segunda-feira, 5 de março de 2012

Este Governo não é austero

A maior crítica que a esquerda vem fazendo a este Governo é o de seguir políticas de austeridade radicais, e com isso ajudar a afundar o país.
Eu tenho um problema com esta crítica: não me parece que as políticas do Governo sejam «austeras», pelo contrário: vejo um enorme desperdício, e uma total despreocupação com a preservação do património público.

Cinco exemplos simbólicos de favorecimento de privados que custam milhões ao estado vêm-me à memória:

«uma das primeiras decisões do Governo depois de tomar posse foi introduzir portagens na ponte 25 de Abril durante o mês de Agosto, [...]. A ideia seria aumentar a cobrança dos impostos pagos nas protagens mas sobretudo poupar na indemnização compensatória paga à Lusoponte pela quebra nas receitas, no valor de 4.4 milhões de euros. O problema é que a Lusoponte, [...] exigiu ao Governo esses 4.4 milhões. [...] Em Novembro, [...], foi decidido que esse dinheiro seria pago à Lusoponte pelas Estradas de Portugal, por sinal uma das empresas públicas que pior desempenho tiveram em 2011.» (Ladrões, corruptos, vigaristas no Arrastão) [Novos desenvolvimentos descritos aqui]

«O Governo vendeu o Banco Português de Negócios (BPN) ao luso-angolano BIC Portugal por 40 milhões de euros, sem ter na sua posse, como a lei exigia, o parecer da Comissão de Acompanhamento das Reprivatizações, que sobre esta operação nunca foi consultada.». Note-se que «Quanto à proposta do NEI, este ofereceu 106,4 milhões de euros» e que «PSD e CDS-PP volt[ar]am a rejeitar requerimento do PS para ouvir concorrentes e CGD sobre venda do BPN».

«Para a TIAC, a nomeação de uma comissão especial de acompanhamento à privatização da EDP, feita já na fase final do processo, não dá quaisquer garantias de escrutínio público. "Trata-se de uma comissão nomeada arbitrariamente pelo próprio Governo ao arrepio das recomendações da TIAC e que nunca produziu qualquer parecer público em relação a um processo que está já praticamente concluído"» e os resultados são conhecidos: «As nomeações para a EDP são um mimo. Catroga, Cardona, Teixeira Pinto, Rocha Vieira, Braga de Macedo... isto não é uma lista de órgãos societários, é a lista de agradecimentos de Passos Coelho. O impudor é tão óbvio nas nomeações políticas que nem se repara que até o antigo patrão de Passos, Ilídio Pinho, foi contratado.»

«O deputado do PSD Mendes Bota veio hoje denunciar o negócio à volta da exploração de gás natural e petróleo no Algarve. Avisa que não há estudo dos riscos e as contrapartidas para o Estado são insuficientes

«A eliminação das golden shares, prevista no memorando de entendimento com a troica, deveria ser paga pelos accionistas dessas empresas, defendem economistas citados pelo jornal de Negócios.»

Mas há uma série de outros exemplos, desde as transacções dos fundos de pensões dos bancos («Sendo assim, se os fundos não tivessem sido transferidos ou tivessem sido transferidos em melhores condições, quantos cortes poderiam ter sido poupados, das pensões às taxas moderadoras, dos subsídios de emprego ao rendimento social? Fácil, o equivalente a 0,3% do PIB»), até novas mordomias e nepotismo, passando por episódios mais simbólicos. Esta lista está muito longe de pretender ser exaustiva...

E depois, existem opções legítimas, mas contrárias aos objectivos de uma política austera. Contratar 4000 militares, como o Governo pretende fazer, corresponde a um gasto muito significativo, e completamente contrário a qualquer pretensão de austeridade. Como já mencionei, existem em Portugal menos de 1500 juízes e temos um sistema de Justiça cuja lentidão é um dos maiores entraves ao nosso crescimento económico. Se as políticas fossem de austeridade, esta contratação de 4000 militares faria algum sentido?

Claro que é possível notar que a esquerda não chama «austeras» a estas políticas, mas sim «austeritárias». Pois, assim faz mais sentido...

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