Está de volta aquela época do ano em que as ruas de cidades universitárias como Braga são dominadas pela presença de estudantes fardados - ou "trajados" - a rigor, para "semanas académicas" de "queima de fitas". De certa forma para os habitantes dessas cidades tal é um alívio, pois tais festas representam o fim das "praxes", que duravam desde o início do ano letivo. Mas o que acaba são os exercícios humilhantes (e barulhentos) de submissão espalhados pela cidade: no resto, a alienação continua a mesma.
Ainda na sexta à noite passei por um grupo que aguardava transporte para o estádio do Braga, o "queimódromo" lá do sítio. Ocupavam todo o passeio no largo da estação. Em direção a eles dirigiam-se grupos de mais estudantes. Dirigiam-se... a marchar. Sempre em frente, disciplinadamente, sem desviarem o olhar um milímetro. Totalmente indiferentes ao trânsito, aos outros peões, que tinham que parar ou se desviar por causa deles.
Há uma semana um aluno da Universidade do Porto, dirigente académico, morreu ao tentar corajosamente defender a receita da associação de que fazia parte durante um assalto. Da restante direção não se ouviu uma palavra dirigida à família. Nem um remorso pelo colega que deu a vida por uma causa que supostamente seria a deles - e poderia ter sido um deles. Se fosse um espectador numa outra circunstância qualquer ainda se compreenderia - mas era um organizador, que morreu graças a essa função. A festa continuou, com a mesma indiferença com que os estudantes em Braga marchavam.
O país ficou indignado com tal indiferença. Mas só quem nunca presenciou cenas como a que eu testemunhei na sexta à noite (e com que sou quotidianamente confrontado em Braga, durante todo o ano letivo) se pode verdadeiramente surpreender. Dizem-me os defensores das praxes e da "tradição académica" que tais ações servem para "integrar" os estudantes e transmitir-lhes uma "sensação de pertença". Talvez por o estudante falecido ter crescido na Venezuela, deveria ter uma noção diferente do que é integração - e sobretudo de solidariedade. A "pertença" de que falam os praxistas é a uma alienação total.
2 comentários :
Não apenas é uma alienação como os «educa» no carneirismo, como bem descreves no post.
Subscrevo e apoio na integra o conteúdo e o espírito deste post.
É pena que vozes como a sua não tenham a projecção mediática merecida.
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