terça-feira, 25 de agosto de 2009

Uniões de facto

Cavaco Silva vetou a lei que a esquerda tentou passar a respeito das uniões de facto, e ainda bem.

Não me interpretem mal: acho deplorável a justificação dada para o veto. Se considerasse que a lei das uniões de facto era uma boa lei, ficaria indignadíssimo com o pretexto mal amanhado para chumbar uma lei que tinha sido aprovada no parlamento. Este não é, a meu ver, o bom funcionamento das instituições democráticas. Mas é por estas e por outras que dificilmente Cavaco Silva vai conseguir ser reeleito para o seu segundo mandato, o que, a meu ver, são boas notícias para Portugal.
A não reeleição de um presidente vai ser uma estreia, e logo quando a direita estreou o seu presidente - que, sendo sincero, foi menos mau do que eu esperava.

Quanto à lei em questão, ela vinha retirar liberdade de escolha às pessoas. Se eu quiser viver com alguém, posso querer ter certas obrigações e garantias de e para com essa pessoa, ou não. Com esta lei, perdia essa escolha.
Se duas pessoas querem coabitar mas não querem nem os direitos, nem as obrigações do casamento estendidas à sua relação, devem ter essa possibilidade. Se querem estas obrigações, devem poder optar pelo casamento - um contrato civíl que tem precisamente esse objectivo.

É verdade que esta lei viria a dar aos homossexuais que vivem juntos alguns direitos (e obrigações) que antes não tinham. Mas creio que esses direitos e obrigações devem ser dados a quem os escolher sob a forma do casamento civíl, estendido como é justo às pessoas de todas as orientações sexuais. E, felizmente, não é que essa realidade não esteja já no horizonte.

Mas acredito que dois cidadãos devem ter a possibilidade, se assim o desejarem, de viver juntos sem qualquer obrigação de um para com o outro. Tal como devem ter a possibilidade de estabelecer essas obrigações qualquer que seja o seu sexo e orientação sexual. Por essa razão, sou contra a lei que Cavaco vetou, assim como sou a favor do casamento cívil estendido a todos os cidadãos.

16 comentários :

F. Penim Redondo disse...

Concordo totalmente com as considerações sobre a liberdade de escolha inerente à união de facto, para todos aqueles que podendo casar-se optam por não o fazer.

Mas os direitos materiais dos homossexuais que vivam numa união de facto deveriam ser regulados de forma específica já que eles não podem casar-se (situação que na minha opinião deve ser mantida).

João Vasco disse...

«(situação que na minha opinião deve ser mantida)»

Com que argumentos defende essa posição?

F. Penim Redondo disse...

Não gosto de coisas faz de conta.

O casamento é um contrato entre um homem e uma mulher que tem na história um significado e uma razão.
Quanto a mim é uma entidade caduca em vias de extinção.

Acho que os homossexuais que procuram o respeito da sociedade através da submissão a um instituto historicamente ultrapassado estão errados. Devem procurar esse resultado de outra forma.

Como é fácil perceber eu não considero o casamento nem dignificante nem benéfico para ninguém e, por maioria de razão, para os homossexuais.

Muitos dos que apoiam o "casamento gay" estão, quanto a mim, a prestar um mau serviço à luta pelo direito de cada um à sua identidade sexual.

João Vasco disse...

«O casamento é um contrato entre um homem e uma mulher que tem na história um significado e uma razão.»

Começo por discordar aqui.

Tem uma história, ao longo da qual teve vários significados e razões.



«Acho que os homossexuais que procuram o respeito da sociedade através da submissão a um instituto historicamente ultrapassado estão errados. »

Acredito que os homossexuais que lutam para terem um direito que todos os outros cidadãos têm estão certos. Mesmo que dele não queiram usufruir.

«Como é fácil perceber eu não considero o casamento nem dignificante nem benéfico para ninguém e, por maioria de razão, para os homossexuais.»

Mas suponho que não é favor de que o casamento, mesmo sem ser benéfico nem dignificante, deva estar vedado às pessoas.

Assim, por maioria de razão, não deveria ser a favor de que estivesse vedado aos homossexuais.


«Muitos dos que apoiam o "casamento gay" estão, quanto a mim, a prestar um mau serviço à luta pelo direito de cada um à sua identidade sexual.»

Aqui discordo, mas não creio que este ponto seja muito relevante.

Uma coisa é discuir aquilo que é justo para todos os cidadãos, e outra coisa é discutir qual a táctica que se deve empregar para lutar contra a descriminação de homossexuais.

E a discussão que pretendia travar era a primeira. Mesmo que fosse contraproducente para a luta dos homossexuais por pelos direitos - que não me parece que seja - eles deviam poder casar-se por um imperativo de justiça. São cidadãos como os outros, e têm de ter o direito a fazer os mesmos contratos - por ultrapassados que os mesmos possam parecer, não estou a julgar isso - que os outros.

Filipe Castro disse...

Percebo os argumentos de F. Penin Redondo, mas concordo com o João Vasco: acho que não podemos impor aos homossexuais os nossos pontos de vista sobre o casamento.

Acho que não faz sentido a República proibir dois homens de casarem de saltos altos e vestidos cor de rosa, e atirarem os ramos de flores aos amigos, todos aos gritinhos.

São coisas que não aquecem nem arrefecem a sociedade. Gostos não se discutem. Senão amanhã eu desatava a recolher assinaturas para fazer uma lei a proibir o uso de adjectivos por comentadores tauromáquicos.

Nuno Gaspar disse...

"Concordo com a decisão que o presidente tomou. Mas acho que por isso ele deve perder as próximas eleições."
Siga!

Sérgio disse...

Nuno Gaspar,

Quer por isso dizer que uma pessoa nunca pode concordar com qualquer acto ou ideia oriundos de indivíduos de outro espectro politico?

E assim vai a politica à portuguesa...

João Vasco disse...

Nuno Gaspar:

Cavaco deve perder as eleições porque foi um mau presidente (menos mau do que eu imaginava, confesso no texto).

Assim, mesmo que ele tenha vetado, (com más razões) uma lei má, o facto disso tornar mais difícil uma vitória nas presidenciais é uma boa notícia.

Por acaso suponho que isto estava bem claro no texto e o Nuno só percebeu mal porque se fez desentendido, mas posso estar a ser injusto.

Pergunto-lhe portanto a si: este esclarecimento era mesmo necessário?

Nuno Gaspar disse...

Continuo sem perceber "o facto de ter vetado uma lei má tornar mais difícil uma vitória nas presidenciais". Talvez se tivesse vetado uma lei boa isso o ajudasse. Tudo é possível.

Pedro, o cristao calmo disse...

Acha o Joao Vasco que Cavaco ao vetar esta lei se aproxima de uma eventual derrota nas presidenciais?.. Bem, eu acho e creio que é percéptivel que para a esmagadora maioria das pessoas este tema nao aquece nem arrefece...

Vai ver Joao Vasco que o Cavaco será reeleito (e ainda bem) com maior facilidade que da primeira vez...e é mais que uma questao de fé -)

Ricardo Ferreira disse...

A astrologia ainda não virou ciência...

Cavaco não será reeleito, se a esquerda apresentar UM candidato, e se as pessoas não se esquecerem dos eus silêncios cúmplices e das suas parcialidades...

João Vasco disse...

«Talvez se tivesse vetado uma lei boa isso o ajudasse. Tudo é possível»

Sim, a democracia tem destas coisas. Às vezes as maiorias não têm razão, e por isso pode acontecer que um governante seja prejudicado por tomar uma boa medida, ou beneficiado por tomar uma má.

Sou democrata, pelo que acho que isso não acontece sempre. Mas às vezes acontece.

Será que eu precisava de explicar isto?
Seja sincero Nuno Gaspar, a explicação serviu para alguma coisa? Não tinha entendido, ou estava a fazer-se desentendido?

João Vasco disse...

«Acha o Joao Vasco que Cavaco ao vetar esta lei se aproxima de uma eventual derrota nas presidenciais?»

Em Portugal existe neste momento uma maioria sociológica de esquerda. Cavaco foi eleito porque muitos dos eleitores do PS (mais moderados) consideraram que Cavaco não traria grandes complicações a Sócrates. Conheço muitos eleitores do PS que votaram Cavaco antevendo a política da "cooperação estratégica".
Mesmo assim Cavaco conseguiu muito pouco mais de metade dos votos.

Ao colocar-se numa rota de colisão com Sócrates e a esquerda em geral, torna-se provável que os votos do PS, PCP e BE caiam todos em Alegre. Já isto faz bem mais que os 50% necessários. Se pensarmos que muitos eleitores do CDS PP se preferem abster a votar em Cavaco...

Nuno Gaspar disse...

"Às vezes as maiorias não têm razão, e por isso pode acontecer que um governante seja prejudicado por tomar uma boa medida, ou beneficiado por tomar uma má"

Pode ser.
Mas todos os resultados dos inquéritos que vi online concordavam consigo (e comigo): o presidente tomou a decisão correcta. Continuo a achar que seria mais prejudicado se tivesse tomado a decisão contrária. De qualquer maneira, nós nem sequer sabemos se ele está interessado na reeleição.

João Vasco disse...

Nuno:

Os inquéritos on-line não são como sondagens - os participantes não são escolhidos ao acaso entre a população, mas sim entre os frequentadores do site com interesse em participar, o que é um universo muito diferente.

De qualquer forma, se ele não estiver interessado na reeleição tanto melhor, visto que penso que foi um mau presidente. Se estiver, acredito que é bom que não a consiga, e este foi um episódio como muitos outros que lhe terão dificultado essa possibilidade.

P Amorim disse...

Ao rever os blogs que perdi durante as férias encontro este, com a esperança de que Cavaco não seja reeleito. Subscrevo, mas tenho a impressão que a esquerda vai facilitar a tarefa, apresentando 10 candidatos ligeiramente diferentes. Seria bom que se fosse pensando na personalidade a apresentar, para não haver brincadeiras parvas à última hora.