Tomo este texto do Daniel Oliveira como base. Li muitas opiniões parecidas de pessoas de esquerda.
Pelos vistos muita gente acha que o Martim não tem idade para responder às questões que lhe foram colocadas pela Raquel. Mantenho-me na minha: qualquer empresário tem que lhes saber responder. O Martim então, se calhar, não terá idade para ser empresário. Espanta-me que ninguém questione isto. Espanta-me que ninguém pergunte ao Martim com que capital começou ele o seu negócio. Espanta-me que toda a gente ache isto perfeitamente natural. E espanta-me (e dececiona-me) que se ache melhor exemplo para o país um menino filho de pais ricos que faz t-shirts que uma académica com trabalho reconhecido. Acresce que na blogosfera e nas redes sociais, sobre este assunto, o que se lê mais são comentários do tipo "David contra Golias", como "o jovem empreendedor deixou sem palavras a doutorada". Até "professora catedrática" já vi chamarem a uma bolseira de pós doutoramento. Tal atitude mesquinha revela um desprezo pela academia e pelo conhecimento que justifica bem como este povo teve um ministro chamado Relvas.
Já o Martim, de acordo com o mesmo texto do Daniel Oliveira, é "um miúdo empenhado, com genica, a querer viver da sua criatividade e do seu trabalho. Não vi um chico esperto, um arrivista, alguém que espezinha os outros para subir na vida. Vi alguém que quer fazer o que gosta e faz por isso. Nada sei sobre ele. Ninguém ali sabia. Logo, o que interessa é o que se viu: um miúdo articulado, despachado, esperto e empenhado." Extraordinário: o Daniel Oliveira não conhece o míudo, mas "viu" isto tudo num vídeo de dois ou três minutos. Teria sucesso a fazer entrevistas de emprego: é rápido a "ver" as pessoas.
Mantenho: não é natural um miúdo de dezasseis anos ser empresário. É normal querer vir a ser. É normal ter ambições e querer progredir na vida. Da minha parte aprecio isso desde que se comece de baixo. E um miúdo que aos dezasseis anos é empresário não começou por baixo.
Há quem refira como uma "virtude" o empreendedorismo de um rapaz que, apesar de não ter necessidade, prefere trabalhar a ficar a ver televisão ou jogar computador. Não concordo. Aos dezasseis anos há muita coisa ainda para aprender e descobrir. Parece-me desejável que se aprenda e descubra algumas dessas coisas mais básicas antes de se começar a trabalhar (principalmente como empresário), mesmo se a trabalhar se descobrem muitas outras coisas. Mas convém estar preparado para elas. Por muito talento que se tenha (e eu não nego o talento do Martim), esse talento será muito melhor desenvolvido com esse conhecimento. Ao elogiarmos a atitude de um rapaz que, por sua livre escolha, e sem precisar, aos dezasseis anos se tornou empresário, estamos a elogiar quem tem como principais, se não únicos valores, o sucesso pessoal, o individualismo e a ganância. Não serei eu a elogiar tal estilo de vida.
Há muitas outras coisas que um rapaz de dezasseis anos pode fazer para se sentir útil, a começar dentro da sua própria casa. Alguém perguntou ao Martim que tarefas domésticas ele realiza? Será que ele sabe cozinhar? Será que ao menos limpa e arruma o seu quarto? Queremos mesmo tomar como exemplo alguém de dezasseis anos que se tornou empresário com dinheiro da família e nunca sequer fez estas tarefas tão simples? Que mundo é o que queremos construir, afinal?
"Martim Neves, sem o saber (ou sabendo, é indiferente), atirou por terra tudo que Raquel Varela tivesse para dizer. Porque a historiadora não tinha razão? Porque o salário mínimo dá para viver? Nada disso. (...) O problema de Raquel Varela foi ter escolhido a pessoa errada para ilustrar o seu ponto de vista."Portanto o problema não é a opinião: é mesmo a Raquel Varela. Reconheço que muitas das opiniões políticas da Raquel (que eu não conheço) são polémicas, mas não é preciso concordar com elas. Parece-me, porém, que o que leva muitas pessoas de esquerda a demarcarem-se da Raquel Varela é o terem medo de serem associados a essas opiniões polémicas. Nada disso, no entanto, se viu no momento da polémica, a questão ao Martim no Prós e Contras. A Raquel não foi agressiva e limitou-se a falar com ele.
Pelos vistos muita gente acha que o Martim não tem idade para responder às questões que lhe foram colocadas pela Raquel. Mantenho-me na minha: qualquer empresário tem que lhes saber responder. O Martim então, se calhar, não terá idade para ser empresário. Espanta-me que ninguém questione isto. Espanta-me que ninguém pergunte ao Martim com que capital começou ele o seu negócio. Espanta-me que toda a gente ache isto perfeitamente natural. E espanta-me (e dececiona-me) que se ache melhor exemplo para o país um menino filho de pais ricos que faz t-shirts que uma académica com trabalho reconhecido. Acresce que na blogosfera e nas redes sociais, sobre este assunto, o que se lê mais são comentários do tipo "David contra Golias", como "o jovem empreendedor deixou sem palavras a doutorada". Até "professora catedrática" já vi chamarem a uma bolseira de pós doutoramento. Tal atitude mesquinha revela um desprezo pela academia e pelo conhecimento que justifica bem como este povo teve um ministro chamado Relvas.
Já o Martim, de acordo com o mesmo texto do Daniel Oliveira, é "um miúdo empenhado, com genica, a querer viver da sua criatividade e do seu trabalho. Não vi um chico esperto, um arrivista, alguém que espezinha os outros para subir na vida. Vi alguém que quer fazer o que gosta e faz por isso. Nada sei sobre ele. Ninguém ali sabia. Logo, o que interessa é o que se viu: um miúdo articulado, despachado, esperto e empenhado." Extraordinário: o Daniel Oliveira não conhece o míudo, mas "viu" isto tudo num vídeo de dois ou três minutos. Teria sucesso a fazer entrevistas de emprego: é rápido a "ver" as pessoas.
Mantenho: não é natural um miúdo de dezasseis anos ser empresário. É normal querer vir a ser. É normal ter ambições e querer progredir na vida. Da minha parte aprecio isso desde que se comece de baixo. E um miúdo que aos dezasseis anos é empresário não começou por baixo.
Há quem refira como uma "virtude" o empreendedorismo de um rapaz que, apesar de não ter necessidade, prefere trabalhar a ficar a ver televisão ou jogar computador. Não concordo. Aos dezasseis anos há muita coisa ainda para aprender e descobrir. Parece-me desejável que se aprenda e descubra algumas dessas coisas mais básicas antes de se começar a trabalhar (principalmente como empresário), mesmo se a trabalhar se descobrem muitas outras coisas. Mas convém estar preparado para elas. Por muito talento que se tenha (e eu não nego o talento do Martim), esse talento será muito melhor desenvolvido com esse conhecimento. Ao elogiarmos a atitude de um rapaz que, por sua livre escolha, e sem precisar, aos dezasseis anos se tornou empresário, estamos a elogiar quem tem como principais, se não únicos valores, o sucesso pessoal, o individualismo e a ganância. Não serei eu a elogiar tal estilo de vida.
Há muitas outras coisas que um rapaz de dezasseis anos pode fazer para se sentir útil, a começar dentro da sua própria casa. Alguém perguntou ao Martim que tarefas domésticas ele realiza? Será que ele sabe cozinhar? Será que ao menos limpa e arruma o seu quarto? Queremos mesmo tomar como exemplo alguém de dezasseis anos que se tornou empresário com dinheiro da família e nunca sequer fez estas tarefas tão simples? Que mundo é o que queremos construir, afinal?
11 comentários :
Filipe,
parece-me que não entendes que a impressão que passa no vídeo que foi viral nas redes sociais é que a Raquel Varela acha que não se deve ser empresário antes de termos resolvido o problema dos trabalhadores da China e do Bangladesh, ou no mínimo antes de subirmos o salário mínimo em Porrtugal (ou até que *nunca* se deve ser empresário). Tu pareces concordar com a Raquel Varela quando afirmas que «qualquer empresário tem que lhes saber responder [a essas questões]». É quase o mesmo que afirmares que antes de se ser operário se tem que compreender o que é a mais-valia e a condição proletária, ou que antes de se ser camponês se tem que entender o minifúndio e o latifúndio (permite-me a redução ao absurdo). Quer a tua posição quer a da Raquel Varela têm essa fragilidade de base que é querer impedir outrem de fazer algo que provavelmente realiza essa pessoa e lhe dá dinheiro - e que não faz mal a ninguém - e de o quererem fazer porque acham que a pessoa em causa não entende consequências muito remotas do que faz.
Haveria outras coisas a dizer sobre o teu texto. Qualquer sociedade em que o sucesso pessoal não seja um valor, está condenada à estagnação e/ou ao carneirismo. Vais dizer-me que não tentas ter sucesso todos os dias? (E continuas a usar «individualismo» com sentido pejorativo, mas vou deixar passar essa). Quanto à «ganância», a verdade é que não tens bases para afirmar que esse é um factor nesta estória.
Concordo contigo que alguém lhe deveria ter perguntado onde conseguiu o capital para o negócio. Mas não foi essa a pergunta que a Raquel Varela fez, pois não?
Ricardo, parece-me que não entendes que resolver os problemas dos trabalhadores na China e saber quais são os problemas dos trabalhadores das fábricas têxteis são duas coisas bem diferentes. Se uma pessoa defende que é necessária a segunda dessas premissas, como eu, não tem necessariamente de defender que é necessária a primeira (e não garanto que a Raquel Varela sequer a defenda). Parece-me que não entendes isto, e como tal grande parte do teu primeiro parágrafo não faz sentido.
Ainda assim, só deves estar a ler a direita e o Daniel Oliveira. A questão do Daniel Oliveira e da Raquel Varela são divergências antigas dentro do Bloco, e é disso que o Daniel se quer demarcar. Mas parece-me que não entendes que, mesmo em setores ligados ao PS, há muita gente que vê o que é essencial aqui. Um exemplo (há mais): http://quandooslobosuivam.blogs.sapo.pt/33293.html
Quanto ao teu segundo parágrafo: parece-me que não entendes que há uma grande diferença entre ter o sucesso pessoal como valor (eu tenho-o) e não se preocupar com os efeitos que o seu sucesso possam ter, ou que custo para a sociedade teve. Isto é uma forma de individualismo.
"E continuas a usar «individualismo» com sentido pejorativo, mas vou deixar passar essa."
Obrigado, Mestre. Não te queres queixar à PGR?
Lapidar, FM, lapidar!
http://www.publico.pt/sociedade/noticia/natalia-trabalha-12-horas-por-dia-seis-dias-por-semana-mas-tem-que-pedir-ajuda-para-comer-1595560
Natália trabalha 12 horas por dia, seis dias por semana, mas tem que pedir ajuda para comer
....mas ao menos tem emprego, näo é? :shock:
Filipe,
tu, a Raquel Varela e os que a defendem não percebem que caíram na esparrela. O Martim não é o banqueiro Espírito Santo, o dono de supermercados Belmiro ou o evasor fiscal Soares dos Santos. É apenas um rapaz que montou um negócio unipessoal que lhe deve levar seis horas de trabalho por semana e render umas centenas de euros por mês. Atirar com a cassete dos salários da China ou com o salário mínimo à cabeça de um adolescente daqueles, ou moralizar como tu fazes neste post sobre o que deve ou não uma pessoa da idade dele estar a fazer, acaba por passar a imagem de uma esquerda dogmática que condena toda e qualquer iniciativa «empresarial» como se fosse obra do «demo». (Já agora: o termo «empresário» é excessivo e até ridículo quando aplicado ao Martim.)
Não concordo com o post desse blogue mencionas, mas concordo com alguns comentários que o criticam.
Quanto à segunda parte da tua resposta: não se preocupar com os efeitos que o nosso sucesso tenha nos outros não é individualismo, é egoísmo. Entendes a diferença?
Acho que o desemprego não lhe iria melhorar a situação, Maquiavel.
Tal como a dos operários cujos patröes violavam mulheres e filhas para lhes manterem os empregos?
Näo entendo como é que a poderia piorar, sinceramente.
É que pelos vistos o emprego é que näo lhe melhorou a situaçäo!
Ainda se dissesses "o filho de 28 anos é que devia ter vergonha na cara e ajudar a mäe", mas com essa do "é melhor comer merda que näo comer merda nenhuma" viro-te as costas.
E depois eu o Filipe, entre outros, é que não percebem que caíram na esparrela. 'tá bem...
Vira-me as costas à vontade. A verdade é que não propuseste nenhuma alternativa realista. Quando eu falei em equilibrar as relações trabalho/capital de uma forma realista - criminalizando os salários em atraso - responderam-me com as PME´s. E entendi que realmente não entendem o que se passa.
Ai fui eu que te respondi isso relativamente aos salários em atraso?
Muito me contas...
Não, relativamente aos salários em atraso até foste dos que entendeste o que estava em causa. Não entendo é como aches que é melhor ganhar dinheiro, mesmo que seja o salário mínimo, do que não ganhar nenhum.
Ricardo, de facto não vale a pena discutir contigo enquanto argumentares com base no que julgas que as pessoas disseram (ou gostarias que tivessem dito), e não no que realmente disseram.
"relativamente aos salários em atraso até foste dos que entendeste o que estava em causa."
É extraordinário como (e os comentários a este post estão aqui para demonstrar), para ti, quem não concorda contigo necessariamente "não entendeu" alguma coisa. Apesar de tudo o João Vasco e os seus "erros" são bem mais divertidos. Acho que isso é falta de hóstias na vossa dieta anticlerical. Recomendo-vos uns ovos moles.
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