A laicidade, ao contrário do que argumentam equivocadamente os clericais, não é simples «autonomia administrativa», ou seja, separação entre registo civil e ficheiros canónicos, entre poder democrático e cargos de nomeação do Vaticano, entre receitas públicas e remunerações do clero. É também a distinção entre regras legais para todos, e conceitos morais para os que são religiosos.
A ICAR tem todo o direito de não casar homossexuais. Tem também o direito de os excomungar. Já duvido de que tenha o direito de despedir alguém a quem pague salário - por esse alguém ser homossexual.
A laicidade garante a liberdade de expressão para todos. Até para os que gostariam de a restringir, ou que a ela se opuseram historicamente. A ICAR pode portanto bradar contra os casamentos entre homens, ou entre mulheres, ou entre pessoas estéreis. Está no seu direito. Como nós estamos no nosso ao criticar os argumentos apresentados e a sua fundamentação. Por exemplo, que «detrimento» resulta para as famílias existentes do reconhecer-se novos tipos (legais) de família? Ou qual será o prejuízo para a «crise» de uma medida legislativa que cria novas famílias? Ou ainda, porque será a «família homossexual» mais «antropologicamente errada» do que o celibato? Finalmente, será que não compreendem que o que se deve mesmo dizer às novas gerações é que «sejam o que quiserem»?
Evidentemente, tudo isto me parece pouco relevante. Apesar de se anunciarem indicações de voto especificando os partidos políticos «catolicamente correctos», já vai sendo tempo de ignorar a ICAR nestes debates. Nos dois referendos sobre a IVG, mostraram a sua inigualável capacidade de envenenar o debate público com panfletos terroristas, imagens sanguinolentas, manipulação de crianças, abuso das plataformas públicas que lhes oferecem (geralmente, para outras finalidades) e, não esquecer, as atoardas sobre as famigeradas «leis naturais». Querem fazê-lo em eleições legislativas? Se sim, convém recordar que há limites legais às intervenções de sacerdotes em campanhas eleitorais. Mas o melhor é mesmo arredarem, porque já não há pachorra.
A terminar, não posso deixar de registar como uma novidade positiva as declarações de dirigentes do PS sobre este assunto. Não vi a mesma clareza aquando dos referendos à IVG. Só falta que Pedro Silva Pereira diga que a ICAR não deve meter o bedelho nesta questão. Mas não deve tardar, penso eu...
[Diário Ateísta/Esquerda Republicana]
4 comentários :
engraçado como um blogue com este nome (esquerda republicana) pouco fala da república, e nada fala da esquerda.
discute-se qualquer questão polémica:o aborto, a eutanásia, os casamentos dos gays - de preferência apimentada pela opinião da Igreja. apresentam-se estudos sobre a inutilidade da oração, da taxa de felicidade das pessoas e a sua relação com a fé, um bispo desexcomungado, fátima, o autocarro ateu...
quanto aos problemas reais de portugal, quer relativamente à ideologia praticada pelo poder político e onde encaixa a esquerda nesse campo (a crise, o desemprego, as condições precárias de vida, etc), quer relativamente à forma institucional de governo, onde encaixa a república (a corrupção total do sistema, a falência da justiça, o caciquismo municipal, etc), são completamente omitidos, em detrimento dos supra-citados temas.
bem sei que o blogue não é meu, e que quem nele escreve o faz sobre o que bem entender, mas era de esperar mais de uma "esquerda republicana". ou não me digam que ser de esquerda e republicano hoje em dia se resume ao anticlericalismo e às posições pelo "sim" em referendos sobre questões fracturantes.
Ricardo: excelente texto! Acabei agora de jantar e de ir por um amigo meu (ateu) ao hotel; e estivemos justamente a conversar sobre a cultura de intolerância da ICAR, que apesar de já não ter padres nem fiéis ainda se atreve a dar-nos ordens com uma arrogância medieval, como se isto fosse o Império Bizantino.
Ricardo,
Acho que deves sentir-te agradecido aos bispos da ICP (gostaste deste?).
Por mais que temas, isso aí não é Itália ou Espanha e a ICP teria aqui uma boa oportunidade de se religar à sociedade ou, pelo menos, de uma saída airosa: já que há separação de direito canónico bastava permanecer calada.
Não soube resistir à tentação evangelista e isso vai sair-lhe caro. Mas não é isso mesmo que tu querias?...
“Desde o Concílio Vaticano 2º” – mentira, a igreja católica sempre advogou a separação. Os “políticos” é que lhes deu jeito juntar-se a ela.
Jesus defendeu sempre a separação entre o poder dos homens o poder de Deus. De resto, a ligação da Igreja ao poder, dada a desonestidade e iniquidade e falta de carácter dos “homens do poder”, apenas serviria para denegrir a Igreja.
laicidade no sentido da autonomia «administrativa» do Estado perante as igrejas - essa é a verdadeira laicidade. Mas, desde a primeira república, com o tal analfabeto (rude nas ideias e nos actos) Costa, que a alicidade é entendida como: o estado regula e limita o campo de acção da Igreja, o contrário é que já não é aceitável. Eis a palermice indecente!
(mas só porque insistimos muito, mesmo muito, durante séculos) - mentira!... foram os governantes e os monarcas que sempre se serviram da religião. Esse “nós” refere-se a quem? Quantos séculos é que o Ricardo tem?
continua sem aceitar a laicidade no sentido da autonomia ética da sociedade perante a cultura cristã. - mas uma cultura cristã não é laica!!! A sociedade não e laica!!!!
A imposição da laicidade à sociedade, é um atentado gravíssimo aos seus direitos. È a mais torpe manifestação de intolerância, de violação dos mais elementares direitos do Homem, e uma demonstração de vontade de aniquilar a própria cultura social (nada que não agrade aos Insolventes e Contraculturais Ateus Republicanos (ICAR).
conflitos contemporâneos entre política e religião - não há conflitos entre políticos e religião. Mas, mesmo que existissem conflitos entre políticos e religiões, não estava a laicidade em causa. Os políticos não são o estado!
Numa sociedade cristã católica a igreja não pode compactuar com aquilo que ofende os seus valores e principiou. Os políticos defendem o que entendem (normalmente apenas pensam em destruir), a igreja defende o que é justo, e o Estado tem que ouvir e decidir em conformidade com maioria – é o mais simples princípio da democracia.
”A laicidade, (…), não é simples «autonomia administrativa», (…), separação entre registo civil e ficheiros canónicos, entre poder democrático e cargos de nomeação do Vaticano, entre receitas públicas e remunerações do clero.” - Se isto não é laicidade, estão os republicanos de hoje a passar o mais dourado atestado de burrice e ignorância ai Costa e sua corja.
“É também a distinção entre regras legais para todos, e conceitos morais para os que são religiosos.” - há aqui a típica confusão da falta de seriedade dos ateus: mais de 90% das “leis”, baseiam-se em valores católicos (que muito desagradam aos ateus, diga-se). Nunca a estrutura a Igreja fez referencia a tais factos, ou incentivou ao seu incumprimento.
No dizer ICAR (Insolentes e Contraculturais Ateus Republicanos), ele não têm que ter qualquer regra de carácter moral. Certo! Daí eu os considerar tão perigosos!
Mas, sempre que as leis ameaçam ser iníquas s, atentatórias da dignidade humana, ou põem em causa os valores, a convivência pacífica e cultura e solidez social, a Igreja tem a obrigação imperiosa de não se calar. Tem o dever e a obrigação de falar! De alertar consciências, de mostrar o caminho correcto a quem não em formação para saber decidir, mas está no cargo de mandante.
Pessoalmente, não reconheço igual direito aos ateus, por falta de formação moral, por falta de valores concretos, por falta de “personalidade” social ou representatividade cultural, e ainda por completa anarquia de ideias, falando sobre aquilo para que não tem qualquer formação.
Como se pode querer que um analfabeto escreva um riquíssimo texto literário!?
”Já duvido de que tenha o direito de despedir alguém a quem pague salário - por esse alguém ser homossexual.” – a Igreja conhece o problema. Há até associações de paneleiros católicos. E, não é uma simples perversão sexual que incomoda a igreja, sendo isso é assunto do foro intimo. O que está em causa é tornar essa perversão com algo de normal, dar-lhe o estatuto de legal.
Eu, pessoalmente, se estivesse a gerir um organismo da Igreja, sabendo as afirmações e ideias dos paneleiros (como as que aqui se fazem), não contrataria um paneleiro, sob nenhum pretexto
A laicidade garante a liberdade de expressão para todos. – laicidade e direito de expressão são coisas completamente diferentes, e que têm tanto a ver como a “água oxigenada” e o Ciclo hidrológico, ou o direito de circular livremente e o código da estrada.
Mas, vindo este afirmação de quem gostaria de retirar o direito de se expressar livremente à Igreja Católica… é ridículo e caricato.
Dada a extensão do comentário, fico por aqui!
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