quinta-feira, 16 de abril de 2015

Significado de «populismo»

No meu dicionário político, «populismo» é prometer algo que é universalmente desejado mas inalcançável (e portanto não anda muito longe de «demagogia»). Por exemplo: prometer acabar com os homicídios e as violações. Todos os cidadãos o querem, não houve na história humana nenhuma sociedade que o conseguisse. E se houvesse alguma iniciativa legislativa garantidamente 100% eficaz, com certeza já alguém a teria proposto. Com a corrupção passa-se o mesmo se nos restringirmos ao sentido exacto e legal desse crime. O problema é que o uso indiscriminado (e popular) do termo «corrupção» para exprimir nojo pelos políticos ou por quem tem dinheiro baralha frequentemente a discussão.

13 comentários :

João Vasco disse...

Já tinha visto este argumento, numa discussão contigo sobre este assunto. Nem parece teu.

Prometer "diminuir o crime", tal como "diminuir a desigualdade" ou "diminuir a pobreza infantil" ou "diminuir a precariedade" não são objectivos inatingíveis. "Diminuir a corrupção" também não.
Portanto o "combate à corrupção" é como o "combate ao desemprego" ou o "combate à precariedade".

E de facto, muita gente à direita chama "populista" ao "combate à austeridade" (e a N outros combates e bandeiras da esquerda): quando não há argumentos para apresentar face a um valor/princípio/proposta que é popular usa-se o termo "populista" para fugir ao debate de ideias.

João Vasco disse...

Isto para já não falar na insistência completamente absurda na definição que apresentas de corrupção. Já te apresentei vários argumentos, nunca apresentaste qualquer resposta satisfatória. Insistes que é assim porque é assim.

Felizmente, isso é uma completa inconsistência da tua parte, porque em quase todos os assuntos tens uma visão menos "legalista", o que faz com que concordemos bastante em quase tudo. Na verdade, tendes a ser mais radical que eu na perspectiva legalista, por exemplo quando recusas que o Vaticano seja um estado.
Mas quando toca à corrupção, tudo muda, e adoptas o extremo oposto, ignorando completamente quem estuda o tema. Até disseste que te estavas a marimbar para a perspectiva dos académicos. Depois condenas o "populismo"...

Ricardo Alves disse...

É possível uma sociedade humana sem desemprego, sem pobreza infantil, sem precariedade. Não é possível uma sociedade humana sem crime, e isto é válido quer para o homicídio quer para a corrupção. Pretender diminuir radicalmente a corrupção não é muito diferente de pretender diminuir drasticamente os homicídios.

Ricardo Alves disse...

Não fui eu quem inventou aquela definição de corrupção. Foi o Ministério da Justiça. Que chamem também «corrupção» ao facto de um tipo que tem uma quota de sociedade de advogados ser deputado, desculpa, mas é uma extensão inaceitável do termo. Também não acho corrupção os deputados ganharem o que ganham, ou não terem um «período de nojo».

Quanto aos académicos: eu pedi-te os artigos científicos onde está essa redefinição da corrupção.

João Vasco disse...

«É possível uma sociedade humana sem desemprego, sem pobreza infantil, sem precariedade.»

Não sei bem como imaginas uma sociedade sem desemprego. Existe o chamado "desemprego friccional" que existe pelo mero facto dos processos de candidatura e selecção das empresas demorarem o seu tempo, já sem falar no próprio processo de procura por parte dos potenciais empregados. Mesmo com muito mais postos de trabalho do0 que candidatos haveria desemprego.
Acreditar que é razoável querer lutar contra o desemprego porque é possível acabar com ele é absurdo. Por essa lógica absurda, nunca mais poderá falar em luta contra o desemprego.

Já eu, acho que faz sentido querer lutar contra problemas que possam ser atenuados, mesmo que não completamente erradicados no espaço de uma legislatura (como aliás é o caso da pobreza e infantil e precariedade, se formos realistas). Por isso acho razoável querer-se lutar contra o desemprego.

João Vasco disse...

Por acaso não tinhas pedido. Eu tinha-te falado nos livros que li sobre o assunto, não em artigos, e foi sobre os livros que me perguntaste (e eu respondi).

Mas dá-se o caso feliz de até conhecer uma pessoa que investiga na área.
Vou pedir-lhe essas referências e depois dou-te.

João Vasco disse...

como contra a pobreza, corrupção, etc.

Ricardo Alves disse...

Uma sociedade sem desemprego é aquela em que só não trabalha quem não quer. E isso é possível.

João Vasco disse...

Não é possível pela razão acima explicada: chama-se desemprego friccional. Desde que tu decides que queres trabalhar até encontrares o emprego onde queres trabalhar, e desde que te candidatas a esse emprego até que és aceite demora tempo. E mesmo num cenário com muito mais postos de trabalho disponíveis do que trabalhadores para os ocupar, o facto destes tempos não serem nulos implica que algum desemprego existe.

Isto para já não falar numa outra questão, que até valeu o prémio nóbel ao Joseph Stiglitz e a muitos outros que estudaram o mesmo efeito: os "salários de eficiência". Significa que como a produtividade das pessoas aumenta com o salário, no global da economia deverá sempre existir uma fatia de desempregados, sem nada que possa ser feito para o evitar (a menos que deixes de funcionar em economia de mercado).
Mas mesmo que não acredites neste efeito, que já valeu vários prémios Nobel, tens sempre o anterior, que é bastante simples.

Desemprego existirá sempre.

Miguel Madeira disse...

De certa forma, existe uma maneira muito simples de não haver desemprego (se essa maneira é boa ideia é outra história) - o Estado (ou algo parecido) garantir postos de trabalho (mesmo que mal pagos e/ou pouco interessantes) a quem não consiga ou não queira arranjar trabalho no sector privado.

https://en.wikipedia.org/wiki/Job_guarantee

Note-se que, num sistema desses e com a definição de "sociedade sem desemprego" do Ricardo, mesmo com desemprego fricional poderia-se dizer que era uma sociedade sem desemprego - os desempregados fricionais só o eram porque não quiseram estar no "emprego mínimo garantido" do Estado.

O salário de eficiência também não impede esse sistema - na verdade, em termos da mecânica dos incentivos, a dinâmica "bom emprego" vs. "emprego mínimos garantidos" funcionaria tal e qual como a dinâmica emprego vs.desemprego (os modelos matemáticos elaborados para estudar os salários de eficiência nem precisariam de ser alterados).

Claro que poderemos questionar se um sistema desses continuaria a ser "funcionar em economia de mercado", mas penso que sim (não é menos economia de mercado do que muitas outras coisas)

[Já agora, uma crítica que se pode fazer - e por vezes é feita - a essa proposta: a de que pouco mais é do que dar um spin positivo e "de esquerda" à velha conversa do "ponham os desempregados e o pessoal do RSI a limpar as matas!"]

João Vasco disse...

Miguel Madeira,

Seja.
Mas isso tem uma conclusão muito curiosa: de acordo com a lógica absurda de que é demagógico um partido alegar que quer lutar contra um problema que não se pode erradicar totalmente, passa a ser particularmente demagógico um partido alegar que quer lutar contra o desemprego sem fazer uma proposta como essa que o erradique.

Como o Ricardo Alves é dirigente de um partido que se apresenta como querendo lutar contra o desemprego, mas não apresenta essa proposta (fala-se em aumentar o número de funcionários públicos, mas creio que não passa pela cabeça de ninguém fazê-lo até que o desemprego chegue aos 0%) só podemos concluir que se trata de um partido populista e demagógico. O que até é chato, visto que sou membro desse partido.

A outra opção é rejeitar a lógica ridícula de acordo com o qual só faz sentido batermos-nos por problemas hipoteticamente erradicáveis, e concluir que é perfeitamente razoável priorizar problemas que podem ser atenuados, mesmo que não completamente erradicados.

Na verdade, até me surpreende que alguém defenda uma tese tão absurda, e depois insista nessa tese.

Ricardo Alves disse...

Há medidas bastante exactas do desemprego. Não há medidas exactas da corrupção. Mesmo os pretensos «especialistas» no assunto ficam-se pela «percepção» e pelos «indícios».

Ricardo Alves disse...

Aguardo.