeito: no fundo, procura apenas alguma realização pessoal, escrevendo sobretudo para si e para meia dúzia de amigos.
No entanto, os blogues que chamaram a atenção dos media partem de uma intenção totalmente diferente: a de serem pequenos jornais de opinião política. É evidente que isso é também inteiramente legítimo (embora seja menos desinteressado), e pode mesmo ser inovador. O «meu» Diário Ateísta, por exemplo, tenta fornecer um serviço que, de outra forma, seria impossível obter em língua portuguesa: o mundo visto de um ponto de vista ateísta, notícias sobre as religiões ignoradas noutros media, alguma divulgação científica. A propósito, não é demais enfatizar que os jornais portugueses, quando escrevem sobre religião o fazem de um ponto de vista exclusivamente católico, e que só falam de ateísmo quando o Saramago é entrevistado. Mais: que me recorde, só existe uma coluna regular sobre ciência (a de Nuno Crato no Expresso). É essa mais-valia (trazer ao debate público informação e pontos de vista de outro modo ausentes) que me fez entrar e me faz continuar na blogo-esfera, assim como me fizera participar nos niusgrupes.
No entanto, a maior parte dos blogues com enfoque político têm uma falta de originalidade aflitiva. Limitam-se a repetir os destaques do telejornal das 20 horas, por vezes acrescido de uma opinião roubada num qualquer jornal obscuro de língua inglesa, quando poderiam trazer ao debate informação ignorada ou subestimada em Portugal. É portanto forçoso concluir que se encaram mais como um complemento às colunas de opinião dos jornais do que como uma alternativa aos media tradicionais. Significativo a este respeito é o facto de se dar grande importância aos blogues de pessoas que se tornaram conhecidas através dos media tradicionais, como o Abrupto de Pacheco Pereira ou o Causa Nossa de Vital Moreira e Ana Gomes. Pessoalmente, raramente visito o famosíssimo blogue de Pacheco Pereira, justamente porque me dá pontos de vista a que já tinha acesso através dos media tradicionais, quando o que eu procuro na internete são os pontos de vista dos excluídos desses media...
A ausência de uma procura deliberada da inovação não seria grave em si mesma, se a própria ferramenta blogue não criasse efeitos perversos que a longo prazo têm sido muito mais nocivos e que acabam por conferir à maior parte dos blogues todos os defeitos dos media tradicionais e ainda mais alguns. Mas isso fica para o próximo fascículo...
(Volumes anteriores nesta colecção: Eu e a internete, Eu e a blogo-esfera(1).)
5 comentários :
Ricardo
Eu costumo dizer que um blogue permite libertar "o pequeno Marcelo Rebelo de Sousa que dentro de cada um de nós".
Quanto aos blogues de politicos conhecidos (JPP, VM, JMF,...) eles têm a vantagem de nos fazerem sentir próximos deles (sobretudo quando eles respondem, ou publicam, algum dos nossos comentários.
«Quanto aos blogues de politicos conhecidos (JPP, VM, JMF,...) eles têm a vantagem de nos fazerem sentir próximos deles (sobretudo quando eles respondem, ou publicam, algum dos nossos comentários.»
Eles jogam com isso. Os blogues também são um jogo de poder um bocado perverso, mas é melhor deixar isso para o próximo volume desta saga...
(Quem é esse JMF e que blogue tem?)
Cumprimentos,
JMF - José Medeiros Ferreira (Bicho Carpinteiro)
Pode ser um jogo da parte deles. Mas eu como cidadão gosto da proximidade que o "jogo" me proporciona. :-)
...tens bastante razão...na maioria do teu artigo...um abraço...
Nem mais.Neste, como noutros casos, a blogoesfera reflecte o mundo fechado e tacanho que é Portugal.Confesso que tambem não visito o Abrupto (publicado pelo Antonio Ferro do novo regime) e afins,porque começo a estar farto de ser "manipulado" e não gosto de alimentar vaidades de prima-donas que não fizeram mais nada na vida do que comentar a vida dos outros.
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