sexta-feira, 25 de outubro de 2013

Sócrates: um vira-casacas ou um convertido sincero à causa dos Direitos Humanos?

Sócrates escreveu um livro contra a tortura, ao que consta. A ser verdade, acho bem. Simplesmente, acontece que este senhor ocupou o principal cargo executivo da República durante mais de seis anos (3/2005-6/2011), período que coincidiu com a ocultação de actos de tortura, e provavelmente com a sua prática. Vale a pena confrontar o Sócrates que foi «Familiar do Santo Ofício» com o Sócrates que agora se diz crítico da tortura.
  1. Circulavam pelos Açores (e outros aeroportos) aviões de Guantánamo e (menos) para Guantánamo (mas não faz muita diferença, porque a tortura não seria em Guantánamo, geralmente, mas antes ou depois). O governo português sabia, como o provaram os telegramas da Wikileaks. Luís Amado mentiu com todos os dentes quando o negou. Sócrates mentiu ao Parlamento, negando ter conhecimento dos voos (ver o vídeo). Agora, mantém que «Eu não sabia e acredito que o Ministro dos Estrangeiros também não sabia!»; mais, «[os EUA] fizeram-no abusivamente e abusando da boa-fé dos países amigos (...) os EUA enganaram muitos dos seus aliados» (Revista do Expresso, 19 de Outubro). Tão engraçado. Foi enganado pelos EUA, ou pelo sinistro Amado (nesta e noutras...)? Se quer que acreditemos nisso, esquece-se que podemos ler os boletins da embaixada dos EUA, que descrevem conversas do «bandalho» Amado com o «estupor» Sócrates sobre esses mesmos voos («the Minister said that he would push hard with the Prime Minister to allow Lajes to be used as a transit point in repatriating Guantanamo detainees», em 2006), e que garantem a autorização do próprio neo-militante anti-tortura: «Socrates agreed to allow the repatriation of enemy combatants out of Guatanamo through Lajes Air Base on a case-by-case basis» (em 2007).
  2. Às quatro da manhã de 1 de Outubro de 2006, um argelino chamado Sofiane Laib foi «expulso» de Portugal. Alegadamente, por elementos do SEF (armados!). Ou do SIS? A ordem de expulsão estava judicialmente suspensa, mas havia interesse da CIA em interrogá-lo sobre o 11 de Setembro (seria da Al-Qaeda). Foi levado para a Argélia, naquilo que pode configurar um sequestro. Ou algo mais, porque não é do conhecimento público se terá sido torturado em Argel ou Plovdiv. E Sócrates era Primeiro Ministro. Não soube de nada?
  3. Silva Carvalho (sim, o pide mais famoso depois do 25 de Abril) foi nomeado por Sócrates para liderar o SIED, em 2008. Antes de o ser, o «filho da mãe» já fazia campanha pública pela alteração da Constituição, para que as escutas ilegais passassem a ser legais (esse grande salto civilizacional). Quando o foi (até 2010), continuou a campanha. Não me recordo de o Primeiro Ministro José Sócrates ter defendido a privacidade dos cidadãos nessa época (e o SIED até dependia da Presidência do Conselho de Ministros). Mas recordo-me de um ministro chamado Alberto Costa ter apoiado essa campanha liberticida.
  4. A Lei Orgânica dos Serviços de Espionagem e Crime Organizado pelo Estado é de 2007. Está assinada por José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa. Alargou as atribuições/poderes/prerrogativas dos espiões. Aliás, o orçamento da espionagem e o número desses criminosos aumentaram imenso enquanto Sócrates era Primeiro Ministro. Ele «acreditava» que era para fazerem recortes de jornais?

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