segunda-feira, 13 de julho de 2009

A esquerda mutilada

Portugal tem a peculiaridade, única na Europa, de a «esquerda radical» (à esquerda do PS) ter chegado aos 23% nas eleições europeias. Leituras mais apressadas podem levar à conclusão de que tal se deve ao facto, também único na Europa, de termos tido uma revolução popular de esquerda há apenas 35 anos (que, porém, não é tão pouco tempo assim). Eu estou mais convencido de que o voto massivo à esquerda do neoliberalismo (mais ou menos social), se deve, não à revolução popular em si, mas ao seu Termidor de Novembro de 1975, que implicou a exclusão da esquerda «radical» do governo desde então.

Efectivamente, como Villaverde Cabral sublinhou pela enésima vez, aquilo a que ele chama «extrema-esquerda» nunca fez em Portugal o teste do poder. Desconfio que, se por ele tivessem passado, os tais 23% seriam hoje bem menores (e que o PS seria bem mais à esquerda).

Note-se, no entanto, que na minha modesta opinião se deveria guardar o prefixo «extrema» para movimentos que defendessem explicitamente o fim da democracia republicana tal como a conhecemos. O que não é de todo o caso do BE, e que mesmo no caso do PCP será discutível. E mais: tenho a impressão (totalmente subjectiva, assumo-o) de que quatro em cada cinco dos eleitores do BE abominam a Albânia de Enver Hoxa e são indiferentes à barbicha de Trotsky. Votam no BE porque este representa as lutas por direitos civis que noutro país (a Espanha ou a França, para não ir mais longe), seriam representadas pelos PS´s locais. Acontece que, entre os militantes do BE, a proporção referida deve ser rigorosamente inversa. O que explica que nem na CML o BE se tenha aguentado na colaboração com o poder.

Enfim, o país é o que tem sido, e não o que gostaríamos que fosse. Há um quarto de século, a situação era muito semelhante, inclusivamente na existência de uma crise económica e social. O bloqueio da esquerda deu primeiro o PRD e depois os dez anos de Cavaco. Agora, já tivemos a Alegre votação na presidencial, e o aviso das europeias. Se persistirmos no «bloqueio» da esquerda, antevejo uma maioria absoluta da senhora Ferreira Leite com (ou até sem...) o eterno PP do PP. O que não me apetece muito, confesso. Parece-me que seria portanto um bom momento para acabar com a auto-mutilação da esquerda, e escaqueirar a divisória entre o PS e a «esquerda radical». O PS poderia ter o maquiavelismo de dar sinais de aceitar o apoio do BE ou do PCP, nem que fosse na forma de acordo parlamentar. E o BE e o PCP poderiam dar sinais de compreender que o mal maior é Ferreira Leite. Sem isso, a abstenção sobe e o eleitorado do centro foge para onde a maioria pode parecer mais fácil: à direita.

11 comentários :

Patrícia Gonçalves disse...

Daqui da Polónia, gostei.

JDC disse...

Mas para isso era preciso que houvesse vontade desses partidos (BE e PCP) de fazer o melhor para o país. Ao invés, vivem e sobrevivem da inquietação social e, apesar de poder dar a vitória a MFL, a subida nas próprias intenções de voto é suficiente. Mostram que são iguais aos outros, é pena...

Jorge Santos disse...

Ricardo,
Se a Manuela Ferreira Leite ganhar as eleições com maioria absoluta em imigro.
É quase impossivel isso acontecer. Já dificil ela ganhar, e então com maioria não há hipótese.
Os portugueses não são assim tão estúpidos. E o sr também não espera que a esquerda se limite ao mesmo triste papel de sempre, o do protesto. Que si limite a unir ao PS mesmo quando não concordam com praticamente nada do que eles defendem.
Eu como homem de esquerda, recuso-me a ver a esquerda render-se á direita e ao neoliberalismo dessa maneira.
Eu quero mudança! Acho que este país merece. Ontem já era tarde.

Anónimo disse...

Mas se formos imparciais haveremos de reconhecer que o PSD em termos de economia e peso do estado na sociedade é claramente "social-democrata", está longe de ser liberal. O PPD liberal do Santana Lopes é apenas uma tentativa.
Não sei se o BE tem alguma ideia de chegar ao poder mas a sua retórica anticapitalista de indivíduos de grande porte intelectual pode ser destruidora, em último caso, dos postos de trabalho dos mais "pequenos".

João Moutinho

no name disse...

o psd social-democrata?? ahahaha, o olof palme deve estar às voltas no túmulo!

João Vasco disse...

O PSD são três partidos.

Um liberal, um social democrata e um populista.

Correspondem às três correntes que concorreram à direcção (Pedro Passos Coelho; Manuela Ferreira Leite; Santana Lopes). A vitória foi da corrente Social Democrata, mas por uma unha negra. Isto quer dizer que as propostas do partido estão severamente condicionadas pelas outras correntes.

É por isso que MFL faz propostas de cariz liberal como a destruição do SNS (que é irrealizável em Portugal, de qualquer das formas); ou de cariz populista (como o adiar (ao invés de cancelar ou iniciar) as grandes obras públicas).

Também é por isso que MFL consegue ser tão "esquizofrénica". Não é tanto ela, é o seu partido.

Também é por isso que um governo de MFL seria uma coisa aterradora para o desenvolvimento do país.

Anónimo disse...

O PSD não é o partido do santana lopes,do oliveira costa,do nuno dlelrue,do isaltino, do 'manjor' valentim loureiro,das camaras do pisd da madeira, e uma fila incontável de corruptos da pior espécie?
Com q então se a 'esquerda extremista' tivesse pasado no governo teria menos voptos?Atão pra q foi feito o golpe do 25 Nov?

Anónimo disse...

Bem esgalhada a sua retórica anti-progresso.Sou levado a pensar q politicas sérias ao serviço do progresso,ie,dinheiros q não vão para os banksters( é o q eles são, e deviamos estar no xilindró!) duma maoir equidade seria derrotada nas urnas,pq a malta gosta é de ver 'encher' personagens do mais fino recorte mafioso!è disato q se trata,continuar o status quo da burguesia.Tudo o rest q escreva é para épater les bourgoises.Eu,votar no PS8de Súcia):NUNCA e desejava ver alguns deles no sitio correto,pq o jorge coelho me mete um nojo indescr
itivel.So that NUNCA MAIS VOTAREI NESTE GANG!!!!!E chamem-me de anti democrta,se isso quer dizer-LADRÕES E XICOS ESPERTOS!By the way,a nata,a fina flor da vigarice não vai dentro,porquê,dr?

Ricardo Alves disse...

«Space Aye»,
o que me parece mais provável neste momento é um governo de coligação MFL-PP. O que seria ligeiramente melhor, pois duraria menos que uma maioria absoluta MFL.

Ricardo Alves disse...

«Com q então se a 'esquerda extremista' tivesse pasado no governo teria menos voptos?Atão pra q foi feito o golpe do 25 Nov?»

Anónimo,
o 25 de Novembro foi feito para afastar do poder, em 1975, a esquerda «radical». Que esse afastamento tenha durado até hoje é o grande problema da esquerda portuguesa.

E sim, se o PCP tivesse passado no poder nos anos 80, hoje seria bem menor. E menos estalinista. Simplesmente porque se teria «aburguesado» na aproximação ao PS. E duvido que o BE existisse.

Filipe Castro disse...
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