quinta-feira, 31 de agosto de 2006

Terá Mussolini sido fascista?

Durante as férias, acompanhei nos jornais a polémica, entre Vítor Dias e Vasco Pulido Valente, sobre qual terá sido o fascismo mais autêntico e mais verdadeiro. Conhecendo a blogo-esfera e os seus revisionistas, imagino que a polémica terá sido interessante por aqui: já vi de tudo, desde «Salazar não era fascista» até «o fascismo é de esquerda», passando por «o único fascista foi Mussolini» e «Salazar era antifascista», incluindo «a mocidade portuguesa não era fascista» enquanto «fascismo é proibir que se fume em maternidades e berçários». Só falta mesmo dizerem que Franco era anticlerical e que Salazar era um homem de esquerda, mas conhecendo a blogo-esfera e a deriva genética de alguns dos blogues de direita, lá chegaremos (ou talvez já lá tenham chegado, mas não tenciono ir à procura...).
Concretamente, sei que a «teoria política» nunca é aplicada perfeitamente. E que portanto nem sequer Mussolini terá conseguido instaurar um regime plenamente fascista. Mas, nos anos 30, independentemente do número de mortos provocados pelo regime (que depende dos acidentes históricos), ou do expansionismo (que é desnecessário quando se herda um império), havia o campo dos «socialismos» e o campo dos «fascismos». Cada um com as suas idiossincrasias nacionais e especificidades circunstanciais, claro (deixo de lado as democracias que ambos ameaçavam). Mas Salazar sabia de que lado estava. Não foi o lado da República que ele apoiou na guerra civil de Espanha. E foi junto do exército nazi que ele enviou observadores na campanha russa. Prudentemente, porque era um professor universitário católico e não um militar excitado como Franco. Mas separá-lo dos regimes que ele apoiava na medida das suas parcas possibilidades (e em que se inspirou), é artificial.

4 comentários :

cãorafeiro disse...

o fascismo, na sua época, era uma ideologis extremamente atractiva, sedutora mesmo, porque vestia-se com as roupas da modernidade, da inovação, do corte com o passado (se pensarmos no que foi a 1ª GM e crise económica entre guerras compreedemos que muita gente se tenha deixado seduzir).

a sociedade nova que queriam criar tinha determinados custos. no caso português, por exemplo, eram custos financeiros para os quais ã havia recursos. o regime só não foi mais claramente fascista porque não conseguiu. não foi porque não quisesse.

a questão, para mim é: o que está errado com a nossa democracia actual, que leva algumas pessoas a assumir com despudor as suas simpatias fascistas, branqueando o carácter totalitário do fascismo? e sobretudo o que leva muitas a acreditar nessas pessoas.

Ricardo Alves disse...

«cãorafeiro»,
nestas polémicas eu não vejo pessoas a assumirem simpatias fascistas. Vejo, isso sim, dificuldade em aceitarem que a genealogia da sua área política passou por um regime fascista. Daí quererem dizer que nunca o foi...

João Vasco disse...

Já vi várias vezes a tentativa de associação do Salazar com a esquerda em blogues liberais. É qualquer coisa do tipo:

«Salazar, como se pode verificar pelo pesado controlo que exercia sobre a ecnonomia (proteccionismo, etc...) era "estatitista", no fundo mais ou menos a mesma coisa que socialista, pois queria um estado forte, como os socialistas. O Liberalismo rompe com isso tudo»

Para os que dizem pérolas destas, existe a ditadura e a iniciativa privada, e Pinochet não era "bem" um ditador.

Enfim...

cãorafeiro disse...

ricardo, vai ao devaneios desintéricos e anda uns dias para trás, encontrarás dois posts acerca de um jovem advogado que assume as suas simpatias fascistas.

até muito recentemente, as pessoas que tinham simpatias fascistas não as assumiam, apenas indirectamente.

a partir dos 30 anos do 25 de Abril, a ofensiva começou a desenhar-se, primeiro através do ataque ao 25 de Abril, a agora de forma ainda mais despudorada.

vasco, exactamente, também os mesmos blogs procuram apresentar o fascismo e o nazismo como ideologias de esquerda.

esquecem-se que o liberalismo não é a única ideologia de direita e que é possível ser estatista sendo de direita. aliás, essas pessoas, quando desenrolam os argumentos securitários, estarão a ser outra coisa que não estatistas???