Uma das coisas que eu percebi aqui nos EUA é que o maior sucesso do capitalismo americano foi o de dominar as classes médias e baixas sem precisar de se rebaixar e fazer as coisas repugnantes (e de mau gosto) que os ditadores da América Latina e do bloco “socialista” tiveram de fazer para dominar as classes média e baixa: assassinatos, prisões políticas, tortura, repressão nas ruas com canhões de água e gorilas... Embora tenham usado a repressão sanguinária sempre que necessário – de Joe Hill e do massacre de Ludlow, até às brutalidades dos anos 60 e 70 em campus universitários, etc. – os robber-barons mudaram eventualmente de estratégia a seguir à segunda guerra mundial.
Como disse Alan Greenspan no final dos anos 80, a força económica dos EUA reside no medo que os seus cidadãos têm de perder o emprego.
Os americanos não refilam porque foram sabiamente isolados por uma campanha de propaganda que promove o individualismo há mais de 20 anos e porque estão endividados ate à raiz dos cabelos. Aqui metem-nos cartões de crédito por baixo da porta por uma razão muito simples: uma população endividada é muito mais fácil de gerir.
As pessoas perguntam-se como é que é possível que haja tantos tiroteios em escolas e universidades, centro comerciais e edifícios de escritórios ou de serviços públicos. Eu acho que os americanos vivem com níveis de stress muito mais altos do que os outros 95% da população do mundo.
E nestas condições a cidadania é uma impossibilidade. Mais de três quartos da população não votam. A televisão bombardeia as pessoas com histórias de terror, algumas exageradas, a maioria inventadas (as abelhas assassinas, a febre aviaria, os terroristas, a droga, etc.).
O resultado é uma população de indivíduos isolados, temerosos, sem poder negocial, ameaçados pela polícia – o programa “Cops” é só isso: uma demonstração de forca da polícia – se fumarem, se beberem, se deixarem uma roda em cima do passeio, ou se disserem um palavrão na rua, e que se viram fanaticamente para a religião e para a pornografia porque precisam de um escape.
A religião é a única actividade comunitária socialmente aceitável na vida deles. Não admira que eles se enfiem na igreja quatro vezes por semana e dêem o dinheiro todo aos padres, pregadores, ministros, e outros aldrabões de varia pena e pelo que lhes vendem a ilusão de uma vida melhor depois de morrerem.
E isto é a visão que o Barroso e os neo-liberaistem têm para a Europa. Quando a gente lhes fala dos crimes hediondos do Pinochet e do Milton Friedman eles dizem-nos que devíamos ir ler o Karl Popper e mais não sei o quê.
Que é como falarmos ao irmão Torquemada das execuções de pessoas inocentes, por apostasia, e ele dizer-nos que antes de percebermos a coisa bem temos de ir ler o Aristóteles e o S. Tomás de Aquino...