segunda-feira, 29 de abril de 2013

Uma ideia que deveria estar na primeira página de qualquer programa de esquerda

35 comentários :

Luís Aguiar-Conraria disse...

Mas um pequeno empresário que no fim do mês não tem dinheiro para pagar o salário de um trabalhador deve despedi-lo ou ser, simplesmente, preso?

JDC disse...

como assim, criminalizar salários em atraso? imaginemos que eu sou dono de um pequeno empreendimento e que tenho um grande cliente. Esse cliente, entretanto, ou vai à falência, ou falha no pagamento, não importa, e isso causa-me um problema de tesouraria. Se, entretanto, não conseguir liquidez, devo ir preso? É que criminalizar não é apenas responsabilizar civilmente. É registar cadastro, pode dar cadeia. É mesmo isso que queremos? é preciso elaborar e não ficar nestas vacuidades pseudo-revolucionárias.

Ricardo Alves disse...

Provavelmente deve fechar a empresa. Ou acha que devem ser os trabalhadores a financiar (à força, note-se...) as necessidades de tesouraria das empresas?

Ricardo Alves disse...

JDC, antes da prisão há a multa. E o cliente que não paga pode ser processado (e, no limite, ir para a prisão). Se o cliente devedor pode ser criminalizado, porque é que o empresário que não paga salários não há-de ser criminalizado?

(E isto não tem nada de revolucionário. Parece-me que exigir que os contratos sejam cumpridos até é um «slogan» dos liberais...)

João Vasco disse...

Discordo. Isto é mau para os pequenos negócios, ou para os negócios que possam estar em dificuldades - muitas das vezes cujo desaparecimento possa levar a uma maior concentração do mercado, desvantajosa para trabalhadores e consumidores, além do desemprego resultante da maior probabilidade de falência devido a estas circunstâncias.

É uma lei com o potencial de favorecer os mais poderosos à custa dos que lhes fazem concorrência. Pode ser bastante questionável.

Ricardo Alves disse...

João Vasco, não sei porque presumes que são os pequenos negócios aqueles onde há mais salários em atraso. Tens alguma evidência que comprove essa premissa?

Luís Aguiar-Conraria disse...

Mas deve poder despedi-lo ou não? Não é capaz de responder a essa pergunta?
A pergunta é simples, suponha que um cliente internacional não paga uma dada encomenda (suponha que de valor muito grande) e a empresa põe esse cliente em tribunal e espera dentro de 4 a 5 anos reaver o seu dinheiro. Assim sendo, terá de procurar clientes alternativos, o demora 2 a 3 meses a conseguir.
O que deve a empresa fazer?
1º Encerrar? Encerrando-se assim uma empresa viável e deixando de pagar quaisquer salários.
2º Despedir os trabalhadores?
3º Manter os trabalhadores, não conseguir pagar os salários no imediato e ir preso?

Luís Aguiar-Conraria disse...

"Tens alguma evidência que comprove essa premissa?"

Evidência não terá assim em 5 minutos, tal como o Ricardo também não terá evidência contrária (estou enganado?). Mas é uma questão de lógica, pequenas empresas têm fontes de receitas menos diversificadas pelo que estão mais sujeitas a flutuações de liquidez.

Ricardo Alves disse...

A minha evidência empírica é no sentido contrário, mas admito que a amostra seja pequena.

Ricardo Alves disse...

Além do que te disse no outro comentário, João Vasco, a questão é que a concentração/monopólios é um problema com imensas causas e várias soluções. Os salários em atraso constituem um problema que afecta directamente os trabalhadores, e têm a solução muito simples mencionada no artigo. Nesta questão coloco os trabalhadores no centro das minhas preocupações. Não as empresas.

Ricardo Alves disse...

As dívidas aos trabalhadores deveriam ser mais facilmente puníveis até do que as dívidas aos credores. Os credores, como a crise dos últimos anos tem mostrado abundantemente, estão longe de ser a parte mais fraca.

Provavelmente não respondi à sua pergunta, mas fazê-lo seria aceitar uma lógica em que os credores podem sempre exigir pagamento, e os assalariados não. E é justamente por rejeitar essa lógica que escrevi este post.

(Quanto à questão da lentidão da justiça, é legítima e muito grave.)

Maquiavel disse...

Deve abrir falência, ou rescindir os contratos por razöes económicas, é o que se faz nos países civilizados. Nos países civilizados as empresas podem despedir por "motivos económicos", ficando impedidas de contratar novas pessoas para os trabalhos que suprimiu durante 1 ou 2 anos (durante esse período, se as condiçöes entretanto melhorarem, podem re-contratar quem foi despedido).
Em Portugal o xô Mário Soares inventou os salários em atraso... px tá claro!

Uma coisa é certa: näo têm de ser os trabalhadores "a financiar (à força, note-se...) as necessidades de tesouraria das empresas", se quer fazer isso o tal empresário que constitua uma cooperativa! Pois que eu saiba, o empresário também näo empresta o seu carro aos trabalhadores, pois näo?

Maquiavel disse...

Nem sei como é que as pequenas empresas das Finlândias, Suécias, Alemanhas, Áustrias, conseguem sobreviver sem ter a possibilidade do pagamento atrasado dos salários...

Luís Aguiar-Conraria disse...

"uma lógica em que os credores podem sempre exigir pagamento, e os assalariados não." -- Ricardo Alves

Mas de onde vem esta lógica? As dívidas aos restantes credores também não são criminalizadas.

Ricardo Alves disse...

As dívidas são sempre pagas com juros. Os salários atrasados, não.

Luís Aguiar-Conraria disse...

Quanto ao "sempre" estás factualmente enganado. Simplesmente não é versade. Eu próprio conheço alguns casos de credores que prdoam parte da dívida, só para conseguirem reaver parte do dinheiro devido.
Além disso, o que defendeste no post foi accriminalização. Isso não tem nada a ver com juros.

Ricardo Alves disse...

É possível. Ficaria mais espantado se me contasse casos de empregadores que pagam salários atrasados com juros, sem a tal serem forçados pelo poder judicial. E a razão é muito simples: a parte mais fraca é o trabalhador, nunca a empresa. E trabalhador que proteste pelos salários em atraso arrisca despedimento, obviamente.

E sim, defendo a criminalização dos salários em atraso. E depois de cinco (5) comentários, o Luís está preparado para assumir frontalmente a sua posição?

Defende que o trabalhador seja coercivamente obrigado a financiar a empresa onde trabalha, ou não?

Luís Aguiar-Conraria disse...

"Defende que o trabalhador seja coercivamente obrigado a financiar a empresa onde trabalha, ou não?"

Não. Parece-me que só uma grande besta defenderia isso.

João Vasco disse...

«Mas quando o atraso é reiterado, sistemático e a empresa apresenta lucros que contradizem a falta de liquidez, é crime, sim, e se não está na lei, deveria estar.»

Isto faz toda a diferença.

Nessas circunstâncias - mas não menos que nessas - concordo com a proposta.

Ricardo Alves disse...

E portanto o Luís defende a criminalização, ou não?

Luís Aguiar-Conraria disse...

Criminalização? Só se fosse maluco, sinceramente. Então eu, dono duma PME, chego ao fim do mês sem um chavo, porque uns clientes não pagaram, e agora sou um criminoso?

Ricardo Alves disse...

Ah. Então e o Luís, empregado de uma grande empresa, chega ao fim do mês e não lhe pagam, e acha aceitável que não aconteça nada?

Luís Aguiar-Conraria disse...

Vejo mais uma vez, que não respondes à minha pergunta e em vez disso fazes outra pergunta. E mais uma vez eu vou responder de forma absolutamente directa: não, não acho. Mais uma vez me parece que só uma grande besta é que pode achar isso.
Já agora, deixe-me fazer outra pergunta, quando diz grande empresa, está a querer dizer que a empresa tem dinheiro para pagar e que só por opção é que não paga os salários? É que se é isso, então tudo esta sua argumentação é uma parvoíce, já que tal constituiria um crime de acordo com a actual lei.

Ricardo Alves disse...

Então eu respondo: sim, um empresário, grande ou pequeno, que não paga salários, é um criminoso.

Luís Aguiar-Conraria disse...

Eu eu digo que és louco. Só um louco é que pode considerar que uma pequena empresa que chega ao fim do mês com falta de liquidez para salários (porque, por exemplo, o Estado não lhe pagou o que devia) está a cometer um crime. Isto é uma perfeita insanidade e nada tem a ver com ser-se de esquerda ou direita.

Filipe Moura disse...

Ricardo e Luís, vocês têm presente a distinção que é feita noutros comentários pelo João Vasco? Eu neste assunto estou plenamente de acordo com o João Vasco.

Luís Aguiar-Conraria disse...

Filipe, o que o João Vasco diz é que quando o atraso é reiterado, sistemático e a empresa apresenta lucros que contradizem a falta de liquidez, deve ser crime. Pois, mas isto é tão óbvio que já é crime, não é preciso mudar nenhuma legislação. Evidentemente que quem não paga o que deve com dolo está a ter um comportamento criminoso. Ou seja, é irrelevante para esta discussão.

E já agora, quantas empresas é que vocês conhecem que têm lucros, que não têm falta de liquidez, e que têm os salários em atraso? Eu duvido que conheçam uma que seja, pois só se o empresário fosse muito irracional é que faria tal coisa. O que eu conheço é o casa de um empresário para poder pagar os salários ficou sem dinheiro para pagar impostos e foi preso e condenado a uns anos de cadeia. Ou seja, arriscou a ir preso (e foi mesmo preso) para não deixar os seus trabalhadores sem salário.

Ricardo Alves disse...

E eu digo que o sr. Conraria é um criminoso. Passe bem.

Ricardo Alves disse...

Qual distinção, Filipe? A questão de aceitar salários em atraso como forma de combater os monopólios? Ou a de manter salários em atraso sistematicamente? Ou ainda a da «liquidez»?

Luís Aguiar-Conraria disse...

E o Conraria é criminoso por ser dono da empresa com salários em atraso, ou é por ser o director financeiro, e portanto o responsável pelos pagamentos, ou é por ser gestor de clientes, e portanto o culpado (???) por estes não terem pago? Ou o criminoso é o fiscalista que não acautelou que as Finanças devolvessem o IVA a tempo e horas? Ou é tudo criminoso e portanto vai tudo preso e pronto? São todos culpados e acabou-se.

Maquiavel disse...

O Xô Conraria conhece "o casa[sic] de um empresário para poder pagar os salários ficou sem dinheiro para pagar impostos e foi preso e condenado a uns anos de cadeia". Exacto. "O" caso, que deve ser único no país. Täo insólito que näo saiu em jornal nem TV nenhumas.
Entretanto eu e todos conhecemos muitos casos de empresários donos de empresas com salários em atraso que se passeiam em seus Ferraris, e que depois de um dia para o outro viajam para o Brasil com o dinheiro desses salários e nunca mais voltam a Portugal. Ah pois é.

Mas entäo expliquem lá como é que as pequenas empresas das Finlândias, Suécias, Alemanhas, Áustrias, conseguem sobreviver sem ter a possibilidade criminosa do pagamento atrasado dos salários, que estou curioso.

Filipe Moura disse...

O Maquiavel toca aqui nos dois pontos principais, a meu ver.

Como conseguem sobreviver as empresas de outros países sem a possibilidade de salários em atraso? Simples: nesses países o despedimento é livre. Não chega a haver salários em atraso: antes disso já os trabalhadores estão na rua por não haver dinheiro para lhes pagar.

Os casos que o Maquiavel refere (empresários donos de empresas com salários em atraso que se passeiam em seus Ferraris e mais) são vários. Não sei se isso é ilegal mas deveria ser. Para mim é imoral.

Filipe Moura disse...

Acho que não tenho que vos explicar a minha opinião sobre o livre despedimento, pois não? Agora se querem perceber por que não há salários em atraso nos países com livre despedimento, julgo que expliquei no primeiro parágrafo.

Isto é independente e não invalida o que eu disse no segundo parágrafo.

Ricardo Alves disse...

Filipe, a tua visão do mercado de trabalho está desactualizada. Parece-me que não te apercebeste do peso que os recibos verdes ou os contratos a prazo têm neste momento, em particular entre os mais jovens.

Filipe Moura disse...

Sim, Ricardo, e de resto com este governo e este ministro da economia, em Portugal despedir é muito fácil. O meu comentário só visava tentar explicar por que razão em Portugal há uma tradição de salários em atraso que não há noutros países.