quarta-feira, 13 de julho de 2005

O bombismo suicida

Segundo as últimas notícias, os atentados de Londres foram cometidos por quatro bombistas suicidas, todos eles súbditos britânicos de origem paquistanesa com idades entre os 18 e os 30 anos. Aparentemente, nenhum tivera qualquer actividade extremista anteriormente.
Muitas pessoas, na direita religiosa e na esquerda multiculturalista, resistem a aceitar que a religião islâmica possa criar o enquadramento ideológico para o terrorismo e a motivação psicológica para o suicídio bombista.
Efectivamente, é verdade que a escolha da táctica (bombismo suicida) e dos alvos (países democráticos com tropas em «territórios ocupados») é partilhada quer por grupos islamistas (Al-Qaida, Jihad Islâmica) quer por grupos marxistas-leninistas (PKK do Curdistão, os Tigres Tamil do Sri Lanka). Em ambos os casos, o objectivo imediato será (divergindo agora do que afirmei anteriormente) impressionar as opiniões públicas dos países democráticos para que pressionem pela retirada das suas tropas. Esta linha de argumentação é desenvolvida por Robert Pape numa entrevista.
No entanto, afirmar que o factor religioso é pouco relevante, como faz Joana Amaral Dias num artigo do blogue Bichos Carpinteiros, é desvalorizar quer os objectivos finais quer as motivações individuais. Na entrevista de Robert Pape referida, pode também ler-se:
«Not every foreign occupation has produced suicide terrorism. Why do some and not others? Here is where religion matters, but not quite in the way most people think. In virtually every instance where an occupation has produced a suicide-terrorist campaign, there has been a religious difference between the occupier and the occupied community. That is true not only in places such as Lebanon and in Iraq today but also in Sri Lanka, where it is the Sinhala Buddhists who are having a dispute with the Hindu Tamils.
When there is a religious difference between the occupier and the occupied, that enables terrorist leaders to demonize the occupier in especially vicious ways. Now, that still requires the occupier to be there. Absent the presence of foreign troops, Osama bin Laden could make his arguments but there wouldn’t be much reality behind them

8 comentários :

Pedro Viana disse...

"resistem a aceitar que a religião islâmica possa criar o enquadramento ideológico para o terrorismo e a motivação psicológica para o suicídio bombista."

Aceito perfeitamente, mas acho que a religião islâmica não é única nisso. Como aliás o resto do post reconhece, o "enquadramento ideológico para o terrorismo e a motivação psicológica para o suicídio bombista" pode advir de qualquer religião. Todas elas geram pessoas com o perfil suicida típico: alguém disposto a obedecer a instruções sem questionar.

Agora, acho que há um empolamento da questão do suicídio. Um atentado é um atentado, e a sua gravidade não resulta maior porque aquele que o executa decidiu morrer no atentado. A repulsa pelo suícidio nas nossas sociedades tanto tem origem no dogma cristão como no hedonismo ocidental, incapaz de aceitar como legítimo alguém abdicar do prazer (de viver). Não tenho por princípio nada contra o sacrifício pessoal (ex. alguém desesperadamente meter-se à frente de uma bala para salvar uma pessoa querida), mas apenas o acho como válido em certas condições muito especiais. E dificil dizer quais são. Mesmo o tirar vidas no âmbito desse sacrifício, que me repugna por princípio, não é algo que automaticamente possa excluir. Um exemplo típico: teria sido legítimo um bombista tentar matar Hitler? Há um exemplo: Claus von Stauffenberg. Foi um herói, ou um monstro bombista? O atentado poderia ter tido sucesso se ele se tivesse mantido no gabinete e aproximado de Hitler com a pasta no momento da explosão. Teria sido um herói, ou um monstro bombista suicida?...

Ricardo Alves disse...

Pedro,
o horror que o suicídio bombismo causa resulta, em primeira instância, de evidenciar a adesão a uma ideologia tão totalitária que leva as pessoas a sacrificarem a sua própria vida (não no sentido de «dedicar a vida a...», mas no sentido de morrer pela causa). Além disso, o bombista que se suicida destrói as provas, as pistas, e a hipótese de o punirmos.

Pedro Viana disse...

"o horror que o suicídio bombismo causa resulta, em primeira instância, de evidenciar a adesão a uma ideologia tão totalitária que leva as pessoas a sacrificarem a sua própria vida (não no sentido de «dedicar a vida a...», mas no sentido de morrer pela causa)."

Ninguém mata (suicidando-se ou não no processo) pela "causa". Todos os que matam deliberadametne fazem-no pela sua família, pelos seus camaradas (que eventualmente partilham a sua causa), pela sua comunidade (real ou imaginária), ou então porque sim (e entramos então na patologia, ex. assassinos em série). Ninguém mata deliberadamente por algo abstracto, como a ideologia. Mesmo que apelem à ideologia fazem-no sempre porque acham que essa ideologia protege a família, camaradas, comunidade, e portanto na realidade é em nome deles que matam (e morrem). Não há assim tanta diferença, em termos dos processos internos de justificação, entre os bombistas suicidas de Londres e alguém que mata em auto-defesa para proteger a família. Não é verdade, nem é útil (porque dificulta a compreensão, e portanto a tomada de medidas eficazes para precaver o fenómeno terrorista), pretender que o terrorista (suicida ou não) é de algum modo não-humano, ou que está sob a influência de processos mentais anormais. As ideologias não são mais ou menos totalitárias nos seus fundamentos, mas sim na sua capacidade de gerarem comunidades coesas e intensamente solidárias. Neste sentido, por exemplo o amor é uma ideologia totalitária, pois gera facilmente uma comunidade (a família) intensamente solidária, onde as pessoas admitem sacrificarem-se em prol das outras, matando se necessário.

"Além disso, o bombista que se suicida destrói as provas, as pistas, e a hipótese de o punirmos."

Há aqui alguns equívocos. Não há qualquer destruição das provas ou pistas. Aliás, ao se suicidar, aquele que faz o atentado geralmente deixa muito mais pistas (a não ser que se consiga reduzir a pó) sobre quem é, do que aquele que se afasta. Quantos assassínos nunca são identificados? E se todos eles se suicidassem no local?... Quanto à hipótese de o punirmos.... pareceu-me que o ricardo era da opinião que não há nada pior do que a morte.... a não ser que estivesse a pensar em torturá-lo, e eventualmente depois matá-lo.

Luís Bonifácio disse...

Tudo depende da maneira com que se lê "o livro".
Uma pessoa religiosa lê "o livro" para encontrar respostas.
Um fundamentalista lê "o livro" para encontrar justificações!

Luís Bonifácio disse...

O postulado de Pape não se verificou na luta pela independência em Timor-Leste!

Biranta disse...

Coitados dos Suicidas. Nem eles sabiam que o eram. Se calhar nem sabiam o que iam fazer. Isto admitindo que foram esses que o fizeram...
Veja os meus artigos sobre este assunto, porque as evidências são tantas que já não é possível continuar a ignorar a realidade...
Estes atentados (também) têm a marca da CIA
em: http://sociocracia.blogspot.com

Ricardo Alves disse...

Luis Bonifácio,
Robert Pape não postula que:
Território ocupado => bombismo suicida
Pelo contrário, ele observa que:
Bombismo suicida => território ocupado por Estado democrático
Note o que ele diz sobre o IRA, por exemplo.

Ricardo Alves disse...

Pedro,
as suas observações realmente estão a fazer-me pensar sobre o bombismo suicida.