sábado, 31 de março de 2007

Comércio Justo

A explicação da Wikipedia


Em Portugal:

Embora praticado em vários países europeus desde a década de 60 do século XX, o Comércio Justo (CJ) só começou a organizar-se a um nível internacional no decorrer dos anos 80 e 90. Em Portugal só no final da década de noventa se começa a falar desta rede alternativa ao comércio convencional, aliada a uma ideia de consumo crítico.

O CIDAC - Centro de Informação e Documentação Amílcar Cabral foi a ONGD pioneira no lançamento da temática do Comércio Justo em Portugal. Em 1998 apoia um seminário no âmbito da Manifesta, realizada em Amarante, factor que, a juntar à experiência no Serviço de Voluntariado Europeu, terá estimulado um grupo de jovens associados do Aventura Marão Clube para o projecto de abrir uma loja de CJ em Portugal: a 21 de Agosto de 1999 nasce a primeira loja de Comércio Justo em Amarante.

Nos anos seguintes formam-se associações e cooperativas em vários pontos do país, sendo 2001 o ano de grande expansão. Uma rede portuguesa de Comércio Justo toma forma, não se limitando à vertente comercial - mais uma loja na Granja do Ulmeiro, Coimbra, em 2001, iniciativa da AJP abre no início do ano - mas promovendo também acções de formação e sensibilização em escolas, feiras e exposições. Desde aí, centenas de eventos de carácter informativo e didáctico foram promovidos por todo o país, tendo o projecto sofrido tal expansão que, em Dezembro de 2001, nasceu a ideia de uma Coordenação Nacional de Comércio Justo (CPCJ). Objectivo: concertar esforços tendo em vista a promoção do Comércio Justo a nível nacional.

A CPCJ foi oficialmente constituída em Abril de 2002, agregando as organizações de norte a sul do país, desde associações juvenis a cooperativas de consumo. O Dia Mundial do CJ - 4 de Maio 2002 - é pela primeira vez festejado em Portugal com uma campanha mediática concertada pela CPCJ. Ao mesmo tempo a Cores do Globo abre o primeiro ponto de venda em Lisboa, o Quiosque do Mundo no Campo Grande, e a Planeta Sul lança a loja virtual. No final do ano, mais duas lojas do mundo alargam a possibilidade dos consumidores portugueses comprarem artesanato e alimentares produzidos em condições dignas no Sul do Planeta: são as lojas de da Reviravolta, no Porto, e da Terra Justa, em Peniche.

2003 é um ano grande para o Comércio Justo em Portugal: a Alternativa abre mais uma loja em Barcelos. O Dia Mundial de CJ é festejado a 17 de Maio pelos membros da CPCJ e marca a abertura de mais uma loja em Almada, pela Mó de Vida. A ARCA abre o Quiosque de Comércio Justo em Faro. Há uma participação conjunta no primeiro Fórum Social Português no início de Junho – com oficinas, stands e a Pausa Justa. Nos dias 28 e 29 de Junho realiza-se a primeira Festa Nacional de Comércio Justo – com o apoio da Junta de Freguesia da Quinta do Anjo/Câmara Municipal de Palmela. E a Comissão instaladora da CPCJ prepara a primeira assembleia geral constituinte, reunindo-se a dezena de organizações-membro em Amarante, no final do ano.
A CPCJ continua a reunir mensalmente, num esquema inédito e precioso de descentralização traçado em 2002: as reuniões são organizadas rotativamente pelas organizações espalhadas pelo país. Além de coordenar o trabalho das organizações em Portugal –tratando as questões relativas à constituição legal da CPCJ, os momentos de formação interna e a estruturação do movimento em Portugal - a CPCJ trabalha em projectos conjuntos com estruturas de outros países, como a Itália e Espanha, e é membro da NEWS – Network of European World Shops. Está ainda a coordenar a criação de uma Importadora Nacional, que fomente a entrada no "circuito justo" de cooperativas nos PALOP.


(texto tirado daqui, as ligações foram acrescentadas por mim)


Outras ligações úteis aqui.
Quem puder, visite a loja mais próxima. Por experiência própria sei que vale a pena.

Sobre o PIB, convém relembrar

Gárvola é uma pequena aldeia com cerca de 30 pessoas. Uma delas é o senhor Janinho, que tem 70 anos. O senhor Janinho não tem qualquer actividade profissional neste momento, mas as pessoas na aldeia gostam dele, pelo que costumam juntas dar-lhe cerca de 30 moedas por mês - é uma dádiva que dão voluntariamente. O senhor Janinho, que gosta muito de jardinagem, sente-se muito agradecido e costuma tratar dos jardins de todos os habitantes da aldeia (é uma aldeia cheia de jardins!). As pessoas ficam contentes por terem o seu jardim bem tratado.

Imaginemos duas situações.

A- As pessoas decidem deixar de dar uma moeda por mês como dádiva, mas passam a dar-lhe uma moeda a troco do serviço de jardinagem, do qual prescidirão quando entenderem. Nesta situação, as pessoas têm os seus jardins igualmente tratados como antes, e Janinho recebe as 30 moedas por mês como antes.
Tudo está igual, são prestados os mesmos serviços, é produzida a mesma riqueza, não há mais nem menos conforto ou bem estar material.
Mas o PIB de Gárvola aumentou em 30 moedas...

B- As pessoas decidem deixar de dar uma moeda por mês como dádiva a Janinho, passando algumas delas a dar uma moeda em troco do serviço de jardinagem. Vamos supor que 10 optam por dar.
Neste caso, Janinho terá menos moedas por mês, mas trabalhará menos que antes. Face à situação inicial, Janinho produz menos. Em Gárvola é produzida menos riqueza (neste caso sob a forma de serviços). Mas o PIB de Gárvola aumentou em 10 moedas.


Conclusão: não se pense que com este exemplo defendo a inutilidade de indicadores como PIB, e outros que tais. Acho-os extremamente úteis, devem ser estudados, a sua evolução deve ser acompanhada. Têm uma grande importância, e obviamente uma íntima relação com a riqueza que é de facto produzida.
Mas temos sempre de ter atenção a estas questões. Às vezes podem ser mais pertinentes e significativas do que aquilo que podem parecer à primeira vista.

Que a qualidade de vida não depende apenas do PIB é óbvio: a esperança média de vida, a liberdade, a justiça, a segurança, a equidade, o meio ambiente, uma série de factores influenciam a qualidade de vida além do conforto material. Mas temos de nos lembrar que mesmo para o conforto material o PIB (PPC) está longe de ser um indicador perfeito...

Revista de blogues (31/3/2007)

  1. «(...) não é coerente defender o multiculturalismo e defender ao mesmo tempo a legitimidade de quem publicou as famosas caricaturas dinamarquesas, porque ao defender a liberdade de expressão de quem quer cometer heresias se está a consagrar o direito de por em causa os padrões culturais de outros grupos; tal como não é coerente defender a emancipação da mulher e o multiculturalismo ao mesmo tempo, porque a emancipação da mulher abala sempre as estruturas tradicionais de uma sociedade; também é incoerente ser a favor da igualdade de direitos para os homossexuais e defender o multiculturalismo, porque a homossexualidade é tabu em praticamente todas as culturas não ocidentais (e mesmo na ocidental...ainda há um longo caminho a percorrer).» («Mais uma vez o multiculturalismo», no armadilhaparaursosconformistas.)
  2. «É inacreditável. Foi no dia 20 de Março. A polícia francesa resolveu prender imigrantes em situação irregular à porta da escola dos seus filhos, quando eles os iam buscar. Uma família chinesa foi interceptada pela polícia ali mesmo, em frente ao infantário do 19° bairro de Paris, e para isso os agentes usaram a força. À porta de um infantário. No meio dos incidentes com os pais de outras crianças e responsáveis do infantário que socorreram os detidos, a Polícia utilizou gás lacrimogéneo atingindo crianças. A directora do infantário chegou a ser detida. Esta é a polícia de Sarkozy. Agora imaginem o que seria o seu governo.» («As sementes de um fascismo popular», no Arrastão.)

sexta-feira, 30 de março de 2007

Extrema Direita em Israel: Religião e Apartheid

Há mais ou menos dois anos, não me lembro bem, meti este texto no meu blog pessoal:

Living with the Holocaust

SARA ROY
Journal of Palestine Studies, Vol XXXII, No. 1, Autumn 2002, Issue 125

(…)
Despite many visits to Israel during my youth, I first went to the West Bank and Gaza in the summer of 1985, two and a half years before the first Palestinian uprising, to conduct fieldwork for my doctoral dissertation, which examined American economic assistance to the West Bank and Gaza Strip. My research focused on whether it was possible to promote economic development under conditions of military occupation. That summer changed my life because it was then that I came to understand and experience what occupation was and what it meant. I learned how occupation works, its impact on the economy, on daily life, and its grinding impact on people. I learned what it meant to have little control over one's life and, more importantly, over the lives of one's children.

As with the Holocaust, I tried to remember my very first encounter with the occupation. One of my earliest encounters involved a group of Israeli soldiers, an old Palestinian man, and his donkey. Standing on a street with some Palestinian friends, I noticed an elderly Palestinian walking down the street, leading his donkey. A small child no more than three or four years old, clearly his grandson, was with him. Some Israeli soldiers standing nearby went up to the old man and stopped him. One soldier ambled over to the donkey and pried open its mouth. "Old man," he asked, "why are your donkey's teeth so yellow? Why aren't they white? Don't you brush your donkey's teeth?" The old Palestinian was mortified, the little boy visibly upset. The soldier repeated his question, yelling this time, while the other soldiers laughed. The child began to cry and the old man just stood there silently, humiliated. This scene repeated itself while a crowd gathered. The soldier then ordered the old man to stand behind the donkey and demanded that he kiss the animal's behind. At first, the old man refused but as the soldier screamed at him and his grandson became hysterical, he bent down and did it. The soldiers laughed and walked away. They had achieved their goal: to humiliate him and those around him. We all stood there in silence, ashamed to look at each other, hearing nothing but the uncontrollable sobs of the little boy. The old man did not move for what seemed a very long time. He just stood there, demeaned and destroyed.

I stood there too, in stunned disbelief. I immediately thought of the stories my parents had told me of how Jews had been treated by the Nazis in the 1930s, before the ghettos and death camps, of how Jews would be forced to clean sidewalks with toothbrushes and have their beards cut off in public. What happened to the old man was absolutely equivalent in principle, intent, and impact: to humiliate and dehumanize. In this instance, there was no difference between the German soldier and the Israeli one. Throughout that summer of 1985, I saw similar incidents: young Palestinian men being forced by Israeli soldiers to bark like dogs on their hands and knees or dance in the streets.

(...)

Acho que numa altura em que a brutalidade e a estupidez assassina dos fundamentalistas muçulmanos faz as notícias todos os dias, vale a pena lembrar a todos que nenhuma religião tem o monopólio da brutalidade e da estupidez assassina.

A secularização da sociedade portuguesa(1): a ascensão do casamento civil

Motivação: a sociedade portuguesa não é confessional

Diz-se frequentemente que Portugal é um Estado laico com uma sociedade confessional. A primeira parte da afirmação tende a ser cada vez mais verdadeira, mas a segunda parte é cada vez mais falsa. Efectivamente, a laicidade do Estado permanece uma obra inacabada, que só pode ser terminada por um esforço deliberado e organizado dos cidadãos. Mas a evolução da sociedade portuguesa desde o 25 de Abril, como o mostra o comportamento espontâneo dos cidadãos na sua vida quotidiana, desmente que a sociedade portuguesa permaneça inalteravelmente católica.

Tentarei mostrar numa série de artigos (de que este é o primeiro), que na sociedade portuguesa actual, e ao contrário do que muita gente pensa, as determinações confessionais são cada vez menos relevantes no comportamento quotidiano dos cidadãos. Nesse sentido, a sociedade é cada vez menos confessional e mais secularizada.

A ascensão do casamento civil

No gráfico pode observar-se o crescimento da percentagem de casamentos civis entre 1966 e 2005. Ao longo destes quarenta anos, a percentagem de casamentos celebrados sem cerimónia católica prévia subiu de 12% para 45%. A década de 1971-1980 é de crescimento rápido (de 14,5% para 25,3%), a de 1981-1990 corresponde a uma estagnação (com oscilações entre 25% e 28%), e a década de 1991-2000 volta a ser de crescimento (de 28% para 35%). Os últimos cinco anos foram de crescimento acelerado: de 37,5% (2001) para 44,9% (2005). O casamento religioso poderá passar a ser minoritário já em 2008 (previsão que resulta de aplicar uma regressão linear aos últimos cinco anos) ou em 2010 (aplicando uma regressão linear aos últimos dez anos).

Em qualquer dos casos, a mensagem é clara: em 2005, nove casamentos em cada vinte foram realizados apenas pelo registo civil; e dadas as tendências de longo prazo, é de esperar que o casamento civil passe a ser maioritário nos próximos anos. Portanto, para os novos casais portugueses, o casamento é cada vez mais apenas um contrato civil (garantido pelo Estado), e não um sacramento religioso (perante «Deus»).

[Diário Ateísta/Esquerda Republicana]

quinta-feira, 29 de março de 2007

Ignorância histórica ou iletracia matemática?

No Público, Esther Mucznick conta-nos o seguinte:
  • «Sessenta e sete anos depois do final da Segunda Grande Guerra, os europeus sentem-se felizes.»

Vamos lá a ajudar a senhora: 2007-67=1940. O ano do final da «Segunda Grande Guerra», que eu saiba, é 1945. Como assumo que a senhora Mucznick não seja totalmente ignorante em História, o problema dela deve ser de iletracia matemática. O que prova, mais uma vez, que a escola portuguesa precisa de mais horas de matemática e de menos horas de religião.

(Ah, mas concordo com a Mucznick quando ela afirma que «reescrever a história foi sempre o desígnio dos que a querem mudar». Exactamente por isso, oponho-me ao projecto dela de corrigir religiosamente os manuais de história e de língua portuguesa no sentido de se suprimirem referências a amores entre cristãos e «mouras encantadas», ou no sentido de apresentarem uma imagem mais negativa do iluminismo.)

Pascal Bruckner: «A reply to Ian Buruma and Timothy Garton Ash»

«Any polemic has the potential to enlighten, even if it ruffles feathers. The polemic I penned for signandsight.com and Perlentaucher.de with my comments on Ian Buruma's book "Murder in Amsterdam," and which has provoked so many passionate reactions in the US, Europe and right across to Israel and the Middle East, seems very revealing in this respect. Allow me to backtrack. In a brilliant book on the end of tolerance in the Netherlands and the murder in Amsterdam of filmmaker Theo Van Gogh by a Moroccan extremist, the Anglo-Dutch intellectual Ian Buruma traced the career of the Somali-born Dutch member of parliament Ayaan Hirsi Ali, herself menaced by death threats. Buruma's portrait is of formidable ambiguity. It celebrates her courage so as better to deplore her blindness and fanaticism on the question of human rights, both of which led her astray in her struggle against religion. Under the guise of an objective reportage, Burma pronounces mezza voce a veritable condemnation. Moreover, supported by Timothy Garton Ash, Ian Buruma has come out in support of the highly controversial Tariq Ramadan, who in the New York Times of February 4, 2007 (online here at the International Herald Tribune) he casts as the sole serious dialogue partner of reformist Islam.

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At the heart of the issue is the fact that in certain countries Islam is becoming Europe's second religion. As such, its adherents are entitled to freedom of religion, to decent locations and to all of our respect. On the condition, that is, that they themselves respect the rules of our republican, secular culture, and that they do not demand a status of extraterritoriality that is denied other religions, or claim special rights and prerogatives such as unisex swimming pools and separate gym or other classes. A tense international context surrounds this problem. Today a fundamentalist wave is bearing down on Europe, seeking to re-Islamise the Muslim communities accused of tepidness, and ultimately to place our entire continent of infidels under the law of the Prophet. This proselytism is carried out by all kinds of revanchist groups, the Saudi Wahhabists, the Muslim Brotherhood and the Salafists, all of whom rival each other in zeal. The birth of an enlightened European Islam takes on importance in this context, one which can serve as a model for Muslims all over the world.
I repeat: two directions lie open to us here. The first, inspired by the Anglo-Saxon tradition, stresses strict differences, basing itself on the respect for religious adherence. Here multicultural Canada is the key reference. The other, more French in inspiration, is based on an equally strict separation of church and state, and the subordination of beliefs to civil law. Even if both models are currently undergoing a crisis, as Timothy Garton Ash rightly notes, it seems to me that in all respects the principle of secularism remains the best compass.
Modern France was formed in the struggle against the Catholic Church, and remains extremely sensitive to religious fanaticism. And I maintain that Jacques Chirac, supported by the commission headed by Bernhard Stasi, was right to put a law to parliament on the banning of religious symbols in school and public administrations. This initiative passed easily, with few opposing voices. Supporters included a majority of French Muslim women keen to safeguard their emancipation, among them Fadela Amara (news story), founder with Mohammed Abdi of the association "Ni putes, ni soumises" in the suburbs (more here).
"In conflicts between the weak and the strong, liberty helps suppress the weak, while the law protects them" said Abbé Grégoire at the time of the revolution. It's so true that many English, Dutch and German politicians, shocked by the excesses that the wearing of the Islamic veil has given way to, now envisage similar legislation curbing religious symbols in public space. The separation of the spiritual and corporeal domains must be strictly maintained, and belief must confine itself to the private realm.
It's not enough to condemn terrorism. The religion that engenders it and on which it is based, right or wrong, must also be reformed. Can one understand the Inquisition, the witches burned at the stake, the Crusades and the condemnation of heretics without referring to the dogmas of Roman Catholicism? The time has come to do for Islam what was done for Christianity as of the 15th century: by bending it to modernity and adapting it to contemporary mentalities. It is too often forgotten that the fight against the Church in Europe was one of outrageous sectarianism, with unheard of violence on both sides. Cathedrals were burned; priests, bishops and nuns were hung or guillotined; the clergy's goods were confiscated. But in the end this fight liberated us from the tutelage of the cassock, radically limiting ambitions on the part of Rome and the various Protestantisms to direct the social order and govern not only people's consciences, but also their bodies. There is no reason why Islam, as soon as it enters the Occidental democratic sphere, should escape secularism and enjoy a favour that is denied to other confessions.
This is why I continue to prefer the position of Ayaan Hirsi Ali over that of Tariq Ramadan, even now that he has become a friend of tolerance and a prophet of anti-capitalism. In his laudatory portrait of Ramadan - that borders on hagiography despite minor reservations - Ian Buruma still manages to reveal some worrying traits in his new champion. I will refer to only one. While propagating the feminine sense of shame and recommending that Muslim women should abstain from shaking men's hands and using mixed swimming pools if they wish, Tariq Ramadan states that for his part, he does shake women's hands. Yes, you read it right: in 2007, a self-styled "progressive" Muslim preacher who has received the support of the entire French extreme Left for his anti-liberalism, pushes audaciousness to the point of admitting that he shakes women's hands. He should be named secretary of state for the condition of women!

quarta-feira, 28 de março de 2007

Haja Memória

1931

O estudante Branco é morto pela PSP, durante uma manifestação no Porto;

1932

Armando Ramos, jovem, é morto em consequência de espancamentos; Aurélio Dias, fragateiro, é morto após 30 dias de tortura; Alfredo Ruas, é assassinado a tiro durante uma manifestação em Lisboa;

1934, 18 de Janeiro

Américo Gomes, operário, morre em Peniche após dois meses de tortura; Manuel Vieira Tomé, sindicalista ferroviário morre durante a tortura em consequência da repressão da greve; Júlio Pinto, operário vidreiro, morto à pancada; a PSP mata um operário conserveiro durante a repressão de uma greve em Setúbal

1935

Ferreira de Abreu, dirigente da organização juvenil do PCP, morre no hospital após ter sido espancado na sede da PIDE (então PVDE);

1936

Francisco Cruz, operário da Marinha Grande, morre na Fortaleza de Angra do Heroísmo, vítima de maus tratos, é deportado do 18 de Janeiro de 1934; Manuel Pestana Garcez, trabalhador, é morto durante a tortura;

1937

Ernesto Faustino, operário; José Lopes, operário anarquista, morre durante a tortura, sendo um dos presos da onda de repressão que se seguiu ao atentado a Salazar; Manuel Salgueiro Valente, tenente-coronel, morre em condições suspeitas no forte de Caxias; Augusto Costa, operário da Marinha Grande, Rafael Tobias Pinto da Silva, de Lisboa, Francisco Domingues Quintas, de Gaia, Francisco Manuel Pereira, marinheiro de Lisboa, Pedro Matos Filipe, de Almada e Cândido Alves Barja, marinheiro, de Castro Verde, morrem no espaço de quatro dias no Tarrafal, vítimas das febres e dos maus tratos; Augusto Almeida Martins, operário, é assassinado na sede da PIDE (PVDE) durante a tortura ; Abílio Augusto Belchior, operário do Porto, morre no Tarrafal, vítima das febres e dos maus tratos;

1938

António Mano Fernandes, estudante de Coimbra, morre no Forte de Peniche, por lhe ter sido recusada assistência médica, sofria de doença cardíaca; Rui Ricardo da Silva, operário do Arsenal, morre no Aljube, devido a tuberculose contraída em consequência de espancamento perpetrado por seis agentes da Pide durante oito horas; Arnaldo Simões Januário, dirigente anarco-sindicalista, morre no campo do Tarrafal, vítima de maus tratos; Francisco Esteves, operário torneiro de Lisboa, morre na tortura na sede da PIDE; Alfredo Caldeira, pintor, dirigente do PCP, morre no Tarrafal após lenta agonia sem assistência médica;

1939

Fernando Alcobia, morre no Tarrafal, vítima de doença e de maus tratos;

1940

Jaime Fonseca de Sousa, morre no Tarrafal, vítima de maus tratos; Albino Coelho, morre também no Tarrafal; Mário Castelhano, dirigente anarco-sindicalista, morre sem assistência médica no Tarrafal;

1941

Jacinto Faria Vilaça, Casimiro Ferreira; Albino de Carvalho; António Guedes Oliveira e Silva; Ernesto José Ribeiro, operário, e José Lopes Dinis morrem no Tarrafal;

1942

Henrique Domingues Fernandes morre no Tarrafal; Carlos Ferreira Soares, médico, é assassinado no seu consultório com rajadas de metralhadora, os agentes assassinos alegam legítima defesa (?!); Bento António Gonçalves, secretário-geral do P. C. P. Morre no Tarrafal; Damásio Martins Pereira, fragateiro, morre no Tarrafal; Fernando Óscar Gaspar, morre tuberculoso no regresso da deportação; António de Jesus Branco morre no Tarrafal;

1943

Rosa Morgado, camponesa do Ameal (Águeda), e os seus filhos, António, Júlio e Constantina, são mortos a tiro pela GNR; Paulo José Dias morre tuberculoso no Tarrafal; Joaquim Montes morre no Tarrafal com febre biliosa; José Manuel Alves dos Reis morre no Tarrafal; Américo Lourenço Nunes, operário, morre em consequência de espancamento perpetrado durante a repressão da greve de Agosto na região de Lisboa; Francisco do Nascimento Gomes, do Porto, morre no Tarrafal; Francisco dos Reis Gomes, operário da Carris do Porto, é morto durante a tortura;

1944

General José Garcia Godinho morre no Forte da Trafaria, por lhe ser recusado internamento hospitalar; Francisco Ferreira Marques, de Lisboa, militante do PCP, em consequência de espancamento e após mês e meio de incomunicabilidade; Edmundo Gonçalves morre tuberculoso no Tarrafal; assassinados a tiro de metralhadora uma mulher e uma criança, durante a repressão da GNR sobre os camponeses rendeiros da herdade da Goucha (Benavente), mais 40 camponeses são feridos a tiro.

1945

Manuel Augusto da Costa morre no Tarrafal; Germano Vidigal, operário, assassinado com esmagamento dos testículos, depois de três dias de tortura no posto da GNR de Montemor-o-Novo; Alfredo Dinis (Alex), operário e dirigente do PCP, é assassinado a tiro na estrada de Bucelas; José António Companheiro, operário, de Borba, morre de tuberculose em consequência dos maus tratos na prisão;

1946

Manuel Simões Júnior, operário corticeiro, morre de tuberculose após doze anos de prisão e de deportação; Joaquim Correia, operário litógrafo do Porto, é morto por espancamento após quinze meses de prisão;

1947

José Patuleia, assalariado rural de Vila Viçosa, morre durante a tortura na sede da PIDE;

1948

António Lopes de Almeida, operário da Marinha Grande, é morto durante a tortura; Artur de Oliveira morre no Tarrafal; Joaquim Marreiros, marinheiro da Armada, morre no Tarrafal após doze anos de deportação; António Guerra, operário da Marinha Grande, preso desde 18 de Janeiro de 1934, morre quase cego e após doença prolongada;

1950

Militão Bessa Ribeiro, operário e dirigente do PCP, morre na Penitenciária de Lisboa, durante uma greve de fome e após nove meses de incomunicabilidade; José Moreira, operário, assassinado na tortura na sede da PIDE, dois dias após a prisão, o corpo é lançado por uma janela do quarto andar para simular suicídio; Venceslau Ferreira morre em Lisboa após tortura; Alfredo Dias Lima, assalariado rural, é assassinado a tiro pela GNR durante uma manifestação em Alpiarça;

1951

Gervásio da Costa, operário de Fafe, morre vítima de maus tratos na prisão;

1954

Catarina Eufémia, assalariada rural, assassinada a tiro em Baleizão, durante uma greve, grávida e com uma filha nos braços;

1957

Joaquim Lemos Oliveira, barbeiro de Fafe, morre na sede da PIDE no Porto após quinze dias de tortura; Manuel da Silva Júnior, de Viana do Castelo, é morto durante a tortura na sede da PIDE no Porto, sendo o corpo, irreconhecível, enterrado às escondidas num cemitério do Porto; José Centeio, assalariado rural de Alpiarça, é assassinado pela PIDE;

1958

José Adelino dos Santos, assalariado rural, é assassinado a tiro pela GNR, durante uma manifestação em Montemor-o-Novo, vários outros trabalhadores são feridos a tiro; Raul Alves, operário da Póvoa de Santa Iria, após quinze dias de tortura, é lançado por uma janela do quarto andar da sede da PIDE, à sua morte assiste a esposa do embaixador do Brasil;

1961

Cândido Martins Capilé, operário corticeiro, é assassinado a tiro pela GNR durante uma manifestação em Almada; José Dias Coelho, escultor e militante do PCP, é assassinado à queima-roupa numa rua de Lisboa;

1962

António Graciano Adângio e Francisco Madeira, mineiros em Aljustrel, são assassinados a tiro pela GNR; Estêvão Giro, operário de Alcochete, é assassinado a tiro pela PSP durante a manifestação do 1º de Maio em Lisboa;

1963

Agostinho Fineza, operário tipógrafo do Funchal, é assassinado pela PSP, sob a indicação da PIDE, durante uma manifestação em Lisboa;

1964

Francisco Brito, desertor da guerra colonial, é assassinado em Loulé pela GNR; David Almeida Reis, trabalhador, é assassinado por agentes da PIDE durante uma manifestação em Lisboa;

1965

General Humberto Delgado e a sua secretária Arajaryr Campos são assassinados a tiro em Vila Nueva del Fresno (Espanha), os assassinos são o inspector da PIDE Rosa Casaco e o subinspector Agostinho Tienza e o agente Casimiro Monteiro;

1967

Manuel Agostinho Góis, trabalhador agrícola de Cuba, more vítima de tortura na PIDE;

1968

Luís António Firmino, trabalhador de Montemor, morre em Caxias, vítima de maus tratos; Herculano Augusto, trabalhador rural, é morto à pancada no posto da PSP de Lamego por condenar publicamente a guerra colonial; Daniel Teixeira, estudante, morre no Forte de Caxias, em situação de incomunicabilidade, depois de agonizar durante uma noite sem assistência;

1969

Eduardo Mondlane, dirigente da Frelimo, é assassinado através de um atentado organizado pela PIDE;

1972

José António Leitão Ribeiro Santos, estudante de Direito em Lisboa e militante do MRPP, é assassinado a tiro durante uma reunião de apoio à luta do povo vietnamita e contra a repressão, o seu assassino, o agente da PIDE Coelha da Rocha, viria a escapar-se na "fuga-libertação" de Alcoentre, em Junho de 1975;

1973

Amilcar Cabral, dirigente da luta de libertação da Guiné e Cabo Verde, é assassinado por um bando mercenário a soldo da PIDE, chefiado por Alpoim Galvão;

1974, 25 de Abril

Fernando Carvalho Gesteira, de Montalegre, José James Barneto, de Vendas Novas, Fernando Barreiros dos Reis, soldado de Lisboa, e José Guilherme Rego Arruda, estudante dos Açores, são assassinados a tiro pelos pides acoitados na sua sede na Rua António Maria Cardoso, são ainda feridas duas dezenas de pessoas.

A PIDE acaba como começou, assassinando. Aqui não ficam contabilizadas as inúmeras vítimas anónimas da PIDE, GNR e PSP em outros locais de repressão.

Mais ainda

Podemos referir, duas centenas de homens, mulheres e crianças massacradas a tiro de canhão durante o bombardeamento da cidade do Porto, ordenada pelo coronel Passos e Sousa, na repressão da revolta de 3 de Fevereiro de 1927. Dezenas de mortos na repressão da revolta de 7 de Fevereiro de 1927 em Lisboa, vários deles assassinados por um pelotão de fuzilamento, à ordens do capitão Jorge Botelho Moniz, no Jardim Zoológico.

Dezenas de mortos na repressão da revolta da Madeira, em Abril de 1931, ou outras tantas dezenas na repressão da revolta de 26 de Agosto de 1931. Um número indeterminado de mortos na deportação na Guiné, Timor, Angra e no Cunene. Um número indeterminado de mortos devido à intervenção da força fascista dos "Viriatos" na guerra civil de Espanha e a entrega de fugitivos aos pelotões de fuzilamento franquist as. Deze nas de mortos em São Tomé, na repressão ordenada pelo governador Carlos Gorgulho sobre os trabalhadores que recusaram o trabalho forçado, em Fevereiro de 1953. Muitos milhares de mortos durante as guerras coloniais, vítimas do Exército, da PIDE, da OPVDC, dos "Flechas", etc.
(Recebido por correio electrónico.)

terça-feira, 27 de março de 2007

Revista de blogues (27/3/2007)

  1. «Contrariamente ao que muitas vezes se afirma, não é apenas o método científico que ajuda os cientistas a eliminar hipóteses e a revelar mais e de forma mais profunda a realidade de que fazemos parte. Há um outro elemento extremamente poderoso: a existência de uma comunidade científica que é constituída por pensadores particularmente cépticos dos achados dos outros. Para um cientista fazer passar uma ideia verdadeiramente inovadora é necessário convencer uma imensidão de cépticos. E isso, por vezes, representa várias gerações deles. (...) O método científico não é um dogma dos cientistas: é apenas o método mais eficaz que a humanidade já conseguiu inventar para colocar questões sobre a realidade e obter respostas consistentes. Nenhum outro lhe chega perto.» («Uma defesa do método científico», no De Rerum Natura.)
  2. «Não há qualquer premissa naturalista na ciência. Pelo contrário, é a ideia de distinguir o natural do sobrenatural que parte de uma premissa dualista, a premissa que o universo se divide em dois tipos de coisas. Espirito e matéria, criação e criador, sobrenatural e natural. Esta premissa cria o falso problema de tentar distinguir categorias que, tanto quanto vemos, são indistintas. O que a ciência faz, e bem, é não assumir o dualismo. Não há qualquer razão para o fazer, nem para se ralar com a nomenclatura inventada pelos crentes no dualismo. O que importa é apenas ver se os modelos propostos servem para alguma coisa.» («A premissa naturalista», no Que treta!)

Que dois!

Tony Blair tem muitos defeitos, mas ter conseguido que estes dois colaborem num governo (o que seria inimaginável há uma década atrás) compensa muitos deles. A democracia tem destas coisas: conseguir que opostos inconciliáveis colaborem para o bem comum, mesmo que transitoriamente.

segunda-feira, 26 de março de 2007

Os escolhidos pelos portugueses (segundo o método Teresa Guilherme)

(Imagem e ideia descaradamente roubadas ao Avenida Central.)

Leituras antifascistas (26/3/2007)

  1. «Quase 33 anos depois da gloriosa Revolução dos Cravos, o país vai "vivendo habitualmente". A memória não se respeita. A memória do sofrimento, das vidas destruídas, da tortura, do atentado à dignidade, da promoção da pobreza honrada e da ignorância feliz. (...) "Um salazar em cada esquina" para pôr isto na ordem, para prender os drogados, os gangs de pretos, restaurar o poder da ICAR... Em cada "votante" em salazar há uma "alma de taxista". Pobre país... A culpa? É toda nossa! Julgam que a culpa deste branqueamento é dos saudosistas e dos jovens manipulados? Acordem! A culpa é nossa! Deixámo-los crescer e multiplicar. Vermes que se transformaram em monstros. Demos a Democracia como dado adquirido. (...) Daqui a um mês celebramos 33 anos sobre a data de um momento lindo da nossa História, personificado na figura de toda a sua pureza: SALGUEIRO MAIA, o rosto de Abril, a morder o lábio para não chorar no momento em que ganhou a DEMOCRACIA para Portugal, e depois recolheu ao Quartel, com toda a dignidade própria dos homens grandes e bons. (...) Abril não morre.» («Amargura de um leitor anónimo», no Ponte Europa.)
  2. «As próximas eleições para a Direcção da Associação de Estudantes da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa (DAELUL), a realizar nos próximos dias 26 e 27 de Março, estão marcadas pela presença de uma lista – lista X – composta por elementos de extrema-direita. Depois dos graves incidentes das últimas semanas – ameaças, pintura de murais, etc. – este é mais um dado que suscita a maior preocupação. Durante a campanha eleitoral o clima de medo, ameaça e intimidação agravou-se na faculdade. Vários elementos da lista X dedicaram estes dias a ameaçar as pessoas da lista opositora e quem se tem organizado para denunciar as atitudes racistas e intimidatórias que se vêm verificando. Desta lista fazem parte membros activos da extrema-direita, nomeadamente um dos condenados de assassinato de Alcindo Monteiro, no Bairro Alto em 1995. (...) Apelamos à mobilização de toda a comunidade escolar e do país contra esta ameaça. Adiar ou assobiar para o lado perante esta realidade apenas trará dissabores maiores no futuro que, acreditamos, ninguém deseja. Este é o momento para afirmar a diversidade política e cultural e recusar o autoritarismo, a violência e o racismo.» (Comunicado de 24 de Março do SOS Racismo.)

Fernando Savater: «Las leyes laicas siempre deben estar por encima de las religiosas»

«(...)
-¿Cómo define los dogmas?
-Como muros, como barreras contra los que te partes la cabeza sin más remedio. Un dogma no tiene resquicios y eso para alguien que, como a mí, le gusta navegar es bastante frustrante.
-¿Se puede tener fe sin caer en la ceguera?
-No, la fe es ciega porque si no no es fe.
-¿Hay fe con matices?
-Yo distingo en 'La vida eterna' entre fe y credulidad. La fe tiene muchas contraindicaciones, porque implica desconfianza en la razón y quiere ir más allá de lo que la razón nos permite. Pero peor aún que la fe es la credulidad, porque la credulidad es cambiar las razones por lo que nos agrada, lo que nos interesa, lo que nos halaga. Creo que nuestro mundo es un mundo mucho más de credulidad que de fe, y la credulidad es un mal mayor que la fe.
-Del fenómeno religioso, ¿qué es lo que más le inquieta o le sorprende?
-Hace cincuenta años pensábamos que la religión era una cuestión que ya había pasado al ámbito privado, que interesaba o que no interesaba, pero a nivel individual. Hoy volvemos a ver que la religión se convierte en un motor social que, incluso, a veces lleva a cometer actos terroristas o practicar formas de intransigencia y de enfrentamiento. En el mundo de hoy hay un montón de conflictos que de una u otra manera tienen un referente religioso.

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-¿Cómo se le queda el cuerpo cuando ve que el amor al prójimo deriva en la aniquilación del prójimo?
-La religión siempre ha tenido esas dos vertientes. Por un lado es capaz de suscitar las mayores muestras de sacrificio, de devoción y de entrega; y, por otra parte, fomenta la intransigencia y la persecución. La religión es capaz de lo mejor y de lo peor. Ese es el problema de la religión: es una droga y antes de tomarla no sabemos si nos vamos a convertir en Jekyll o Hyde.
-¿Dónde cree que debería enseñarse la religión?
-En las parroquias, en las mezquitas, en las sinagogas. Nunca en una escuela dentro de la enseñanza pública.
-¿Usted cree que en países occidentales como España realmente es posible la convivencia pacífica y el entendimiento con el Islam?
-Por supuesto que sí. Todas las religiones, si se convierten en un derecho de cada cual y no en un deber de todos, pueden convivir perfectamente. El problema es cuando una religión cree que puede dictar normas a toda la sociedad, creyentes o no; con ese tipo de religión no se puede convivir democráticamente. Otra cosa es que las religiones asuman que hablan sólo para sus fieles y que no pueden pretender convertir en crímenes lo que ellas consideran pecado.
(...)»
(Fernando Savater em entrevista.)

domingo, 25 de março de 2007

Nem o meu?

Eu tenho um amigo cujo pai estava numa mesa eleitoral e a quem foi dito pelo presidente da mesa: “Resultado: Assembleia Nacional – tantos votos; Oposição – zero votos.”

Como era uma freguesia pequena, onde todos se conheciam, o pai do meu amigo perguntou: “Nem o meu?”

E o presidente da mesa respondeu: “Nem o seu!”

sexta-feira, 23 de março de 2007

Entrevista de Luis Mateus

A não perder, a entrevista de Luis Mateus à TSF que se pode ouvir aqui.

quinta-feira, 22 de março de 2007

António Brotas: «Salazar e as eleições»

«Agora que Salazar parece em vias de ganhar pela primeira vez uma "eleição", e logo contra o Afonso Henriques, convém lembrar como eram as votações quando ele era vivo.

No que diz respeito à aprovação da Constituição de 1933, foi simples. As abstenções contaram a favor. A maioria foi esmagadora. Os portugueses nem precisaram de sair de suas casas para exprimir a sua "vontade".

Nas eleições legislativas o método também era infalível. Nas eleições de 1957, por exemplo, em Lisboa, na véspera da eleição, os responsáveis pelas mesas eleitorais foram chamados ao Governo Civil onde receberam a indicação do resultado da votação do dia seguinte com uma margem de erro de 2 %. Assim, na freguesia de São João da Pedreira o resultado devia ser 56 ou 57 %.

No dia seguinte houve guarda republicanos que andaram pelas mesas de voto a levar pacotes de votos de "guardas que estavam de piquete", que foram metidos nas urnas pelos presidentes das mesas. Mas isto teve uma relativa pouca importância.

Perto do fim, depois de assegurada a ausência de testemunhas inconvenientes, os elementos das mesas multiplicaram o número total de eleitores por 0,57 e dividiram o resultado pelo número de páginas dos cadernos eleitorais. Tiveram, assim, o número de eleitores de cada página que "deviam votar".

Procederam, então, sem se preocupar em lançar votos nas urnas, à operação de "compor os cadernos eleitorais", descarregando conscenciosamente nos dois cadernos o conveniente número de eleitores que "tinham" votado. A operação foi acompanhada de comentários do tipo: " Este é comunista, mas desta vez vai votar no governo".

Depois, enviaram para o Governo Civil um documento a dizer: "Percentagem de eleitores: 57 %." Mas não se ficaram por aqui: abriram as urnas, contaram os votos, e enviaram para o Governo Civil um outro documento a dizer. "Percentagem real de eleitores, tantos por cento".

No caso concreto de uma mesa, a percentagem real de eleitores, incluindo os votos dos "guardas de piquete" e 50 votos riscados foi de 28 %, mas os elementos da mesa enviaram um documento a dizer que a "percentagem real", era de 30 %. É provavel que, quando chegasse ao Salazar, esta percentagem já fosse um bocadito mais alta.

Fui testemunha parcial destes factos em 1957. Uma outra testemunha foi o escritor Luis Pacheco a quem envio, 50 anos depois, as minhas saudações e que devia ser agora ouvido. Como comentador da "eleição de Salazar" e porque pode confirmar factos importantes para esclarecer um país que, 30 anos depois do 25 de Abril, ainda está muito mal informado.

Que, ao falar nas eleições do "antigamente", ainda fala em chapeladas, como se a fraude "dos guardas que estavam de piquete" e de uns tantos legionários fosse a mais importante. Salazar era muito mais subtil. Quarenta anos depois de morto, ainda engana o país.

E não só. Quando em Novembro de 1957 cheguei a França vi que os jornais franceses analisavam a situação portuguesa a partir do resultado de 57% de votos obtidos pelo governo nas últimas eleições legislativas.
»

(Texto de António Brotas; recebido por correio electrónico e publicado com a autorização do autor.)

Um problema de «Português Técnico»?

No jornal Público de hoje, são dedicadas quatro páginas ao percurso académico do actual Primeiro Ministro. Tudo lido, de relevante vejo os seguintes factos:
  1. Existe uma pós-graduação em «não-sei-quê sanitária» que o Sócrates mete no currículo e que parece (já?) não existir na instituição referida.
  2. A burocracia da Universidade Independente deve ser uma desgraça.
  3. Existem indícios de que a nota de «Inglês Técnico» do Sócrates terá sido lançada pelo reitor, provavelmente para conclusão do curso. (A este respeito, deve dizer-se que há precedentes de «passagem administrativa» a uma cadeira para terminar uma licenciatura, mesmo em universidades públicas.)

Conclusão: um curso de «Português Técnico» talvez fosse útil ao director do Público. Escrever «Por que publicamos esta investigação» como título de uma nota editorial de um jornal (supostamente) de referência é vergonhoso.

A Comissão de Liberdade Religiosa

Tenho feito alguns longos comentários ao papel da Comissão de Liberdade Religiosa, uma comissão estatal em que apenas parecem ter entrada religiosos, no blogue Povo de Bahá. Ver aqui.

terça-feira, 20 de março de 2007

Retrato de um partido conservador que já esteve no governo e que enche o peito a falar de princípios e valores

  1. «Se ninguém aqui à saída teve a humildade para pedir desculpas aos militantes do partido pelo triste espectáculo, alguém tem de o fazer. Faço-o eu (...) Lamento profundamente que a direcção do CDS tenha tido mau perder: quando percebeu que perdeu, bateu com a porta e foi-se embora» (Paulo Portas no Portugal Diário)
  2. «O dr. Paulo Portas mentiu e sabe que mentiu, ao ter dito que a dra. Maria José Nogueira Pinto abandonou os trabalhos (...) O dr. Paulo Portas mentiu e sabe que mentiu ao ter dito que eu próprio abandonei os trabalhos» (Ribeiro e Castro na TVNET)
  3. «A desfaçatez de Paulo Portas chegou ao ponto de ameaçar e mandar calar a jovem filha de Narana Coissoró, só porque ela, que estava na sala na qualidade de convidada, cometeu o grave pecado de aplaudir uma intervenção.» (Daniel Campelo no Portugal Diário)
  4. «Não há assalto ao poder, o que há é um presidente do partido e uma presidente do Conselho Nacional que estão desesperadamente agarrados ao poder e que se querem manter nos lugares a qualquer preço. Deu-se ao luxo de insultar 150 conselheiros nacionais cujo único delito é não terem a mesma opinião que a Dra. Maria José Nogueira Pinto» (Telmo Correia no Portugal Diário)
  5. «Hélder Amaral avançou pelas minhas costas e magoou-me nas costas e no ombro. Virei-me e identifiquei o senhor deputado. Vi nele duas coisas: um conselheiro e um deputado da Assembleia da República a agredir a presidente do Conselho Nacional e uma mulher que merece consideração e respeito (...) durante todo o Conselho Nacional foi visível o recurso pela maioria dos conselheiros à coacção psicológica, violência verbal e, por fim, a violência física.» (Maria José Nogueira Pinto no Portugal Diário)
  6. «Eu apenas estava a tentar fazer com que o engenheiro Anacoreta Correia, por ser amigo de Maria José Nogueira Pinto, a ela chegasse para a retirar daquela situação. Deve ter olhado para as pessoas e só me terá visto a mim. (...) Os beirões não batem em mulheres.» (Hélder Amaral no Portugal Diário)
  7. «Confirma-se que a senhora foi agredida. Pelo menos, segundo os meus interlocutores, as considerações sobre a sua mãezinha foram uma nota constante. Pelos vistos, até o cervejeiro de serviço, não se coibiu de alinhar nas inúmeras definições laborais da mãe da senhora.» (Comunicatessen)
  8. «A melhor hipótese que o CDS tem é a cisão. Não vou escamotear o que se passou ontem, o partido foi enxovalhado publicamente, e a reputação do CDS foi profundamente ferida (...) a direita olhará para estes acontecimentos com grande horror.» (Maria José Nogueira Pinto no Portugal Diário)
  9. «Podem crer que, se fosse possível e estatutário, o que me apetecia fazer era declarar a independência do partido na Madeira em relação ao partido a nível nacional.» (José Manuel Rodrigues no Jornal da Madeira)
  10. (Adenda) «Para se fazer de vítima, a dra. Maria José Nogueira Pinto invocou a sua condição de mulher que um homem teria agredido. Se isso fosse verdade, era a pior das cobardias. Mas é demagogia da mais barata: tal como seria eu vir aqui dizer que ela me está a atacar por não ser branco como ela. (...) Utilizarei todas as armas que do direito e instâncias judiciais me conferem para me defender da grotesca acusação e da infâmia que recai sobre o meu nome» (Hélder Amaral na TSFonline)

(Sugestão: da próxima vez atirem ovos podres uns aos outros. Sempre é mais divertido e depois as pessoas até acreditam se disserem que foi tudo a brincar.)

segunda-feira, 19 de março de 2007

Castelhano, a língua do futuro

  • «A procura do castelhano disparou nas escolas públicas do Alentejo e já atinge números considerados "surpreendentes" pelos próprios professores. No total, existem 2477 alunos a estudarem espanhol, repartidos por 280 turmas, quando em 2004 não iam além dos 786 estudantes e 48 turmas, segundo dados revelados pela Direcção Regional de Educação. (...) a leitura que as famílias e os jovens começaram a fazer é a de que os cenários de empregabilidade e formação em certas áreas, como acontece com a medicina, conduzem à definição de uma estratégia que privilegia Espanha.» (Diário de Notícias)

Perseguição a livre pensador durante a monarquia

O Almanaque Republicano tem prestado um serviço inestimável na divulgação de efmérides, fotografias e memórias do período da 1ª República. Num dos últimos artigos, encontra-se este facto singelo:
  • «1906 [16 de Março] - Dá entrada na cadeia do Limoeiro, Carlos Cruz, secretário da Associação Propagadora do Registo Civil de Lisboa, para cumprir a pena de vinte meses de prisão por ofensas ao dogma da Imaculada Conceição, publicadas no jornal Vanguarda. Carlos Cruz acabou por cumprir somente setenta e oito dias de prisão, porque foi indultado pelo governo de João Franco.»
Para quem não sabia: em pleno século 20, ainda havia em Portugal quem fosse parar à prisão por pôr em causa um dogma religioso (ou seja, por expressar o seu pensamento em matéria religiosa). E depois ainda dizem que a República é que «perseguiu» a ICAR...

A ofensiva clerical e obscurantista na Comissão de Liberdade Religiosa

«A mesa redonda «Religião e Educação», integrada no 2º colóquio «A religião fora dos templos», organizado pela Comissão de Liberdade Religiosa, foi marcada por um documento de Esther Mucznick intitulado «A religião nos manuais escolares».

A generalidade das intervenções, tanto da mesa como do público, foram no sentido de apoiar a linha de actuação proposta por Mucznick, e que passa por, numa primeira fase, reivindicar a criação de uma comissão junto do Ministério da Educação dominada por religiosos e que zele pela correcção religiosa dos manuais escolares; numa segunda fase, pela inserção no currículo escolar de uma disciplina multi-religiosa obrigatória.

Desde o início da existência da Comissão de Liberdade Religiosa, criada pela Lei da Liberdade Religiosa (Lei 16/2001), que a Associação República e Laicidade exprimiu a sua apreensão pela composição deste organismo estatal e pelo papel que poderia vir a desempenhar. Essa apreensão revela-se, infelizmente, cada vez mais justificada.

Se a actual Comissão de Liberdade Religiosa levasse avante as propostas apresentadas por Esther Mucznick, os estragos feitos à laicidade da escola pública e à difusão da ciência em Portugal seriam tremendos e duradouros.

1. Sob os pretextos, assumidos por Esther Mucznick, de combater o carácter que ela entende «excessivamente laicista» dos manuais escolares, e de garantir que os manuais escolares não ofendem a religião judaica por acção ou omissão, a comissão atribuiria a grupos confessionais a possibilidade efectiva de rever os programas escolares e de decidir sobre o que pode ou não ser ensinado em matéria religiosa (e não só) na escola pública, ferindo decisivamente a liberdade de ensino e a não confessionalidade da escola pública.

2. Mais grave ainda seria a «inserção no currículo escolar do estudo obrigatório das grandes religiões e doutrinas religiosas», que atingiria a liberdade de consciência dos alunos, e o direito dos pais a educarem os filhos segundo as suas convicções em matéria religiosa.

3. Finalmente, é preocupante que o deputado Vera Jardim tenha manifestado a sua abertura à correcção religiosamente orientada dos currículos, e é gravíssimo que esteja disponível para aceitá-la mesmo no caso, levantado por um elemento do público, do ensino da teoria religiosa da «criação cristã do mundo e da vida» a par da teoria científica da evolução. A escola pública não pode ser, de forma alguma, o local para a transmissão de teorias obscurantistas.

A Associação República e Laicidade reafirma que a própria existência da Comissão de Liberdade Religiosa, com a orientação actual, é um perigo para a laicidade do Estado e para a difusão do conhecimento científico em Portugal, e lamenta a complacência que a postura anti-laicista e a propaganda anti-ciência encontram no referido elemento do partido no governo.»

[Publicado originalmente no blogue da Associação República e Laicidade.]

domingo, 18 de março de 2007

Fascismo é...

Creio que perdi a oportunidade de continuar o fascinante debate sobre a verdadeira natureza do fascismo. No Kontratempos, o Tiago Barbosa Ribeiro continuou com os seus exercícios de revisionismo histórico. No último, por entre uma confusa exibição de conceitos teóricos que parecem denunciar uma fuga à realidade, chega a implicar que nem o regime de Mussolini terá sido fascista.
Enfim. Não deixa de ser cómico que quem é tão exigente com o uso do termo «fascismo» quando aplicado ao regime de Salazar, seja mais desprendido quando se trata de proibir o fumo de tabaco em recintos fechados. Conforme já notara no meu Manual da direita politicamente corrigida, existem pessoas para quem o único uso politicamente correcto da palavra «fascismo» é para a proibição de fumar em hospitais e berçários, decidida democraticamente em regimes constitucionais. Já a violência de rua, a Mocidade Portuguesa e a Legião, o SNI e o resto, não, nada disso é fascista quando comparado com o horror totalitário que é não se poder fumar num restaurante...

sábado, 17 de março de 2007

Revista de blogues (17/3/2007)

  1. «Decorreu hoje a 1ª sessão do II Colóquio «A Religião fora dos Templos», no Centro Ismaili, organizado pela Comissão de Liberdade Religiosa, um organismo governamental criado pela Lei da Liberdade Religiosa. Infelizmente não tive possibilidade de assistir mas tenho um relato fidedigno do que aconteceu naquele que pode ser um dia negro na educação nacional. Mesmo a propósito do tema a que temos consagrado os últimos posts, as intervenções num dos paineis da manhã, devotado ao tema «Religião e Educação», corroboram o que escrevemos sobre as ofensivas criacionistas cá no burgo. Assim, a tónica das referidas intervenções assentou no lamento da valorização do iluminismo (e consequente humanismo) e da verdade «secular» no sistema de ensino público nacional e na verberação da necessidade da correcção dos manuais escolares no sentido de reporem a «verdade» religiosa dos factos. Nas respectivas intervenções, Esther Mucznick, Guilherme Oliveira Martins e Alfredo Teixeira (Univ. Católica) exigiram do Ministério da Educação a criação de uma comissão tripartida para corrigir manuais escolares de História e Língua Portuguesa, eliminando tudo o que as confissões religiosas considerem discordante da «verdade» religiosa.» («O insustentável peso da religião», no De Rerum Natura.)
  2. «Tiago Barbosa Ribeiro insistiu e desenvolveu a sua tese, no que é acompanhado há largo tempo por uma corrente académica do “revisionismo histórico-sociológico”, afincada no purismo quanto aos requisitos da “qualidade de fascismo”, sobre o “erro” de qualificar o “salazarismo” como um “fascismo”. A sua reinvestida constitui um texto interessante mas mostra, também, as fragilidades da espiral revisionista. Pois que agora, até já o fascismo italiano (o modelo fascista mais copiado com Salazar) não seria um verdadeiro “totalitarismo” (qualidades reservadas ao nazismo e ao estalinismo). E, de degrau em degrau, na perda da “qualidade fascista”, o salazarismo ficaria nas águas turvas de uma mistura de “nacionalismo antiliberal, autoritarismo antidemocrático e corporativismo antisocialista”.» («Ainda o fascismo e o salazarismo (3)», no Água Lisa(6).)

sexta-feira, 16 de março de 2007

Perguntem aos índios pelo amor cristão...

Não sei se já escrevi isto aqui, ou no meu blog Oeste Bravio. A idade já me vai baralhando as ideias. Mas um comentário do “liberal” Tiago, a propósito já não sei de quê, a acusar-me de meter “os cristãos” em tudo, lembrou-me uma história que me aconteceu há dois ou tres anos, em York, UK, num café onde entrei cheio de frio.

Estavam quatro pessoas lá dentro (dois casais) e o dono, muito bem disposto, que me perguntou de onde eu era. Passados poucos minutos o casal mais novo – que conhecia College Station! – já me estava a perguntar se eu, vivendo em College Station, era “cristão”... (“Cristãos” são os evangélicos. Para eles os católicos nem sequer são considerados cristãos).

Eu respondi-lhe que gostava muito de viver aqui, mas apesar dos cristãos, que a meu ver eram um perigo para o ambiente e para a paz mundial, e um insulto ao bom gosto e à civilização, todos com os autocolantes na parte de trás do carro, a louvar este presidente inimputável, juntamente com aquele peixe medonho, que apregoa a ignorância militante dos condutores...

O casal mais velho meteu-se na conversa e o senhor informou-me que eu ia para o Inferno. Eu expliquei-lhe que antes de ser ateu me tinham impingido a doutrina católica e que os católicos não vão para o Inferno, mesmo que não acreditam em deus. Só a Margaret Thatcher, o Pete Botha, o Ronald Reagan e o Karl Rove é que iam ferver em azeite para a eternidade, juntamente com o Judas, o Caius e o Br...

O senhor não estava a gostar nada das minhas piadas e levantou-se, lívido, pagou e saiu, seguido pela mulher, que me mandava uns olhares odiosos e doloridos. O casal mais novo já não ousava abrir a boca, pagou e saiu também...

E e pedi a conta e pedi deculpa ao dono do café por lhe ter espantado os clientes todos em tão pouco tempo... ele saiu de trás do balcão estendeu-me a mão e disse-me: você aqui não paga!! Eu levo com estes anormais todos os dias em cima!! E eu não posso dizer nada senão eles não vêm cá!! Há aqui um centro evangélico e estes idiotas não são capazes de beber um café sem me darem uma m... de um folheto sobre Jesus ou o Inferno!! Não imagina o prazer que me deu ouvi-lo estraçalhá-los! E acompanhou-me até à porta com muitos abraços e palmadas nas costas.

O Tiago obviamente não faz ideia de quem são estes fanáticos perigosos, estes neo-nazis violentos e anti-intelectuais, que se metem nas nossas vidas por tudo e por nada, e sobretudo não sonha que mundo é que eles já têm planeado para ele viver.

Mesmo correndo o risco de lhe destruir as conviccoes “liberais”, atrevo-me a sugerir-lhe que leia um artigo sobre a estupidez perigosa desta gente horrível, de um senhor chamado Jeff Sharlet, “Soldiers of Christ” (Harper’s, Maio de 2005 :41-61).

Se quiser, eu posso fazer um pdf e mandar-lhe.

Mais do que um blogue

domingo, 11 de março de 2007

Breve História da religião

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(Via Devaneios Desintéricos.)

Revista de blogues (11/3/2007)

  1. «primeiro julguei que estava a ver mal, depois lembrei-me de que isto é perfeitamente normal: o cardeal patriarca de lisboa, nos seus paramentos, a benzer o monumento dos cinquenta anos da rtp, antes de o presidente da república avançar para o inaugurar. e o presidente a subir para o palanque, imediatamente seguido pelo cardeal. tem graça. julguei que esta coisa das cerimónias oficiais e do papel das confissões religiosas nas mesmas e no protocolo de estado tinha sido discutido no parlamento no ano passado e se chegara à conclusão de que era necessário respeitar a não confessionalidade do estado nas ditas cerimónias. mas foi engano, claro. tudo como dantes, quartel general em abrantes.» («deus, pátria, RTP», no Glória Fácil.)
  2. «Este senhor (Almerindo Marques) é o presidente do conselho de administração da RTP, empresa pública. Foi ele, seguramente, quem teve a ideia de convidar o cardeal para benzer o novo centro de produção da RTP, ontem "solenemente" inaugurado. Continuo à espera, com a Constituição da República na mão, que ele me peça desculpa pelo despautério e pela afronta. Ou, em alternativa, que se demita ou seja demitido. Depois da missa de graças mandada dizer pelo director-geral dos impostos, só faltava mesmo que o presidente da RTP convidasse o cardeal para uma benzedela. Estes católicos não têm vergonha na cara, nem respeito por ninguém. E usam o Estado como uma quinta ou um quintal. Basta!» («O patrocinador da palhaçada», no Abnóxio.)

sábado, 10 de março de 2007

Beautiful People!

Ontem ouvi um jornalista, todo entusiasmado, na telefonia: a revista Forbes identificou 178 novos bilionários. Segundo aquela alegre notícia, o mundo tem este ano 946 bilionários, mais 178 que no ano passado. Mais ou menos metade são norte americanos.

Pensei imediatamente nos malandros que acham que isto não quer dizer que o planeta esteja mais rico, mas que a riqueza está (ainda) mais concentrada este ano que no ano passado.

As más línguas podem falar de injustiça social e de uma perigosa concentração do dinheiro nas mãos de tão poucos cidadãos, esvaziando o poder dos governos e transformando a democracia parlamentar numa farsa. Há mesmo que pense que estes 946 bilionários são uma classe que não tem qualquer contacto com a realidade e portanto não se sabe sequer defender nem de si própria, apoiando-se estrategicamente no movimento cristão evangélico – que justifica a riqueza e a injustiça social com a vontade de deus e culpa os pobres por serem pobres – e ignorando os perigosos sinais de degradação ambiental, do ataque à ciência e à educação da defesa de um modelo económico que está a criar um mundo populado por biliões desesperados.

E depois há os humanistas seculares, que acham imoral que o mundo se reja pela máxima de Milton Friedman “a única obrigação moral das empresas é a maximização do lucro”.

Mas eu aposto que todos estes bilionários ganharam as suas fortunas trabalhando, suando, fazendo as escolhas certas – como se sabe, os pobres do México e da Bolívia fizeram as escolhas erradas – e que não há nenhum que não seja culto e generoso, inteligente e cheio de preocupações sociais.

sexta-feira, 9 de março de 2007

A igualdade que vai dar polémica

  • «O Governo decidiu estender às mulheres o carácter obrigatório do recenseamento militar a partir deste ano, anunciou ontem o ministro da Defesa. "Está na hora de acabar com essa discriminação" relativamente aos homens, afirmou Nuno Severiano Teixeira, no final do almoço com que as Forças Armadas assinalaram, na messe de oficiais de Caxias, Lisboa, o Dia Internacional da Mulher.» (Diário de Notícias)

Eu acho bem.

Revista de blogues (9/3/2007)

  1. «(...) as pechas dos “revisionistas” (que se perdoe a expressão) que, alcandorados no meio académico, pretendem criar a inibição social de se continuar a falar de “fascismo salazarista” (por pecado de falta de rigor), são algumas (...) O primeiro grande sofisma dos “revisionistas” é que falam da referência ao “modelo fascista” como se ele tivesse existido e permanecido em estado puro algures (...) E se formos por esta mesma via, não só não houve fascismo em Portugal, como ele igualmente inexistiu em Espanha, na Hungria, na França-Vichy, na Croácia, na Eslováquia, na Hungria. Porque nenhum deles foi cópia dos fascismos italiano e alemão. E no entanto, a matriz foi a mesma (...) A adopção por Salazar do “modelo fascista italiano” foi dominante na sua prática política (...) ao contrário dos fascismos italiano e alemão, o Estado Novo, em termos territoriais e de “espaço vital”, em vez de expansionista era um aflito conservador dos seus territórios coloniais (...) A LP desempenhou funções repressivas brutais e tinha um completíssimo serviço de controle, informações e denúncias.» («Ainda o fascismo e o salazarismo (1)», no Água Lisa (6).)
  2. «O Governo português decidiu desactivar a embaixada portuguesa no Iraque por considerar perigos vários e falta gritante de condições de segurança. Ao mesmo tempo, os Serviços de Estrangeiros e Fronteiras do Ministério da Administração de Interna resolveram recusar o pedido de asilo a um cidadão iraquiano alegando “não estar provado que não existem condições de segurança no Iraque”.» («A cobardia nunca é muito generosa», no Cinco Dias.)

Salazarismo foi/não foi fascismo: mais do mesmo

No Rabbit´s blog, Luis Pedro insiste que «Salazar não era fascista». Resposta breve aos seus argumentos.
  1. «Salazar combateu os verdadeiros fascistas portugueses (...) encabeçados por Rolão Preto». E lá voltamos a esta fatídica criatura. Combateu é um verbo demasiadamente forte: arrebanhou-os para o regime quando sentiu que poderiam obrigá-lo a partilhar o poder. E quanto a saber se Rolão Preto era fascista, voltamos ao mesmo: foi monárquico integralista antes e depois da «aventura» nacional-sindicalista dos anos 30, durante a qual não deixou de identificar o «Chefe» com o rei. E declarava-se «para além da democracia, do fascismo e do comunismo». No sítio dos integralistas, está ainda uma biografia onde se afirma que «o autoritarismo de Salazar (...) veio a revelar-se bem mais próximo do fascismo»...
  2. «Salazar era um conservador, não um revolucionário». O problema fundamental deste debate é que essa diferença não interessa. Do ponto de vista doutrinal e teórico, é possível distinguir tudo, o integralismo e o nacionalismo, o fascismo e o autoritarismo de direita, o conservadorismo e o catolicismo integrista, etc. Mas a História não é feita com teorias perfeitas. É feita por homens que se inspiram noutros homens com cujas ideias sentem afinidades. O que interessa avaliar é se as instituições e as leis do Estado Novo se integravam, ou não, no modelo de Estados autoritários de direita que existiram na Europa dessa época. E avaliar também se procedia em conformidade na sua política interna e externa. E a resposta é que sim. A lei do trabalho portuguesa foi inspirada na de Mussolini. O retrato que Salazar tinha na mesa de trabalho era o de Mussolini. (Demarcações de Mussolini até Hitler fez, quando os interesses do seu regime não coincidiam com os do vizinho transalpino.) Os republicanos espanhóis eram entregues para fuzilamento na fronteira de Barrancos. (Já agora, Franco também não era fascista? E porquê?)
  3. Na acção concreta, todas estas correntes teóricas apareciam unidas (com uma outra divergência táctica e/ou de liderança) contra o bolchevismo ascendente, num momento de crise económica em que a urbanização e a industrialização se acentuavam de forma irresistível, em que os oficiais que tinham estado na mais mortífera guerra de sempre tinham voltado e se sentiam desaproveitados depois do seu «heroísmo», e quando as hierarquias tradicionais estavam em desagregação.
  4. Na parte final da sua contribuição, Luis Pedro interroga-se «até que ponto é que o Estado Novo contém elementos fascistas?». É uma pergunta mais interessante. Tinha, e muitos. Até «revolucionários». Falava-se em «Revolução Nacional» porque, como dizia Salazar, «enquanto houver um português com fome, a revolução continua»...

quinta-feira, 8 de março de 2007

Salazar e o sindroma de Estocolmo

Sempre achei interessantíssimo ver as pessoas mais desgraçadas acabarem amigas de quem lhes fez as piores coisas. É um fenómeno humano, quase terno, que Eça de Queiroz retratou tão bem em vários romances, mas sobretudo em Alves & Cia.

E agora é divertido ver os portugueses almejar outra vez uma ditadura, um ditador paternal que os proteja e lhes diga o que é melhor para eles. Um pai que os ampare e que puna implacavelmente os que rejeitam o seu amor paternal (como diz Deus: sofrimento eterno para os que duvidarem do Meu amor infinito!).

Acredito que o salazarismo tem duas raízes fundamentais: o medo da liberdade, da confusão e da criatividade (relacionado com a falta de auto-estima dos oprimidos), e a inveja dos vizinhos.

O medo: Portugal tem vivido sob regimes políticos opressivos há quase 500 anos e é natural que os portugueses lidem mal com as responsabilidades e a iniciativa, o pensamento crítico e a independência de espírito.

Quando os americanos disseram ao rei George III que apertavam o cinto mas só se fosse à volta do pescoço dele e da escumalha de ladrões e de inúteis que entulhava a Casa dos Lordes, os portugueses andavam a escrever coisas sobre Deus e o rei e a autoridade e o clero, a tentarem recuperar das constipações que apanharam quando o Marquês de Pombal abriu a janela e deixou entrar um bocadinho do ar fresco do iluminismo nesta sacristia miserável que (ainda) é Portugal.

Desde sempre que este país puniu os mais espertos e os mais ambiciosos (em Portugal a ambição é um crime: chama-se arrivismo), os que gostavam de melhorar a vida à custa do trabalho próprio. Não é bom ser-se muito esperto em Portugal. Vale mais ter amigos poderosos.

Por isso, quando há um problema os portugueses olham para cima! “Eles” haviam de fazer aqui uma estrada, “eles” haviam de prender esta malandragem toda (os gadelhudos!), “eles”, “eles”, “eles”.

Nunca se fala em “nós” como parte da solução.

A segunda razão é a inveja miserável dos infelizes. Os búlgaros contam uma anedota que explica bem o peso da opressão: o Inferno é um sítio cheio de caldeirões com óleo a ferver e demónios com forquilhas, que empurram as almas que querem sair. Menos no caldeirão da Bulgária, que não precisa de demónios porque cada vez que um búlgaro tenta sair os outros puxam-no para baixo.

A coisa melhor que o salazarismo tem para nos oferecer é que deixa ser preciso ser-se invejoso: nas ditaduras passam a ser todos miseráveis.

Revista de blogues no dia da mulher

  1. «Não, não preciso de expiar ou envergonhar-me dos séculos de exploração feminina, das humilhações a que os homens sujeitaram a mulher, do sofrimento que lhe impuseram. Não sou culpado do anacronismo das leis, do carácter misógino da tradição judaico-cristã, dos preconceitos do clero e da violência das leis que a discriminaram. Não defendo os conteúdos misóginos da Tora, da Bíblia ou do Corão que legitimam a violência de que são vítimas e as penas a que são sujeitas, sem esquecer a lapidação e as vergastadas públicas a que o fascismo islâmico ainda submete as mulheres. Nos primórdios da humanidade a força física foi determinante, a divisão do trabalho e a apropriação dos incipientes meios de produção conferiram ao homem a supremacia que o tempo se encarregaria de perpetuar e os homens de defender.» («Dia Internacional da Mulher», no Ponte Europa.)
  2. «Eu acredito que já se mudou muito da antiga mentalidade, as diferenças não são assumidas com a naturalidade que eram dantes e, sobretudo entre gente mais jovem, já há a noção de que as obrigações, direitos, deveres, deveriam ser iguais. E o pensar-se isso, mesmo que na prática não aconteça, é bom. Quero eu dizer, que se o trabalho doméstico recair na mulher, pelo menos o marido fica com alguma má consciência… É alguma coisa. Contudo se isso é a nível ‘doméstico’ chamemos-lhe assim, do ponto de vista patronal a coisa continua complicada: a mulher é ainda a primeira a ser despedida, e ao ser admitida no trabalho sofre um inquérito a nível pessoal que não se utiliza para os homens (se tem filhos, ou até se pensa engravidar). E, é claro, que estamos a pensar em termos de Primeiro Mundo, porque se formos para a África ou Ásia então a mulher é ainda um ser humano de segunda classe. Portanto falta ainda muita luta, muita paciência, muita força de vontade para se conquistar essa igualdade de oportunidades em todo o Mundo.» («Mulher», no Pópulo.)

O cardeal no protocolo da TV pública

Na comemoração dos 50 anos da RTP, lá estava a sotaina de José Policarpo, sempre um passo atrás do Presidente da República e um passo à frente de dois ministros do governo da República. Como se não bastasse, benzeu o monumento dos 50 anos da RTP, um gesto «mágico» cujas consequências se ignoram.

Tendo em conta que se fez uma lei de protocolo de Estado, há menos de um ano, pela qual o cardeal-patriarca de Lisboa deixou de ter lugar no protocolo de Estado, como deve ser interpretada a atitude de uma das mais emblemáticas empresas públicas, ao colocar o cardeal Policarpo no protocolo da TV pública? Foi uma provocação deliberada?

[Esquerda Republicana/Diário Ateísta]

quarta-feira, 7 de março de 2007

O salazarismo foi um fascismo

No Kontratempos, o Tiago Barbosa Ribeiro escreveu um espantoso artigo onde defende que o salazarismo não foi um fascismo. (Felizmente, existem dois excelentes comentários em que os seus argumentos são criticados.) Algumas breves achegas.
  1. «O salazarismo afastou-se do tipo ideal-fascista que emergiu no âmago da modernidade europeia». Do «ideal» teórico, todas as concretizações práticas se afastaram, até a italiana. De resto, houve variações nacionais, resultantes das circunstâncias da chegada ao poder, das características de cada país, ou dos objectivos imediatos. «Tipo ideal», só nos livros.
  2. «Globalmente identificado no campo político-ideológico do movimento fascista europeu, o salazarismo diferencia-se daquele pelas suas causalidades sociais mas também pela sua própria natureza política e ideológica». Se fosse assim, Tiago Barbosa Ribeiro teria encontrado diferenças de natureza. Pelo contrário, e como nota um comentador, só encontra diferenças de grau.
  3. «Só isso explica a sobrevivência do Estado Novo depois da derrota do Eixo em 1945, num conflito mundial em que se manteve virtualmente neutro». A «sobrevivência» resultou exactamente da neutralidade (e também da cedência das Lajes a partir de 1943). Qual é o mistério?
  4. «[O regime] reprime a oposição, mas não a suprime». Não é bem assim. Os grupos anarquistas foram rigorosamente suprimidos, apesar de alguns militantes se terem refugiado no PCP (que tinha uma organização centralizada e autoritária mais apta para resistir à repressão). As organizações populares republicanas foram também suprimidas, por vezes, como em Fevereiro de 1927, em frente a pelotões de fuzilamento. Outros, foram deportados. O facto de muita gente equacionar resistência ao Estado Novo e luta comunista, deveria levar Tiago Barbosa Ribeiro a interrogar-se sobre o que aconteceu às outras oposições que existiam organizadas em 1926. A resposta é que foram mesmo suprimidas.
  5. «A matriz católica, que restaurou as forças tradicionalistas e permitiu a neutralização das veleidades totalitárias do regime, diferenciando o autoritarismo nacionalista conservador do Estado Novo dos nacionalismos modernizantes da Itália e da Alemanha.» De acordo que o regime era de matriz católica, mas não compreendo porque esse facto o torna menos totalitário. Entre as manifestações de Fátima e as de Nuremberga, o resultado, em termos de unificação e mobilização social, será assim tão diferente?
  6. «O exército português também nunca se aproximou do fascínio militarista que era exercido pelo poderio da Wehrmacht nazi ou do Exército Vermelho comunista.» Salazar não promovia o «fascínio militarista» porque não tinha ambições de expansionismo territorial, na Europa ou fora dela. E não as tinha porque o Estado Novo herdou um império e queria preservá-lo, ao contrário dos regimes da Alemanha e da Itália, que não herdaram e precisavam de conquistar.
  7. «A hibridez constitucional, num regime que rejeita a democracia e formula o autoritarismo de Estado mas dota-o de princípios de representação democrática». «Princípios de representação democrática», num regime em que a oposição nunca elegeu um deputado, e onde os sindicatos eram «oficiais» ou clandestinos? Francamente. Um pouco mais e tentam convencer-nos de que o Estado Novo era uma democracia liberal...

Salazar, desta vez com graça!

Tirei esta história, que considero deliciosa e muito a propósito, do meu blog (Fevereiro de 2004):

A mulher de um amigo meu andou no colégio de Odivelas e no verão de 1968 esteve de férias com outras alunas no Forte de Catalazete, como parece que era hábito. Durante uma brincadeira partiu uma cadeira do pátio e voltou a pô-la no armário sem dizer nada a ninguém. Poucas semanas depois, a 6 de Setembro, Salazar acabou a sua carreira política ao cair de uma cadeira no terraço do Forte de Catalazete. Até 1974, quando percebeu quem Salazar realmente tinha sido, esta minha amiga viveu com a dúvida e a culpa horríveis de poder ter sido responsável pelo acidente que vitimou o Sr. Presidente do Conselho. Nunca vamos saber se foi ela quem de facto precipitou os acontecimentos. Mas na dúvida, aqui fica a minha gratidão.

Salazar

Eu tenho seguido esta história com alguma curiosidade antropológica.

Quando Salazar morreu, depois de se ter babado insconciente na cama durante dois anos, sem que ninguém lhe tenha sequer dito que já não era Chefe do Estado, não se deitou um foguete, não se verteu uma lágrima.

A Sra. Maria ficou na rua, sem pensão de reforma, e uns amigos do Chefe de Estado quotizaram-se para a meter num asilo.

A ditadura passou-se a chamar ditamole e depois caiu, sem que se tivesse disparado um tiro, na apatia geral. Os ex-PIDEs arrastaram-se lascarinos aos pés dos jovens intelectuais que tinham torturado e insultado apenas uma semana antes.

O PC entregou as colónias à URSS e depois resignou-se, também ele, à democracia parlamentar, sempre com umas saudades indescritíveis da clandestinidade, quando bastava uma palavra do Fuhrer (Cunhal) para que todos concordassem em entregar um amigo ou um camarada à PIDE, por discordar das directivas do Partido, ou por ter preferências sexuais contra-revolucionárias.

Foi isso o Salazarismo: a destruição total da auto-estima de um povo, até que ninguém acreditasse em nada, se importasse com nada, se indignasse com nada.

E agora os portugueses têm saudades!

De quê? De não haver estradas e uma viagem ao Porto demorar seis horas? De não haver escolas dignas desse nome? Dos pobres não terem passado, nem futuro, nem sapatos, nem dignidade? Da censura dos jornais? De ser preciso ter licença para usar isqueiro? De as mulheres precisarem de uma autorização escrita do marido para terem conta bancária? Ou passaporte? De ainda se morrer com cólera nos anos setenta, como no resto da Europa 100 anos antes? De haver 30% de analfabetismo? De Portugal ser o país da Europa com menos telefones per capita? E menos esgotos? E menos água potavel? E menos electricidade? De os gorilas baterem nos estudantes dentro das universidades?

Se calhar afinal foi tudo merecido.

terça-feira, 6 de março de 2007

Liberdade para os que querem destruí-la

Existe liberdade para se ser fascista. Liberdade de expressão para gritar «viva Salazar». Liberdade de reunião para fazer saudações nazis em grupo, no Rossio ou em Santa Comba Dão. Existe liberdade, em resumo, para quem quer destruir a liberdade.
Evidentemente, qualquer cretino pode fazer um museu sobre Salazar. Até pode ser um museu privado. Já me parece inaceitável que a câmara municipal de Santa Comba Dão queira usar fundos públicos para um museu desse tipo, quando este não tem quaisquer garantias de defender os valores do Estado democrático. E parece-me ainda mais afrontoso quando penso que há poucos meses a ex-sede da PIDE foi transformada em condomínio de luxo.
Existe uma solução para o problema criado: a intervenção do Estado. O governo poderia encarregar-se de fazer um museu em Santa Comba Dão sobre o regime político do «filho da terra». Se fosse pedagógico e não fosse entregue a um Jaime Nogueira Pinto qualquer, poderia ser útil para a terra e para o regime democrático...

Revista de blogues (6/3/2007)

  1. «Na noite de passagem de ano, quase nunca há táxis em Lisboa. Às cinco da manhã, junto ao Lux, não havia táxis. A Maria, vamos fazer de conta que é esse o nome dela, saiu do Lux a essa hora. Como mora perto do Cais do Sodré, resolveu ir a pé para casa. (...) Quando estava a 300 metros do destino, um grupo de três rapazes de vinte anos apareceu-lhe à frente. O primeiro mandou-lhe a mão ao rabo, o segundo imitou-o. O terceiro encostou-a à parede e passou-lhe revista. A Maria gritou, empurrou, debateu-se, deu pontapés, mas não conseguiu rechaçá-lo. (...) Há uma esquadra ali perto. Mas Maria já lá foi algumas vezes, uma das quais quando roubaram um telemóvel a uma amiga que a ia visitar, e ficou com a ideia de que ir à esquadra só serve para perder tempo e ficar ainda mais irritada. Suspeitava aliás de que, se fosse à polícia queixar-se de ter sido apalpada na rua por três marmanjos, ainda acabaria a sentir-se gozada ou a ter de responder a perguntas do tipo ‘Então e o que estava a senhora a fazer na rua a esta hora, sozinha?’ ou ‘Não acha que é muito perigoso uma senhora tão atraente andar assim vestida por aí, a estas horas? Não acha que até teve muita sorte de não lhe ter acontecido pior?’» («de penoso a penal, um juízo do apalpão — here we go again», no Cinco Dias.)
  2. «The marks of the second world war can be seen all over Europe, in restored buildings, destroyed neighbourhoods, war cemeteries, painful memories and memorials to the millions who died in the war against nazism. In almost all countries the memorials are treated with respect. (...) But in Estonia a new law threatens the very principle of the sanctity of the war dead. The War Graves Protection Act will allow the memorial that stands in the centre of the capital, Tallinn, to be dismantled, and the bodies of unknown soldiers beneath it to be disinterred and reburied elsewhere. (...) Meanwhile in Estonia, as in Latvia, it has become permissible for veterans of the Hitlerite SS not only to form associations, but to hold rallies in city centres. In other words, it has become politically correct among some EU members to honour those who tried to bury European civilisation and were responsible for a five-year catastrophe on our continent, while they make it more difficult to honour those who gave their lives to stamp out the cancer of fascism. (...) the men and women who fought in the Red Army believed they were ridding the world of fascism - and that is what they did. They and their children can't be held responsible for crimes committed later. It is unforgivable to equate liberators with occupiers.» («An insult to our war dead», no The Guardian.)