terça-feira, 27 de junho de 2006

Um passo importante

O Hamas finalmente aceitou assinar o documento dos prisioneiros depois de constantes pressões por parte do presidente Abbas, e da ameaça deste em submeter o texto a referendo, o que poderia colocar em causa a representatividade política do Hamas em caso de sua aprovação em seu contra (ler post anterior). Um risco que os homens do Hamas parecem ter preferido não correr. Na prática esta assinatura corresponderia finalmente ao reconhecimento por parte do Hamas do Estado de Israel, ainda que de forma indirecta. A única organização importante a ficar de fora do acordo seria então a Jihad Islâmica.

No entanto parte central do acordo, que trata do tal reconhecimento implícito do direito de Israel a existir, parece à primeira vista em perigo perante as declarações dos dirigentes do Hamas ao esclarecer a leitura que fazem do conteúdo do documento... Ainda assim Israel deve demonstrar sabedoria suficiente para entender as sutilezas políticas da questão como espaço verbal necessário para a evolução interna do discurso do Hamas. Seria demasiado mal para todos que Israel se deixasse cair na armadilha radical criada pelo sequestro do soldado israelita Shalit por militantes palestinianos, e desperdiçasse assim esta oportunidade de dar seguimento conjunto ao que parece já ter sido alcançado depois de uma primeira fase de passos unilaterais que, apesar de tudo, deram importantes frutos. Demasiado importantes para serem jogados fora.

10 comentários :

Pedro Viana disse...

Caro Rui... gostaria que o que diz não fosse uma grande ingenuidade, mas infelizmente é. Israel vai "desperdiçar esta oportunidade". Vai, porque não lhe interessa ter com quem negociar do lado palestiniano. É tão simples como isso. Israel sente que neste momento pode utilizar as posições do Hamas para negar a existência de interlocutor palestiniano e assim impôr a "solução" que quer (ou seja as fronteiras que quer). Se fosse apostador, apostaria uma boa maquia com o Rui que nos próximos dias os responsáveis israelitas (e americanos) em vez de darem enfâse ao apoio do Hamas ao "documento dos prisioneiros", e implícito reconhecer de Israel, vão antes procurar dar maior enfâse a quaiquer declarações de responsáveis do Hamas a negar tal reconhecimento, declarando que tornam a assinatura do documento algo de inútil. Aliás, Israel não tem interesse nenhum em reconhecer esse documento como ponto de partida para uma negociação. Nenhum interesse. Isto apesar de tal documento ser justo nas suas reenvidicações e simplesmente apelar a que todas as resoluções da ONU sobre o conflito sejam implementadas. Vamos ver se a ingenuidade do Rui vai resistir à atitude do governo de Israel aos próximos dias...

Rui Fernandes disse...

Caro Pedro,

O teu realismo é sempre causa de admiração... Antes prefiro o bom senso das recentes declarações de Condoleeza Rice e que desmentem a radicalidade do teu comentário que, aliás, parece uma fotocópia da argumentação fatalista e parcial dos radicais palestinos. Podes ler as tais declarações aqui. Já sei que ainda assim me vais acusar de parcial, ou de pró-americano, ou de pró-israelita, ou de ingênuo, e provavelmente de todas estas coisas ao mesmo tempo... A não ser que eu debitasse aqui a ladainha do Hamas tu nunca serias um homem feliz.

Um abraço!

Pedro Viana disse...

Caro Rui,

Numa discussão há que ter honestidade, coisa que parece lhe faltar.

1) O link que indica tem a ver com o caso do soldado raptado. Não tem nada a ver com o assunto do seu post.

2) Rice apelou à diplomacia, ou seja à presuasão através do diálogo e à negociação. Os captores já agora também já disseram que querem dialogar e negociar com Israel. Israel é que diz que não. Portanto, diria que aqui o Rui nem sequer está a ser ingénuo, está de má-fé e a ser intelectualmente desonesto. Responda-me então a algumas simples perguntas que têm a ver com o assunto do seu post:

a) já algum responsável israelita elogiou o Hamas por ter assinado o documento dos prisioneiros? Acha que alguma vez algum o vai fazer?

b) acha que o documento dos prisioneiros é justo, e devia servir de ponto de partida de negociações com Israel?

E mais genericamente, talvez ficassemos todos mais esclarecidos se o Rui esclaressece os seus leitores se:

1) concorda que os palestinianos têm o direito de establecer um Estado plenamente independente nos territórios que lhe foram concedidos a quando da partilha decretada pela ONU em 1948 e anexados por Israel em 1967? Se depois os palestinianos quiserem trocar território com os Israelitas é com eles.

2) concorda que os palestinianos e seus descendentess expulsos de Israel em 1948 têm direito pelo menos a indemnizações?

A minha resposta é sim às duas questões. E a defesa desse direito é o meu ponto de partida. Israel que viva à vontade no que conseguiu em 1948 através da ONU, e deixe o resto em paz. É exactamente a posição do Gush Shalom, o movimento pacifista israelita. Se continua desonestamente a chamar-me apoiante do Hamas por causa disso, seja, infie a carapuça de metiroso que talvez lhe fique bem.

Rui Fernandes disse...

Pedro, carapuças à parte... os pontos uma a um, na "tua ordem" tal como é "numerada".

1) O caso do soldado raptado é precisamente a armadilha radical de que falo no post. Com nome próprio e tudo... Pelos vistos nem lestes o post ou andas meio esquecido.

2) Seria totalmente absurdo esperares que Israel negociasse com os raptores. Como os próprios raptores já o sabiam. Isso é Al Zarqawi em estado puro.

a) Esperar que algum responsável executivo israelita elogie o hamas por ter assinado o documento com as ressalvas por estes avançadas é que é ingenuidade...

b)Acho que o documento de prisioneiros foi sempre o ponto de partida das exigências dos palestinos que não desejaram a destruição de Israel, e continuará sendo se retiramos ressalvas como as avançadas pelos líderes do hamas.

1) O direito poderão ter se admitissemos que viviamos no melhor dos mundos, como nao vivemos falar da partlha decretada pela Onu em 1948 tal qual como um direito palestino é uma utopia. Não serve para os realistas como tu dizes ser.

2) Não, não concordo, é absurdo entrar-se em um jogo de exigências de indenizações entre ambas as partes no quadro deste conflicto.

Pedro Viana disse...

Sim, é verdade que quando escrevi o meu segundo comentário me esqueci que o Rui menciona o caso do soldado raptado. De qualquer modo esse assunto é secundário. O meu comentário original centra-se na afirmação de que:

"Ainda assim Israel deve demonstrar sabedoria suficiente para entender as sutilezas políticas da questão como espaço verbal necessário para a evolução interna do discurso do Hamas. Seria demasiado mal para todos que Israel se deixasse cair na armadilha radical criada pelo sequestro do soldado israelita Shalit por militantes palestinianos, e desperdiçasse assim esta oportunidade de dar seguimento conjunto ao que parece já ter sido alcançado depois de uma primeira fase de passos unilaterais que, apesar de tudo, deram importantes frutos. Demasiado importantes para serem jogados fora."

Ora,

1) o documento foi assinado pelo Hamas uns dias antes do soldado ser raptado, e durante esse tempo não se ouviu nenhum comentário do governo de Israel;

2) é óbvio que Israel "se deixou cair" na armadilha radical criada pelo sequestro do soldado israelita, porque isso é no seu interesse, senão diga-me Rui que medidas de "desanuviamento" o governo de Israel tem feito nos últimos anos, indicando a sua vontade de negociar, seja com quem fôr? Nenhuma. Israel não tem facilitado nem um pouco o trabalho de Abbas que o Rui parece ter em tão boa consideração.

Seria interessante saber o que é necessário Israel fazer para que o Rui admitisse que Israel não está interessada em assinar uma paz justa com os Palestinianos, mas sim interessada em maximizar os seus interesses, mesmo à custa de assim tornar os palestinianos em seres humanos de segunda, sem direito à auto-determinação plena. Provavelmente necessitaria de matar umas centenas ou milhares de palestinianos duma vez só e expulsar os restantes para fora das suas terras.... e mesmo assim.... porque é exactamente isso o que o Israel tem feito nas últimas décadas. Claro que diluído no tempo já não "parece" tão mau. Não dá tanto "espetáculo" como os refugiados kosovares...

E suponho então que para o Rui o realismo exige que quando se está em presença duma potência ocupante se deva ceder e parar de resistir. Ainda bem que os portugueses assim não fizeram relativamente a Espanha e a Napoleão, os franceses, ingleses e jugoslavos relativamente aos nazis, os argelinos relativamente aos franceses, os sul-africanos negros relativamente aos afrikaners, os angolanos relativamente aos portugueses... deviam ter desistido do que é justo, do seu direito à auto-determinação. Suponho que o Rui se teria sentido à vontade no regime de Vichy.... porque afinal eles é que eram os realistas à época.

Rui Fernandes disse...

Só faltava a identificação de Israel com a Alemanha nazi. Redondo.

Anónimo disse...

É, para o sr. rui fernandes só existe uma
forma de estar na vida, de cócoras perante os mais fortes.
Que subserviencia.

Rui Fernandes disse...

Eu não me importo de responder a comentários anônimos. Mas este comentário sendo apenas insultuoso não possibilita resposta, ignoro-o na impossibilidade de apagar-lo e na falta de interesse em chamar-lo de palhaço, já que seria uma obviedade.

Pedro Viana disse...

rui, essa tentativa de dar a entender que considero o governo de Israel parecido com o regime nazi é obviamente sinal de desespero. Com atitudes dessa só perde credibilidade. O que apresentei foi situações em que é habitualmente aceite que a resistência foi o caminho correcto a seguir, rejeitando acordos "realistas" que teriam impedido a auto-determinação dos povos ocupados. Estavam errados esses povos?... Dei o exemplo do regime de Vichy por ser aquele que historicamente simboliza, no passado recente da Europa, a capitulação, o colaboracionismo com o ocupante, o "realismo" da submissão ao mais forte. Repito, teria o rui apoiado o regime de Vichy?...

Mas posso lhe dizer qual é a analogia histórica mais semelhante ao conflito Israel-Palestina: o conflito afrikaners-negros na África do Sul. Hoje como então uma parte da população numa região quer segregar a outra, reduzindo os direitos da outra parte ao direito de viver em bantustões inviáveis e sem direito à auto-determinação. Devia a população negra render-se ao "realismo" e procurar quiçá apenas melhorar as sua condições de vida nos bantustões?... Pense nesta analogia. Talvez se faça luz.

Rui Fernandes disse...

Nenhuma das duas analogias é boa, pedro, e só demonstram a tua aberrante parcialidade (e desespero) na tua avaliação do conflito. Responder a qualquer uma das duas questões seria ofensivo para mim. Espero que esta resposta seja suficiente para ti.