terça-feira, 1 de setembro de 2009

Por que não apelo ao voto

Este blogue já conta com dois apelos ao voto no PS, do Ricardo Schiappa e do João Vasco. Eu, não apelo ao voto. Nem no PS, nem no BE, nem na CDU.

Não apelo ao voto no PS porque, na legislatura que agora termina, não houve nenhuma grande medida de reforço do Estado Social. Guterres, que critiquei imenso, deixou o Rendimento Mínimo Garantido. Sócrates será lembrado pelo combate a algumas «corporações», mas não por ter alargado ou melhorado significativamente os serviços públicos de saúde, educação ou segurança social. Na escola pública, «comprou» uma guerra com os professores que ainda lhe poderá custar a vitória de dia 27 - se até lá não der um sinal de apaziguamento. Não se reforma um sector contra a esmagadora maioria dos profissionais desse sector, e um político democrático tem que saber reconhecer os limites da teimosia. E creio que a «municipalização» da gestão da escola pública é um erro cujas consequências, embora possam demorar muito tempo a ser reconhecidas, serão graves.

E não apelo ao voto no PS porque, pela enésima vez, a «questão europeia» foi tratada como o grande tabu do regime democrático (comparável às colónias no salazarismo), sobre o qual não se pode divergir, questionar, ou sequer informar o povo. Não houve referendo, ao contrário do prometido, e nem sequer uma tentativa de explicar aos cidadãos que a União Europeia, hoje, é mais determinante para os próximos quatro anos deste país (e para a legislação que o Parlamento que vamos eleger produzirá) do que as eleições de dia 27.

Finalmente, não apelo ao voto no PS porque ouvi falar em alterar a Constituição para legalizar as escutas telefónicas que os serviços de informações fazem ilegalmente, porque o Primeiro Ministro concentrou as polícias sob a sua tutela directa, por causa disto, e porque um governo que nada faz de significativo pela laicidade do Estado, e até mantém padres equiparados a funcionários públicos quando despede médicos e enfermeiros (isto, num contexto de secularização acelerada da sociedade portuguesa), não merece a caracterização de «socialista, republicano e laico», quando muito de «social-cristão, semi-republicano e laico maricas».

Também não apelo ao voto na CDU porque, embora o PCP seja justamente soberanista na questão europeia, é uma sobrevivência estalinista cada vez mais anacrónica. Claro que isso só afecta quem lá está dentro, e que o PCP tem mérito nas lutas sociais que organiza e na representação dos sectores operários (reconheço-o), mas não é propriamente um sinal de saúde da sociedade portuguesa ter um partido cripto-totalitário que representa 10% do eleitorado e controla dezenas de câmaras. Ponto.

E não apelo ao voto no BE porque cada vez se parece mais com um saco cheio de ilusões que rebentarão no dia em que esse partido for chamado a exercer o poder, seja sob que forma for. Não sei qual é a ideologia do BE, para além do «caldo de cultura» que ficou do 25 de Abril, e que é hegemónico (e ainda bem) em alguma juventude urbana. E, se o BE tem qualidades, até na denúncia da corrupção (apesar dos exageros moralistas), há indefinições que podem ser mortais a prazo. Que tipo de democracia e que tipo de socialismo quer o BE? Da resposta a essa pergunta depende saber se ainda poderá ser a «ala radical» da esquerda de governo que muitos esperavam que fosse, mas que, provavelmente (e o problema é todo esse), os seus dirigentes com mais de 45 anos nunca quiseram que fosse.

Resumindo: não vou votar nem branco nem nulo, muito menos na direita, e apelo a que todos votem. Mesmo que seja contra mim.

8 comentários :

Ruca disse...

Para o PS e para o PCP apresenta razões claras para não votar. Quanto ao BE parece-lhe "isto" e "aquilo" e até tem "qualidades". O BE já disse que não quer ser governo com Sócrates. O tipo de governo que o BE defende vem no programa (óbvio que tem um programa menos claro do que aqueles que querem realmente governar). Claro que isto não são razões para votar BE, mas também não são razões palpáveis (pelo menos como as que apresenta para os outros dois partidos) para não votar.

Ricardo Alves disse...

Caro Ruca,
eu reconheço «qualidades» ao PS e ao PCP. Algumas até vêm no texto. O PS até será, acrescento, o mais «democrático» dos três (em termos de projecto de sociedade). E o PCP o voto mais «seguro» (sabe-se exactamente o que vai sair dali).

Quanto às razões para não votar BE, também lá estão: não se sabe o que seria quando apoiasse um governo, e suspeito que explodiria.

Cumprimentos à Rosita e cuidado com o Riscas.

no name disse...

"...mas não por ter alargado ou melhorado significativamente os serviços públicos de saúde, educação ou segurança social..."

ricardo, sejamos pragmáticos: há que reconhecer que a significativa melhoria da sustentabilidade da segurança social não é coisa pouca (e que o psd agora quer colocar em risco). e a reposição da tendência decrescente da taxa de risco de pobreza (aliás para valores mais baixos que no tempo guterres) também me parece merecedora de nota.

devemos ser exigentes e querer sempre mais. mas também temos que ser pragmáticos e reconhecer algum trabalho feito no bom caminho! mais terá que vir.

Ricardo Alves disse...

Justamente, Ricardo. Esse trabalho não me parece suficiente para apelar ao voto no PS.

Anónimo disse...

??????Belo post sobre o non-sense.
Além disso,gosto do cripto-totalitário,algo 'entelectual',tipo Hanna-Arendt e toda a pafernália Hayekiana no fundo.Pena é que não fale dos partidos amigos dos EUA com das oitocentas e tal bases militares espalhadas pelo mundo e a sua praxis Imperialista(termo em desuso desde a queda da cortina fe ferro(aposto q gosta deste termo,inventado por esse ganda democrata do Churcill,pessoa nada eugenista, nem racista...)

Anónimo disse...

Nem é de direita nem de esquerda,antes pelo contrário...

João Vasco disse...

Anónimo(s?):

Acho que está a falhar o alvo...

Ricardo Alves disse...

«Nem é de direita nem de esquerda,antes pelo contrário»

Se isso é comigo, a resposta é que estou à esquerda, mas um bocado desalinhado.