O título deste texto é forte, mas não creio que seja desapropriado às recentes acções do Tribunal Constitucional.
Daniel Oliveira, no seu blogue, explica e analisa muito bem aquilo que se passou (destaques meus a negrito):
«Cabe ao Tribunal Constitucional (TC) legalizar os partidos políticos. Várias normas têm de ser respeitadas: não são permitidos partidos de inspiração fascista e racista, regionais, confessionais, armados, de tipo militar, militarizados ou paramilitares, por exemplo. Podemos concordar ou discordar destas limitações, mas são as que estão na lei. Cabe ao TC garantir a sua observância. A nova Lei dos Partidos foi mais longe e define regras de funcionamento interno. Tenho muitas dúvidas sobre várias delas, mas aceito a sua validade. Com uma condição: aplicam-se a todos por igual. Uma das regras: a possibilidade de recorrer a tribunais de decisões tomadas pelos órgãos internos do partido, incluindo os de jurisdição: "Da decisão do órgão de jurisdição pode o filiado lesado e qualquer outro órgão do partido recorrer judicialmente, nos termos da lei de organização, funcionamento e processo do Tribunal Constitucional", diz o artigo 30º. Não consigo compreender, nem consegue ninguém, porque que tal tenha de estar nos estatutos de um partido. Está na lei e a lei sobrepõe-se a eles de forma automática. A ideia de que aos partidos não basta não violar a lei, mas têm de a repetir, sendo redundante, nos seus estatutos, parece-me difícil de defender. Mas adiante.
O MAS apresentou à apreciação do TC a sua legalização. Tudo estava certo: nome, símbolo, princípios, assinaturas. Tudo, menos uma coisa: a omissão, nos estatutos provisórios, da possibilidade de se recorrer a tribunais de decisões do órgão de jurisdição. E isso serviu para o TC não legalizar este novo partido. Vários dos partidos existentes não explicitam isso nos seus estatutos (nem estou seguro que algum o faça) e nenhum foi ilegalizado. Seria uma decisão política difícil, claro.
Mesmo que, por absurdo, se isente os partidos já existentes de cumprir a lei que se aplica aos novos, um caso recente mostra a disparidade de critérios. Os estatutos provisórios do "Portugal Pro Vida" (PPV) confrontaram o TC com mesmíssimo problema, tendo o tribunal solicitado que mudassem os seus estatutos. Isso foi feito e o partido foi legalizado. Tal oportunidade não foi dada ao MAS, sendo que as duas decisões tiveram como relator o mesmíssimo juiz conselheiro.
No caso do MAS, pela omissão da possibilidade de recurso aos tribunais, decidiu-se: por violar "o disposto nos artigos 30.º, nºs. 1 e 2, e 34.º [a mesma questão, mas referente a atos eleitorais internos], nºs. 2 e 3 (...) não pode, por isso, proceder-se à inscrição". No caso do PPV, "foi decidido convidar o requerente a aperfeiçoar os estatutos provisóriosde modo a dar satisfação ao estatuído pelo artigo 30.º da Lei dos Partidos Políticos." Um pôde corrigir a omissão, o outro não foi legalizado nem mereceu tal oportunidade.
Sem ter simpatia por nenhum dos partidos em causa, ou considerar que qualquer um deles venha a ter grande relevância política, fica a pergunta: como pode um mesmo juiz, perante um mesmo problema, ter comportamentos tão distintos? Se já me parece estranho que aos novos partidos se exijam regras diferentes das que, na prática, se impõe aos já existentes, parece-me que, perante distintos comportamentos em dois casos iguais, entramos no território da pura arbitrariedade.»
Marinho Pinto, neste seu texto de opinião, tira as devidas conclusões deste processo:
«Por outro lado, a participação política constitui hoje, em Portugal, um monopólio partidário. E, se cada vez for mais difícil constituir partidos políticos, cada vez mais os cidadãos se afastarão da desejável participação na vida política, com todas as consequências que isso terá para o enfraquecimento e desprestígio das instituições democráticas.
Com decisões como esta, o TC está a prestar um mau serviço à democracia e ao Estado de Direito, embora muito útil aos atuais partidos. E, sobretudo, ao prestar-se a essa função de guardião do sistema partidário, dificultando a sua renovação com fundamentos "jurídicos" que não convencem ninguém, o TC está a ultrapassar as funções próprias de um verdadeiro tribunal.»
O que me revolta é não ter ouvido nenhum partido político a pronunciar-se sobre este flagrante ataque à Democracia. Portam-se como cúmplices.
Daniel Oliveira, no seu blogue, explica e analisa muito bem aquilo que se passou (destaques meus a negrito):
«Cabe ao Tribunal Constitucional (TC) legalizar os partidos políticos. Várias normas têm de ser respeitadas: não são permitidos partidos de inspiração fascista e racista, regionais, confessionais, armados, de tipo militar, militarizados ou paramilitares, por exemplo. Podemos concordar ou discordar destas limitações, mas são as que estão na lei. Cabe ao TC garantir a sua observância. A nova Lei dos Partidos foi mais longe e define regras de funcionamento interno. Tenho muitas dúvidas sobre várias delas, mas aceito a sua validade. Com uma condição: aplicam-se a todos por igual. Uma das regras: a possibilidade de recorrer a tribunais de decisões tomadas pelos órgãos internos do partido, incluindo os de jurisdição: "Da decisão do órgão de jurisdição pode o filiado lesado e qualquer outro órgão do partido recorrer judicialmente, nos termos da lei de organização, funcionamento e processo do Tribunal Constitucional", diz o artigo 30º. Não consigo compreender, nem consegue ninguém, porque que tal tenha de estar nos estatutos de um partido. Está na lei e a lei sobrepõe-se a eles de forma automática. A ideia de que aos partidos não basta não violar a lei, mas têm de a repetir, sendo redundante, nos seus estatutos, parece-me difícil de defender. Mas adiante.
O MAS apresentou à apreciação do TC a sua legalização. Tudo estava certo: nome, símbolo, princípios, assinaturas. Tudo, menos uma coisa: a omissão, nos estatutos provisórios, da possibilidade de se recorrer a tribunais de decisões do órgão de jurisdição. E isso serviu para o TC não legalizar este novo partido. Vários dos partidos existentes não explicitam isso nos seus estatutos (nem estou seguro que algum o faça) e nenhum foi ilegalizado. Seria uma decisão política difícil, claro.
Mesmo que, por absurdo, se isente os partidos já existentes de cumprir a lei que se aplica aos novos, um caso recente mostra a disparidade de critérios. Os estatutos provisórios do "Portugal Pro Vida" (PPV) confrontaram o TC com mesmíssimo problema, tendo o tribunal solicitado que mudassem os seus estatutos. Isso foi feito e o partido foi legalizado. Tal oportunidade não foi dada ao MAS, sendo que as duas decisões tiveram como relator o mesmíssimo juiz conselheiro.
No caso do MAS, pela omissão da possibilidade de recurso aos tribunais, decidiu-se: por violar "o disposto nos artigos 30.º, nºs. 1 e 2, e 34.º [a mesma questão, mas referente a atos eleitorais internos], nºs. 2 e 3 (...) não pode, por isso, proceder-se à inscrição". No caso do PPV, "foi decidido convidar o requerente a aperfeiçoar os estatutos provisóriosde modo a dar satisfação ao estatuído pelo artigo 30.º da Lei dos Partidos Políticos." Um pôde corrigir a omissão, o outro não foi legalizado nem mereceu tal oportunidade.
Sem ter simpatia por nenhum dos partidos em causa, ou considerar que qualquer um deles venha a ter grande relevância política, fica a pergunta: como pode um mesmo juiz, perante um mesmo problema, ter comportamentos tão distintos? Se já me parece estranho que aos novos partidos se exijam regras diferentes das que, na prática, se impõe aos já existentes, parece-me que, perante distintos comportamentos em dois casos iguais, entramos no território da pura arbitrariedade.»
Marinho Pinto, neste seu texto de opinião, tira as devidas conclusões deste processo:
«Por outro lado, a participação política constitui hoje, em Portugal, um monopólio partidário. E, se cada vez for mais difícil constituir partidos políticos, cada vez mais os cidadãos se afastarão da desejável participação na vida política, com todas as consequências que isso terá para o enfraquecimento e desprestígio das instituições democráticas.
Com decisões como esta, o TC está a prestar um mau serviço à democracia e ao Estado de Direito, embora muito útil aos atuais partidos. E, sobretudo, ao prestar-se a essa função de guardião do sistema partidário, dificultando a sua renovação com fundamentos "jurídicos" que não convencem ninguém, o TC está a ultrapassar as funções próprias de um verdadeiro tribunal.»
O que me revolta é não ter ouvido nenhum partido político a pronunciar-se sobre este flagrante ataque à Democracia. Portam-se como cúmplices.
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