- «Os registos de tráfego das chamadas telefónicas e das mensagens de e-mail dos portugueses vão em breve passar a ser guardados durante um ano. O ministro da Justiça, Alberto Costa, disse ontem que a proposta de lei já deu entrada na Assembleia da República, devendo ser aprovada “nas próximas semanas”.» (Correio da Manhã, via Argos-Zoom.)
- «O ministro da Justiça admitiu hoje que a possibilidade dos serviços de informação fazerem escutas telefónicas "é um tema para pôr na agenda de uma próxima revisão constitucional".» (Expresso)
Não gosto deste senhor. Para já, vai saber a quem telefono e a quem envio e-mails. A seguir, quer ouvir o que digo ao telefone e ler a minha correspondência. Nem a Constituição o pára. Quer suprimir o que há de melhor na Europa: a privacidade dos cidadãos. É um tipo perigoso. Alguém faça alguma coisa para o parar.
9 comentários :
ricardo, não acho que seja assim tão grave. outro dia na televisão dizia o júdice, a propósito do "folhetim maddie", que a investigação criminal em portugal funcionava muito na base da confissão, directa ou indirecta (escutas telefónicas ou registos electrónicos, etc). a investigação criminal científica em portugal, ao que parece, ainda não se encontra ao nível que seria bom estar.
neste contexto, e como medidas temporárias, por forma a assegurar um mínimo desempenho funcional da investigação criminal , não me parece que sejam medidas graves --- pelo menos se necessitarem de autorização de um juíz para serem de facto aplicadas. claro que de nada serve este "compasso de espera" se, ao mesmo tempo, não se colocar a investigação criminal científica up to date com as melhores práticas internacionais.
se entras por esta linha, logo acabas por te colocar contra o fim do sigilo bancário --- passo sabido como absolutamente fundamental para travar um sério e eficaz combate à corrupção, por exemplo. (embora este caso seja completamente trivial do ponto de vista de violação de privacidade: se nas escutas telefónicas alguém tem que ouvir a conversa, no sigilo bancário todo o controle pode ser feito por computador.)
Desculpa lá, mas o que está em causa é registo de tráfego a toda população, independentemente de sermos ou não suspeitos. Quando já há uma suspeita ou uma acusação, admito que a situação seja um pouco diferente.
E a comparação com o segredo bancário é mázita: ouvir conversas não é bem a mesma coisa do que saber para onde transfiro o carcanhol.
Como se não bastasse registar o tráfego de telemóvel e e-mail de toda a gente, ele ainda quer pôr os serviços de informação a escutar o que dizemos ao telefone. «Serviços de informação», percebeste?! Não é a Judite, pá!
volto a dizer que tudo depende de como for feito. imagina um cenário em que existe apenas registo electrónico ao qual só se pode aceder em caso de autorização de um juíz (seja acesso da pj ou do sis). é grave? pode não ser um mundo perfeito, mas não me parece que seja assim tão grave como pensas (e a frase anterior tanto é válida para escutas, emails, dinheiro em bancos, o que for).
senão repara: tu aceitas que essa informação possa ser acedida em caso de suspeição; mas se ela não existe (por não ter sido registrada), então não podemos aceder a ela.
ou seja, como princípio não me parece que seja um ideia abominável. claro que é preciso ao mesmo tempo reforçar a investigação criminal científica para ir preparando o futuro. mas não vejo, para já, caso para histeria.
e digo "para já" pois falta o cerne da questão, onde aí sim poderia concordar contigo: se não acho que, como ideia, isto seja assim tão terrível, gostava por outro lado de saber como vai ser efectivamente posta em prática: vai mesmo ser necessária autorização de um juíz para aceder aos registros electrónicos? e vão esses registros ser mesmo electrónicos ou vai haver um factor humano pelo meio? estas sim, parecem-me ser as questões importantes...
Ora bolas. E eu que me preparava para cerrar fileiras com o homem contra os gémeos anti-aborto e eutanásia.
eu também considero este facto gravíssimo, um atentado contra a privacidade dos cidadãos e um atentado à democracia.
com coisas destas a acontecer, teremos de deixar a polónia para segundo plano e defender-mo-nos a nós mesmos antes que portugal se transforme na polónia do sul da europa.
a questão é: o que fazer?
não sou a favor de petições online que não servem para grande coisa, mas sim de petições ou abaixo-assinados a sério.
ao ricardo s. carvalho:
espanta-me profundamente que não se sinta incomodado por esta medida.
o argumento do quem não deve não teme é completamente falacioso.
uma coisa é existirem investigações que são feitas em função de actos ilícitos concretos decorridos ou em preparação.
outra coisa é esta proposta. a isto chama-se totalitarismo: ou seja, a pretensão de o estado controlar a TOTALIDADE das formas de comunicação entre os cidadãos. ao controlar telefonemas e emails estará a controlar 90% das formas de comunicação. sobra o correio tradicional e a conversa cara a cara.
junte-se a isto a proliferação da videovigilãncia...
a questão é que, criados os mecanismos de vigilância da totalidade da população, não podemos ser ingénuos e acreditar que nunca ninguém irá abusar deles.
antigamente os maridos abriam o correio endereçado às esposas e aos filhos.
hoje é o estado a reservar-se o direito de saber a quem eu escrevo, a quem eu telefono, quem me escreve e quem me telefona....
cão, como já disse ao ricardo, não acho que haja qualquer razão para histerias, pelo menos não neste momento.
existem muitos crimes que podem ser investigados sem "violações de privacidade". existem muitos outros que não. e existem muitos outros que nem sequer se podem descobrir como crimes a menos que exista alguma forma de "violação de privacidade". exemplos óbvios são os radares nas estradas (se ninguém medir o excesso de velocidade, ele nunca é registrado). exemplos menos óbvios dizem respeito aos crimes de evasão fiscal e corrupção. o levantamento do sigilo bancário pode resolver esse problema sem sequer haver intervenção humana: um programa de computador adequado pode verificar todas as transacções efectuadas no país e procurar anomalias.
neste contexto, o simples registro de comunicações telefónicas ou electrónicas, desde que feito por computador, e desde que o seu acesso seja vedado excepto sob autorização de um juíz, não é nada que me choque. como já disse acima acho que isso não justifica uma falta de investimento na investigação criminal científica; mas até o posso ver como medida transitória razoável. se eu decidir planear um atentado bombista por e-mail: convém ou não convém que existam programas de IA a processar e-mails?
ou seja, o simples registro da informação não é, nem nunca foi, mecanismo de controlo ou opressão. apenas o que se faz com essa informação o pode ser. daí voltar a dizer que não ache esta medida chocante. a questão que deve ser equacionada é, precisamente, como vão ser implementadas as medidas. eu concordo que a haver oportunidade para abusos, eles ocorrerão; penso que compete ao homem que o ricardo quer parar legislar para que isso não aconteça. nesse sentido, como já indiquei, parece-me que o tratamento da informação por software adequado, sem intervenção humana, a forma mais clara e transparente de nos garantir os nossos direitos, ao mesmo tempo que se contribui para uma sociedade mais justa do ponto de vista criminal...
Ricardo,
parece-me que estamos de acordo quanto à possibilidade de escutar quem está a ser investigado. A questão não é essa. A questão é registrar todas as chamadas de toda a gente, indiscriminadamente, e no futuro levantar as restrições constitucionais às escutas, como ele quer (ver a segunda citação).
Este é o género de medida que, uma vez implementada, toma uma vida própria. A partir do momento em que se possa registrar a quem telefonamos, ou a partir do momento em que o SIS comece a escutar o que dizemos ao telefone (que é o que ele está a dizer na segunda citação), já não haverá maneira de recuperarmos a nossa privacidade. É por isso que nem vale a pena discutir a implementação técnica. A partir do momento em que isto seja feito, haverá abusos todos os dias.
e o que eu estou a dizer é a velha frase do "mais vale prevenir do que remediar". se isso pode ser feito sem que haja ataques graves à violação de privacidade e às liberdades individuais (e este "se" implica que de facto se discuta com algum detalhe a implementação técnica), então não vejo nenhum real argumento contra a medida em questão...
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